IEDI na Imprensa - Reformas e crédito renovam o otimismo na Indústria
Valor Econômico
Indicadores de atividade industrial ainda são negativos, mas as perspectivas para o médio e longo prazos já refletem uma melhora no ambiente de negócios
Domingos Zaparolli
Um moderado otimismo desponta da indústria após um primeiro semestre em que as atividades produtivas do setor recuaram 0,3%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “O pior já passou”, diz Marcos de Oliveira, diretor-presidente da fabricante de autopeças Iochpe-Maxion. “Estamos considerando uma pequena melhora nas vendas de aço em função da redução dos juros e de programas públicos como o Minha Casa, Minha Vida”, diz Jefferson De Paula, presidente da ArcelorMittal Brasil. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) captou uma virada no humor empresarial em julho, quando 21 de 29 segmentos industriais responderam positivamente ao Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei), o melhor resultado do ano.
Essa renovação no ânimo foi alcançada mesmo diante de indicadores negativos. A utilização da capacidade instalada (UCI) recuou 0,3 ponto percentual em junho, para 78,7%. Na comparação com junho de 2022, a queda foi de 2,4 pontos percentuais. No primeiro semestre, a indústria brasileira perdeu quatro posições no ranking global de desempenho do setor e caiu para a 66ª posição entre 112 países, com base em dados da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido).
A retomada do otimismo do industrial ocorre como consequência do avanço da reforma tributária, da proposta de um novo arcabouço fiscal e do início de uma trajetória de queda da Selic. “O industrial vive no desalento e se anima diante de qualquer indício de melhoria”, diz Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).
Para Cagnin, o crescimento efetivo da atividade industrial demandará mais do que a implementação das reformas em discussão no Congresso. O governo também precisa transformar em projetos concretos os planos já anunciados, mas não detalhados, a exemplo dos incentivos para modernização e digitalização industrial e para o desenvolvimento sustentável, como o apoio para a transformação energética e implementação das cadeias produtivas do hidrogênio verde e da energia renovável. Há a expectativa que o Minha Casa, Minha Vida (MCMV) e a volta do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) gerem encomendas em 2024. Para 2023, as projeções ainda refletem incertezas e a estagnação das atividades.
A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) reduziu de 2% para 1,5% sua previsão de crescimento para 2023 por retração nos lançamentos imobiliários. No primeiro semestre, as vendas de cimento somaram 30,3 milhões de toneladas, queda de 1,8% ante o mesmo período de 2022, de acordo com o Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC). O sindicato espera que o MCMV, que promete financiar 2 milhões de habitações até 2026, gere um incremento no consumo de cimento de 10 milhões de toneladas.
Osvaldo Ayres Filho, CEO da Votorantim Cimentos: Selic menor estimula obras — Foto: Divulgação
“A expectativa é de uma melhora para os próximos meses”, diz Osvaldo Ayres Filho, CEO global da Votorantim Cimentos. “A queda da taxa de juros gera investimentos e estimula a retomada de obras paradas e novos projetos de infraestrutura”, afirma. A companhia, cuja receita líquida cresceu 15,7% em 2022, para R$ 25,797 bilhões, já se prepara para o novo cenário e vai investir R$ 2,5 bilhões em 2023 (ante R$ 2 bilhões no ano anterior), sendo a metade no Brasil. “Nosso foco é o aumento da competitividade e o avanço na modernização de nossas fábricas para fazer frente à agenda de descarbonização de nossas atividades”, diz Ayres Filho. A empresa atua em 11 países em cinco continentes. Em novembro, concluiu a aquisição da Heidelberg Materials, na Espanha.
O setor siderúrgico espera que os próximos anos sejam melhores que 2023, quando a produção de aço bruto deve cair 5%, para 32,4 milhões de toneladas. No primeiro semestre o recuo foi de 8,9%. “As indústrias automobilística, de bens de capital e de construção civil, que respondem por 82,5% da demanda de aço, estão tendo dificuldade em retomar o crescimento”, diz De Paula. “Mas as perspectivas para o próximo ano e para o médio e longo prazos são otimistas.”
