Carta IEDI
Sem fôlego
Na passagem de 2018 para 2019, a indústria perdeu fôlego e desligou motores. Sua produção declinou no último trimestre do ano passado e em janeiro do presente ano. Em fevereiro último, o resultado voltou a ser positivo, mas a recomposição do nível de atividade foi pouca, tendo como consequência uma virtual estagnação no primeiro bimestre de 2019.
A variação obtida em fevereiro foi de +0,7% frente ao mês anterior, já descontados os efeitos sazonais, isto é, o suficiente meramente para fazer frente à retração de -0,7% em janeiro. Em relação ao mesmo período do ano anterior, o fato de fev/19 ter tido dois dias úteis a mais do que fev/18 ajudou na alta de +2,0%. Apesar disso, este desempenho foi fraco diante da sequência anterior de variações negativas.
Por ora, é precipitado interpretar o crescimento de fevereiro como indício de dias melhores. Pode ser que tenha sido resultado apenas de um movimento de recomposição de estoques, o que sozinho não garante a sustentabilidade da alta. De fato, o indicador da CNI mostra que os estoques caíram de nov/18 a jan/19, mas voltaram a ficar praticamente estáveis em fev/19.
O que sabemos com certeza é que -0,2% foi o desempenho industrial neste 1º bimestre de 2019 quando comparado ao mesmo período do ano anterior. Algumas outras informações também corroboram o estancamento do setor:
• Dos 26 ramos pesquisados pelo IBGE, 14 ficaram no vermelho no bimestre jan-fev/19 ante jan-fev/18, sendo que destes últimos 64% também tinham registrado perdas no 4º trim/18. Este aspecto sugere problemas mais sistemáticos do que pontuais.
• A utilização da capacidade instalada continua abaixo da média histórica e não tem progredido. Segundo o indicador da FGV para a indústria de transformação, estava em 74,7% em fev/19, isto é, no mesmo nível de dez/17. Difícil imaginar, então, retomada consistente do investimento industrial.
• A confiança do empresário industrial caiu em março de 2019, segundo tanto o ICI-FGV como o ICEI-CNI, indicando o risco de mais um resultado desfavorável para o setor, o que comprometeria o primeiro trimestre do ano.
No 1º bimestre de 2019, entre os macrossetores industriais, o caso mais grave de perda de dinamismo é o de bens intermediários. Não tanto pela magnitude (-0,9% ante 1º bim/18), mas pela sequência das quedas, que vêm ocorrendo repetidamente desde set/18. Como os bens intermediários consistem em insumos aos demais setores, este macrossetor ocupa uma posição central no sistema industrial. Por isso, seu retrocesso duradouro é mais uma evidência do enfraquecimento do dinamismo da indústria geral.
Bens de capital, por sua vez, apresentam uma patente a desaceleração. Depois de crescer +11,1% no 1º trim/18, terminou o ano passado com um resultado de apenas +3,6% no 4º trimestre e parou no 1º bim/19 (+0,1% ante 1º bim/18). Muito disso se deve a bens de capital para a própria indústria, mas, segundo o IBGE, também a bens de capital agrícola, para o setor de energia e de uso misto.
Bens de consumo semi e não duráveis também cresceu pouco no 1º bim/19 (+0,5%), mas pelo menos evitou o terreno negativo em que se encontrava na segunda metade de 2018. Apesar disso, existem ramos em uma situação muito pior, como têxteis, vestuário e acessórios e couros e calçados, que já acumulam vários meses de queda. Este é um mau sinal para o emprego, já que são ramos intensivos em mão de obra.
O macrossetor de bens de consumo duráveis, por fim, não parece que repetirá o sinal negativo do 4º trim/18. A alta de apenas +3,7% ante o 1º bim/18, entretanto, acena para uma mudança no padrão de crescimento que vinha ocorrendo, em boa medida devido à evolução mais contida do ramo automobilístico. Em outras palavras, é possível que as altas de dois dígitos em duráveis tenham ficado para trás.
Resultados da Indústria
Em fevereiro de 2019, a produção industrial variou +0,7%% na comparação com o mês anterior, já descontados os efeitos sazonais. Isso foi suficiente apenas para compensar o retrocesso de mesma magnitude registrado em janeiro (-0,7%). Assim, depois de um desempenho insatisfatório no último quarto do ano passado, a indústria parou no começou 2019.
