Carta IEDI
A Indústria de Transformação por Intensidade Tecnológica: da Desaceleração à Queda
Depois de assumir uma clara tendência de desaceleração em 2018, a indústria voltou a acumular dois trimestres seguidos de resultados negativos. Nos três primeiros meses de 2019, a situação se agravou ao registrar -2,2% frente ao mesmo período do ano anterior. Somente na indústria de transformação o recuo foi de -1,4%. Abril, como vimos esta semana, não trouxe nenhum alívio: queda de -3,9% ante abr/18.
Este movimento de retrocesso, como o IEDI já apontou em outras ocasiões, se mostra bastante difundido do ponto de vista tanto setorial como regional, tornando difícil creditá-lo a causas meramente pontuais e excepcionais. O que falta são condições favoráveis para a produtividade e o custo do produto industrial e, por outro lado, bases sólidas de dinamização da demanda que possam gerar um processo consistente de recuperação.
O que não se sabia até então era o perfil por intensidade tecnológica desta nova fase recessiva. Esta Carta IEDI trata do tema a partir da metodologia desenvolvida pela OCDE que divide a indústria de transformação em quatro faixas distintas: alta, média-alta, média-baixa e baixa tecnologia.
As principais evidências do estudo são sintetizadas a seguir:
• A faixa de alta intensidade tecnológica foi quem liderou o declínio neste início de ano. Depois de registrar -1,5% no 4º trim/18, mergulhou para -12,5% no 1º trim/19 frente a igual período do ano anterior. Essa performance levou ao retrocesso de -3,2% em doze meses, o pior desempenho dentre os quatro segmentos por intensidade tecnológica. Na origem desta involução está o complexo eletrônico (-13%), mas que foi seguido de perto pela indústria farmacêutica (-10,6%). Nenhum ramo desta faixa conseguiu crescer agora em 2019.
• Na indústria de média-alta, o quadro tinha sido de virtual estagnação no 4º trim/18 (+0,2%), mas passou ao vermelho no 1º trim/19: -1,6% frente ao mesmo período do ano anterior. Todos os seus componentes regrediram, com destaque para máquinas e equipamentos mecânicos por sua intensidade (-4,6% ante 1º trim/18) e para máquinas e equipamentos elétricos e produtos químicos exceto farmacêuticos por sua duração (caem há dois trimestres). A indústria automobilística, que já foi líder da recuperação deste grupo assim como da indústria como um todo, sofreu forte desaceleração. Chegou a crescer mais de 20% em seguidos trimestres e agora em jan-mar/19 registrou -0,8%.
• A faixa de média-baixa intensidade foi a única a crescer no 1º trim/19: +1,4%, embora tenha regredido no 4º trim/18 (-0,6%). Fugiu à regra graças à produção de coque, produtos de petróleo refinado e afins, que cresceu +4,2%, mas também devido a minerais não metálicos (+2,2%) e produtos metálicos (-0,6%). Quem não está ajudando é o ramo de borracha e plástico: -3,8% e -3,4% no 4º trim/18 e 1º trim/19, respectivamente.
• Por fim, a indústria de baixa intensidade tecnológica não caiu tanto, registrando -1,2% no 1º trim/19. Aqui, a gravidade do quadro se dá pela sequencia de quedas que já dura quatro trimestres, isto é, um ano todo. É pior ainda em alguns de seus componentes, como em têxteis, couro e calçados no vermelho desde jan-mar/18. Alimentos e bebidas também caíram por vários trimestres, mas ao menos conseguiram se estabilizar (0%) neste início de 2019. Madeira, papel e celulose, por sua vez, foi quem mais caiu no 1º trim/19: -4,7%.
Uma visão geral da indústria de transformação
Em março, a produção física da indústria de transformação retrocedeu 0,5% frente a fevereiro pela série dessazonalizada. Ademais, na comparação entre meses de março e de primeiros trimestres de 2019 e 2018, as retrações foram de 5,0% e de 1,4%, respectivamente. Desse modo, em doze meses, a indústria de transformação continuou em seu processo de desaceleração iniciado em meados de 2018 para encontrar-se estagnada no terceiro mês de 2019.
