IEDI na Imprensa - Relatorio da Moody's vé Brasil bem posicionado para enfrentar tarifaço
O Globo
Volume alto de reservas atenuaria impacto no pais, mas economistas citam efeitos negativos nos juros e no cambio
Vinicius Neder
As economias emergentes deverão sofrer com o tarifaço sobre importações prometido pelo governo de Donald Trump nos EUA, mas o Brasil, ao lado da Índia, esta bem posicionado para enfrentar as turbulências, sustenta um relatório da agência de classificação de risco Moody's Ratings. Segundo a análise, os dois países têm economias relativamente fechadas, voltadas para o mercado doméstico, o que ajudaria no caso, mas economistas lembram de efeitos colaterais tanto na estabilidade, com altas nos juros e no cambio, quanto em setores específicos, como a industria mais tecnológica.
Brasil e Índia têm baixa vulnerabilidade externa, pouca divida em moeda estrangeira e centenas de bilhões de dólares em reservas, afirma a Moody's no relatório. A diretora de Pesquisa Macroeconômica da agência, Madhavi Bokil, uma das autoras do trabalho, disse ao GLOBO que "ser uma economia grande e principalmente impulsionada pelo mercado interno é uma vantagem quando os fluxos de comércio global estão em risco".
PESO DAS VENDAS AOS EUA
Outro fator considerado é que as economias de Brasil e Índia dependem pouco das exportações para os EUA. Segundo levantamento da Moody's, as vendas para o mercado americano respondem por 1,7% do PIB brasileiro e por 2,1% do indiano.
Todos os países deverão experimentar uma desaceleração no crescimento econômico se os EUA levarem adiante a estratégia de redesenhar completamente o comércio global, mas as pequenas economias emergentes, que dependem da demanda e dos investimentos estrangeiros, sofrerão mais.
Essa dependência atingira em cheio também algumas economias maiores, como o México. Nas contas da Moody's, as exportações para os EUA pesam 27,3% do PIB mexicano. O pais "desempenha um papel fundamental na fabricação de automóveis, eletrônicos e bens de consumo com destino aos EUA" e terá uma freada no crescimento econômico. Tailândia e Malásia também estado na lista dos mais expostos.
Para o economista Marcos Lisboa, que foi secretario de Politica Econômica do Ministério da Fazenda no primeiro governo Lula, o peso relativamente pequeno das vendas para os EUA na economia brasileira é importante para resistir as turbulências.
Mas a economia relativamente fechada — algo frequentemente apontado por economistas como uma das causas da falta de competitividade internacional e da baixa produtividade do Brasil —é um problema.
Segundo Marcos Lisboa, economias mais fechadas sentem mais os choques externos na taxa de cambio. E isso pode resultar em mais inflação e elevação de juros.
— A nossa sorte é ter a relação com a China. A economia brasileira é muito complementar a da China, que é um mercado incrível para o Brasil — disse Lisboa.
INDUSTRIA PERDE
Por outro lado, os EUA são importantes para as exportações da industria brasileira — além de semiacabados de aço, um destaque são os avides da Embraer. Das vendas de manufatura- dos do Brasil no exterior, 22% vão para o mercado americano, disse Rafael Cagnin, diretor executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI): — Mesmo que o impacto seja mitigado, porque a economia doméstica no Brasil é muito maior do que em outros casos (de emergentes menores), isso nado quer dizer que, do ponto de vista setorial ou localizado não haja efeitos importantes. Um tarifaço
que cubra tudo não é trivial, especialmente para os ramos de maior intensidade tecnológica.
Mesmo com o Brasil bem posicionado, a mudança no comércio global proposta por Trump causara problemas para todos, disseram os economistas. Os EUA poderão entrar em recessão, arrastando a economia global, o que derrubaria cotações de commodities e afetaria o Brasil. Ou a alta da inflação americana, esperada diante do maior protecionismo, levaria o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) a subir juros, elevando as taxas mundo afora e fazendo o dólar subir.
— A teoria da dependência, da América Latina, da Cepal (uma referência aos estudos sobre desenvolvimento econômico surgidos em torno da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe das Nações Unidas) chegou aos EUA. Eles vão, agora, arcar com os problemas que temos ha muito tempo. Agora, o Brasil é uma economia muito fechada, não deveria se manifestar sobre esse tema. Para usar a linguagem atual, não temos "lugar de fala". O que o Trump esta propondo, fazemos há muito tempo —disse Lisboa.