IEDI na Imprensa - Com cenário eleitoral incerto, economia fica em compasso de espera
O Globo
Chances de recuperação da atividade ficam para 2019
João Sorima Neto e Ana Paula Ribeiro
Aguardado como o momento em que a economia brasileira deslancharia, 2018 passará para a história como o ano da “paralisia”, dizem analistas. A incerteza sobre quem vai dirigir o país após a eleição leva empresas a suspenderem projetos, fundos a adiarem investimentos, consumidores a postergarem compras. Na prática, a economia anda de lado, com indicadores que alternam, a cada mês, resultados positivos e negativos.
— No fim do ano, pode até aparecer um número positivo, seja no Produto Interno Bruto (PIB) ou na indústria, mas o que importa é a qualidade dessa recuperação, sem tendência definida — diz o economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI). — O perfil está dado: será o ano em que os agentes econômicos trabalharam em compasso de espera.
Para Cagnin, a incerteza e os riscos de uma eleição presidencial indefinida foram subestimados. No início do ano, havia previsões de crescimento de até 3% do PIB. Agora, já se fala em 1%. O economista afirma que a eleição está pesando mais que o esperado porque virou uma incógnita:
— Essa incerteza sobre o que vai acontecer com a política paralisou a economia.
Investir no Brasil ficou mais arriscado. Só este ano, investidores internacionais já retiraram R$ 2,6 bilhões da Bolsa, a B3. Segundo o boletim Focus, do BC, a previsão de investimento estrangeiro direto no ano caiu de US$ 80 bilhões em janeiro para US$ 67 bilhões.
Indústria e serviços estão em queda
Em julho, a indústria caiu 0,2% em relação a junho. O varejo ampliado (que inclui veículos, autopeças e material de construção) encolheu 0,4%. E o volume de serviços prestados recuou 2,2% sobre o mês anterior. Na indústria, diz Rafael Cagnin, do IEDI, a reação talvez só venha em 2019.
— Há muita ociosidade na indústria, e a decisão de investimento exige um nível de confiança na economia muito elevado. O empresário precisa visualizar o longuíssimo prazo — diz Cagnin, lembrando que a indústria de transformação trabalha abaixo de seu o patamar histórico.
Cauteloso, consumidor não vai às compras
O consumidor perdeu a confiança para gastar desde a paralisação dos caminhoneiros em maio, e a incerteza eleitoral aprofundou esse sentimento, diz a economista especialista em varejo Isabela Tavares, da consultoria Tendências. Alimentos e remédios puxam as vendas, mas gastos com itens como roupas e sapatos estão sendo adiados.
— Eletrodomésticos, roupas e sapatos estão em compasso de espera. O brasileiro quer saber quem será o próximo presidente — afirma Isabela, observando que em maio, junho e julho o varejo acumula queda de quase 3%.
Dólar dispara com incertezas
Empresas com dívidas em dólar ou ações negociadas em Bolsa estão fora do radar dos investidores neste momento de volatilidade. A moeda americana subiu mais de 20% no ano reagindo às incertezas da eleição e ao cenário internacional. O resultado é que insumos importados sobem e pesam no bolso dos brasileiros.
— No mesmo mês, uma empresa pode estar valendo muito ou pouco na Bolsa, e a volatilidade do câmbio impede um cálculo realista do investimento. São fatores que criam uma trava aos negócios— diz o advogado Eduardo Zilberberg, do escritório Dias Carneiro.
Investidores desconfiados adiam decisões
O s fundos de private equity (que compram participações em empresas) têm R$ 36 bilhões em estoque para investir no Brasil, segundo a Associação Brasileira de Private Equity. É uma alta de R$ 5,3 bilhões no ano, o que demonstra que os investidores estão parados.
— O dólar alto deixa esse investimento mais atrativo para o estrangeiro, mas há muita volatilidade — explica Claudio Montoro, presidente do Instituto Recupera Brasil.
Até a renda fixa perdeu fôlego. Para José Eduardo Laloni, vice-presidente da Anbima, a situação só não é pior porque o segmento cresceu nos últimos anos.
Lançamentos previstos na Bolsa não saem do papel
Este ano, pelo menos onze empresas cancelaram ou adiaram abertura de capital na Bolsa de São Paulo (B3), entre elas Blau Farmacêutica, Ri Happy, a varejista Quero-Quero, e a unidade de cartões do Banrisul. No primeiro semestre, elas abandonaram seus planos devido ao cenário externo e, agora, não veem espaço para captar devido à eleição. Só em 2008, ano da crise nos EUA, houve tantas desistências: 42. Este ano, foram três IPOs, contra 20 em 2017
— Não tem muito o que fazer. São operações que dependem dessa definição — afirma o executivo de um banco de investimento.
Risco de investir no país aumenta
O cenário de paralisia econômica e a turbulência que atinge outros países emergentes, como a Argentina, aumentaram o risco de investir no Brasil, na percepção do mercado. O Credit Default Swap (CDS), espécie de seguro contra um possível calote do país, subiu de 162 pontos em janeiro para 264 pontos. O diretor de pesquisa da América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, diz que houve piora das condições financeiras nos últimos meses, com a desvalorização do câmbio, o aumento do risco-país e a elevação dos juros futuros. O quadro indica economia fraca, com ritmo lento de expansão.