IEDI na Imprensa - Crescimento de 1,1% no PIB amplia desafio de Bolsonaro na economia
Folha de São Paulo
Recuperação, que já vinha lenta, desacelera no fim do ano e deixa uma herança ruim para novo governo
Flavia Lima e Lucas Vettorazzo
O desafio econômico do governo de Jair Bolsonaro (PSL) -de transformar confiança em crescimento- ficou maior depois desta quinta-feira (28).
Oficialmente já se sabe que o país cresceu 1,1% em 2018, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Foi o mesmo crescimento registrado em 2017.
Economistas começaram 2018 esperando 3% para o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto). É fato que não foi um ano fácil. Houve alta no preço do petróleo, paralisação dos caminhoneiros, crise argentina com reflexo na indústria brasileira.
Agora, o temor dos economistas é que o ciclo de baixo crescimento contamine 2019.
Ficou claro, pelos dados divulgados, que a herança estatística é complicada. °crescimento ria atividade no último trimestre de 2018, de 0,1% sobre o período anterior, deixa um legado muito fraco.
Cálculos indicam que, se a economia se mantiver no mesmo nível em 2019, encerrará o período com expansão de apenas 0,4% -o mesmo quadro delineado entre 2017 e 2018. Além disso, a confiança oscila. Após quatro altas consecutivas, a confiança empresarial caiu em fevereiro, segundo indicador da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
Outro ponto em comum entre os períodos é que, até meados do ano passado, as previsões para o PIS de 2019 também estavam próximas de 3%. Hoje, já há quem enxergue a economia rodando abaixo de 2%.
Em termos de PIB per capita, diz a consultoria Rosenberg, o cenário é ainda pior: depois da queda de 4,4% em 2015 e de 4,1% em 2016, houve crescimento de apenas 0,3% em 2017 e mais 0,3% em 2018.
A percepção é que, mesmo com a reforma da Previdência, a economia não deve encontrar fôlego para deslanchar.
O desafio se agiganta.
“Medidas para ajudara construção poderiam ajudar já que o setor gera efeitos em cadeia, do aço ao imobiliário” Thiago Xavier, economista da Tendências Consultoria. No pis, a construção foi a única atividade a cair em 2018 (-2,5%).
Xavier porém, destaca que, do ponto de vista das despesas do governo, há quase nada a ser feito, "só melhorar os ruídos na comunicação para que a reforma seja aprovada o mais breve possível".
Além de lenta, a reação econômica segue muito dependente da demanda interna, em especial do consumo das famílias, que representa 64,3% do PIB. Se dependesse apenas da demanda interna, o PIB teria crescido 1,6% em 2018.
O setor externo, porém, acabou segurando o crescimento, com uma contribuição negativa de 0,5 ponto percentual.
O problema é que a demanda interna tem enviado sinais mistos. Enquanto o consumo das famílias cresceu 1,9% em 2018, após uma alta de 1,4% um ano antes, o consumo do governo segue bastante afetado pela crise fiscal.
O investimento, medido pela chamada formação bruta de capital fixo, também exibe sinais controversos. Subiu 4,1%, a primeira alta após quatro anos de recuos, de quase 30%.
Mas entre os componentes da alta está um elemento curioso: a expansão do transporte por apps (aplicativos).
A compra de um automóvel para esse tipo de serviço, assim como a compra de automóveis feita por locadoras, é considerada como investimento (e não consumo), diz Rebeca Palis, coordenadora de contas nacionais do IBGE.
Ocorre que ser motorista com o próprio carro cresceu como alternativa para complementar a renda de desempregados ou subempregados, movimento que tende a não ter fôlego longo para impulsionar novas aquisições.
Nessa conta, pesou também o efeito da mudança de contabilização de plataformas de petróleo muito concentrado no terceiro trimestre -o que explicaria a queda de 2,5% nos investimentos no último trimestre sobre o terceiro. Sem esse impacto contábil, os investimentos teriam crescido só 2%, diz Luana Miranda, economista da FGV.
Diante dos resultados, a economia do Brasil ainda se mantém no mesmo patamar do primeiro semestre de 2012 e 5,1% abaixo do pico alcançado no primeiro trimestre de 2014.
