IEDI na Imprensa - Produção industrial contraria projeções e recua em março
Valor Econômico
Estevão Taiar, Adriana Mattos e Bruno Villas Boas
A produção industrial voltou a surpreender negativamente em março, reforçando cenário de crescimento fraco da atividade no primeiro trimestre. A Pesquisa Industrial Mensal, do IBGE, teve queda de 0,1% entre fevereiro e março, com ajuste sazonal. A estimativa média de 20 instituições financeiras e consultorias era de alta de 0,5%.
Já o resultado de fevereiro foi revisado, de avanço de 0,2% para alta de 0,1%. Com isso, a produção do setor ficou estável em relação ao quarto trimestre do ano passado, feito o ajuste sazonal. "A indústria é um segmento que poderia ajudar na recuperação da atividade nesse período, mas não vai ajudar tanto", diz Flávio Serrano, economista-sênior do Haitong.
Nos cálculos de Alberto Ramos, diretor de pesquisas econômicas para a América Latina do Goldman Sachs, o resultado de março deixa herança estatística levemente negativa (-0,04%) para o segundo trimestre. Isso significa que, se a produção industrial permanecer ao longo de todo o segundo trimestre no mesmo patamar, haverá recuo de 0,04%. Para o ano a herança estatística é positiva em 1,9%.
Para Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), diversos fatores levam à "falta de oxigênio" que impede recuperação mais robusta do setor. Ele cita a eleição presidencial, a recuperação lenta do mercado de trabalho, baseada em vagas informais, a queda dos juros que ainda "chega timidamente" ao tomador final e os investimentos também em recuperação lenta, afetados pela grande capacidade ociosa e pelo caixa esvaziado do setor público.
A indústria fechou o primeiro trimestre com crescimento de 3,1% em relação ao mesmo período do ano passado. Em 12 meses encerrados em março, houve alta de 2,9%. Em relação ao mesmo mês do ano anterior, a expansão foi de 1,3%, a menor nesse tipo de comparação desde junho de 2017.
A perda de fôlego da recuperação industrial fica mais clara pela média móvel trimestral, segundo André Macedo, do IBGE. Nessa base de comparação, houve recuo de 0,7% em março e fim da sequência de elevação iniciada em maio de 2017.
Os bens intermediários, "o núcleo duro da indústria", completaram em março o terceiro mês seguido de queda na série dessazonalizada. Em relação a fevereiro, o recuo foi de 0,7%. Os bens intermediários foram o único grupo em que houve queda nesse tipo de comparação. A produção de bens de capital registrou alta de 2,1%, enquanto duráveis aumentaram 1% e semi e não duráveis avançaram 0,2%. A questão é que os intermediários respondem por 60% da produção industrial. "Os resultados positivos vêm, portanto, de uma parcela menor da industrial", afirma Macedo.
Entre os duráveis, os destaques foram automóveis e televisores. A produção de veículos automotores, reboques e carrocerias cresceu 1,8% em março, após alta de 1,2% no mês anterior. Já a produção de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos - que inclui a linha marrom, como televisores - cresceu 4,9%.
No varejo, grandes redes identificaram em março uma leve melhora não apenas na venda de televisões, mas também na demanda por móveis e eletrodomésticos como refrigeradores e micro-ondas.
No entanto, houve uma mudança de cronograma neste ano que pode ter afetado o ritmo de produção. A expectativa de um início de 2018 mais forte levou grupos como Magazine Luiza e Via Varejo a anteciparem para dezembro parte da compra da indústria que seria feita entre janeiro e fevereiro. "Isso foi feito para se preparar melhor para a demanda dos primeiros meses do ano", diz Paulo Naliato, diretor da Via Varejo.
Entre as redes ouvidas, a projeção é que a Copa eleve em até 50% a venda de televisores na comparação com o Mundial de 2014. Em relação à demanda por produtos de 'linha branca', como refrigeradores, o IBGE retrata queda na produção de janeiro a março - apenas em março, o recuo foi de 8,3%. Mas as cadeias ressaltam que o início de ano foi bom nas lojas.
A desvalorização recente do câmbio pode dar impulso à indústria por meio do aumento das exportações, diz Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados. Os principais segmentos beneficiados seriam bens de capital e duráveis, por terem maior participação nas vendas para outros países.
Novas desvalorizações, no entanto, indicariam também turbulências internas em função do processo eleitoral, o que "acabaria afetando toda a produção industrial". "Daí não tem exportação que salve", afirma Vale. A estimativa da MB Associados é de crescimento de 4% da produção industrial para este ano, mas Vale não descarta que "talvez caia para 3%".
Cagnin, do IEDI, afirma que as exportações vêm ajudando a indústria. As vendas de manufaturados ao exterior cresceram 16,5% no primeiro trimestre em relação a igual período de 2017. No último trimestre do ano passado, a alta foi de 1,9%. "A produção industrial teria desempenho ainda mais fraco se não fossem as exportações", diz.