IEDI na Imprensa - Indústria de alta tecnologia tem o melhor 1º semestre desde 2021
Valor Econômico
Todos as categorias desse segmento tiveram alta na primeira metade do ano, diz IEDI
Alessandra Saraiva
Pela primeira vez em três anos, a indústria da transformação mostrou expansão no primeiro semestre em todas as categorias tecnológicas, sejam de alta tecnologia, como equipamentos de televisão; sejam de média-baixa, como produtos de metal. É o que mostrou pesquisa do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), antecipada ao Valor.
No estudo “Expansão industrial por intensidade tecnológica: da exceção à regra” foram apuradas, no primeiro semestre deste ano ante mesmo igual período do ano passado, altas nas produções da indústria de média e baixa tecnologia (3,7%); de indústria de média tecnologia (0,3%); de média-alta tecnologia (2,4%); e de alta tecnologia (1,9%). Essa expansão generalizada em todas as categorias não acontecia desde 2021 e comprova, segundo o IEDI, o atual bom momento da produção da indústria da transformação, que no ano passado caiu 1,1%.
No primeiro semestre deste ano, a produção da indústria da transformação subiu 2,7%, melhor desempenho desde 2021 (14,5%). No entanto, o cenário pode não se manter positivo assim por muito tempo, diz Rafael Cagnin, economista do IEDI responsável pelo estudo. Isso porque os próximos meses contam com novo ciclo de aperto monetário. A intenção do BC - que elevou em setembro a taxa básica de juros (Selic) em 0,25 ponto para 10,75% ao ano - é conter o aquecimento da demanda interna para limitar a alta de preços.
“A sinalização de reversão da política monetária acende a luz amarela. Porque tende a afetar principalmente as atividades mais sensíveis à taxa de juros, que são as que estão melhorando mais, que estão puxando, vamos dizer, subjacente a esse processo de dinamização maior, de aceleração da indústria”, completa Cagnin.
O economista destacou que o cenário de juros mais elevados tem como efeito colateral a redução do ritmo de encomendas à indústria, visto que inibe o consumo interno. E também eleva custo de capital para ramos industriais mais dependentes de crédito. Ao mesmo tempo, o aperto monetário ocorre em momento de câmbio mais elevado, o que deixa mais caros os insumos industriais importados.
“As indústrias de alta e média-alta [tecnologia] são as que mais devem sofrer com nova fase de alta da Selic”, alerta Cagnin. “Existem mercados que são mais sensíveis às condições de juros e crédito porque necessariamente envolvem algum tipo de financiamento.” Ele cita como exemplo os bens de capital: “Os mercados de produtos de alta e média-alta tecnologia são, na maioria, de bens duráveis, que têm tíquete médio elevado e dependem de financiamento”.
A indústria de máquinas e equipamentos encontra-se em recuperação. Cristina Zanella, diretora de Competitividade, Economia e Estatística da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), afirma que a receita do setor ainda opera em queda, embora menos intensa. Essa indústria acumulava queda de receita líquida interna de 14% no ano até agosto, para R$ 130,4 bilhões. Porém, até junho, essa queda era mais forte, de 20%. O setor deve fechar 2024 ainda no vermelho, mas com recuo menor da receita, entre 8% e 9% em 2024.
Zanella admite que a Selic maior indica desaceleração da atividade. “E isso passa por menos investimento”, disse. “O primeiro que sofre, quando isso acontece, é setor de bens de capital, a indústria de máquinas e equipamentos. No longo prazo, vamos voltar a amargar, provavelmente, números um pouco mais negativos”, afirma.
No longo prazo, vamos voltar a números um pouco mais negativos”
— Cristina Zanella
Felipe Novaes, economista da Tendências Consultoria, lembrou que a indústria de transformação opera em alta capacidade. A Fundação Getulio Vargas (FGV) registrou Nível de Utilização de Capacidade Instalada (Nuci) de 83,4% em setembro, o maior desde maio de 2022 (83,6%). Isso, em tese, exigiria maior investimento em compras de máquinas e equipamentos pela indústria. “E é justo nesse momento que vemos o mercado de crédito proibitivo”, diz. “É esse acesso a crédito que se faz mais necessário em momento de renovar maquinário, de expandir capacidade.”
Para os especialistas ouvidos pelo Valor, o efeito de juros mais elevados na indústria da transformação só será mais sentido a partir de 2025. O impacto da Selic mais alta ocorre de forma defasada, em cerca de seis a nove meses. A projeção dele é alta de 3,3% para 2024 na produção da indústria da transformação. Para 2025, a expectativa de Novaes ainda é de alta, embora mais tímida, com avanço de 2,3%.
Victor Furtado, head de Alocação da W1 Consultoria, também reconhece que 2025 “não vai ser cenário fácil” no acesso da indústria ao credito. “O BC não quer que o consumo pare, mas que seja em patamar de tranquilidade, e não cause inflação”, diz. “Mas, realmente, as empresas vão ter que ter muito jogo de cintura para conseguir manter o ritmo de crescimento.”
Furtado pondera que a continuidade do apoio de crédito do BNDES ao setor industrial será fundamental. “Mas, apesar de o repasse para indústria estar crescendo, dificilmente apenas com o BNDES teremos efeito grande de segurança.”
Erminio Lucci, CEO da BGC Liquidez, concorda. Ele lembra que existem três vias principais de acesso a capital para a indústria. Os dois primeiros - bancos públicos, como o BNDES, e bancos comerciais - são influenciados por juros de mercado. O terceiro seria pelo mercado de capitais. No entendimento dele, no caso de médias e grandes indústrias, recorrer mais a mercado de capitais pode ser a alternativa para obter recursos em meio aos juros mais altos.