IEDI na Imprensa - Importação da indústria cresce mesmo com dólar alto e atividade fraca
Valor Econômico
Arícia Martins
A reação da indústria de transformação perdeu fôlego no segundo trimestre, mas em ritmo insuficiente para conter a alta das importações no setor, que aceleraram no período, mesmo com o dólar mais alto. Enquanto a produção física do ramo manufatureiro avançou 1,7% de abril a junho em relação a igual período do ano anterior, as compras externas do segmento saltaram 17,7% na mesma comparação, segundo levantamento do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI). Nos primeiros três meses do ano, a produção cresceu 3,9% sobre o mesmo intervalo de 2017, ritmo também inferior ao avanço das importações, que foi de 11,8%.
Os desembarques aumentaram em todas as quatro faixas tecnológicas de acordo com os cálculos do IEDI, que levam em conta a metodologia adotada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A maior alta no segundo trimestre, de 21,4%, foi registrada na indústria de média-alta tecnologia, puxada pelas compras externas de máquinas e equipamentos mecânicos, que ficaram 33,5% maiores. Também cresceram de forma acelerada as importações veículos automotores, com expansão de 31,3%.
Segmentos que representam principalmente insumos usados no processo produtivo, como borracha e plásticos e produtos químicos, também foram mais importados de abril a junho (altas de 18,4% e 13,4%, respectivamente). Aumentaram, ainda, as importações de bens de consumo semi e não duráveis, como têxteis, couro e calçados, em que as compras do exterior avançaram 9,8% no segundo trimestre em relação ao mesmo período do ano passado.
As importações feitas pela indústria de transformação aceleraram na passagem trimestral mesmo com a taxa de câmbio menos favorável para compras no período, uma vez que o dólar subiu 17,3% ante o real do primeiro para o segundo trimestre. Como resultado das compras externas crescendo em ritmo muito acima das exportações, a balança comercial do setor manufatureiro acumulou déficit de US$ 9,4 bilhões na primeira metade do ano, bem acima do observado de janeiro a junho do ano passado (US$ 1,3 bilhão).
Rafael Cagnin, economista do IEDI, pondera que, mesmo com a rápida aceleração das importações industriais, elas estão bastante aquém do nível pré-crise. No pico da série trimestral da entidade, alcançado no segundo trimestre de 2013, as compras externas do setor ficaram em US$ 53,047 bilhões, 41,7% acima do valor registrado em igual período de 2018. Mesmo assim, comenta Cagnin, chama atenção que os desembarques sigam crescendo em ritmo muito superior ao da atividade, num contexto de retomada lenta do Produto Interno Bruto (PIB).
“Durante a crise, quando as importações caíram muito, a esperança era que a produção doméstica pudesse ocupar esse espaço perdido, mas o processo de substituição de importações acabou não ocorrendo”, diz o economista, para quem o comportamento do comércio exterior na indústria manufatureira está retornando ao padrão anterior à recessão. Isso significa saldos deficitários para o setor, com inserção no mercado internacional principalmente via importações, afirma ele.
Sócio da Barral M Jorge Consultoria e ex-secretário de Comércio Exterior, Welber Barral avalia que a taxa de câmbio ao redor de R$ 3,90 pode reduzir o ritmo de importações na média, mas não a de determinados bens industriais em que não há substitutos produzidos em território nacional. Este é o caso de boa parte dos bens intermediários. “Principalmente para insumos químicos, produtos siderúrgicos, partes e peças, o ritmo de crescimento de importações não deve arrefecer”, disse.
O acirramento da tensão comercial entre EUA e outras potências mundiais, como União Europeia e China, é outro fator que pode acelerar ainda mais o ritmo das importações industriais, observa Barral. As barreiras impostas pelo governo Donald Trump às importações de outros países tendem a causar uma sobreoferta de produtos que podem ser direcionados ao mercado brasileiro, afirmou.
Para Bruno Lavieri, da 4E Consultoria, em alguma medida a reação das importações no segmento de transformação é um bom sinal, por apontar aquecimento da atividade do setor, que depende da importação de insumos. Por outro lado, diz, as compras externas, mesmo crescendo a um ritmo de dois dígitos, ainda estão longe de recuperar o tombo registrado nos dois anos de recessão. “Isso mostra que a economia ainda está muito fraca.”
Por isso, afirma o economista, a forte alta das compras do exterior não é motivo para rever para baixo as estimativas para o saldo da balança comercial brasileira, que contam com superávit significativo para este ano. Nos cálculos da 4E, a balança será superavitária em US$ 43,5 bilhões em 2018, com expansão de 2,4% das exportações e de 16% das importações frente ao ano passado. Ainda assim, ressalta ele, as compras externas ainda fechariam o ano 27% abaixo de 2013, quando as importações atingiram o valor recorde de US$ 175 bilhões.
A trajetória de superávits mensais elevados não deve mudar, concorda Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria, para quem o saldo comercial deve ficar em US$ 57,3 bilhões este ano, projeção que contempla alta de 5,6% do valor exportado pelo país, e de 14,6% das importações. O avanço expressivo das compras internas já era esperado, na medida em que a economia retomasse o ritmo de crescimento, diz Campos Neto.