O presidente da ArcelorMittal elenca razões conjunturais e estruturais para um aumento do consumo de aço nos próximos anos. A melhoria conjuntural é esperada como resposta à queda dos juros e à reforma tributária, mas também é resultado da redução do desemprego e da recuperação da capacidade de crédito com o Desenrola, programa de renegociação de dívidas. A demanda estrutural deve ser puxada pela infraestrutura, com oportunidades em saneamento, habitação, logística e parques industriais.
“Vamos estar preparados para aproveitar essa nova onda de crescimento, estamos ampliando nossas capacidades instaladas”, diz De Paula. Os investimentos da ArcelorMittal no Brasil somam R$ 25 bilhões entre 2022 e 2025. O principal negócio, R$ 11,4 bilhões, foi a aquisição da Companhia Siderúrgica do Pecém, no Ceará, com capacidade de 3 milhões de toneladas por ano. Em 2022, antes dessa aquisição, a companhia produziu 12,7 milhões de toneladas de aço e 3,3 milhões de toneladas de minério de ferro, com receita líquida de R$ 71,6 bilhões.
Os investimentos também contemplam a ampliação e modernização das siderúrgicas de João Monlevade, Sabará (MG), Barra Mansa (RJ) e Vega (SC) e das minas do Andrade e Serra Azul (MG). A meta é somar uma capacidade de produção de 17,6 milhões de toneladas de aço em 2026.
Já a produção de veículos nos sete primeiros meses do ano, 1,31 milhão de unidades, é praticamente igual à do mesmo período de 2022, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Neste ano, as vendas internas cresceram 11,3%, para 1,22 milhão de unidades, mas as exportações caíram 10,6%. “Estamos vendo uma melhora gradual do mercado e 2024 deve ser um ano positivo”, diz Marcos de Oliveira, da Iochpe-Maxion.
Um impulso deverá vir dos caminhões, cuja produção recuou 36,2% em relação aos primeiros sete meses de 2022 – queda esperada, uma vez que frotistas anteciparam suas compras nos últimos anos para fugir dos reajustes de preços previstos para a linha 2023, em decorrência da entrada da tecnologia Euro 6 de controle de emissões de poluentes. As vendas de máquinas agrícolas, que recuaram 6,8% no primeiro semestre, também devem se recuperar com o aumento de 36% nos recursos para a aquisição de máquinas e equipamentos do Plano Safra 2023/24.
A Iochpe-Maxion, fabricante de rodas automotivas e componentes estruturais, espera ampliar as encomendas com um investimento de R$ 100 milhões em sua fábrica de Cruzeiro (SP), a partir de 2024. A companhia possui 32 fábricas em 14 países e teve faturamento de R$ 16,9 bilhões em 2022, sendo 30% na América do Sul. A capacidade instalada nas cinco fábricas do Brasil aumentou de 75% para quase 80% em 2022. Neste ano, as unidades brasileiras vão receber R$ 90 milhões para modernização e melhorias nos processos produtivos. “Vamos ganhar competitividade e reduzir em 30% nossas emissões de dióxido de carbono”, diz Oliveira. A meta é a neutralidade de emissões de CO2 até 2040.
No primeiro semestre do ano, a produção de bens de capital recuou 9,7% em relação ao mesmo período de 2022. “O otimismo com a conjuntura só vingará quando voltarem os investimentos na própria indústria”, diz Rafael Cagnin, do IEDI.
No setor de proteína animal, o excesso de oferta de aves no mercado global e as margens estreitas no negócio de bovinos nos Estados Unidos são os desafios da JBS para obter um bom desempenho em 2023. “Os números do segundo trimestre demonstram a força da nossa plataforma global e a capacidade para implementarmos as medidas operacionais necessárias para melhorar nossa performance comercial e industrial”, diz Gilberto Tomazoni, CEO global da empresa. “Estamos confiantes que encontramos o caminho de recuperação das nossas margens”, completa o executivo.