Carta IEDI
À espera de dias melhores
A contar pelo desempenho dos principais setores da economia em julho, o segundo semestre de 2018 começou com o pé esquerdo. Houve queda generalizada, chegando a -2,2% no setor de serviços, -0,4% no varejo ampliado, que inclui as vendas de automóveis, autopeças e material de construção, e -0,2% no caso da produção industrial, já descontados os efeitos sazonais.
Mesmo que, em alguma medida, estes resultados ainda possam refletir efeitos reminiscentes da paralisação dos caminhoneiros de maio, como a queda adicional de 4% dos serviços de transporte, a disseminação das variações negativas dentre os distintos ramos que compõem cada um dos grandes setores econômicos sugere causas menos pontuais que esta. Na indústria, 10 dos 26 ramos e 8 das 15 localidades pesquisadas pelo IBGE ficaram no vermelho. No comércio foram 7 de 10 ramos e no setor de serviços nada menos do que 4 dos seus 5 segmentos.
Além de fatores que há mais tempo penalizam muito a recuperação da economia, como a manutenção da taxa de desemprego em patamares elevados, a elevação da incerteza e menor confiança em decorrência da aproximação das eleições podem estar ganhando importância e minando o nível recente de atividade econômica. Indícios disto é a expressiva queda da produção industrial de bens de capital (-6,2%) e a retração da formação bruta de capital fixo calculada pelo IPEA para o mês de julho (-1,0%).
Reação econômica lenta e descontínua deve, assim, marcar também a segunda metade do ano, fazendo de 2018 um período de “espera por dias melhores”, que podem ficar só para 2019. Por ora, os avanços foram muito relativos. Em julho, o nível de produção da indústria estava 0,8% abaixo daquele registrado em dezembro do ano passado e o patamar de vendas reais do varejo apenas 0,4% acima (0,7% no conceito ampliado). No caso do setor de serviços, que ainda vive uma crise, esta comparação indicava um nível de faturamento 1,7% inferior àquele do final de 2017.
Quanto ao desempenho industrial de julho a perda mais intensa ficou a cargo de bens de capital, de -6,2% ante jun/18, com ajuste sazonal, seguida por bens de consumo duráveis (-0,4%) e bens de consumo semi e não duráveis (-0,5%), que já haviam registrado quedas importantes no segundo trimestre do ano. A exceção coube a bens intermediários, que cresceram 1%.
Regionalmente, o aspecto mais desfavorável, além do fato de que mais da metade das localidades ficou no vermelho, foi que o núcleo industrial do Sudeste, a região do país com maior renda, maior consumo e maior densidade industrial, não se saiu bem. São Paulo (-1,1%), por exemplo, caiu muito mais do que a média nacional (-0,2%) apontando para a possibilidade de registrar mais um trimestre de perdas na série com ajuste. Outros resultados negativos vieram de Rio de Janeiro (-0,3%) e Minas Gerais (-1,0%), mas também de Paraná, Mato Grosso, Goiás, Ceará e Pernambuco.
Quanto ao varejo, a situação poderia ter sido ainda mais complicada, não tivesse sido o crescimento considerável das vendas de supermercados, alimentos, bebidas e fumo (+1,7%), a melhor marca na série com ajuste sazonal desde janeiro de 2018 (+2,7%). A maioria dos seus segmentos, contudo, não teve tanta sorte, principalmente aqueles do comércio de bens duráveis ou semi duráveis, como equipamentos de escritório, informática e comunicação (-2,7%); móveis e eletrodomésticos (-4,8%); material de construção (-2,7%). Consumidores apreensivos com o futuro tradicionalmente adiam a compra desses tipos de bens.
Já no setor de serviços, além do segmento de transportes, não têm se saído bem, e não é de hoje, os serviços profissionais, administrativos e complementares (-1,1% em jul/18), demandados pelas empresas. Outro ramo que ficou no vermelho foi informação e comunicação (-2,2%), que representa uma grande fatia do total do setor. Quem conseguiu crescer a despeito de tudo foram os serviços prestados às famílias (+3,1%), a única variação positiva no setor.
Indústria
O início da segunda metade de 2018 decididamente não trouxe sinais favoráveis para o desempenho industrial. O resultado geral anunciado na semana passada acusou declínio de 0,2% em julho frente a junho, já descontados os efeitos sazonais. Ou seja, passada a volatilidade decorrente da greve dos caminhoneiros, a indústria encontrou-se novamente no negativo.
O declínio da produção foi acompanhado por 10 dos 26 ramos industriais e por 8 das 15 localidades acompanhadas pelo IBGE. Em outras palavras, embora não tenha sido intensa, a queda do começo do semestre não foi produto de fatores isolados, pois atingiu um número grande de setores e regiões.
