Carta IEDI
A Relevância da Indústria de Transformação: As Experiências dos SEANICs e do Brasil Comparadas
Diante do atual contexto brasileiro de reprimarização da pauta de exportações e dos movimentos desindustrializantes da estrutura produtiva brasileira, cabe lembrar que a literatura já apresentou diversas discussões e evidências de que a diversificação das atividades industriais é intrínseca ao conceito de desenvolvimento econômico em si, tomado como um processo relacionado à ampliação do emprego e da capacidade produtiva, com a contínua elevação da produtividade, incorrendo em mudança estrutural para setores capital e tecnológico intensivos.
Desde 1980 a indústria brasileira caminha a passos lentos, retrocedendo em alguns casos, o que se traduziu no fraco avanço da economia como um todo. O PIB cresceu em média 2,8% entre 1980 e 2010 e o PIB per capita 1,0%. O valor agregado da indústria da transformação registrou um crescimento de 1,6%. E a parcela da mesma nas exportações se reduziu de 53% em 2001-2005 para 47% de 2006-2010 (dados WDI – World Development Indicators). Assim, o Brasil ocupa atualmente a 30ª posição no ranking internacional dos exportadores desses bens, posição atrás da Malásia (19ª) e da Tailândia (20ª), e encostada na Indonésia (31ª), de acordo com a OMC.
Esses três países, conhecidos como SEANICs (SouthEast Asian Newly Industrialized Countries), viveram um crescimento espetacular do PIB e do PIB per capita, respectivamente com médias anuais de 5,4% e 4,0% na Indonésia, 6% e 2,7% na Malásia, e 5,6% e 3,4% na Tailândia entre 1980 e 2010 (dados WDI). A expressiva elevação do PIB foi puxada pelo setor industrial, que reconfigurou suas estruturas produtiva e exportadora. A transformação estrutural dessas economias está entre as mais notáveis da história econômica recente mundial. O crescimento de suas indústrias de transformação alcançou em todos a média de 8% ao ano.
A Malásia é o caso de maior sucesso de diversificação produtiva dos SEANICs, tendo atingido o nível de PIB per capita mais elevado – que, inclusive, é superior ao brasileiro. A sua configuração das exportações é bastante semelhante à mundial, com maior peso nos produtos de média e alta intensidade tecnológica (Malásia 39%, Tailândia 28%, Indonésia 10%, e no Brasil 9% em 2009, de acordo com a UNIDO). A Malásia também promoveu uma rápida urbanização, ao contrário dos outros SEANICs porque mais de 40% da mão-de-obra continua no setor primário (WDI).
A Indonésia possui uma forte indústria de alimentos e bebidas, que representou quase a metade da produção da indústria de transformação em 2009. Destacam-se também as indústrias de petróleo refinado, coque e energia nuclear (15%), produtos de metal (7,9%) e veículos automotores (7,6%). A indústria de veículos, aliás, tem peso semelhante nos quatro países, sendo um pouco menos significativa na Malásia e no Brasil. Na Malásia, as indústrias principais são de telecomunicações (22%), petróleo refinado e etc. (11,8%), alimentos e bebidas (11,6%), borracha e plástico (10,9%) e químicos (9,6%). Na Tailândia, primeiramente vem equipamentos de escritório, mensuração e contabilidade (computadores) (28%), alimentos e bebidas (15,2%), vestuário (8,6%) e veículos automotores (7,0%). Finalmente, no Brasil percebe-se uma distribuição melhor entre as indústrias, com destaque para alimentos e bebidas (13,7%), petróleo etc. (11%) e químicos (9,9%). Contrastando a configuração do produto industrial dos SEANICs com as exportações, percebem-se discrepâncias importantes, que estampam um modelo de crescimento nos SEANICs orientado para as exportações de manufaturas.
Examinando o período mais atual, constata-se que a evolução da indústria da transformação nos SEANICs também superou à brasileira, a taxas médias acima de 5% entre 2000 e 2005 – enquanto a do Brasil foi 3,2% (inferior ao crescimento mundial também). Entre 2005 e 2010, o valor agregado das manufaturas de Indonésia e Tailândia também cresceram significativamente acima do Brasil, que superou apenas a Malásia. Em todos os SEANICs, a participação da indústria da transformação no valor agregado é bastante alta relativamente ao mundo, o que sustenta empregos e salários (WDI e UNIDO).
