Análise IEDI
Um novo modelo de financiamento do investimento no Brasil
O desenvolvimento de um novo modelo de financiamento do investimento, especialmente para projetos de infraestrutura e setores industriais mais intensivos em capital, é prioritário e urgente. O modelo de financiamento dos investimentos privados que prevaleceu nos últimos anos, com participação predominante do BNDES, apresenta profundas dificuldades de seguir operando nas mesmas bases, dada a substituição da TJLP pela TLP e a antecipação da amortização dos recursos concedidos ao BNDES pelo Tesouro.
Por essa razão, o IEDI vem divulgando estudos de pesquisadores da área, com avaliações e sugestões para que sejam acionados novos mecanismos de financiamento de médio e longo prazo e haja uma reformulação do papel do BNDES, que precisa ser mantido e revigorado para servir como importante agente de nosso desenvolvimento. Essas contribuições serão sintetizadas na Carta IEDI a ser divulgada hoje. Este é mais um trabalho que subsidiou a formulação da estratégia industrial do IEDI a ser publicada em breve.
Os estudos, cujos principais argumentos e conclusões estão aqui reunidos, compreendem: “O BNDES em uma encruzilhada: como evitar sua desmontagem” (Carta IEDI n. 828 de 30/1/18) preparado pelo economista Ernani Teixeira; “Para um novo desenvolvimento, um novo BNDES” (Carta IEDI n. 834 de 5/3/18) realizado pelo consultor do IEDI, João Furtado; “A importância do BNDES no acesso ao crédito e na produtividade das empresas brasileiras” (Análise IEDI de 1/6/18), de autoria de Filipe Sousa e Gianmarco Ottaviano; “Financiamento do investimento no Brasil e o papel do mercado de capitais” (Carta IEDI n. 850 de 6/6/18), de Carlos Rocca e “BNDES Relevante” (Carta IEDI n. 857 de 29/6/18), de João Carlos Ferraz.
Segundo Carlos Rocca, desde que se mantenha um ambiente de juros baixos, existem razões para acreditar que o mercado de capitais pode se transformar no mais destacado canal de financiamento de longo prazo da economia brasileira. O ajuste fiscal de longo prazo capaz de estabilizar e depois reduzir a carga da dívida pública é uma condição básica para isso. O autor recomenda a atuação do BNDES em sinergia com o mercado de capitais, a exemplo da subscrição e apoio à emissão de debêntures como alternativa à concessão de financiamentos, compra de quotas de fundos de investimento em infraestrutura e sua atuação como “market maker” das debêntures de infraestrutura.
Sobre o BNDES, todos os estudos destacam que, mesmo na hipótese de um forte desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro, o Banco deverá continuar desempenhando papel de grande importância em várias áreas, como infraestrutura, modernização e expansão da indústria, do agronegócio e dos serviços, inovação, exportação de manufaturados e de serviços, meio ambiente e pequenas e médias empresas.
Ernani Torres ressalta que, a despeito dos reveses que nos últimos anos, a qualidade dos ativos do BNDES se manteve elevada, garantindo sua solvência e abrindo espaço para se repensar sua atuação. Neste sentido, o autor propõe:
• isenção pelo BNDES do pagamento de certos impostos e desobrigação de transferir dividendos à União, como ocorre em outros países;
• criação da Letra de Crédito de Infraestrutura, emitida com lastro em operações amparadas na Lei 12431 (debêntures incentivadas), permitindo ao BNDES concorrer na captação de recursos de longo prazo para financiar infraestrutura;
• redução do prazo de tramitação e das exigências para empresas de bom risco financeiro;
• criação de um programa de garantias firmes para a parcela das ofertas de debêntures incentivadas não atendidas pelos bancos privados;
• atuação do Banco como um importante dealer do mercado de debêntures incentivadas, promovendo a liquidez desses títulos no mercado secundário.
Os autores, a exemplo de João Furtado, advertem que certas críticas feitas ao BNDES, como a de favorecimento a grupos específicos, podem e devem ter resposta rápida, com o reforço da governança, incluindo conselhos independentes e conselheiros com mandatos definidos, impedimento de reconduções e regras de funcionamento que tornem públicas as atas das reuniões de diretoria e dos conselhos.
Para Furtado, o financiamento em condições adequadas dos esforços de capacitação tecnológica das empresas (de todos os tamanhos) deve ser uma prioridade sobre todas as demais, norteando a atuação do BNDES. Assim, a produtividade se tornaria a missão principal do Banco. O autor, entre outras medidas, sugere:
• criação da Finame Produtividade, para aquisição subsidiada de produtos e serviços promotores de produtividade empresarial e das cadeias produtivas;
• estabelecimento de um fundo de investimento em empresas de base tecnológica e inovadoras detentoras de tecnologias que possam servir para a elevação substancial da produtividade do sistema econômico;
• criação de programa de apoio à internacionalização das empresas com propósitos tecnológicos, para alcançar novas posições na cadeia de valor;
• apoio à Economia de Baixo Carbono e à transição energética.
Já o estudo de Filipe Sousa e Gianmarco Ottaviano mostra a capacidade do BNDES de mitigar as restrições de crédito impostas às empresas brasileiras do setor industrial e de alavancar a produtividade delas, embora não tenha sido capaz de conferir às empresas financiadas uma performance superior quanto à produtividade. Se for objetivo da política de desenvolvimento aumentar a produtividade da economia, o BNDES precisa privilegiar tecnologias de ponta, ou seja, as linhas de fomento do Banco deveriam apresentar parâmetros que reforçassem a adoção de tecnologias modernas.
Por fim, o trabalho de João Carlos Ferraz sustenta que o BNDES tem a forma e a função de uma instituição voltada para missões pró-desenvolvimento. Sugere que as autoridades devem avaliar se extensão dos benefícios concedidos ao BNDES são adequados a suas missões, que o escopo de suas operações continue diversificado para diluir riscos, que sua atuação anticíclica seja preservada e que o BNDES deve atuar não em oposição, mas sim em parceria com a indústria financeira local. Finalmente, é fundamental o desenvolvimento de ferramentas de avaliação de políticas.