Análise IEDI
O quadro setorial da crise do crédito
O mercado de crédito em agosto manteve sua tendência contracionista, segundo os dados do BC divulgados hoje. As concessões totais, em termos reais, caíram 4,1% frente a agosto do ano passado. Com isso, no acumulado dos oito meses de 2016 a retração já atinge 8,3%. Vale lembrar que para no ano de 2015 como um todo as concessões reais tinham caído 3,6%, o que revela que a crise de crédito se desenvolve no corrente ano com maior gravidade do que no ano passado.
As taxas de juros dos empréstimos, por sua vez, continuam em elevação, ainda que em um ritmo menos acelerado depois do último mês de maio. Entre julho e agosto, os juros médios para o total das concessões ficaram praticamente estáveis em termos nominais, mas em um patamar muito elevado. Passaram de 33,0% a.a. para 32,9% a.a.. Quanto à inadimplência, em agosto de 2016, correspondeu a 3,6% do total do crédito, o mesmo patamar de verificado em julho.
Esse quadro complicado do crédito no país não tem poupado praticamente nenhum setor da economia. O crédito à indústria de transformação chama atenção não apenas pela intensidade da retração, mas também pela rapidez de sua piora. E isso a despeito de o BC acompanhar o crédito setorial por meio da evolução dos estoques e não das concessões, o que tende a amortecer os movimentos de queda ou de alta.
Em seis meses, a retração do estoque de crédito à indústria de transformação saiu de -0,2% em março de 2016, quando caiu pela primeira vez no período recente, para -6,8% em agosto, sempre frente ao mesmo mês do ano anterior. Essa é mais uma evidência da gravidade da crise por que passa a indústria nacional.
O setor de transportes, que reflete muito o nível de atividade da economia, também apresentou rápida contração de seu estoque de crédito, passando, em termos reais, de uma queda de -0,3% em maio para uma -7,5% em agosto frente ao mesmo mês do ano anterior.
Outros setores cujo estoque de crédito vem caindo há mais tempo, mas que também atingiram um patamar expressivo de retração em agosto foram o comércio, a indústria de construção e o setor de outros serviços, que nas estatísticas do BC é aquele que exclui as atividades de comércio, transporte e administração pública.
No caso de comércio, o estoque de crédito cai, em termos reais, desde novembro de 2015 (-0,6%) e atingiu o percentual de -8,9% em agosto, frente ao mesmo período do ano anterior. Já o estoque de crédito da construção civil, que apresentou queda de 9,5% em agosto, está em contração sistemática desde outubro do ano passado (-0,9%).
Também vem em declínio há muitos meses o crédito aos serviços propriamente ditos, que o BC classifica de outros serviços exceto comércio, transporte e administração pública. O estoque de crédito a esses serviços apresenta taxas negativas desde janeiro de 2015 na comparação com o mesmo mês do ano anterior, à exceção do primeiro quadrimestre de 2016 quando voltou a crescer marginalmente. Em agosto, a queda chegou a -5,0%.
Nesse panorama, que evidencia não só a gravidade da crise de crédito pela qual passa a economia brasileira, mas também sua abrangência setorial, os setores que apresentaram aumento real do estoque de crédito em agosto foram serviços de administração pública (+10,4%) e serviços industriais de utilidade pública (+3,3%). O estoque de crédito às pessoas físicas, modalidade que confere maior rentabilidade aos bancos, também cresceu: +3,8% em termos reais frente ao mesmo período do ano passado, ainda que sua trajetória seja de desaceleração.
Resultados Gerais. Os dados de crédito, divulgados hoje pelo Banco Central, indicaram que o saldo das operações alcançou R$3.115 bilhões em agosto, que corresponde a uma participação no PIB de 51,1%. As operações de crédito realizadas a partir de recursos livres responderam por 25,4% do PIB e a parcela com recursos direcionados, por 25,7% do PIB.
