O Cenário Atual do FMI
para a Economia Global em 2016 e 2017. Quatro
vezes ao ano (janeiro, abril, julho e outubro),
o Fundo Monetário Internacional (FMI)
divulga seu panorama atualizado para a atividade
econômica global. O World Economic
Outlook (WEO) de abril de 2016, recentemente
divulgado, incorporou informações
sobre a atividade econômica global no
segundo semestre de 2015 e início de
2016, que revelaram um desempenho mais fraco
do que o previsto nos dois cenários
precedentes (outubro de 2015 e janeiro de
2016).
As novas projeções do fundo
preveem uma expansão de 3,2% da economia
mundial em 2015, cifra 0,2 ponto percentual
(p.p.) inferior à divulgada na atualização
do WEO de janeiro, que também tinha
recuado 0,2 p.p frente à estimativa
de outubro (3,6%). Ou seja, o cenário
básico desse organismo multilateral
para o desempenho global sofreu duas deteriorações
sucessivas e de igual intensidade num período
de seis meses. Já o desempenho em 2015
(3,1%) confirmou a previsão das duas
edições anteriores do WEO. Com
isso, enquanto em outubro e janeiro projetava-se
uma aceleração do crescimento
em 2016 frente a 2015 (de 0,5 e 0,3 p.p.,
respectivamente) a previsão atual,
de 3,2%, sugere uma virtual estagnação.
Já para 2017, o crescimento também
foi revisto para baixo, mas em menor intensidade
(de 3,6% em janeiro para 3,5% em abril). Com
isso, a previsão de recuperação
aumentou ligeiramente (de 0,2 p.p. para 0,3
p.p frente a 2016), mas o cenário continua
sendo decepcionante. Como sintetiza o título
da publicação do FMI, o crescimento
econômico mundial está “too
slow, too long”, ou seja, muito
baixo por muito tempo. Esse diagnóstico
fica evidente na trajetória do Produto
Interno Bruto (PIB) global nos períodos
anterior e posterior à crise financeira
e à grande recessão. Na fase
de boom que a precederam (quinquênio
2003-07), a média de crescimento foi
de 5,1% e o patamar anual manteve-se acima
de 4%. Em contrapartida, na fase pós-crise
(quinquênio 2010-2015), a média
foi de 3,5%, já que, após a
retirada prematura dos estímulos fiscais,
as políticas monetárias não
convencionais foram insuficientes para manter
o maior dinamismo registrado no biênio
2010-11. A partir de 2012, a economia global
voltou a crescer num patamar inferior a 4%,
padrão que perdurará até
2017 de acordo com o cenário atual
do FMI.

O cenário mais pessimista do FMI para
2016 reflete a redução das projeções
para os dois principais grupos de economias
(“avançadas” e “emergentes
e em desenvolvimento”). As economias
avançadas devem manter o ritmo de expansão
de 2015 (1,9%), enquanto em outubro e janeiro
as previsões eram de aceleração
do crescimento (2,2% e 2,1%). Essa mudança
decorreu da revisão para baixo do desempenho
dos quatro principais países/regiões
diante da desaceleração registrada
na produção industrial e no
índice de gerente de compras (indicador
antecedente do desempenho da indústria)
a partir do terceiro trimestre do ano passado.
Nesse contexto, a deflação dos
preços das commodities se acentuou,
puxando ainda mais para baixo o patamar da
inflação nas economias avançadas.


