IEDI na Imprensa - Agora a Cautela É Maior
Agora a Cautela É Maior
Brasil Econômico – 22/12/2011
Julio Gomes de Almeida
As grandes empresas brasileiras têm fama de conservadoras. Alavancam pouco suas operações e são cuidadosas no investimento para não serem pegas com capacidade produtiva exagerada diante de súbitas mudanças de conjuntura. Como as reviravoltas na economia foram a tônica nas últimas três décadas e prevaleceram mesmo após a estabilização do Plano Real em razão de uma vulnerabilidade externa somente debelada com a política de acumulação de reservas cambiais a partir de 2005, a cautela patrimonial e financeira das empresas nacionais só se aprofundou.
Não é despropositado relacionar, ao menos parcialmente, esse comedimento com alguns problemas com os quais a economia se defronta. Por exemplo, os baixos níveis de investimento em capital e em inovação decorrem em parte do fato de que as empresas preferem aguardar claros sinais emanados de uma demanda crescente para investir, evitando antecipar a demanda, assim como relutam em apostar em inovações arrojadas, optando por adaptar tecnologias externas. Em nossa opinião, esse comportamento tem sido alterado para melhor nos últimos tempos com os empresários nacionais olhando menos o passado e mais a demanda à frente e seu posicionamento futuro na concorrência como critérios definidores do investimento fixo e em P&D. É uma postura mais ousada.
Onde parece ter havido um retorno empresarial ao conservadorismo foi na questão do endividamento externo, o que também é bom. No colapso financeiro de setembro de 2008, o país ficou sabendo que várias de suas corporações haviam deixado a cautela de lado e contrataram financiamentos "ponzi", ou seja, incapazes de serem honrados diante de mudanças financeiras como uma acentuada desvalorização do real, o que acabou ocorrendo. Uma formidável operação de salvamento envolvendo bancos privados e públicos, além de grandes empresas, acomodou a crise empresarial que teria levado a uma recessão muito mais profunda e duradoura da economia.
Pois bem, uma pesquisa conduzida pelo economista Luiz Fernando Novais, do Grupo de Conjuntura da Fundap, monitorou o endividamento externo de 239 empresas brasileiras não financeiras de capital aberto entre setembro do ano passado e setembro deste ano. O objetivo foi avaliar o impacto da desvalorização que a crise internacional determinou para o real e que chegou a 9,5% no período em foco. É claro que a rentabilidade das empresas cedeu por causa da maior despesa financeira causada pela desvalorização: como proporção da receita líquida, o lucro líquido de 14,1% em média no terceiro trimestre do ano passado passa para 8,4%. Mas as empresas ainda tiveram lucro líquido de R$ 26 bilhões. Absorveram esses primeiros sinais do agravamento externo com perdas, mas sem traumas devido aos cuidados em seu endividamento. A dívida em moeda estrangeira não cresceu como proporção do endividamento total das empresas, o que revela um equilíbrio entre as fontes de fundos externas e internas e as empresas usaram parcela de suas disponibilidades para o financiamento dos seus investimentos. Se o Brasil tivesse um desenvolvimento maior de seu mercado de capitais, o impacto da crise internacional seria ainda menor.
Julio Gomes de Almeida é ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor da Unicamp