O resultado da indústria em comparação com o mesmo período do ano anterior, por sua vez, foi um pouco melhor em fevereiro: alta de +2%, interrompendo uma sequência de três meses consecutivos de queda. Parte disso, porém, deve-se a um efeito calendário, já que fev/19 teve dois dias úteis a mais do que fev/18. Ademais, este ritmo de crescimento não fez frente à queda de -2,4% de janeiro, na mesma comparação.
Em relação aos macrossetores, na comparação com janeiro de 2019, descontados os efeitos sazonais, os resultados foram majoritariamente positivos. A única exceção foi o de bens intermediários, que caiu -0,8%. A produção de bens de capital, que nos três meses anteriores ficou no vermelho, registrou a taxa de crescimento mais expressiva: +4,6%, seguida pelo macrossetor de bens de consumo duráveis (+3,7%) e de semi e não duráveis (+0,7%).
Já na comparação de fevereiro de 2019 com fevereiro de 2018, obteve-se o mesmo perfil de resultados em que apenas os bens intermediários registraram queda: -0,4%. Embora modesta, esta variação negativa em intermediário já é a sexta consecutiva, totalizando, assim, um semestre inteiro de perdas. Em se tratando do núcleo duro do sistema industrial, por atender a demanda dos demais setores por insumos, esta evolução ilustra a fraqueza com que segue a indústria total nos últimos meses. Em contrapartida, bens de consumo duráveis conseguiram crescer 12,2% ante fev/18, depois de quedas sucessivas de nov/18 a jan/19. Bens de capital avançaram +7%, simplesmente anulando a queda de -7% de janeiro. Já bens de consumo semi e não duráveis também apontaram alta, de +3,2%, depois de uma sequência de variações negativas,
Em fevereiro de 2019, o declínio interanual de -0,4% de bens intermediários foi condicionado pelas variações negativas de celulose, papel e produtos de papel (-4,2%), metalurgia (-1,6%), produtos alimentícios (-0,8%) e outros produtos químicos (-0,7%), além do ramo extrativa (-9,9%). Pressões positivas vieram de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+8,6%), veículos automotores, reboques e carrocerias (+11,3%), produtos de minerais não-metálicos (+4,7%), produtos de metal (+3,6%) e produtos têxteis (+2,0%), entre outros.
O aumento de produção de bens de consumo semi e não duráveis em fevereiro de 2019, de +3,2%, foi explicado pela expansão em alimentos e bebidas elaborados para consumo doméstico (+5,5%, pelos subsetores de semiduráveis (+1,3%), de não-duráveis (+0,9%) e de carburantes (+0,8%).
Já o macrossetor de bens de capital, que cresceu +7,0% em relação ao mesmo mês do ano passado, teve desempenho explicado pelos avanços verificados nos grupamentos de bens de capital para equipamentos de transporte (+12,6%), devido à fabricação de caminhões, reboques e semirreboques e de caminhão-trator, de bens de capital para fins industriais (+3,6%) e para construção (+13,3%). Já os impactos negativos vieram de bens de capital de uso misto (-1,4%), para energia elétrica (-2,6%) e agrícolas (-0,5%).
Por sua vez, o macrossetor de bens de consumo duráveis, cuja produção avançou +12,2% ante fevereiro de 2018, foi particularmente impulsionado por: fabricação de automóveis (+18,2%), eletrodomésticos da “linha branca” (+17,6%), motocicletas (+21,5%), outros eletrodomésticos (+11,1%) e móveis (+0,2%). O principal impacto negativo veio do grupamento de eletrodomésticos da “linha marrom” (-5,7%), devido à menor produção de televisores.
Assim, no acumulado do primeiro bimestre de 2019, a indústria geral ficou virtualmente estagnada, variando -0,2% em relação ao mesmo período do ano anterior. Também nesta comparação bens de capital foram o único macrossetor a registrar queda (-0,9%). Os demais, porém, embora tenham crescido, apresentaram taxas menores do que em períodos anteriores: bens de consumo duráveis variou +3,7%, semi e não duráveis apenas +0,5% e bens de capital ficaram praticamente estáveis (+0,1%).