A carteira de crédito com recursos livres atingiu R$1.550 bilhões, o que representou uma retração de 0,3% frente ao mês anterior, em termos nominais. Em relação ao mesmo mês do ano anterior, a retração nominal foi de 3,2%. O valor destas operações realizadas junto a pessoas físicas correspondeu a R$803 bilhões, queda nominal de 0,6% frente ao mesmo mês do ano anterior. Já o valor das operações junto a pessoas jurídicas alcançou R$747 bilhões, uma diminuição de 7,3% frente a agosto de 2015.
O estoque de crédito com recursos direcionados atingiu em agosto R$1.565 bilhões, o que representou, em termos nominais, expansão de 0,2% frente ao mês anterior e expansão de 2,0% frente a agosto de 2015. O saldo referente a pessoas físicas foi de R$736 bilhões (aumento nominal de 7,5% sobre o mesmo mês do ano anterior), enquanto que, para pessoas jurídicas, foi de R$828 bilhões (2,8% menor do que o mês de julho de 2015).
No mês de agosto foram concedidos R$ 280,8 bilhões em novas operações de crédito, frente a R$ 292,9 bilhões no mesmo mês do ano passado, uma variação real negativa de 4,1%. Deste volume, R$ 249,6 bilhões foram originados de recursos livres (redução de 2,9% frente ao mesmo mês do ano anterior), sendo que 59,3% em operações junto a pessoas físicas e 40,7 % para a pessoas jurídicas.
Dentre as concessões de crédito às pessoas físicas a partir de recursos livres, destacaram-se as operações de cartão de crédito (R$ 90,4 bilhões), cheque especial (R$ 31,2bilhões) e crédito pessoal (R$ 18,0 bilhões). Junto às empresas, as principais modalidades foram cheque especial (R$ 19,4 bilhões), conta garantida (R$ 18,8 bilhões), capital de giro (R$ 13,9 bilhões) e desconto de duplicatas (R$ 9,9 bilhões).
Quanto às concessões com recursos direcionados, a variação real foi de -13,56% frente a agosto de 2015, atingindo R$ 31,0 bilhões. Deste montante, 49,5% foram destinados como crédito às famílias e 50,5% destinados a pessoas jurídicas.
Nas novas concessões de crédito realizadas com recursos direcionados destacaram-se, para pessoas físicas, as modalidades de crédito rural (R$ 6,4 bilhões) e financiamento imobiliário (R$ 7,6 bilhões). Para as empresas, as principais modalidades foram crédito rural (R$ 6,2 bilhões), BNDES (R$ 5,9 bilhões) e financiamentos imobiliários (R$ 2,5 bilhões).
Setores. Do saldo total de crédito do sistema financeiro nacional, a carteira de operações para indústria alcançou R$ 777,4 bilhões, o que representa uma retração nominal de 4,5% frente a agosto de 2015. No caso da indústria de transformação, a redução do saldo nominal de crédito foi de 6,8% nesta mesma comparação, atingindo o valor de R$ 431,4 bilhões. O setor agropecuário respondeu por R$ 23,6 bilhões do montante, valor 4,9% menor, em termos nominais, do que o registrado em agosto de 2015. O saldo do setor de serviços foi de R$ 740,2 bilhões, redução nominal de 4,8% em relação ao mesmo mês do ano anterior.
Juros e Inadimplência. A taxa média de juros total atingiu 32,9% a.a. em agosto. Nas operações originadas a partir de recursos livres, a taxa média foi de 53% a.a. (avanço de 7,6 p.p. em relação a agosto de 2015): 71,9% para pessoas físicas e 30,7% para pessoas jurídicas. Já no âmbito das operações de crédito oriundo de recursos direcionados, a taxa média foi de 11,3 % a.a. (aumento de 1,1 p.p. frente ao mesmo mês do ano passado): média de 10,4% para pessoas físicas e 12,3% para pessoas jurídicas.
A inadimplência total de agosto fica estável em 3,6%, um aumento de 0,5 p.p. em relação a agosto passado. Nas operações feitas com recursos livres, a taxa de inadimplência média registrada foi de 5,7% (estável frente a julho de 2016): 6,2% para pessoas físicas e 5,2% para pessoas jurídicas. Para os contratos feitos com recursos direcionados, a taxa média foi de 1,5 (variação de 0,1 p.p. frente ao mês anterior) %: 1,8% para as famílias e 1,3% para empresas.