Quanto à indústria geral (ramo extrativo mineral e o de transformação), pelos dados dessazonalizados, a queda foi maior, de 1,3%, na passagem de fevereiro para março. No contraponto entre meses de março de 2018 e de 2019, sua produção física diminuiu 6,1%, puxando o retrocesso tanto no primeiro trimestre, de 2,2%, quanto em doze meses, de 0,1%. Em todas essas bases comparativas, as retrações foram lideradas pelas indústrias extrativas. No desempenho mensal (série livre de sazonalidade), a extração mineral declinou 1,7%. Já na comparação entre meses de março, recuo de dois dígitos, 14%, concorrendo para as retrações de 7,5% no acumulado do ano e de 0,4% em doze meses.
A indústria de transformação por intensidade tecnológica
A produção física da indústria de transformação pode ser abordada com mais detalhe mediante sua divisão em quatro segmentos de intensidade tecnológica, em conformidade com a OCDE: alta intensidade, media-alta, média-baixa e baixa intensidade.
Ressalte-se que desde os mais recentes aprimoramentos metodológicos da PIM-PF, está se tratando a indústria de transformação sem a atividade de manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos. Tal ramo passou a ser discriminado em versão mais recente da Classificação Industrial Internacional Uniforme (CIIU) e, por conseguinte, na versão 2 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE). Na sequência, estão os resultados selecionados para as faixas de intensidade tecnológica, com dados sujeitos à revisão.
Ao se confrontar o primeiro trimestre de 2019 com igual período de 2018, as duas faixas mais intensivas em tecnologia e a de baixa intensidade se retraíram. A queda mais aguda, de 12,5%, foi na de alta intensidade, puxada pela retração de 17,1% na comparação entre meses de março. Tais números foram suficientes para que, em doze meses, esse segmento registrasse taxa negativa, de 3,2%. Voltando ao acumulado do ano, confronto entre primeiros trimestres, a faixa de média-alta retrocedeu 1,6%, resultado também capitaneado pelo terceiro mês do ano, recuo de 8,8% frente a março de 2018. Apesar de tanto, em doze meses, a variação prossegue positiva, 2,9%. O segmento de baixa intensidade se retraiu 1,2% no primeiro trimestre, queda também liderada pelo mês de março, concorrendo para o declínio em doze meses. Assim só a faixa de média-baixa intensidade cresceu em janeiro-março, 1,4%, com março registrando 0,6% a mais de produção do que em igual mês de 2018 e logrando a segunda melhor performance em doze meses dentre as quatro faixas.
A faixa de alta intensidade foi a que mais declinou no confronto entre primeiros trimestres de 2019 e de 2018. Segundo o IBGE, a própria fabricação de aviões diminuiu no período. A retração no comparativo entre primeiros trimestres foi puxada pela forte queda na produção física do complexo eletrônico, cujo declínio na comparação entre meses de março passou de 20%. Desse modo, o ramo fechou o período de doze meses encerrados em março retrocedendo. A indústria farmacêutica também atingiu retração de dois dígitos no primeiro trimestre, com março também recuando fortemente, mas sem tal magnitude. Mesmo assim, em doze meses, o ramo farmacêutico logrou expansão.
O acima exposto decréscimo do segmento de média-alta intensidade no trimestre inicial do ano foi disseminado: todos seus ramos se retraíram, sobressaindo o forte recuo em máquinas e equipamentos mecânicos e não especificados noutras atividades. A indústria automotiva também retrocedeu por conta principalmente do desempenho ruim em março, sendo o dessa faixa que mais declinou por essa base comparativa. Ironicamente, esses dois ramos, os que mais retrocederam em março e no primeiro trimestre, lideram o incremento em doze meses da faixa como um todo, em virtude dos três últimos trimestres de 2018. A fabricação de máquinas e equipamentos elétricos e a indústria química produziram menos nas três bases de comparação.