Por dentro da Indústria de Transformação
A variação de +0,7% da produção industrial geral em fevereiro de 2019 ante janeiro, já realizado o ajuste sazonal, foi acompanhada de expansão (+1,0%) na indústria de transformação e de forte retração de -14,8% no ramo extrativista, influenciado pelos efeitos do desastre de Brumadinho. No primeiro caso, foi a primeira taxa positiva depois de sete meses consecutivos sem crescimento. No segundo caso, desde ago/18 o número de meses em quedas tem sido largamente superior ao de meses em alta.
Em relação a fevereiro de 2018, os resultados da indústria geral e de transformação foram negativos: de +2,0% e +3,8%, respectivamente, arrefecendo as perdas acumuladas entre nov/18 e jan/19. O setor extrativista, por sua vez, registrou -9,9%, o pior resultado da série interanual desde ago/16.
Frente a janeiro de 2019, na série com ajuste sazonal, o acréscimo de +0,7% da indústria geral foi acompanhado por 16 dos 26 ramos pesquisados. As principais influências positivas vieram de veículos automotores, reboques e carrocerias (+6,7%), produtos alimentícios (+3,2%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+4,3%), máquinas e equipamentos (+1,7%), entre outros. Dos dez ramos em queda, as principais pressões negativas couberam a vestuário e acessórios (-4,8%), produtos de metal (-2,0%), móveis (-4,1%), produtos do fumo (-8,5%) e equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (-1,5%), além do ramo extrativista (-14,8%), entre outros.
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou alta de +2,0% na produção, variações positivas marcaram o desempenho de 17 dos 26 ramos, 48 dos 79 grupos e 53,2% dos 805 produtos pesquisados. Vale lembrar que fevereiro de 2019 (20 dias) teve dois dias úteis a mais do que igual mês do ano anterior (18). O destaque desfavorável ficou a cargo de veículos automotores, reboques e carrocerias (+16,4%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+6,8%), produtos alimentícios (+4,2%), produtos de metal (+6,1%), bebidas (+5,0%), máquinas e equipamentos (+3,5%), entre outros. Do lado negativo, além do ramo extrativista (-9,9%), os destaques foram, celulose, papel e produtos de papel (-3,0%), produtos de madeira (-7,5%), metalurgia (-1,6%) e equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (-3,1%).
Exportação
Segundo os dados da Funcex, divulgados pelo IBGE conjuntamente com os resultados da produção industrial, o quantum das exportações de manufaturados no mês de fevereiro de 2019 recuou -22,6%, frente ao mesmo período do ano anterior. Com isso, o desempenho do primeiro bimestre do ano também foi negativo: -4,8% ante o mesmo período do ano passado, isto é, uma realidade bastante diferente do 1º bim/18, quando as exportações de manufaturados avançavam +28,8%.
Por sua vez, as importações em quantum de matérias-primas para a indústria também cresceram, +9% na comparação com fevereiro de 2018, contribuindo para que o resultado acumulado no primeiro bimestre de 2019 fosse de +6,1%. No 1º bim/18, o crescimento tinha sido quase 1/3 disto (+2,2%).
Utilização de Capacidade
O nível de utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, foi de 74,7% em fevereiro de 2019, 0,4 p.p. acima do patamar de jan/19 e praticamente o mesmo de dez/18 (74,8%). Este nível de utilização continua inferior ao de meados do ano passado e muito abaixo da média histórica do próprio indicador (80,1%), iniciado em janeiro de 2001.
Já o indicador da CNI, ficou praticamente estável na passagem de janeiro para fevereiro de 2019, já descontados os efeitos sazonais, ao variar apenas +0,1 p.p. e chegando a 78%. Frente ao patamar médio de 77,3% no último trimestre de 2018, estes níveis de utilização da capacidade nos primeiros meses de 2019 mostram alguma evolução favorável. Entretanto, tal como ocorre no caso do indicador da FGV, a utilização aferida pela CNI permanece razoavelmente abaixo da média histórica do indicador, iniciado em jan/03, e que é de 80,9%.
