Análise IEDI
Uma melhora no crédito às famílias
A situação do crédito no país parece esboçar alguma reação no primeiro trimestre de 2017, embora este movimento seja muito desigual entre as diferentes modalidades de crédito. O resultado geral foi um declínio, em termos reais, de apenas 0,6% das concessões totais frente ao primeiro trimestre de 2016, o que representa um patamar significativamente menor do que aquele do ano passado, quando oscilava entre -10% e -14%.
Foram as concessões de crédito às famílias que despontaram neste começo de ano, obtendo uma alta de 7,0%, em termos reais, na comparação com o primeiro trimestre do ano anterior, devido especialmente ao crédito consignado, cartão de crédito, financiamento da aquisição de veículos e de imóveis. Com isso, as concessões cujos termos são livremente pactuados entre as partes (crédito com recursos livre) avançaram 7,0% e aquelas do crédito direcionado, 6,2% frente a igual trimestre de 2016.
Seguem abaixo as trajetórias recentes do crédito total, às empresas e às famílias, a partir das variações trimestrais, em termos reais, frente ao mesmo período do ano anterior:
• Total geral: -12,3% no 2º trim. 2016; -13,5% no 3° trim. 2016; -10,8% no 4º trim. 2016 e, agora, -0,6% no 1º trim. 2017;
• Pessoa física total: -10,9%; -11,0%; -5,4% e +7,0%;
• Pessoa Jurídica total: -13,9%; -16,3%; -16,6% e -9,3, respectivamente;
• Total recursos livres: -11,7%; -12,3%; -9,7% e +0,1%;
• Pessoa física recursos livres: -11,5%; -9,8%; -5,9% e +7,0%, respectivamente.
• Pessoa jurídica recursos livres: -11,9%; -15,2%; -14,0% e -8,0%;
A retomada do crédito às famílias parece ter chegado, mas custou muito para isso, já que o persistente, embora moderado, recuo da inadimplência já vinha autorizando nos últimos meses uma melhora do seu acesso ao crédito. Nesse sentido, a reação que vimos neste primeiro trimestre de 2017 poderia ter sido maior se os spreads e os juros cobrados pelos financiadores não tivessem subido.
Cabe observar que, em termos médios, a inadimplência do crédito às famílias caiu de 4,3% para 4,0% do primeiro trimestre de 2016 para o primeiro de 2017, enquanto os spreads subiram 29,3 p.p. para 33,3 e os juros nominais de 40,3% para 41,7% no mesmo período. E isso a despeito da redução mais intensa da taxa básica de juros desde o final de 2016, o que reduz o custo de captação dos credores.
Se o crédito às famílias voltou a crescer, as concessões totais permanecem no negativo devido à retração do crédito das empresas, que, em termos reais, já dura dez trimestres consecutivos. Neste início de 2017, as concessões às empresas tiveram uma queda real de 9,3% frente ao primeiro trimestre de 2016. Esse resultado traz uma moderação se comparada com a intensidade das quedas dos dois últimos trimestres de 2016, da ordem de -16%, mas ainda deixa muito a desejar.
No caso do crédito corporativo, mesmo as modalidades supostamente menos pró-cíclicas, como o crédito direcionado, não têm se comportado desta maneira. No primeiro trimestre de 2017, a queda real das concessões de crédito direcionado às empresas chegou a -21,1%, enquanto a do crédito livre ficou em -8,0%, frente a igual período do ano anterior.
Dessa maneira, o processo de recomposição das condições de crédito das empresas estaria mais avançado se as agências públicas de financiamento, especialmente o BNDES, não tivessem suas operações tão restringidas e se o Banco Central tivesse sinalizado com uma redução da Selic há mais tempo ou que tivesse acompanhado mais rapidamente a convergência das expectativas inflacionárias à meta almejada.
Em síntese, depois de um longo período de forte contração, começa a haver uma luz no fim do túnel para o crédito. O processo de melhora ainda é muito parcial e já poderia estar em estágio mais avançado se o comportamento dos financiadores e as decisões de política econômica atuassem mais em prol a uma retomada do crédito, com desdobramentos positivos sobre o nível geral de atividade econômica.
Segundo os dados de crédito para março, divulgados hoje pelo Banco Central, o valor do saldo das operações foi de R$ 3.077 bilhões, correspondente a uma participação no PIB de 48,6%. Sendo a parcela das operações de crédito realizadas a partir de recursos livres de 24,3% do PIB e a de recursos direcionados, de 24,4%.
