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Exame
Enquanto a economia não colabora, a queda dos juros ajuda a resolver um dos grandes problemas das empresas: O endividamento elevado.
Patricia Valle
À medida que a expectativa de recuperação da economia em 2017 vai ficando mais tímida, os empresários se preparam para um ano mais difícil do que esperavam alguns meses atrás. Com o desemprego alto - e pouca chance de diminuir tão cedo -, a confiança dos consumidores voltou a cair, o que significa menor disposição para comprar. Os bancos continuam relutantes em emprestar. Ainda assim, a maioria dos empresários está mais otimista hoje do que há um ano, e há um único motivo para isso: o corte dos juros. Ainda que nada mais melhore - a reforma da Previdência não passe, as receitas das empresas não cresçam -, a queda da inflação vem permitindo que o Banco Central, presidido por Ilan Goldfajn, reduza a taxa Selic, e isso está ajudando a resolver um dos grandes problemas das empresas brasileiras: o endividamento elevado.
Estudos encomendados por EXAME mostram o impacto da queda dos juros nos resultados financeiros das maiores companhias do pais.
Segundo levantamento do economista Rafael Cagnin do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, feito com 294 empresas abertas, o valor que elas geraram de caixa em 2016 era suficiente para pagar apenas 80% dos juros de suas dividas, em média. Hoje, a geração de caixa é 20% superior às despesas com juros. Uma pesquisa do professor Marcos Piellusch, coordenador do curso de finanças da Fundação Instituto de Administração, feita com 251 empresas de capital aberto, detalha esse resultado. De acordo com ele, em 2016, 30% dessas empresas usavam todo o caixa para pagar juros; hoje, são 26%. Ao mesmo tempo, o total de empresas que pagam os juros com sobra de caixa subiu de 50% para 53%. Ainda há um percentual signíficativo de empresas, 20% do total, que não geram caixa. Analistas acreditam que isso possa melhorar ao longo do ano. Segundo a agência de avaliação de risco Fitch, se os juros continuarem caindo e chegarem a 8% em dezembro, como previsto pela maioria dos analistas, o custo médio de captação de recursos pelas empresas deve ficar em torno de 12% neste ano - em 2016, ficou em 20%. Com essa redução, as despesas financeiras devem consumir de 44% a 48% da geração de caixa das companhias - mesmo que os resultados não melhorem. Não é pouco, mas é um percentual bem menor do que os 80% do ano
passado. "É possivel que muitas empresas não consigam aumentar o faturamento neste ano, mas, com a queda dos juros, podem não usar toda a receita só para pagar juros”, diz Ricardo Carvalho, diretor da Fitch.
A redução dos juros abre espaço para outra estratégia que deve contribuir para reduzir o endividamento das empresas: captar recursos em condições mais favoráveis para rolar dívidas antigas e mais caras. As companhias têm recorrido principalmente à emissão de títulos de divida, aqui e no exterior, para fazer isso. Foi o que fez a usina de açúcar e álcool São Martinho. A empresa concluiu duas captações de recursos no último ano: uma de 300 milhões de reais em julho de 2016, pagando 99% do CDI, e outra de 500 milhões de reais em março de 2017, pagando 96% do CDI numa parcela e inflação mais 5% em outra parcela.
Com isso, conseguiu abater dívidas antigas, mais caras, e também atrelar 40% do endividamento ao CDI. "Estar atrelado ao CDI num momento de redução de juros é bastante vantajoso.
Sempre que a Selic diminui, nosso custo financeiro cai junto", diz Felipe Vicchiato, diretor financeiro da São Martinho. A empresa consegue levantar recursos pagando menos do que o CDI porque se financia por meio da emissão de títulos isentos de imposto de renda, os Certificados de Recebiveis Agrícolas (CRAs). É a mesma situação de outra produtora de açúcar e etanol, a Raizen, mas a estratégia da empresa é também diversificar as fontes de financiamento. Além de um CRA de 970 milhões de reais, emitiu neste ano um título de 500 milhões de dólares no exterior. “Como o cenário está muito volátil, não queremos depender excessivamente de um mercado”, diz Guilherme Cerqueira, vice-presidente de finanças da Raizen.
Com o alívio dado pela queda dos juros no caixa das empresas, mais investidores têm se sentido confortáveis para comprar títulos de dívida. As enússões desses papéis, aqui e no exterior, aumentaram 19% no primeiro semestre, para 91,3 bilhões de reais. A varejista Lojas Americanas, que pretendia captar 1 bilhão de reais para alongar o prazo de sua dívida no começo do ano, acabou conseguindo 1,5 bilhão de reais em maio. A rede de
eletroeletrônicos Magazine Luiza captou 200 milhões de reais no começo do ano pagando de 109% a 112% do CDI, dependendo do prazo de vencimento dos papéis, que variou de um a dois anos. Deve captar mais 300 milhões de reais em agosto pagando 113,5% do CDI por um prazo de três anos. Em 2016, pagou 125% do CDI por um título que venceria em dois anos. "Temos condições melhores no mercado de capitais do que nos bancos atualmente”, diz Roberto Rodrigues, diretor financeiro do Magazine Luiza.
Além de emprestar menos, os bancos estão cobrando caro - enquanto a taxa Selic diminuiu 5 pontos percentuais de agosto a junho, os juros médios para as empresas baixaram 3,3 pontos percentuais. Executivos de bancos dizem que o risco de não receber o dinheiro de volta contínua alto em razão da crise, o que justifica o crédito mais caro e escasso. A concessão de empréstimos bancários caiu 8% no primeiro semestre, e a contração foi ainda maior nos bancos públicos.
No BNDES, presidido desde maio pelo economista Paulo Rabello de Castro, a queda foi de 50% do primeiro semestre de 2015 para este último, e tudo indica que o crédito de longo prazo do banco estatal ficará mais caro.
Está em discussão no Congresso um projeto para fazer com que os juros acompanhem a taxa dos títulos públicos atrelados à inflação com vencimento em cinco anos, que hoje é o IPCA mais cerca de 5% ao ano. Atualmente, o banco cobra 7% ao ano, menos do que a taxa Selic, o que exige que os empréstimos sejam subsidiados.
“Os bancos não serão mais os grandes financiadores de projetos de longo prazo no Brasil. Incentivamos as empresas a ir ao mercado de capitais", diz Alberto Fernandes, vice-presidente executivo do banco Itaú BBA.
O momento também tem se mostra do favorável para as aberturas de capital. Houve sete ofertas de ações neste ano - e, até o fechamento desta edição, mais duas empresas haviam informado ao mercado a decisão de abrir o capital, entre elas a fabricante de alimentos Camil. “As janelas abrem e fecham, mas é importante estar preparado para capturar as oportunidades", diz John Rodgerson, presidente da companhia aérea Azul, que, depois de anos de preparação, fez sua oferta inicial de ações em abril e captou 2 bilhões de reais. “A inflação e os juros, fundamentos importantes da economia, estão melhorando apesar da crise política. Isso atrai investidores para a bolsa brasileira”, diz André Rosenblít, diretor de renda variável do banco Santander. Quem ainda não sentiu os efeitos dessa melhora foram as empresas de menor porte, que não têm acesso ao mercado de capitais para emitir títulos, muito menos ações. Para elas, que dependem de uma recuperação mais sólida da economia e de financiamento bancário para sair do sufoco, a crise continua dramática.