Os Estados Unidos, que continuam liderando
a recuperação, devem manter
em 2016 o patamar de crescimento de 2015 (2,4%),
o que representou um corte de 0,4 p.p frente
à projeção de outubro
(0,2 p.p em janeiro e 0,2 p.p em abril). Já
o Reino Unido, com a segunda maior taxa de
crescimento nesse grupo, deve desacelerar
2,2% em 2015 para 1,9% em 2016 (recuo de 0,3
p.p frente às projeções
de outubro e janeiro). Para a área
do euro, em terceiro lugar no ranking de desempenho
econômico desde 2014, as expectativas
mais favoráveis no início do
ano (subjacentes ao aumento da projeção
de crescimento de 1,6% em outubro para 1,7%
em janeiro) foram parcialmente revertidas
na revisão do cenário, que projeta
agora crescimento de 1,6%, praticamente o
mesmo patamar de 2015 (1,5%). Essa redução
decorreu do corte nas projeções
de crescimento das quatro maiores economias
do bloco. Somente a Espanha continua com uma
expansão prevista maior do que no cenário
de outubro (2,6% contra 2,5%). Finalmente,
no caso do Japão, a previsão
de aceleração do crescimento
para 1% em 2016 também foi revista
e a projeção atual é
de manutenção do patamar de
expansão de 2015 (0,5%). Ou seja, a
revisão mais expressiva (-0,5 p.p)
ocorreu para a economia nipônica, que
desde 2014 ocupa a posição de
“lanterninha” nesse grupo.
Com essas mudanças, a assimetria de
crescimento entre o país com maior
dinamismo (os Estados Unidos) e as demais,
que tinha se atenuado em 2015, voltou a aumentar.
Já na região da moeda única,
a divergência nos ritmos de expansão,
que também havia diminuído no
ano passado, manteve-se praticamente estável.
No cenário atual, apenas o desempenho
da economia italiana será um pouco
melhor em 2016 na comparação
com 2015 (1,0% contra 0,8%).

Os denominadores comuns por detrás
do cenário de manutenção
do desempenho modesto nas economias avançadas
são as tendências demográficas
desfavoráveis, o baixo crescimento
da produtividade e os legados da crise financeira
global (sobretudo os níveis de endividamento
ainda elevados em alguns países e o
espectro da deflação), que continuam
dificultando uma retomada mais forte da atividade
econômica. Embora as políticas
monetárias acomodatícias (principalmente,
na área do euro e no Japão)
e o baixo preço do petróleo
favoreçam a recuperação
da demanda doméstica, ao lado da demanda
externa ainda anêmica, alguns fatores
prejudicarão a retomada, dentre os
quais:
- Apreciações cambiais verificadas entre agosto de 2015 e fevereiro de 2016 como reflexo do aumento da aversão aos riscos dos investidores globais num contexto de deterioração do desempenho das economias emergentes (questão retomada a seguir), cujas moedas se depreciaram; no caso do dólar, o movimento foi reforçado pelas expectativas de alta da taxa de juros básica pelo banco central americano (Federal Reserve - Fed), que se confirmaram em dezembro; o tão esperado início da segunda fase do processo de normalização da política monetária americana (a primeira foi a desmontagem da política de afrouxamento quantitativo) trouxe forte volatilidade aos mercados financeiros em janeiro, que, contudo, se atenuou a partir de fevereiro, refletindo-se na reversão parcial da trajetória de apreciação das moedas das economias avançadas;
- Condições financeiras ligeiramente mais restritivas associadas, por um lado, às menores expectativas de inflação na área do euro, que têm puxado para cima as taxas de juros reais; e, por outro lado, à alta dos rendimentos em alguns mercados de dívida corporativa diante dos temores de aumento da fragilidade financeira devido à combinação de baixo crescimento, deflação dos preços das commodities, regras mais rígidas de regulação financeira na União Europeia e taxas de juros baixas por um período prolongado.



Já no âmbito das economias emergentes
e em desenvolvimento, o cenário atual
do FMI prevê uma ligeira aceleração
do crescimento, dos 4% registrados em 2015
(que confirmou as projeções
de outubro e janeiro) para 4,1% em 2016, percentual
0,4 p.p inferior ao previsto em outubro. Mas,
a piora no cenário foi ligeiramente
mais intensa do que no grupo de economias
avançadas (-0,3 p.p) e também
ocorreu em duas etapas (-0,2 p.p em janeiro
e abril). Essa revisão decorreu de
dois fatores.
