Análise IEDI
Assimetrias no crédito
Em maio de 2018, completou-se doze meses seguidos de expansão do total das concessões reais de crédito na economia brasileira, com o que a relação crédito sobre PIB parece ter parado de cair (46,6% desde jan/18). Este é um dos principais fatores na origem da reativação da atividade econômica que temos visto desde o ano passado. É também, contudo, uma das explicações do caráter lento e descontínuo de nossa recuperação. Isso porque o crédito voltou a fluir, mas poderia estar avançando muito mais.
Neste ponto, cada vez mais, ficam nítidas importantes assimetrias no crédito. A mais flagrante delas é o comportamento do crédito direcionado, que parece ter aberto mão completamente de seu papel anticíclico. Ocioso dizer a falta que este instrumento faz para dotar de maior dinamismo o crescimento econômico, que, vale lembrar, perdeu força no primeiro trimestre de 2018, levou um tombo no final de maio, com a paralisação do transporte rodoviário, e ainda pode enfrentar um cenário de recrudescimento das incertezas devido ao processo político-eleitoral.
No momento em que nos encontramos, já seria de grande valia se o crédito direcionado parasse de se contrair. No acumulado de janeiro a maio, já descontada a inflação, suas concessões ainda registram, no entanto, queda de 4,9%, enquanto aquelas do crédito livre crescem 13,1%. São, então, as modalidades de crédito em condições livremente pactuadas entre credores e tomadores, sejam eles empresas ou famílias, as responsáveis pela alta de 11,5% das concessões totais nesta mesma comparação.
Quem está freando o funcionamento do crédito direcionado são as linhas de financiamento para as empresas, o único segmento do mercado ainda em retração, como mostram as variações interanuais das concessões reais abaixo. Neste caso, muito se deve ao encolhimento do BNDES, que se traduz em uma queda de nada menos que 19% nas concessões acumuladas nos cinco meses de 2018. Para as famílias, o crédito direcionado cresce, mas pouco e dá sinais de ter perdido força.
• Crédito livre às empresas: -6,0% em jan-mai/17 e +15,8% em jan-mai/18;
• Crédito direcionado às empresas: -15,5% e -12,7%;
• Crédito livre às famílias: -7,9% e +11,1%;
• Crédito direcionado às famílias: +4,1% e +1,2%, respectivamente.
No que diz respeito aos juros cobrados, o segmento direcionado também impõe obstáculos, notadamente no caso do financiamento às empresas. Os juros nominais médios do período de janeiro-maio deste ano para o crédito direcionado a pessoa jurídica declinaram muito pouco em relação ao patamar de igual período de 2017 e em intensidade incompatível que o recuo da inadimplência. Nesta comparação interanual, os juros ficaram apenas 7% menores, enquanto a inadimplência caiu 27% (de 2% para 1,48% da carteira).
Neste sentido, os juros dessas operações seguem outras modalidades de crédito que acompanham muito lentamente a redução da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central. Esta lentidão da redução dos juros do crédito relativamente à diminuição da inadimplência e à retração da taxa básica de juros constitui outra assimetria das mais graves que afetam atualmente o quadro do crédito e não poupa nem o crédito livre que, em tese, deveria refletir mais de perto a redução do custo do dinheiro e do risco de inadimplência.
Não custa insistir: entre setembro de 2016 e maio de 2018, a meta da taxa Selic caiu de 14,25% a.a. para 6,5% a.a., isto é, um corte superior a 50%. Já a taxa média de juros do total das operações com recursos livres (a empresas e famílias) caiu bem menos, algo como 27%, ao sair de 53,6% a.a. para 39,2% a.a., em termos nominais. No caso dos juros médios do total do crédito direcionado, o recuo foi ainda menor: -23%, ao passar de 11% a.a. para 8,5% a.a. Apesar de estar refluindo, é notável o quão mais elevado é o patamar dos juros cobrados pelas linhas com recursos livres. Depender mais dessas operações, por ora, impõe um custo bastante elevado aos tomadores.
Os dados de crédito divulgados hoje pelo Banco Central mostram que o saldo das operações alcançou R$ 3.1 trilhões em maio, crescimento de 0,5% no mês, influenciado tanto pela concessão na carteira das famílias (0,6%, para R$ 1.7 trilhão), quanto na das empresas (0,5%, para R$ 1.4 trilhão), e apresentando variação de 1,3% em comparação ao mesmo mês do ano anterior. A relação crédito/PIB ficou em 46,6%.