A carteira de crédito com recursos livres atingiu R$ 1.535 bilhões, uma expansão de 0,3% frente ao mês anterior em termos nominais. Em relação ao mesmo mês de 2017, a queda nominal foi de 3,6%. O valor destas operações realizadas junto a pessoas físicas foi de R$ 810 bilhões, elevação nominal de 0,6% em relação ao mês anterior e de 1,1% frente ao mesmo mês de 2016. Já o valor das operações com recursos livres junto a pessoas jurídicas alcançou R$ 725 bilhões, crescimento de 0,1% frente a fevereiro e queda de 8,4% em relação a março do ano passado.
O valor do estoque de crédito com recursos direcionados em março foi de R$ 1.542 bilhões, aumento de 0,1% frente a fevereiro e queda de 1,7% em doze meses, ainda em termos nominais. O saldo referente a pessoas físicas foi de R$ 767 bilhões, representando crescimento de 0,7% frente ao mês imediatamente anterior, enquanto que o saldo relativo a pessoas jurídicas foi de R$ 775 bilhões, recuo de 0,5% na mesma base de comparação.
No mês de março foram concedidos R$ 286,6 bilhões em novas operações de crédito, frente a R$ 276,2 bilhões no mesmo mês do ano passado, uma variação positiva de 3,8% no período. Deste volume, R$ 261,7 bilhões foram originados de recursos livres (expansão de 5,8% frente ao mesmo mês do ano anterior).
Dentre as concessões de crédito às pessoas físicas a partir de recursos livres, destacaram-se as operações de crédito rotativo (R$ 116,2 bilhões), cartão de crédito (R$ 84,7 bilhões) e cheque especial (R$ 34,2 bilhões). Junto às empresas, as principais modalidades foram cheque especial (R$ 19,4 bilhões), conta garantida (R$ 18,7 bilhões), desconto de duplicatas (R$ 16,5 bilhões) e capital de giro (R$ 16,0 bilhões).
Quanto às concessões com recursos direcionados, a variação foi de -14,5% frente a março de 2016, atingindo R$ 24,8 bilhões.
Nas novas concessões de crédito realizadas com recursos direcionados destacaram-se, para pessoas físicas, as modalidades de financiamento imobiliário (R$ 6,9 bilhões) e crédito rural (R$ 5,8 bilhões). Para as empresas, as principais modalidades foram crédito rural (R$ 4,3 bilhões) e BNDES (R$ 4,3 bilhões).
Setores. Do saldo total de crédito do sistema financeiro nacional, a carteira de operações para a indústria registrou R$ 729 bilhões, um valor nominal 0,3% inferior ao de fevereiro de 2017. No caso da indústria de transformação, a retração do saldo nominal de crédito foi de 0,2% nesta mesma comparação, resultando em um montante de R$ 397,6 bilhões. O saldo do setor de serviços foi de R$ 718 bilhões, equivalente a uma redução nominal de 0,2% em relação ao mês imediatamente anterior, sendo que comércio e transportes tiveram quedas de 0,3% e 1,0%, respectivamente. O setor agropecuário respondeu por R$ 22,4 bilhões do montante, valor 7,9% menor, em termos nominais, do que o observado em março de 2016.
Juros e Inadimplência. A taxa média de juros total chegou a 32,2% a.a. em março. Nas operações originadas a partir de recursos livres, a taxa média foi de 52,5% a.a. (recuo de 0,9 p.p. em relação a fevereiro de 2017), sendo de 72,7% para pessoas físicas e de 27,5% para pessoas jurídicas. Já no âmbito das operações de crédito oriundo de recursos direcionados, a taxa média foi de 10,5% a.a. (elevação de 0,6 p.p. frente ao mês anterior), sendo de 9,6% para pessoas físicas e de 11,7% para pessoas jurídicas.
A inadimplência total de março, de 3,8%, ficou estável em relação a fevereiro e teve leve alta de 0,3 p.p. em 12 meses. Nas operações feitas com recursos livres, a taxa de inadimplência registrada foi de 5,9% para pessoas físicas e 5,6% para pessoas jurídicas. Para os contratos feitos com recursos direcionados, a taxa foi de 1,9% para as famílias e 2,0% para empresas.