Financiar exportação Exige Mudança Estrutural
Financiar exportação Exige Mudança Estrutural
O Estado de São Paulo - 25/08/2002
Médias e pequenas empresas ainda enfrentam dificuldades para exportar
PATRÍCIA CAMPOS MELLO
A Bandeirantes Gráfica fechou seu primeiro contrato de exportação em abril deste ano. Trata-se de um pedido pequeno: 60 mil livros para uma empresa inglesa. "Estou usando capital próprio, mas se houver um aumento nas encomendas, vou precisar de financiamento e ainda não sei que tipo de crédito vou conseguir", diz Mário César de Camargo, presidente da editora.
"Está muito difícil e caro conseguir um Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC), e o BNDES é muito burocrático."
A escassez de crédito para os exportadores pode ser um problema duradouro e exigir mudanças estruturais nos mecanismos de financiamento à exportação.
Especialistas argumentam que, mesmo após as eleições, as linhas de crédito oferecidas por bancos estrangeiros não devem voltar aos níveis históricos.
"Mesmo quando elas começarem a voltar, vamos ficar com um buraco", diz Júlio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). "O governo precisa pensar em mudanças estruturais para garantir financiamento para médias e pequenas empresas", diz José Augusto de Castro, diretor da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). "Só assim conseguiremos aumentar nossa base exportadora."
O BNDES vem aumentando sua participação no financiamento às exportações - era de 4,1% do total de recursos em 1996 e neste ano, até julho, chegou a 35%. A maioria do crédito, porém, é destinada para pós-embarque (financia a comercialização e é mais usada por grandes exportadores, como a Embraer). O valor de crédito pós-embarque subiu de US$ 591 milhões em 1997 para US$ 1,9 bilhão até julho de 2002.
Já o financiamento de pré-embarque sofreu uma redução drástica. Semelhantes aos ACCs oferecidos pelos bancos, os financiamentos pré-embarque são vitais para muitos pequenos e médios exportadores bancarem sua produção. Em 2000, o BNDES destinou US$ 809 milhões para pré-embarque; em 2001 o valor caiu para US$ 410 milhões e em 2002, até julho, foram apenas US$ 30 milhões. "E esse é justamente o crédito mais escasso do mercado", diz Castro.
Apesar de o crédito emergencial liberado pelo banco nesta semana atender melhor às necessidades das pequenas e médias - a liberação leva apenas cinco dias e foi desburocratizada - o banco não deve mudar seu perfil. "Limitamos o pré-embarque porque em 2001 havia muita oferta de ACCs dos bancos de varejo e o papel do BNDES não é suprir a demanda por ACC mais barato", disse Isac Zagury, diretor da área internacional do BNDES, em um seminário em São Paulo. Ele reconhece, porém, que a situação atual é diferente. "Se as grandes estão pagando Libor + 10, imagine as pequenas, nem passam pela porta dos bancos", disse. Para ele, a crise vai passar e os bancos vão restabelecer 100% das linhas. "O negócio do BNDES não é financiar curto prazo, quem tem de fazer isso são os bancos comerciais."
Porém, depender de recursos externos, que flutuam ao sabor do risco Brasil, é visto como um perigo que precisa ser minimizado. Para o ex-diretor do Banco Central Emilio Garofalo Filho, a mudança deve também ser cultural, com os exportadores passando a se financiar em reais em vez de dólares.
Tradicionalmente, o crédito externo vale a pena por causa da taxa de juros menor. "Mas nos últimos tempos a variação cambial tem sido tão grande que atrapalha muito", diz Garofalo.
Para muitos, essa é a hora de "reabilitar" o Banco do Brasil. "Precisamos recuperar o papel do BB no comércio exterior", diz Almeida. Para Castro, o grande problema é que poucas empresas têm acesso aos financiamentos do BNDES. "Já o BB tem maior capilaridade e mais agilidade", diz.
Outra mudança proposta pelos exportadores é a concessão de linhas de crédito para países, como faz o Eximbank dos EUA. Nos EUA há linhas oficiais para países - por exemplo, um determinado crédito para importadores do Brasil comprarem produtos americanos. "Isso forma um público cativo, porque facilita a compra", diz Castro. "No Brasil, é feito caso a caso, cada operação é analisada."