Porém nos quatro países houve crescimento do setor primário nas exportações e no valor agregado entre 2005 e 2010, por conta do aumento do preço das commodities. Contudo, ainda assim, Indonésia teve um crescimento médio das exportações de manufaturas de 55%, a Malásia 44,5% e a Tailândia 87,5% – enquanto as exportações de manufaturas do Brasil aumentou 8,2% (comparando as exportações em US$ corrente, médias 2001-2005 vs. 2006-2010, dados UNIDO e WDI).
Há uma aparente divisão de produção setorial entre os três “mini-tigres” no sudeste asiático: produtos do primeiro estágio de industrialização – têxteis, alimentos, minérios – na Indonésia, eletroeletrônicos e telecomunicações na Tailândia e na Malásia. Destarte, a intensidade tecnológica e de capital do valor agregado industrial da produção e das exportações da Indonésia é inferior ao dos outros SEANICs, mas superior ao do Brasil em alguns casos.
Analisando alguns fatores de competitividade no período mais recente, constata-se clara vantagem de custos de mão-de-obra nos SEANICs. Contrastando os salários médios, depreende-se que na Indonésia são deveras deprimidos. Contudo na Malásia, já são bastante similares ao brasileiro, alcançando uma participação no valor da produção semelhante à nossa (dados UNIDO). A taxa real de juros real no Brasil é bem superior à dos SEANICs, que entre 2005 e 2009 foi em média 2,8% na Malásia e na Tailândia e 1,1% na Indonésia. A Indonésia teve um pouco de inflação na última década, em média 13% entre 2005 e 2009 e a Malásia e a Tailândia não. O Brasil registrou um índice médio de inflação moderado (UNIDO). Além dos juros mais elevados, o Brasil apresenta taxa de câmbio menos competitiva. Apesar do viés de valorização de todas (rúpia indonésia, ringgit, bath e real), os SEANICs, através de um regime de câmbio administrado, mantêm taxas bastante desvalorizadas em relação ao dólar, ao contrário do Brasil.
Quanto ao investimento, os SEANICs apresentam taxas elevadas. A formação bruta de capital fixo, entre 2006 e 2010, equivaleu a 20,5% do PIB na Malásia, 26,2% na Tailândia e 28% na Indonésia – enquanto no Brasil foi de apenas 17,7%. E, ao contrário do senso comum, não se pode atribuir as altas taxas de investimento dos SEANICs somente à entrada de investimento direto estrangeiro (IDE). O IDE é também uma pequena parte da formação bruta de capital fixo (FBCF), sendo maior na Malásia (15,8%) e menor na Indonésia (5,5%) em média, entre 2006 e 2010. Além do mais, nesse quinquênio o Brasil recebeu maior porção do IDE mundial do que os países dos SEANICs.
Contrastando as experiências dos SEANICs com a brasileira, fica claro como a indústria da transformação continua sendo o principal motor daquelas economias, tanto voltada ao setor externo, quanto ao doméstico. Apesar dos bens primários terem galgado maior parcela das exportações e do produto recentemnte, as exportações da indústria de transformação mantiveram forte expansão, diferentemente do Brasil.
O expressivo crescimento e diversificação da Indonésia, Malásia e Tailândia se deveram, por um lado, às políticas industriais e ao regime macroeconômico (vide o estudo do IEDI de meados de 2011, “Indústria e política industrial no Brasil e outros países”). De outro lado, às estratégias das empresas multinacionais diante do contexto internacional de globalização produtiva e financeira. Os governos dos SEANICs aproveitaram esse contexto, para ativamente transformarem a especialização em recursos naturais em economias diversificadas, ainda que remanesçam problemas estruturais, como a má distribuição de renda.
Para finalizar, cabe ressaltar que tanto o Brasil quanto os SEANICs têm de enfrentar no curto e médio prazo o duplo desafio de não permitir excessiva valorização das moedas e nem a reprimarização da economia. Ao contrário, para sustentar o processo de desenvolvimento econômico, precisam criar instituições facilitadoras e investir em indústrias mais intensivas em tecnologia e conhecimento, avançando no processo de sofisticação da matriz industrial e da pauta exportadora.
Introdução. Diante do atual contexto brasileiro de reprimarização da pauta de exportações e dos movimentos desindustrializantes da estrutura produtiva brasileira, questiona-se a desejabilidade, ou antes, as possibilidades de desenvolvimento com base em recursos naturais. A literatura estruturalista já apresentou diversas discussões e evidências de que o crescimento econômico está altamente associado ao crescimento do produto da indústria da transformação. Aliás, a diversificação das atividades industriais é intrínseca ao conceito de desenvolvimento econômico em si, tomado como um processo relacionado à ampliação do emprego e da capacidade produtiva, com a contínua elevação da produtividade, incorrendo em mudança estrutural para setores capital e tecnológico intensivos.
