IEDI na Imprensa - Mais Um Ano de Ajustes na Produção
Publicado em: 18/12/2015
Mais Um Ano de Ajustes na Produção
Valor Econômico - Revista Grandes Grupos dezembro/2015- 18/12/2015
Com participação no PIB cada vez menor, empresários do setor queixam-se da falta de agenda de Iongo prazo
Por Márcia R. Corradini
A indústria ainda teme pelo pior em 2016. O fechamento de postos de trabalho, que em 2015 ultrapassou 150 mil vagas nas linhas de montagem do país, não deve ser interrompido no próximo ano. Ao contrário, o corte de pessoal tende a passar do chão de fábrica para os cargos que orbitam o comando das indústrias. E assim como em 2014 e 2015, o próximo ano deve ainda apresentar um recuo na participação da produção industrial. Os números desta edição de Valor Grandes Grupos justificam o quadro desolador. A participação dos grupos industriais na receita dos 200 maiores caiu de 44,4% em 2013 para 42,4% em 2014. O lucro, então, teve um comportamento mais drástico: queda de 73,7%.
Em 2015, as coisas não melhoraram como mostram as estatísticas do IBGE. Em outubro, a produção recuou 11,2% em relação ao mesmo mês de 2014 - o pior desempenho desde 2009. A indústria extrativa, antes um suporte para que a situação do setor em geral não fosse pior, passou a empurrar os indicadores para baixo, com os problemas na Petrobras apontados na Operação Lava-Jato. E o desastre ecológico de Mariana - as barragens rompidas da mineradora Samarco, em novembro – só deve piorar a situação.
Motivos estruturais também sobram para explicar o desânimo na indústria. “A questão fundamental é que não temos uma agenda econômica ou um projeto nacional de longo prazo no país", afirma Pedro Wongtschowski, membro do conselho do grupo Ultra e presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (ledí). "Ficamos olhando o curto prazo, a instabilidade na cena política e recuando com mais cortes que podem, até, vir a comprometer a capacidade de inovação e desenvolvimento da indústria.”
Wongtschowski lembra que concorrentes dos Brics já lançaram planos efetivos de amparo à produção ante a crise. A Índia, por exemplo, anunciou um projeto para elevar a participação da indústria no PIB de 16% em 2014 para 25% até 2022. O “Make in India" é um programa de incentivos à atração de capital para instalação de centros de produção no país como base de exportação. O economista Julio Gomes de Almeida completa: “Eles perceberam que a onda de incentivos no setor de serviços, que marcou a política nos últimos anos, era muito limitada para manter o crescimento e passaram a atrair a indústria."
Os industriais brasileiros têm mantido a busca de interlocutores no governo, mas o quadro político complica as conversas.
Sem a segurança de como serão as coisas em 2016, a ordem do dia na produção é de ajustes para todos os lados. A nova realidade pode representar uma queda de produção a índices parecidos com os dos anos 1930, quando os efeitos da crise de 1929 mostraram sua intensidade nas fábricas do Brasil. Desta vez, a crise internacional, que explodiu em setembro de 2008 nos Estados Unidos, demorou mais para apresentar-se plenamente no Brasil, o que revela certa capacidade de resistência- com a indefectível ajuda de governos, como no resto do mundo.
“Quem achou que o crescimento de 2010 era uma prova de novo paradigma ou de solidez econômica brasileira e não aproveitou o momento para tomar as devidas precauções está sofrendo mais agora”, afirma João Miranda (ex-Citi), primeiro executivo com origem no mercado a comandar as operações industriais do grupo Votorantim, antes sempre chefiadas por alguém com o sobrenome Ermírio de Moraes. A troca do comando familiar no grupo Votorantim, que encabeçou por décadas a lista dos maiores grupos industriais nacionais, é bastante emblemática do efeito da atual crise na capitalização e defesa dos meios de produção.
Dos dez maiores grupos do país, de acordo com os resultados de 2014 consolidados pelo Valor Data, cinco são bancos e mesmo o maior grupo industrial privado, que aparece só na sexta colocação, a J&F Investimentos, dona da indústria de alimentos JBS Friboi, tem um braço crescente no setor bancário, o Banco Original, dirigido pelo ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles. E diversifica para além das fronteiras como forma de reduzir riscos.
