Análise IEDI
Um triênio devastador (2014-2016)
A indústria brasileira completou três anos seguidos de uma crise sem precedentes em sua história recente. É verdade que há décadas o setor vem sendo obrigado a lidar com um ambiente pouco propício a suas atividades – com uma das maiores taxas de juros do mundo, câmbio geralmente apreciado e sempre muito volátil, infraestrutura deficiente, estrutura tributária complexa e demais fatores que compõem o elevado Custo Brasil – mas desde 2014 passa por um período de devastação.
O declínio da produção industrial entre 2014 e 2016 chegou a 17% na indústria geral e a quase 20% na indústria de transformações. Apesar de já muito elevados, esses patamares de queda não ilustram bem o quadro completo. Há ramos industriais em que a destruição de produção foi muito além disso, ultrapassando largamente a marca de -50% no período. É o que mostra o levantamento que fizemos do desempenho de 96 ramos da indústria de transformação no último triênio, segundo os dados do IBGE.
Denominamos esses casos de “fulminante”, na tentativa de expressar propriamente o que tem significado a crise recente para esses ramos e a urgência com que precisam encontrar uma luz no fim do túnel. De qualquer forma, trata-se apenas de uma nomenclatura, pois a realidade é muito próxima da crise de outros setores que classificamos como “grave” ou “intensa”.
Do total de 96 ramos pesquisados, 8 apresentaram quedas acumuladas no último triênio entre -50% e -66%. São resultados assustadores, atingindo especialmente bens voltados a investimentos produzidos pela indústria automobilística, tais como ônibus e caminhões (-64%) e cabines, carrocerias e reboques (-66%), mas também alguns bens de consumo duráveis (equipamentos de informática e periféricos: -53%) e outros bens de capital (estruturas metálicas e caldeiraria pesada: -50%).
Isto é, a crise atinge com mais força aqueles ramos cujo desempenho exigem confiança e perspectivas favoráveis para o futuro, para os quais o nível das taxas de juros e a disponibilidade de crédito são cruciais. Este também é o perfil preponderante dos ramos cujas perdas foram consideradas graves e intensas: entre -15% e -47% no acumulado de 2014-2016. Ao todo foram 46 ramos ou 48% do total que apresentaram quedas neste nível, incluindo a produção de automóveis (-40%), móveis (-29%), cimento (-25%), motores, bombas, compressores e equipamentos de transmissão (-16%) e calçados (-15%).
Muitos ramos da indústria de bens intermediários e de bens de consumo não duráveis, geralmente aqueles que conseguiram adiar suas perdas, caindo só depois de 2015, tiveram uma crise que poderia ser classificada como “moderada” ou “fraca” em comparação com os resultados dos demais ramos. No triênio em questão, cerca de 37% dos ramos pesquisados (isto é, 36 deles) caíram entre -2% e -13% e compuseram estes grupos. Foram os casos de gases industriais (-13%), químicos inorgânicos (-8%), bebidas alcoólicas (-5%) e metais não ferrosos (-5%), entre outros.
Pouquíssimos foram os ramos que obtiveram crescimento da produção quando tomado o período 2014 a 2016 como um todo. Estes casos “sem crise” compreendem sobretudo ramos com boa competitividade internacional e, por isso, podem ter compensado, ao menos parcialmente, a queda da demanda doméstica por meio do aumento de exportações. Estão aqui, por exemplo, a fabricação e refino de açúcar (+2%) e a produção de celulose (+19%). Vale notar, contudo, que nenhum desses ramos passaram completamente ilesos da crise, apresentando queda de produção em um ou dois anos.
A boa notícia é que, ao menos, para a maioria dos 96 ramos o ano de 2016 não foi tão ruim quanto 2015. Em mais de 62% deles (60 ramos), o patamar de queda se reduziu muito de um ano para outro ou até voltaram a apresentar resultado positivo. Dentre estes 60 ramos, por sua vez, para 42, ou 70%, o desempenho do último trimestre de 2016 frente a igual período do ano anterior foi melhor do que aquele de 2016 como um todo, o que traz um viés positivo para o início de 2017.
É nos ramos que enfrentaram o pior quadro nos últimos três anos (crise fulminante, grave e intensa) que avolumam a lista daqueles com melhores perspectivas, devido a uma base de comparação extremamente baixa. Cerca de 72% desses ramos (39 de 54) apresentaram um viés de alta no final de 2016. Dado que muitos deles, como vimos anteriormente, são bens de capital e bens de consumo duráveis, a queda mais intensa da taxa básica de juros (Selic), ao ser repassada aos juros dos empréstimos, pode potencializar essa trajetória de superação da crise.
Mas nem tudo são boas notícias. Dentre os poucos setores classificados como “sem crise”, a maioria terminou 2016 com um viés de baixa: 4 de 6 ramos ou 67%. Como muitos deles são exportadores, é bem provável que a tendência de apreciação da taxa de câmbio, depois do início do ano passado, e o recente aumento da volatilidade venham criando dificuldades às suas atividades.