Em primeiro lugar, vários indicadores
divulgados após o cenário de
outubro mostraram que o impacto do novo perfil
de crescimento chinês (taxas menos elevadas
e mudança na composição
com aumento da importância do consumo
frente ao investimento e do mercado interno
frente ao externo) sobre as demais economias
desse grupo foi maior do que o então
previsto. Os principais canais de transmissão
foram a deflação dos preços
das commodities e a perda de dinamismo do
volume do comércio mundial. Devido
às características da economia
chinesa e sua inserção na divisão
internacional do trabalho (segunda maior economia
do mundo, elevada taxa de investimento, alto
conteúdo importado dos investimentos
e das exportações), sua desaceleração
teve efeitos significativos sobre o comércio
mundial mediante canais diretos (queda da
demanda por produtos dos parceiros comerciais)
e indiretos (impacto nos preços dos
produtos importados).
Em 2016, todavia, se confirmado o cenário
básico do Fundo, esses efeitos serão
um pouco menos adversos: a deflação
dos preços das commodities será
menor do que em 2015 e o volume do comércio
mundial ganhará um pouco mais de ritmo.
Em 2017, a trajetória de melhora se
reforçará: os preços
das commodities metálicas e agrícolas
registrarão ligeira deflação,
mas os preços do petróleo voltarão
a aumentar e o comercio mundial registrará
a maior taxa de crescimento desde 2012.

Em segundo lugar, as economias emergentes
e em desenvolvimento também se depararam
com uma deterioração adicional
das condições de financiamento
externo. Os ingressos de capitais para esse
grupo de países atingiram no segundo
semestre de 2015 seu menor patamar desde a
crise financeira global. Como as saídas
de capitais diminuíram em menor intensidade
que os ingressos e o saldo agregado em conta
corrente praticamente não se alterou,
a variação de reservas tornou-se
negativa para esse grupo nos últimos
dois trimestres de 2015 pela primeira vez
no período pós-crise.
Além das expectativas de alta da taxa
de juros básica dos Estados Unidos,
que se confirmaram em dezembro, contribuíram
para esse resultado a turbulência financeira
na China no terceiro trimestre do ano passado
e as incertezas sobre o impacto do novo perfil
de crescimento desse país sobre as
demais economias emergentes. Ou seja, o impacto
das mudanças na dinâmica da economia
chinesa sobre essas economias não se
restringe mais ao comércio mundial,
como observado antes da crise financeira global.
No contexto atual, essas mudanças também
se propagam por canais de transmissão
financeiros. Assim, embora pelo critério
do PIB per capita utilizado pelo FMI, a China
continue sendo um país emergente, ela
é, simultaneamente, uma economia central
na medida em que sua dinâmica afeta
decisivamente o desempenho da economia mundial
em âmbito comercial e financeiro e,
sobretudo, dos demais países emergentes
e em desenvolvimento, que continuam sendo
periféricos.

A interação desses dois fatores
comprometeu, sobretudo, as perspectivas para
a Rússia e a América Latina,
países e regiões exportadores
de commodities e dependentes de financiamento
externo. No primeiro caso, a projeção
é de uma contração de
1,8% (contra 0,6% em outubro), que, contudo,
representará uma melhora frente a 2015
(-3,7%). No segundo, o PIB deve recuar 0,5%
(frente à projeção de
uma expansão de 0,8% em outubro) sob
a influência do desempenho das duas
principais economias da região: a brasileira
(com queda estimada de 3,8% em 2016, mesmo
percentual registrado em 2015 contra as projeções
de -1% e -3,5% em outubro e janeiro, respectivamente)
e a mexicana (2,4% contra 2,8% em outubro,
o que representará uma ligeira perda
de ritmo frente ao ano passado). A boa notícia
foi o aumento da projeção para
a China: de 6,3% em outubro e janeiro para
6,5% em abril. Isso significa que, se confirmado
esse cenário, a desaceleração
frente a 2015 será um pouco menor.
