IEDI na Imprensa - Brasil Fica Longe de Cumprir Metas Industriais de 2010
Brasil Fica Longe de Cumprir Metas Industriais de 2010
Brasil Econômico - 14/12/2009
Crise global altera panorama e deixa país distante dos objetivos traçados pela Política de Desenvolvimento Produtivo
Marcelo Cabral
A crise econômica global encerrou as perspectivas do Brasil cumprir as metas estabelecidas na sua política industrial, conhecida como Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP). Lançada em maio de 2008 - antes da fase aguda da turbulência financeira - a PDP estabeleceu quatro grandes objetivos nas áreas de investimentos, inovação, comércio exterior e micro e pequenas empresas (MPEs). Mas é consenso hoje entre especialistas que elas não serão atingidas até o final de 2010, como previsto pelo governo.
"Quando as metas foram traçadas, o cenário que se desenhava era de crescimento de 4% a 5% do PIB em 2009 e de crescimento de 6% a 7% do comércio mundial. A crise mundial comprometeu tudo. O Brasil deve ficar estagnado esse ano e o comércio global caiu 25%", pondera Ernesto Lozardo, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV). "Ficou muito complicado cumprir as metas. O foco mudou completamente com a crise, as atenções se voltaram para resolver os problemas mais imediatos e a PDP acabou ficando meio de lado", concorda Rogério César de Souza, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).
Milagre econômico
Os números mostram que seria preciso um verdadeiro milagre econômico para chegar aos objetivos em 2010. O setor externo é um exemplo. Um dos alvos da PDP era atingir exportações de R$ 208 bilhões no próximo ano. Mas a crise e o câmbio golpearam fortemente essa ambição. Em 2009, até novembro, as exportações estavam em US$ 138 bilhões, e a expectativa é que encerrem 2009 próximas da casa de US$ 150 bilhões.
Com o esfriamento do comércio mundial, ameta de atingir 13 mil micro e pequenas empresas exportadoras também ficou comprometida. O número fechou 2008 em 11.120, quantidade inferior às 11.800 companhias apuradas no final de 2007.
No caso dos investimentos fixos a situação não é diferente. A meta preconizava que a Formação Bruta de Capital Fixo atingisse o patamar de 21% do Produto Interno Bruto (PIB) no próximo ano. Mas o indicador está atualmente na casa de 14%, o que tornaria necessário investir quase R$ 100 bilhões no próximo ano para atingir o patamar desejado.
E não será nada fácil atingir esse valor, segundo Carlos Fagundes, professor do Insper.
"O cenário mudou com a crise. Tínhamos uma liquidez quase ilimitada no portfólio de investidores, com uma percepção de risco muito baixa. Isso se inverteu, e o capital à procura de investimento secou. Isso gerou uma retração de investidores, uma maior seletividade e uma aversão ao risco".
O cenário se repete no segmento de Pesquisa e Desenvolvimento. A meta era investir R$ 18,2 bilhões no próximo ano, equivalentes a 0,65% do PIB. Mas, para o ano passado, o valor estava em R$ 4,7 bilhões, segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia.
Questionamento
Além do fracasso das metas, a PDP ainda enfrenta questionamentos sobre o seu modelo, que prioriza ações em seis setores considerados estratégicos - Saúde, Defesa, Tecnologia da Informação, Nanotecnologia, Biotecnologia e Energia Nuclear.
Para Lozardo, "escolher setores para serem priorizados é uma moda antiga, é algo que se fazia nas décadas de 1950 e 1960. Seria melhor seguir algo similar ao que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) está fazendo, que é favorecer as indústrias que se mostram mais competitivas, independente do setor."
Segundo o economista, esse é o modelo atualmente adotado com sucesso pela China e por outros países asiáticos. "É mais inteligente, menos extorsivo e menos paternalista", analisa.
"Existe uma atuação sem foco comum, cada um rema para um lado. A meta deveria ser tornar o Brasil um país competitivo, mas não estão conversando entre si no governo", completa.
Outros economistas discordam. Antônio Correia de Lacerda, professor-doutor da PUC-SP, diz que “o recorte setorial é válido. É preciso definir algumas prioridades, porque senão não tem prioridade nenhuma. Mas também não pode ser uma camisa de força. O desafio do Brasil hoje não é retomar o consumo, e sim expandir os investimentos. A política industrial deveria ser flexível para levar isso em consideração”. Souza, do Iedi, afirma não achar “a atuação do BNDES e a PDP tão antagônicas. O banco tem tido uma atuação mais no curto prazo, para reagir à crise, enquanto a Política é voltada mais para o médio e o longo prazo”, diz.
Além disso, a PDP acaba mascarando problemas estruturais da indústria, segundo Fagundes. “Ela funciona como um paliativo que desvia a atenção de problemas fundamentais, como a questão trabalhista e a carga tributária. Soluções temporárias evitam que ataquemos a questão principal. As premissas do planejamento deveriam ser a redução tributária e a reforma trabalhista”, finaliza.
A executora da PDP, a Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), foi procurada pelo jornal, mas preferiu não semanifestar.