A produção maior no trimestre da indústria de média-baixa decorreu de três de seus ramos, com destaque para a expansão de 4,2% da fabricação de coque, produtos de petróleo refinado e afins, crescimento este puxado pelo desempenho desse ramo em março. Já a produção brasileira de bens metálicos, inclusive da siderurgia, e a de outros produtos minerais não-metálicos cresceram no trimestre a despeito do recuo em março. A fabricação de borracha e produtos plásticos declinaram nas três bases comparativas.
A retração sofrida pela faixa de baixa intensidade de 1,2% no trimestre, foi puxada pela contração dos ramos madeireiro, produtos derivados, papel, celulose e gráfica; e de produtos têxteis, de vestuário, couro e calçados. Esses dois conjuntos de bens sofreram tal retração, com declínios expressivos em março. A produção madeireira, de derivados, papel, celulose e impressos ainda conseguiu crescer em doze meses, diferentemente da indústria têxtil, de vestuário e calçadista. O principal ramo dessa faixa, a indústria de alimentos, bebida e tabaco, ficou estável no primeiro trimestre, em que pese a variação negativa de março. No entanto, é aquele que mais retrocedeu em doze meses dentro dessa faixa. A produção de manufaturados não especificados noutras atividades e de reciclados foi a única desse segmento a crescer tanto em janeiro-março quanto em doze meses, mesmo com o recuo de março.
Alta intensidade tecnológica
No trimestre inicial do ano, a faixa de alta intensidade recuou 12,5%, com o março concorrendo sobremaneira para tanto, retração de 17,1%. Segundo expôs o IBGE, a própria fabricação de aeronaves declinou em ambas as bases de comparação. Dessa maneira, a indústria de alta intensidade experimentou o pior resultado em doze meses dentre as quatro, variação de -3,2%.
Quanto ao complexo eletrônico, retrocedeu impressionantes 13,0% no primeiro trimestre, sendo que em março sua produção diminuiu 23,7%. Aliás, no contraste entre trimestre e igual trimestre do ano anterior, desde julho-setembro de 2018, a produção desse complexo eletrônico tem caído, levando a uma retração de 6,7% em doze meses. O maior dos três ramos do complexo no País, fabricação de equipamentos de rádio, TV e comunicação, que abarca também partes e componentes eletrônicos empregados nele e em leque cada vez mais amplo de atividades econômicas, teve queda de 14,0%, puxada pela retração de 24,9% em março. Assim, em doze meses, o ramo declinou 8,1%.
A fabricação de material de escritório e informática caminhou na mesma direção, retraindo-se em 11,6% no trimestre, com a produção de março caindo 17,1%. Daí o declínio de 1,8% em doze meses. A produção de instrumentos e equipamentos médico-hospitalares, óticos e de precisão, por sua vez, sofreu recuo de 7,7% no trimestre, tendo retração de 18,1% em março e culminando na taxa de -6,5% em doze meses.
A indústria farmacêutica também apresentou variação negativa de dois dígitos, -10,6%, no contraponto entre primeiros trimestres de 2019 e de 2018. Em março, a queda foi de 7,7%. Apesar dessas taxas negativas, em doze meses, o ramo ainda apresenta expansão, de 1,8%.
Média-alta intensidade tecnológica
O segmento de média-alta intensidade tecnológica registrou declínio de 1,6% no primeiro trimestre frente a seu equivalente de 2018, resultado puxado pelo recuo de 8,8% em março. Em que pese tanto, dentre as quatro faixas, ainda logrou o melhor resultado em doze meses, 2,9%.
A fabricação de veículos automotores foi o ramo dessa faixa que menos se retraiu, taxa de -0,7%, com março trazendo retração de 13,3%. Embora sua produção tenha se contraído nas duas bases comparativas, registrou expansão expressiva em doze meses, de 7,6%.
