Análise IEDI
Lições de Inovação que Vêm da China (Homenagem a Antônio Barros de Castro)
Esta é uma singela homenagem a Antônio Barros de Castro, falecido ontem no Rio de Janeiro. Grande historiador e um dos maiores economistas do País, Antônio Barros de Castro foi professor da Unicamp e da UFRJ e presidiu o BNDES. Dedicava-se ultimamente com grande afinco e paixão ao estudo da China, preocupado como era com o futuro da economia mundial e com as possibilidades brasileiras de ampliar seu desenvolvimento. Antônio Castro em diversas ocasiões esteve muito próximo do IEDI. Escreveu textos, colaborou com as propostas de política industrial e tecnológica do Instituto e foi membro do Fórum IEDI em companhia de outros grandes economistas que discutiam o presente e o futuro da indústria no Brasil e no mundo.
Esta Análise traz um resumo de um estudo que o IEDI está ultimando e que em breve será publicado sobre as políticas de inovação na China, um dos temas prediletos de Antonio Barros de Castro. O Instituto pretende oferecer ao governo e à sociedade brasileira um exemplo de grande determinação e esforço de ampliação de avanço tecnológico e de inovação empresarial.
Desde 1978 quando iniciou sua reforma econômica, a China vem reduzindo rapidamente sua distância em relação aos países de economia avançada. O sucesso da estratégia chinesa de catching-up se expressa em diversos indicadores. Em 2010, por exemplo, a China, que em termos do produto interno bruto (PIB) em paridade do poder de compra já ocupava o segundo lugar desde 2001 atrás apenas dos Estados Unidos, tornou-se também a segunda maior economia mundial em termos do PIB em dólar corrente.
Em ciência, tecnologia e inovação (C, T & I), a ascensão da China tem sido especialmente impressionante. Desde 1999, os investimentos chineses em pesquisa e desenvolvimento (P&D) crescem em média 20% por ano, tendo alcançado 1,44% do PIB em 2007, convergindo rapidamente para a média de 2,1% do grupo dos principais países avançados. A meta é elevar as despesas com P&D para 2,5% do PIB em 2020. A emergência da China como potência em tecnologia e inovação é o objeto do presente estudo.
A China registra um notável desempenho na solicitação de patentes no exterior, indicador da aplicação do conhecimento científico. O número de patentes de invenções obtidas junto ao escritório americano de patentes e marcas (USPTO, na sigla em inglês) atingiu 2.657 em 2010 (90 em 1999). Já o número de solicitações chinesas de patentes internacionais no âmbito do Tratado de Cooperação de Patentes (PCT, na sigla em inglês), que garante proteção às invenções domésticas em 142 países, mais do que triplicou entre 2006 e 2010, levando a China da oitava para a quarta posição do ranking, ultrapassando a Coreia do Sul, a França, o Reino Unido e a Holanda e reduzindo o diferencial em relação à Alemanha, terceiro lugar do ranking, atrás dos Estados Unidos e do Japão.
Embora os Estados Unidos e o Japão permaneçam como os países-líderes em ciência, tecnologia e inovação (C, T & I), a China se tornou em 2008 o segundo maior produtor mundial de conhecimento científico, expresso no número de artigos publicados, após revisão crítica, em revistas científicas, atrás apenas dos Estados Unidos. Mantido na atual trajetória, o avanço chinês na produção científica mundial deverá levar o país à primeira posição em meados da presente década. Em algumas áreas do conhecimento, como química e nanotecnologia, a China já alcançou reconhecida excelência.
O sucesso da convergência tecnológica chinesa frente aos países avançados repousa na visão estratégica de longo prazo do governo, que vem, desde a década de 1980, elaborando sucessivos planos de desenvolvimento cientifico e tecnológico. Nesses planos, a prioridade conferida à ciência e inovação tem sido coerentemente articulada com outros aspectos da política industrial, tais como formação de recursos humanos, estratégias setoriais, propriedade intelectual, uso seletivo do investimento estrangeiro direto.
Além da rápida e sistemática absorção de conhecimento estrangeiro, a China investiu pesadamente em capital humano, promovendo todos os níveis educacionais do país, bem como educação e treinamento no exterior, e na construção da infraestrutura de ciência e tecnologia. Desde meados de 1990, foram criados mais de 100 laboratórios nacionais em áreas selecionadas de pesquisa básica e inúmeros parques científicos e tecnológicos.
Na China, onde muitos membros do Conselho de Estado – a mais alta instância do governo – são cientistas e engenheiros experientes, o progresso científico e tecnológico é entendido como o principal meio de obter ganhos substanciais de produtividade e de promover o desenvolvimento econômico e social, de forma coordenada e sustentável. Essa visão está claramente explicitada no Programa Nacional de Médio e Longo Prazo para o Desenvolvimento Ciência e Tecnologia (MLP, na sigla em inglês), anunciado em 2006, que pretende transformar a China em uma economia orientada à inovação até o ano de 2020, de modo a garantir a manutenção do crescimento em um patamar elevado e assegurar a coesão social interna. Os princípios norteadores dos esforços chineses nesse período de
quinze anos são:
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Inovação nativa: fomento à inovação original própria, à inovação integrada (novos usos para tecnologias existentes) e à re-inovação (absorção e aperfeiçoamento de tecnologias importadas), em ordem de melhorar a capacidade de inovação nacional;
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Saltos tecnológicos (“leapfrogging”) em áreas prioritárias: selecionar e concentrar esforços em áreas-chave, de força e vantagem relativa, vinculadas à economia nacional e à subsistência da população, bem como à segurança nacional;
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Promoção do desenvolvimento: viabilizar tecnologias-chave que são urgentemente necessárias para o desenvolvimento econômico e social sustentável e coordenado;
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Liderar o futuro: utilizar pesquisas básicas e tecnologias de ponta para criar novas demandas e novas indústrias, as quais irão impulsionar o futuro crescimento econômico e desenvolvimento social.
Os principais objetivos do MLP são: reduzir a dependência da China de tecnologia estrangeira para menos de 30% até 2020; ampliar o gasto doméstico bruto com P&D de 2,0% do PIB em 2010 para 2,5% em 2020; elevar a contribuição das atividades de C, T & I a 60% do crescimento do PIB; posicionar a China entre os cinco principais países do mundo em número de patentes domésticos e em citação internacional de artigos científicos. São inúmeras as evidências de que a China vem realizando progressos significativos em direção as metas definidas no MLP.
A emergência da China como potência científica e tecnológica representa um sério desafio para os países avançados, que já enfrentam a crescente concorrência chinesa em diferentes áreas, e deve servir de inspiração para outros países em desenvolvimento. Porém, é preciso ressaltar que o avanço chinês ainda está longe de implicar no declínio dos Estados Unidos, Japão, Alemanha, França e Reino Unido e outros. Embora estejam perdendo participação em termo de investimento e desempenho na atividade global de P&D, a produção científica e tecnológica desses países segue crescendo em termos absolutos a partir de uma base já elevada.