A carteira de crédito com recursos livres ficou em R$ 1.617 bilhões, crescimento de 1,0% em relação ao mês anterior e variação positiva de 6,2% quando comparado com maio de 2017. A parcela destas operações realizada junto a pessoas físicas foi de R$ 878,3 bilhões, crescimento de 7,8% quando comparado com o mês de maio de 2017 e aumento de 1,0% quando em relação ao mês imediatamente anterior. As operações junto a pessoas jurídicas ficaram em R$ 739.4 bilhões, apresentando crescimento de 4,4%, também na comparação com o mesmo período de 2017, e crescimento de 1,1% em relação ao mês anterior.
O estoque de crédito com recursos direcionados ficou em R$ 1.489 bilhões para maio, em termos nominais, indicando decréscimo de 3,5% frente ao mesmo mês de ano anterior e estabilidade quando comparado ao mês imediatamente anterior. O saldo referente a pessoas físicas foi de R$ 808.8 bilhões, apresentando crescimento de 4,6% frente ao mês de maio de 2017, influência destacada do financiamento imobiliário. O saldo relativo a pessoas jurídicas foi de R$ 680.5 bilhões, queda de 11,7%, aumento decorrente do crédito rural e dos financiamentos do BNDES.
Foram concedidos R$ 301.6 bilhões em novas operações de crédito no mês de maio, crescimento de 6,3% frente ao montante de R$ 283.6 bilhões observado em maio de 2017. Deste volume, R$ 274.5 bilhões foram originados de recursos livres e R$ 27.1 bilhões de recursos direcionados, o que representou, quando comparados ao mesmo mês do ano anterior, crescimento de 7,3% para recursos livres e redução de 1,8% para recursos direcionados.
Dentre as concessões de crédito às pessoas físicas a partir de recursos livres, destacaram-se as operações de crédito rotativo (R$ 115.0 bilhões), cartão de crédito (R$ 88.3 bilhões), crédito não rotativo (R$ 39.3 bilhões), cheque especial (R$ 30.6 bilhões) e crédito pessoal (R$ 24.9 bilhões). Quanto as pessoas jurídicas, as principais modalidades foram desconto de duplicatas (R$ 24.6 bilhões), cheque especial (R$ 17.0 bilhões), conta garantida (R$ 16.5 bilhões) e capital de giro (R$ 12.6 bilhões).
Nas novas concessões de crédito realizadas com recursos direcionados destacaram-se, para pessoas físicas, as modalidades de financiamento imobiliário (R$ 7.5 bilhões), crédito rural (R$ 6.7 Bilhões), microcrédito (R$ 936 milhões) e BNDES (R$ 625 milhões). Já para as empresas, as principais modalidades foram BNDES (R$ 5.7 bilhões) e Crédito Rural (R$ 4.5 bilhões).
Setores. Considerando o saldo total de crédito do sistema financeiro nacional por atividade econômica, a carteira de operações para a indústria atingiu R$ 664.0 bilhões, o que significa uma retração nominal de 8,9% frente a maio de 2017. O saldo do setor de serviços foi de R$ 707.3 bilhões, redução nominal de 0,9% em relação ao mês do ano anterior, variação positiva de 5,7% na administração pública, aumento de 1,9% em transporte e retração de 1,8% no comércio geral. Por fim, o setor agropecuário apresentou crédito de R$ 22.3 bilhões, valor 0,2% maior, em termos nominais, do que o registrado no mesmo mês de maio de 2017.
Analisando a distribuição de crédito do sistema financeiro nacional por controle de capital, temos que as instituições financeiras públicas contribuíram em R$ 1.6 trilhões, representando 53,2% do volume de crédito, as instituições financeiras privadas contribuíram com R$ 1.0 trilhão, representando 32,7% e as instituições financeiras estrangeiras contribuíram com R$ 437.3 bilhões, representando por sua vez 14,1% do crédito total no sistema financeiro.
Juros e Inadimplência. A taxa média de juros das operações contratadas em maio situou-se em 25% a.a., registrando quedas de 0,9 p.p. no mês e de 4,5 p.p. nos últimos doze meses. Excluindo-se as operações rotativas, a taxa de juros de maio atingiu 18,5% a.a. (-0,4 p.p. no mês). No crédito livre, a taxa sem rotativos recuou 0,9 p.p., situando-se em 28,9% a.a. Em maio, as principais reduções no mês foram registradas no crédito às famílias, cuja taxa média recuou 1,3 p.p., situando-se em 31,4% a.a., com destaque para as reduções nas taxas de cartão de crédito rotativo (-25 p.p.), crédito pessoal não consignado (-10,2 p.p.), cheque especial (-9,1 p.p.) e cartão de crédito parcelado (-6,4 p.p.). No crédito às empresas, a taxa média alcançou 15,8% a.a. (-0,2 p.p. mês).