Dentre seus macrossetores industriais, a perda mais intensa ficou a cargo de bens de capital (-6,2% ante jun/18, com ajuste sazonal), cujo desempenho pode estar refletindo a deterioração das expectativas vindas do cenário político, mas também do próprio ritmo de recuperação da indústria, que tem deixado muito a desejar.
Outros macrossetores igualmente no vermelho em julho foram bens de consumo duráveis (-0,4%) e bens de consumo semi e não duráveis (-0,5%), que já haviam registrado as quedas mais intensas no segundo trimestre do ano, de -5,6% e -3,0%, respectivamente, descontados os efeitos sazonais. Bens intermediários, por sua vez, foram a exceção: cresceram +1% frente a junho, mas isso depois de dois trimestres consecutivos de perda de produção.
A composição regional deste resultado também não foi nada reconfortante. Além de um placar pouco favorável, dado que a maioria ficou no vermelho, o mais grave é que o núcleo industrial do Sudeste, a região do país com maior renda, maior consumo e maior densidade industrial, não se saiu bem.
A trajetória de São Paulo é sintomática. Em julho, sua indústria caiu (-1,1%) muito mais do que a média nacional (-0,2%) apontando para a possibilidade de registrar mais um trimestre de perdas na série com ajuste. Vale lembrar que a indústria paulista já havia declinado -0,8% no 1º trim/18 e -1,3% no 2º trim/18, descontados os efeitos sazonais. Na comparação interanual, tampouco a indicação gera entusiasmo: +5,2% no 1º trim/18; +4,0% no 2º trim/18 e +2,8% em jul/18 contra jul/17. Ao que parece, São Paulo está perdendo vigor industrial com o avançar do ano; exatamente o oposto do desejável.
A indústria paulista, porém, não é a única a deixar a desejar, como mostram as variações frente ao período anterior com ajuste sazonal, logo abaixo. Rio de Janeiro (-0,3%) e sobretudo Minas Gerais (-1,0%) também caíram mais do que o total Brasil em julho, retomando, no caso mineiro, a sequência de resultados negativos que já vinha ocorrendo há mais tempo. Paraná, Mato Grosso, Goiás, Ceará e Pernambuco completam a lista dos desaventurados.
Em contrapartida, julho também assegurou alguns resultados promissores. Além dos estados com forte presença de ramos extrativistas, como Pará e Espírito Santo, o destaque coube ao Rio Grande do Sul, que não só conseguiu crescer +4,6% em julho frente a junho, como superou os impactos adversos vindos da greve dos caminhoneiros em maio. O nível de produção em jul/18 estava 5,4% acima daquele de abr/18, uma das melhores performances regionais nesta ótica. Cabe notar ainda que o 1º trimestre do ano havia sido positivo para a indústria gaúcha.
Outras localidades também se destacam favoravelmente, como o Amazonas, cuja queda no 2º trim/18 não foi capaz de anular o crescimento acumulado nos três primeiros meses do ano. Agora em julho, cresceu +2,5% frente a junho, com ajuste sazonal. O Nordeste também logrou ampliar produção em julho, mas foi de apenas +0,5%. Como o histórico recente da região não é dos melhores, tendo apresentado queda nos dois primeiros trimestres de 2018 e no último trimestre de 2017, é cedo para considerar esta alta uma sinalização de reação da indústria nordestina.
Comércio
A segunda metade de 2018 começou com quedas disseminadas entre os setores econômicos. O comércio varejista não escapou desde padrão e registrou, em julho, perda de 0,5% em suas vendas reais frente ao mês anterior, já descontados os efeitos sazonais. Em seu conceito ampliado, que inclui o comércio de automóveis, autopeças e material de construção, a variação foi de -0,4%.
Com isso, já são três meses consecutivos de retração do varejo restrito na margem, período no qual o nível de vendas encolheu 2,3%. Para o varejo ampliado, por sua vez, a trajetória é mas oscilante, mas o resultado é o mesmo: declínio de 3,1%. Muito dessa performance recente se deve aos impactos negativos vindos da paralisação do transporte rodoviário de carga, que levou a perdas intensas no mês de maio. Depois disso, o setor segue sem esboçar reação.
Ademais, é possível que o varejo já esteja refletindo outros fatores negativos, notadamente o aumento da incerteza decorrente do quadro político-eleitoral, que contribui para o adiamento das decisões de consumo. Tudo isso, vale frisar, em um ambiente onde o desemprego ainda é muito elevado.
Deste modo, o trimestre maio-julho devolveu quase tudo o que o setor havia conquistado deste o começo do ano. É o que sugere a comparação do nível de vendas de jul/18 com aquele de dez/17: só +0,4% para o varejo restrito e +0,7% para o varejo ampliado.
