IEDI na Imprensa - Indústria tem menor participação da série e deve manter queda
Valor Econômico
Marta Watanabe e Thais Carrança
A indústria de transformação perdeu mais espaço no primeiro trimestre deste ano. A fatia de participação dessa indústria no PIB caiu de 11% para 10,4% do primeiro trimestre de 2018 para igual período deste ano, segundo as Contas Nacionais Trimestrais divulgadas ontem pelo IBGE.
Trata-se do menor nível da indústria manufatureira como participação no PIB da série desde que foi adotada a nova metodologia, em 1995, destaca Paulo Morceiro, pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). O segundo pior resultado, salienta, foram justamente os 11% do primeiro trimestre do ano passado.
Morceiro estima que, se nada mudar o atual cenário, a participação da indústria de transformação fechará 2019 em torno de 10,7% do PIB. Isso porque usualmente, diz, os primeiros trimestres tendem a ser mais fracos, com recuperação no terceiro trimestre. No ano passado, a participação da indústria de transformação no PIB foi de 11,3%.
Ele destaca que a indústria vem perdendo espaço no PIB desde 2017, considerando os últimos anos. Depois de avançar um pouco, de 12,2% para 12,5% do PIB de 2015 para 2016, a indústria de transformação caiu a 12,2% em 2017. 2Se nada for feito, a fatia da indústria de transformação no próximo ano ficará abaixo de dois dígitos", diz Morceiro. Ele explica que uma participação da manufatura abaixo de 10% é própria de países com indústria em estágio inicial, que atende predominantemente demanda por produtos como alimentos, vestuário e calçados.
Morceiro defende que sejam adotadas medidas contracíclicas para estímulo do consumo no curto prazo. Mesmo com a aprovação de uma reforma previdenciária robusta, o resultado começará a vir de forma lenta e deve dar resultados em dois ou três anos, acredita. "A confiança das empresas pode melhorar com a aprovação da reforma previdenciária, mas a capacidade ociosa da indústria está muito alta." Para investir de forma mais acelerada, diz ele, as empresas precisam ver o consumo reagir.
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), também defende a adoção de medidas anticíclicas. "A dicotomia que se coloca hoje entre questões conjunturais e estruturais não é útil. ", diz. É preciso, defende ele, trabalhar as duas condições simultaneamente, cuidando tanto da demanda quanto da oferta. O encaminhamento das reformas deve amenizar a oferta, mas o problema da demanda se mantém.
Além do direcionamento de receitas de privatização para a reativação de investimentos, Cagnin defende a recomposição do Reintegra, benefício fiscal que devolve ao exportador parte dos tributos pagos na cadeia de produção. Ele reconhece que há restrição fiscal, mas é preciso estabelecer medidas estratégias. "As medidas estruturais são importantes lá na frente. Mas o dia a dia de hoje não dá condições de chegar lá. O BC também poderia, segundo ele, estabelecer uma regulação para criar maior concorrência e assim permitir que os juros mais baixos cheguem ao mercado de crédito na ponta.
O volume de produção da indústria no primeiro trimestre deste ano, em valores dessazonalizados, foi o terceiro pior considerando as Contas Nacionais Trimestrais da última década, salienta Lucas Souza, economista da Tendências. O volume mais baixo do período foi o do último trimestre de 2016, e o segundo pior, do terceiro trimestre de 2017, salienta.
"O volume de produção da indústria retornou um ano e meio para trás", diz Souza. Para ele, o desempenho não está relacionado a questões pontuais, como a tragédia de Brumadinho ou a recessão argentina, que afeta a demanda pela exportação brasileira de manufaturados.
A indústria já vinha perdendo fôlego ao fim do ano passado, destaca Souza. Segundo dados do PIB divulgados ontem, a indústria como um todo recuou 0,7% no primeiro trimestre de 2019 contra o anterior, quando caiu 0,3%.
A indústria de transformação teve queda de 0,5% no primeiro trimestre. De outubro a dezembro de 2018 a queda foi de 0,9%, sempre contra o trimestre anterior e na série com ajuste sazonal.
A fraqueza da indústria, diz Souza, está muito disseminada e reflete uma queda de confiança das empresas que já se desenhava desde a segunda metade do ano passado. A falta de confiança, diz o economia, já vinha sendo sinalizada quando se colocava em perspectiva os primeiros meses do ano e se materializou. Juntaram-se a isso instabilidade cambial e lentidão da retomada da demanda, que vieram mais fortes que o esperado.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim, também acredita que o recuo da indústria de transformação e da construção civil - que caiu 2% no primeiro trimestre contra o anterior - reflete o cenário global e a piora da confiança. "Os problemas na indústria são resultado, portanto, de choques, da desaceleração global e das incertezas que abalam a confiança."
Para o segundo trimestre, diz Souza, da Tendências, espera-se uma "suave recuperação" da indústria. "Isso não significa necessariamente que o quadro vai melhorar", diz. Ele explica que a base de comparação será baixa, tanto em relação ao trimestre anterior quanto na comparação interanual, já que a produção do segundo trimestre de 2018 foi afetada pela greve dos caminhoneiros.