No caso da Índia, a projeção
de outubro (+7,5%) foi mantida, o que representa
aceleração do crescimento frente
a 2015 e desempenho superior ao chinês
pelo segundo ano consecutivo.
Assim, as economias emergentes e em desenvolvimento
continuarão respondendo pela maior
parte do crescimento da economia global em
2016, mas agora com um menor dinamismo e maior
heterogeneidade entre os países em
relação tanto ao período
pré-crise como ao imediato pós-crise.
Vale lembrar que a retomada após a
grande recessão em 2009 foi denominada
de “double speed recovery”,
ou seja, recuperação em duas
velocidades, exatamente em função
da forte aceleração do crescimento
nesse grupo sob liderança da China.
Contudo, no segundo semestre de 2013, emergiu
um novo perfil de desempenho da atividade
econômica mundial, caracterizado pela
menor assimetria no dinamismo dos dois grupos
de países decorrente de dois movimentos
simultâneos: desaceleração
dos “emergentes e em desenvolvimento”
e aceleração dos “avançados”.
Esse perfil manteve-se no biênio 2014-
2015 e terá continuidade em 2016 no
cenário atual do FMI (2,2 p.p contra
2,1 p.p em 2015).
Já em 2017, a divergência nos
ritmos de expansão voltará a
aumentar de acordo com esse cenário
(2,6 p.p). O maior dinamismo da economia global
projetado para o próximo ano (3,5%
contra 3,2% em 2016) ancora-se, essencialmente,
na aceleração do crescimento
das economias emergentes e em desenvolvimento
já que o desempenho dos países
avançados deve permanecer modesto,
como destacado acima. As hipóteses
subjacentes a esse cenário são:
- Normalização gradual das condições macroeconômicas nas economias em situação de stress desde 2015;
- O reequilíbrio bem sucedido da economia chinesa, o que significa manutenção de taxas de crescimento elevadas, embora menores do que nas duas últimas décadas;
- Recuperação da atividade econômica nos países exportadores de commodities, embora num ritmo também mais modesto que no passado;
- Sustentação do crescimento nas demais economias emergentes e em desenvolvimento.
Contudo, a probabilidade do cenário
básico para 2016 e 2017 se confirmar
foi reduzida em comparação com
as duas edições anteriores do
WEO em função dos seguintes
riscos. No âmbito das economias avançadas,
se as tendências observadas a partir
do segundo semestre de 2015 (desaceleração
da atividade econômica, queda dos preços
dos ativos, piora nas condições
financeiras), que se atenuaram a partir de
fevereiro, ganharem força novamente,
o crescimento será ainda mais comprometido,
aumentando a possibilidade de um cenário
de estagnação e inflação
excessivamente baixa. No grupo dos países
emergentes, a situação de stress
pode aumentar. Por exemplo, uma nova onda
de depreciações cambiais pode
fragilizar ainda mais os balanços corporativos
e um declínio adicional nos ingressos
de capitais pode exigir o reforço das
políticas restritivas nos países
que já enfrentam dificuldades macroeconômicas
(caso do Brasil), o que resultará numa
contração adicional na demanda
doméstica. Nos países exportadores
de petróleo, o desempenho futuro será
prejudicado se o período de baixos
preços dessa commodity for mais prolongado
do que o atualmente projetado. E, o reequilíbrio
da economia chinesa pode ser menos suave do
que o assumido nesse cenário, com repercussões
negativas sobre a economia mundial mediante
os canais mencionados acima (comerciais e
financeiros). Finalmente, também aumentou
o risco de choques de natureza não
econômica em algumas regiões
e países (associados a conflitos geopolíticos,
terrorismo, fluxos de refugiados), que, se
não forem evitados, podem ter amplas
repercussões negativas sobre a atividade
econômica global.
Bibliografia
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