Há perda de qualidade da recuperação, diz o IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento industrial).
O instituto aponta que, em 2017, o PIB crescia e ganhava velocidade, saindo de uma alta de apenas 0,1% no primeiro trimestre para 2,2% no 4º trimestre. Já em 2018, o que houve foi acomodação em um nível de dinamismo baixo: o PIB cresceu 1,1% na prirneira metade do ano e 1,2% na segunda.
“A acomodação do PIB foi acompanhada da desaceleração de alguns setores, sobretudo da indústria”, diz o IEDI.
Para Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, 2019 será ano de novas e velhas turbulências. A Argentina continuará um peso, a base de crescimento se inicia fraca e o mundo não deve ajudar.
“A expectativa é de alta de 2,2%, aquém do que poderíamos alcançar, especialmente depois de uma recessão do tamanho que tivemos”, diz.
Recessão pode ter agravado crise no modelo industrial
ANÁLISE
Érica Fraga
Já soa como notícia velha dizer que a economia brasileira vai mal, que a recuperação após uma das mais severas recessões da história não engatou.
Diversos indicadores divulgados nos últimos meses indicavam que 2018 havia sido decepcionante. Os dados mais detalhados do PIB (Produto Interno Bruto) apenas corroboraram isso.
O problema maior está no que os números nos dizem sobre o futuro.
Nenhum dos recortes das contas nacionais -seja pelo lado da demanda, que inclui consumo, investimentos e exportações, seja pelo lado dos setores da economia- teve desempenho excepcional no último trimestre. Pelo contrário.
A economia terminou o ano mais fraca do que havia começado.
Entre os componentes do PIB, talvez um que mereça especial preocupação, pensando nos próximos anos, é a indústria.
Após quatro anos consecutivos de queda, o setor teve expansão pífia de 0,6% em 2018, além de ter recuado 0,3% no último trimestre do ano em relação ao período imediatamente anterior.
O patamar de produção do segmento ainda se encontra 12% abaixo do registrado antes do início da recessão, no primeiro trimestre de 2014.
Nessa mesma base de comparação, a atividade na agropecuária -apesar da estagnação registrada em 2018 - subiu 141%.
Como os anos anteriores haviam sido especialmente bons para a agricultura, talvez seja mais justo fazer essa comparação como setor de serviços. Assim corno a indústria, esse segmento também ainda não recuperou o patamar de antes da recessão.
Mas, no caso dos serviços, a diferença restante é bem menor, de 2,9%.
Outra forma de enxergar a dificuldade da indústria brasileira a sustentar uma recuperação é achar na série do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) o momento do passado em que sua produção era equivalente ao nível atual.
A resposta dos números a essa pergunta é: meados de 2009. Ou seja, nenhum progresso em quase uma década.
Imprevistos ocorridos fora da dinâmica interna da economia brasileira ajudam a ex-plicar por que o setor -que parecia estar engatando uma primeira marcha no início de 2018- sofreu novo golpe.
Paralisação dos caminhoneiros, em maio, e crise na Argentina seriam os culpados, sob essa ótica.
Sem dúvida esses dois choques tiveram grande impacto negativo.
Mas a questão que economistas começam a se perguntar é se a recessão não teria agravado um quadro pregresso de atraso industrial de reversão, agora, ainda mais difícil.
Afinal, problemas estruturais como ambiente de negócios nocivo ao empreendedorismo, carga tributária excessiva e complicada, pouco incentivo à inovação e baixa oferta de mão de obra qualificada não brotaram do nada nos últimos anos. São velhos conhecidos nossos.
O sucesso ou o fracasso do atual governo em atacá-los - além de enfrentar outros problemas, como as contas insustentáveis da Previdência- dirá se ainda há chance de modernização e crescimento industrial mais vigoroso no país nos próximos anos.
Vale acrescentar que a indústria é a principal empregadora de mão de obra formal.
Portanto, enquanto não houver uma recuperação mais robusta do setor dificilmente o emprego com carteira assinada sairá de seu persistente quadro de crise.