A permanência da utilização da capacidade em níveis historicamente baixos e sem uma trajetória inconteste de acentuada melhora não é um indício favorável para a evolução futura do investimento, isso porque máquinas e equipamentos atualmente ociosos deverão ser postos em funcionamento antes de os empresários pensarem em ampliar sua capacidade de produção. Em contrapartida, a existência de capacidade ociosa significa que existem plenas condições de oferta para garantir uma recuperação da atividade econômica sem pressões inflacionárias.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, os estoques de produtos finais da indústria em fevereiro de 2019 assinalaram índice de 50,2 pontos, voltando a ficar ligeiramente acima da marca dos 50 pontos, o que indica algum aumento de estoques. Vale lembrar que ao registrar valor inferior a 50 pontos o indicador aponta redução de estoques. No caso do segmento da indústria de transformação, o indicador de estoques ficou em 50,1 pontos (+1,1 pontos frente a jan/19) e para a indústria extrativa em 51,1 pontos (+5,3 pontos frente a jan/19).
Na avaliação dos empresários, os estoques efetivos da indústria geral continuaram acima do nível planejado (isto é acima de 50 pontos), atingindo o patamar de 51,1 pontos em fevereiro de 2019. Este tem sido o padrão desde março de 2018, à exceção de dezembro, quando ficou em 48,9 pontos. No caso do setor extrativo e no caso da indústria de transformação, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 54,7 pontos e em 51,1 pontos, respectivamente. Estes valores acima da linha dos 50 pontos em fevereiro podem se traduzir em menor produção em março.
No grupo industrial da indústria de transformação, 16 dos 26 ramos acompanhados pela CNI tiveram estoques iguais ou menores do que o planejado (50 pontos) em fevereiro de 2019, isto é, abaixo do número de ramos nesta posição em dez/18 (22) e em jan/19 (19), reduzindo o número de ramos cujas produções podem avançar nos próximos meses para recompor estoques abaixo do planejado. Dentre eles, estão os ramos de outros equipamentos de transporte (43,8 pontos), biocombustíveis (45 pontos), máquinas e materiais elétricos (45,6 pontos) e veículos automotores (47,6 pontos), entre outros. Em contraste, ficaram com estoques efetivos acima do planejado em fevereiro os setores de couros (56,8 pontos), calçados (56,8 pontos), móveis (53,8 pontos) e papel e celulose (53,7 pontos), entre outros.
Confiança e Expectativas
Diante da patente desaceleração do crescimento industrial sobretudo a partir do final de 2018, em um movimento que contaminou também o início de 2019, a confiança do empresariado industrial, segundo o Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI (ICEI), pode ter começado a ser corrigido no mês de março, depois de alguns meses de relativa estabilidade. De 64,7 pontos em fev/19 passou para 62,5% em mar/19. Apesar da moderação, por se encontram acima da marca de 50 pontos, este indicador continua registrando otimismo dos empresários.
O desempenho da confiança em março do presente ano resultou principalmente de seu componente de expectativas para o futuro, que ficou na marca de 66,5 pontos neste mês, registrando mais um recuo pela segunda vez seguida (69,1 pontos em fev/19 e 70 pontos em jan/19). O componente do ICEI-CNI de avaliação das condições atuais dos negócios também regrediu, passando de 56,1 pontos em fev/19 para 54,4 pontos em mar/19. Em ambos os casos o quadro ainda é de otimismo, dados os níveis acima de 50 pontos.
Já o Índice de Confiança da Indústria de Transformação (ICI) da FGV também mostrou deterioração no mês de março, ao passar de 99 pontos em fevereiro para 97,2 pontos, com ajuste sazonal. Deste modo, distanciou-se ainda mais da linha divisória (100 pontos) que, ultrapassada, poderia sugerir um retorno ao otimismo dos empresários do setor.
Este movimento do ICI-FGV foi condicionado por seus dois componentes. O Índice de Expectativas em relação ao futuro declinou pela segunda vez consecutiva, passando de 99,2 pontos para 97,4 pontos de fevereiro a março. No caso do Índice da Situação Atual, o recuo foi de 98,8 pontos para 97,1 pontos no mesmo período.
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Seu nível vinha se mantendo, em média, em 52,7 pontos entre novembro de 2018 e janeiro de 2019, avançou para 53,9 pontos em fevereiro deste ano, mas retrocedeu novamente para 52,8 pontos em março. Vale mencionar que níveis acima de 50 pontos sugerem melhora das condições de negócio.
Os indicadores de confiança acima mencionados, notadamente seu componente referente às avaliações dos negócios correntes, sugerem que o desempenho industrial em março pode ser fraco mais uma vez.
Anexo Estatístico
Mais Informações
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)