Corroborando o quadro nada favorável do comércio, a comparação interanual voltou a registrar retração em julho (-1,0%), algo que não ocorrida desde março do ano passado. No caso do varejo ampliado, a deterioração se verifica na intensidade do crescimento. O ritmo de recuperação das vendas que vinha oscilando entre 6% e 9% desde a segunda metade de 2017 caiu substancialmente, atingindo 3% em julho.
Assim, o desempenho do comércio varejista na entrada do segundo semestre não confere muito otimismo, inclusive porque 7 dos seus 10 segmentos também acabaram ficando no vermelho.
A situação poderia ter sido ainda mais complicada, não tivesse sido o crescimento considerável do segmento de supermercados, alimentos, bebidas e fumo, que atingiu +1,7% em julho, a melhor marca na série com ajuste sazonal desde janeiro de 2018 (+2,7%). Outro segmento a ficar no positivo foi o de combustível e lubrificantes, mas sua variação chegou apenas a +0,4%, depois de quedas intensas tanto em maio (-6,2%) como em junho (-1,9%).
São os ramos do comércio de bens duráveis ou semi duráveis que mais causam preocupação, tanto pela intensidade da retração das vendas em julho, como da trajetória recente e isto seja na comparação interanual, seja na série com ajuste sazonal. É o caso de tecidos, vestuário e calçados (-1,0% em jul/18 com ajuste); equipamentos de escritório, informática e comunicação (-2,7%); móveis e eletrodomésticos (-4,8%); material de construção (-2,7%); e veículos e autopeças (-0,8%).
Serviços
Se há um setor que ainda vive a recessão, este setor é o de serviços. Depois de registrar quedas por três anos seguidos, entre 2015 e 2017, o faturamento real dos serviços permanece no vermelho em 2018, ainda que sua crise venha se mostrando menos severa: -0,8% no acumulado do ano de janeiro a julho. A contar pelo início do segundo semestre, o quadro decididamente não parece estar evoluindo para melhor.
De fato, os dados divulgados pelo IBGE mostram que houve declínio de -2,2% em julho frente a junho, já descontados os efeitos sazonais, resultado de variações negativas na grande maioria dos segmentos do setor, sendo que apenas 1 dos 5 não teve perda. Este é um nível de queda dos mais intensos e o pior para um mês de julho desde o início da série em 2011. Em relação a julho de 2017, por sua vez, tampouco os serviços evitaram o pior e registraram queda de -0,3%.
Assim como em outros setores, a greve dos caminhoneiros afetou o desempenho dos serviços em maio (-3,4%, com ajuste), que se recompôs já no mês de junho (+4,8%). Por isso, a má evolução do setor não decorre apenas de tais eventos excepcionais. O nível de faturamento em jul/18 ficou 1,7% abaixo daquele de dez/17, já descontada a sazonalidade, mas a comparação de abr/18 (isto é, antes da greve) com dez/17 já apontava um quadro desfavorável: -0,7%. Estes são dados que mostram que o setor esteve em marcha ré ao longo de todo o presente ano, a despeito dos efeitos, sem dúvida negativos, da paralisação dos caminhoneiros.
A sequência de resultados trimestre após trimestre com ajuste também ilustra este ponto: -0,7% no 1º trim/18 e -0,1% no 2º trim/18, com um indicativo de possível agravamento trazido pelo resultado de julho, de -2,2%, como vimos anteriormente. Apenas um ramo dos serviços destoa neste panorama, aqueles prestados às famílias.
Os serviços prestados às famílias conseguiram crescer no segundo trimestre de 2018 e, mais do que isso, apontam para um ganho de ritmo em julho (+3,1%, com ajuste), mês em que apresentaram a única variação positiva dentre todos os segmentos. Este impulso veio sobretudo de seu componente alimentação e alojamento (+4%).
Do lado negativo, destacaram-se os serviços de transporte e correios, que não só caíram 4% em julho, em parte devido a efeitos secundários da paralisação dos caminhoneiros, mas já vinham em uma trajetória nada satisfatória desde o início do ano. No último mês em questão, apresentaram taxas expressivas de declínio tanto os serviços de armazenagem e correios, como outros modais de transporte, além do rodoviário.
Outro segmento que não tem se saído bem, e não é de hoje, é aquele de serviços demandados pelas empresas, isto é, os profissionais, administrativos e complementares. Desde o final do ano passado, o melhor que este segmento conseguiu foi ficar meramente estável (crescimento zero) no 2º trim/18 na série com ajuste. A segunda metade do ano começou ainda pior: -1,1% ante jun/18, devido principalmente a seu componente de serviços técnico-profissionais, que reúne atividades de maior qualidade.
Serviços de informação e comunicação, que representam uma grande fatia total do setor, têm apresentado, por sua vez, um comportamento bastante variável. Depois de ter conseguido crescer 1,1% no 2º trimestre do ano, na série com ajuste sazonal, começou segundo semestre também com uma indicação negativa: -2,2% em jul/18 ante o mês anterior.