Wesley Mendonça Batista, CEO da JBS, diz estar otimista com a manutenção do plano plurianual de investimentos e aquisições do seu grupo para 2016. “Apostamos muito na internacionalização do grupo até agora e hoje temos um 'hedge' [proteção] natural com uma variada cesta de moedas no nosso resultado", diz, depois de ter ganho R$ 9,4 bilhões com operações de derivativos cambiais que resultaram num lucro líquido de R$ 3,44 bilhões para companhia no terceiro trimestre . Os resultados não operacionais, aliás, voltam a ter peso no balanço da indústria em geral, como era comum na época pré-Real. A falta de visão de longo prazo tem levado à hipertrofia do setor financeiro e ao enfraquecimento dos meios de produção.
O maior grupo industrial do país continua sendo a Petrobras, que anunciou um novo corte de investimentos de US$ 11 bilhões para 2015 e 2016. Ela informou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em outubro, uma redução de US$ 7 bilhões nos custos operacionais. Atribuiu os cortes “aos novos patamares do preço internacional do petróleo e da taxa de câmbio". A combalida estatal informou que as mudanças visam "preservar seus objetivos fundamentais de redução no endividamento [desalavancagem] e geração de maior valor para os acionistas”. O governo federal é o acionista controlador da Petrobras. Para ajudar o caixa, a estatal, que ganha mais e mais espaço no noticiário com as acusações de corrupção na operação Lava jato, também informou que projeta fazer desinvestimentos - venda de ativos e fechamento de operações -, entre 2015 e 2016, da ordem de US$ 15 bilhões.
Fora casos como o da Petrobras, há recuos generalizados, e os mais simbólicos, no momento, talvez sejam o da indústria automobilística e o dos segmentos ligados a ela - autopeças, pneus, aço. A indústria tem efeito multiplicador na economia e já recebeu vários incentivos do governo depois do início da crise internacional, em 2008, pelo seu impacto no emprego e no consumo. Com a deterioração das contas públicas desde 2014, essa fonte secou. Em novembro de 2015, a produção de veículos caiu 33,5% em relação ao mesmo mês de 2014. As vendas recuaram no mesmo ritmo e os estoques eram suficientes para 50 dias de vendas.
“Os últimos dois anos foram desafiadores para a indústria, com queda nas vendas superior a 30%”, afirma Santiago Chamorro, presidente da General Motors (GM). “Além disso, tivemos o impacto de aumentos de custos, taxa de juros, impostos e acentuada perda de confiança do consumidor.” Mesmo assim, a subsidiária brasileira vai manter os investimentos acertados com a matriz, programados em R$ 13 bilhões entre 2014 e 2019.
Na esteira da queda do setor automobilístico estão grupos industriais da siderurgia e metalurgia, como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que anunciam perdas. A CSN divulgou um prejuízo de R$ 532,6 milhões no terceiro trimestre e, apesar de este montante ser 13% menor que as perdas do segundo trimestre, ele é o dobro do resultado do terceiro trimestre de 2014.
“A indústria vai ter que se reinventar no Brasil", afirma José Carlos Grubisich, presidente da Eldorado Celulose, a caçula da próspera indústria de celulose do país. A empresa embarca praticamente 90% da sua produção, principalmente para a Ásia. Segundo Grubisich, hoje, quando os prognósticos são de uma queda menor do que a estimada na demanda mundial de produtos comprados do Brasil, a indústria local suspira aliviada. “A boa notícia agora passou ser a de uma queda menor do que a esperada."
A participação da indústria no PIB brasileiro não para de cair desde 2005. Até 2000 já se registrara um forte baque. Com a queda ampla da produção nos anos 1990 após a abertura das importações da era Collor, a participação caiu da casa de 34% para 26,5%. Nos anos de 2004 e 2005, períodos de exceção, subiu para 28%. Em 2015, era de 21,9%. O melhor sinal para 2016 será, mesmo, parar de cair.