Indonésia, Malásia e Tailândia estão entre os maiores exemplos da história recente mundial de países que promoveram mudança estrutural em uma velocidade acelerada, transformando as estruturas produtiva e exportadora antes altamente especializadas em recursos naturais para a diversificação em manufaturas. Conhecidos como SEANICs, “países recentemente industrializados (NICs) do sudeste asiático” ou “NICs de segunda geração”, alcançaram taxas de crescimento tão expressivas quanto os NICs (Coréia, Hong Kong, Singapura e Taiwan). Apoiados na indústria da transformação, seu estudo comparado ao Brasil traz lições interessantes – considerando que, diferentemente dos NICs, também são economias de renda média e população grande, abundantes em recursos naturais. Este texto realiza, assim, uma comparação resumida da estrutura produtiva e exportadora e dos fatores de competitividade dessas economias em relação ao Brasil de 1980 a 2010, conferindo especial foco no período mais recente entre 2001 e 2010.
Crescimento Econômico e da Indústria da Transformação. A Indonésia, a Malásia e a Tailândia pertencem ao sudeste asiático e possuem territórios fragmentados, de proporções que vão do médio ao grande - a Malásia é o 67º maior país do mundo, Tailândia 51º e Indonésia 15º. Todos são populosos: a Malásia em 2011 ocupava o 43º lugar no ranking internacional - com 29 milhões de habitantes, a Tailândia 20º - com 67 milhões, e a Indonésia 4º - com 250 milhões. O Brasil é o 5º país em território e também em população, com quase 200 milhões de habitantes (CIA).
Desde 1980, os SEANICs vivenciaram crescimento espetacular do PIB, em média 5,4% na Indonésia, 6% na Malásia e 5,6% na Tailândia. O Brasil cresceu a 2,6% - taxa não somente inferior à dos outros países como também à do mundo. Em 1980 o PIB per capita do Brasil era mais do que o dobro do malaio, quatro vezes maior do que o tailandês e nove vezes o indonésio. As taxas de crescimento do PIB per capita brasileiro foram tão inferiores às dos SEANICs que em 2010 foi ultrapassado pelo PIB per capita malaio, e a diferença em relação aos outros países caiu pelo menos pela metade do que era em 1980 (WDI).
Entre 2006 e 2010, o Brasil recuperou o crescimento mediano do quinquênio anterior, crescendo a expressivos 4,4% em dólares constantes de 2000. Esse resultado foi superior ao da Tailândia (3,6%), ficando atrás de Malásia (4,5%) e Indonésia (5,7%). Vale notar que o segundo quinquênio foi de menor crescimento do que o primeiro na Malásia e na Tailândia (WDI).
Examinando o período recente, nota-se que expansão do valor agregado da indústria da transformação nos SEANICs também foi maior do que a brasileira, a taxas médias superiores a 5% entre 2000 e 2005. Entre 2005 e 2010, o valor agregado das manufaturas de Indonésia e Tailândia também cresceram significativamente acima do Brasil, que superou apenas a Malásia. O mesmo cenário se observa no crescimento do PIB excluindo o setor de indústria de transformação (UNIDO).
A indústria da transformação possui um peso no PIB dos SEANICs elevado, de 26,4% na Indonésia, 27,1% na Malásia e 36,6% na Tailândia, em 2010. No Brasil, por sua vez, a parcela está em 13,5% - quase a metade da Indonésia, e percentagem inferior também à mundial. Vale notar que esta parcela decresceu em 2010 em todos os países, exceto na Indonésia, mas a queda foi proporcionalmente maior no Brasil (de 10%).
O Brasil ainda mantém uma participação superior no valor adicionado mundial de manufaturas aos SEANICs, mas seu peso nas exportações mundiais desses bens é inferior à da Malásia e da Tailândia. Em 2011 o Brasil ocupou a posição de 30º maior exportador mundial de manufaturas, atrás da Malásia (25º) e Tailândia (20º), e encostado na Indonésia (31º) (OMC).
Especialização Exportadora e Produtiva. De modo geral, as exportações tanto do Brasil quanto dos SEANICs assistiram a um crescimento da parcela dos gêneros agrícolas e/ou de combustíveis e minérios na segunda metade da década de 2000. Na Indonésia, os dois setores somados passaram de 50% para quase 60%; na Malásia, de 22% para 30%; na Tailândia o aumento foi menor – de 23% para 25%; e no Brasil de 47% para 52%.
