IEDI na Imprensa - Queda na indústria, alerta no PIB
O Globo - 05/10/2016
Produção cai 3,8% em agosto, após 5 altas. Dado de setembro será crucial para economia
Daiane Costa
Com forte retração na produção de veículos e de açúcar, a indústria voltou ao vermelho em agosto, com recuo de 3,8%, anulando os ganhos acumulados nos cinco meses anteriores. Houve queda em 21 das 24 atividades pesquisadas pelo IBGE. O tombo ligou o sinal amarelo, e analistas dizem que o resultado de setembro será fundamental para definir se a recuperação foi interrompida de vez, com consequências para o desempenho da economia.
O tombo de 3,8% da indústria brasileira em agosto, acima das expectativas do mercado, acendeu um sinal de alerta sobre o desempenho do setor neste segundo semestre. Ainda que o recuo tenha sido intensificado por problemas pontuais na produção de alimentos e veículos, as taxas negativas voltaram a se disseminar pelos grandes grupos e atividades: 21 dos 24 setores registraram queda. Frente ao mesmo mês do ano passado, a queda foi de 5,2% — 30ª taxa negativa consecutiva nessa comparação. Com o tombo frente ao mês anterior, a produção industrial interrompeu cinco meses de resultados positivos consecutivos nessa comparação e anulou o ganho acumulado de 3,7%. Foi a maior retração na passagem de um mês para outro desde janeiro de 2012, quando houve queda de 4,9%. Segundo analistas, o resultado de setembro será crucial para saber se a recuperação da indústria foi realmente interrompida.
— O resultado de agosto mostra que a trajetória ascendente, dos cinco meses de alta, não era tão consistente — afirma André Macedo, gerente de Coordenação da Indústria do IBGE.
Ele ainda aponta um distanciamento grande entre o nível em que a indústria opera hoje, semelhante ao de dezembro de 2008, e o maior patamar já atingido, registrado em junho de 2013. Hoje, a indústria encontra-se 21,3% abaixo do seu pico de produção. Isso ocorre, segundo Macedo, porque o cenário recessivo não mudou.
TOMBO EM ALIMENTOS E VEÍCULOS
A consultoria Tendências, que projeta queda de 0,2% para o Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre, não reviu suas estimativas, porque já esperava um desempenho ruim da indústria em agosto — queda de 3,6%. Para setembro, a consultoria espera uma recuperação. Mas, se isso não se confirmar, o PIB pode encolher mais do que o 0,2% projetado, segundo o economista da Tendências Rafael Bacciotti. Para o ano, ele estima retração de 3,1% do PIB.
O resultado ruim de agosto foi influenciado negativamente principalmente pelos recuos de 8% nos produtos alimentícios e de 10,4% em veículos automotores, reboques e carrocerias. Bacciotti, da Tendências, observa que, mesmo sem o tombo do setor automotivo, a indústria teria recuado 2,8% em agosto.
— As influências negativas de veículos e alimentos refletem principalmente dois problemas: a paralisação mais acentuada da produção de uma montadora em razão de problemas com fornecimento de matéria prima, e problemas climáticos no CentroSul, que afetaram o processamento de canade-açúcar e, consequentemente, a produção de açúcar — explica Macedo, do IBGE, referindo-se à paralisação nas fábricas da Volkswagen em São Bernardo do Campo e Taubaté, em São Paulo, no início de agosto, voltando a operar sem setembro.
Segundo o economista Silvio Sales, da superintendência adjunta de Ciclos Econômicos do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da FGV, foi justamente o resultado da produção de alimentos que fez com que a queda de agosto fosse maior que a mediana das expectativas, de 3,1%:
— Como a indústria de veículos tem estatísticas mais avançadas, as notícias de greves e faltas de peças paralisando produções já tinham tido seus impactos projetados. O cenário dos alimentos é que surpreendeu — diz o economista, que projeta recuperação no setor de veículos em setembro.
REAL APRECIADO ELIMINA EFEITO CÂMBIO
Pelas contas de Sales, que projeta queda de 5,5% na indústria este ano, a produção industrial vai acumular, de 2014 a 2016, uma perda de 16%.
O economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), lembra que, além da demanda deprimida, pela falta de crédito e redução da massa salarial, pesa o fator câmbio. Os efeitos benéficos observados no primeiro semestre estão sendo revertidos pela apreciação do real, explica. Para o Iedi, a indústria deve cravar o terceiro ano consecutivo de retração, com queda entre 6,5% e 7%.
— Esse número (de agosto) mostra que a luz amarela acendeu. Tivemos uma estabilização da crise no primeiro semestre. Alguns setores foram beneficiados por um câmbio mais próximo de R$4, o que aumentou a sua competitividade, fazendo com que avançassem no mercado internacional. Agora, esse efeito se reverte com o câmbio mais próximo de R$ 3,20 — explica Cagnin.
Ele observa que o mercado de trabalho continua sem perspectiva de reversão do fechamento de vagas, o que impacta diretamente no segmento de bens semiduráveis e duráveis. Sem oferta de crédito e com redução da massa salarial, a demanda não reage.
— Tivemos uma melhora das expectativas dos empresários e do consumidor, mas elas precisam se reverter em realidade. Se isso não acontece, essa melhora se desfaz no ar. O setor de bens de capital, por exemplo, teve uma alta muito pequena, de 0,4%, depois de uma alta de 2,1% em julho, o que mostra enfraquecimento das indústrias que compram bens de capital — analisa Cagnin, lembrando que o nível de ociosidade da indústria atualmente está em 23,1%, enquanto a média dos últimos 13 anos foi de 18,4%, segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
O economista do Iedi diz que agora é preciso observar o desempenho da indústria no segundo semestre. Se a situação piorar, haverá mais pressão negativa sobre o PIB.
Os economistas do Santander não revisaram suas projeções para o PIB, que são de queda de 0,5% neste trimestre frente ao anterior e recuo de 3,3% no ano. Rodolfo Margato, economista do banco, explica que as estimativas já consideravam uma piora da indústria em agosto. Para os próximos meses, ele acredita que a indústria deve retomar sua trajetória de recuperação. Margato projeta crescimento de 1% em setembro — mas, no ano, a produção industrial deve encerrar com queda de 6%.
A Federação da Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) classificou o resultado de agosto de desanimador, mas espera uma melhora se o governo implementar o ajuste fiscal.
— (A recuperação) só será possível com uma retomada da economia, espalhando taxas positivas por todos os segmentos. O ambiente hoje ainda é desfavorável, mas acreditamos que, com a aprovação da PEC do teto de gastos e a reforma da Previdência, o ajuste fiscal será possível, e voltaremos a crescer — analisa o economista-chefe da Firjan, Guilherme Mercês, que projeta queda de 7,6% para a indústria este ano.
Sales lembra que as expectativas e a confiança de empresários continuam numa trajetória menos pessimista, inclusive para a indústria, por também apostarem nesse cenário melhor para a economia em 2017.