Os ramos mais associados à indústria de bens de capital – fabricação de máquinas e equipamentos elétricos; e fabricação de máquinas e equipamentos mecânicos e não especificados em outras atividades – tiveram em comum a retração no primeiro trimestre, puxada pela performance de março. A fabricação de máquinas mecânicas ou não especificadas noutros ramos declinou 4,6% no primeiro trimestre e 7,8% em março. Ainda assim, cresceu 0,8% em doze meses. A produção de equipamentos elétricos experimentou retração nas três bases de comparação, declinando 1,2% no primeiro trimestre do ano, 4,6% em março e 0,3% em doze meses.
A indústria química (com exceção da farmacêutica) também registrou taxas negativas nas três bases comparativas. No acumulado do ano, sua produção foi 1,1% menor, puxada pela queda de 4,4% em março. Em doze meses, retrocedeu 0,7%.
Média-baixa intensidade tecnológica
O segmento de média-baixa intensidade foi o único a crescer nas três bases de comparação. No primeiro trimestre, sua produção aumentou 1,4%, com março crescendo 0,6%. Em doze meses, a taxa foi de 1,9%.
A indústria de bens de petróleo refinado, álcool e outros combustíveis teve o melhor desempenho dentre os ramos dessa faixa. Em janeiro-março, produziu 4,2% a mais, com o terceiro mês do ano registrando 5,0% de aumento. Tais números contribuíram para a produção 3,3% maior em doze meses.
Já a fabricação de produtos metálicos, que inclui a siderurgia, cresceu 0,6% no primeiro trimestre, mesmo tendo sofrido contração em de 0,1% em março. Em doze meses teve incremento de 2,4%.
A indústria de produtos de minerais não-metálicos também cresceu no primeiro trimestre, 2,1%, a despeito da variação de 0,3% em março. Nos doze meses terminados em março, sua produção aumentou 1,0%.
Em contraste, conforme o IBGE, a produção de itens importantes da construção naval recuou na comparação entre meses de março e entre primeiros trimestres. Já a fabricação de borracha e produtos plásticos teve produção menor nas três bases de comparação. No trimestre inicial, houve retrocesso de 3,4% com março apresentando recuo de 6,7%. Em doze meses, teve retração de 1,1%.
Baixa intensidade tecnológica
A faixa de baixa intensidade tecnológica, assim como a de alta intensidade, registrou retração nas três bases de comparação. A queda de 1,2% no primeiro trimestre, com uma produção em março 3,9% menor do que a do mesmo mês de 2018. Em doze meses, o segmento teve queda de 2,9%.
O desempenho dessa faixa no primeiro trimestre foi puxado por dois conjuntos de bens: o de produtos madeireiros, seus derivados, papel, celulose e impressos; e o de têxteis, de vestuário, couro e calçados. O ramo madeireiro, de papel e celulose retrocedeu 4,7% no primeiro trimestre, tendo um recuo de 7,4% em março. Mesmo assim, ainda registrou taxa positiva de 0,4% em doze meses.
As indústrias têxteis, de vestuário, calçadistas e de couro produziram 3,5% menos trimestre inicial de 2019, sendo que, em março, a diminuição foi de 7,6%. Tais resultados concorreram para a queda de 3,1% em doze meses.
O ramo de maior peso da indústria de transformação, a fabricação d alimentos, bebidas e tabaco, ficou estagnada no contraponto entre primeiros trimestres, mês com queda de 1,5% em março. Embora não tenham sido os piores resultados dentro da faixa, em doze meses, esse ramo experimentou retração mais aguda, de 4,4%.
Em janeiro-março, o único ramo do segmento de baixa intensidade a crescer foi o de produtos manufaturados não especificados noutras atividades e reciclados, taxa de 4,8%, mesmo com recuo de 1,9% em março. Foi o ramo dessa faixa com melhor performance em doze meses, incremento de 1,2%.