Analisando o perfil das exportações de manufaturas, de acordo com os dados da OMC, chama a atenção a predominância de máquinas e equipamentos, incluindo transportes, nas exportações da Malásia e da Tailândia (acima de 40%). Nos dois casos, essa parcela é alta devido aos bens eletrônicos, de processamento de dados, equipamentos elétricos e dos componentes eletrônicos e circuitos integrados. Ainda que parte desses bens seja apenas montada nesses países, e a despeito também da parcela deles ter se reduzido em 2005-2010, o fato é que Malásia e Tailândia mantêm uma alta participação de bens de alta e média intensidade tecnológica na pauta de exportações.
A composição da pauta de bens manufaturados do Brasil e da Indonésia é diferente entre si e dos outros SEANICs. Na Indonésia, destacam-se químicos e têxteis e vestuário – estes últimos, contudo, perderam mais de 3 pp de 2000-2005 para 2005-2010. No Brasil, os setores com maiores participações relativas são produtos automotivos, aço e ferro, e químicos.
Examinando por perfil tecnológico (dados UNCTAD), impressiona a queda da participação dos bens de alta intensidade ao longo da década até 2011, nos quatro países. Mais da metade das exportações da Malásia entre 2000 e 2005, eram desses bens, passando para 39% em 2011. Na Tailândia, a queda foi de 33% para 28%, na Indonésia de 15% para 10%, e no Brasil de 14% para 9%.
Este movimento foi compensado pelo expressivo crescimento de bens primários e de energia em todos os países. Destaca-se a participação de quase 54% dos bens primários em 2011 nas exportações brasileiras. Vale notar também a quedas das exportações de bens intensivos em trabalho e recursos naturais, outrora relevantes nos quatro países – principalmente na Indonésia. Os bens de baixa e média intensidade tecnológicas mantiveram participação estável, exceto no Brasil, onde reduziram consideravelmente de 27% em 2000-2005 para 19% em 2011.
O dado mais impressionante é o da expansão das exportações dos SEANICS. A Indonésia e a Tailândia praticamente dobraram, e a Malásia elevou em 61,4% o valor em dólares correntes médio das exportações totais de 2001-2005 para 2006-2010, enquanto o Brasil apenas 21,2%. Não há sequer um subsetor em que o Brasil cresceu mais do que os SEANICs.
Nos quatro países, combustíveis, minérios e bens agrícolas tiveram maior expansão das exportações do que a indústria da transformação. Contudo, ainda assim, Indonésia teve um crescimento médio das manufaturas de 55%, a Malásia 44,5% e a Tailândia 87,5% anuais entre 2006 e 2010, versus 2001 e 2005 – e o Brasil de 8,2%. Em todos os países, os bens de maior conteúdo tecnológico registraram o crescimento mais baixo, mas somente no Brasil foi negativo. O mesmo se pode dizer dos setores trabalho-intensivos de vestuários e têxteis. Por sua vez, os setores de aço/ ferro e químicos expandiram em todos os países acima do crescimento médio da indústria de transformação.
Valor Agregado. Conforme apontado anteriormente, os SEANICs possuem uma composição do valor agregado em que a indústria da transformação apresenta grande peso relativamente ao Brasil e ao resto do mundo. Mas é importante ressaltar que a estrutura do emprego na Indonésia e na Tailândia é bem discrepante em relação à estrutura do valor agregado: pois a despeito da menor participação de bens primários no valor agregado, cerca de 40% da força de trabalho está alocada no setor primário na Indonésia e na Tailândia. No Brasil, há também uma significativa diferença, já que em 2005-2010, 18% do emprego estava no setor primário, enquanto 6% do valor agregado correspondeu àquele setor.
Vamos agora examinar em detalhes a produção industrial comparada. Infelizmente o ano mais recente disponibilizado abertamente pela UNIDO é 2009, que apresenta algumas distorções por ter sido o ano da crise. Mesmo assim, pode-se dimensionar a importância de cada setor nos diferentes países estudados.
A Indonésia possui uma forte indústria de alimentos e bebidas, que representou quase a metade da produção da indústria de transformação em 2009. Destacam-se também a indústria de petróleo refinado, coque e energia nuclear (15%), produtos de metal (7,9%) e veículos automotores (7,6%). A indústria de veículos, aliás, tem peso semelhante nos quatro países, sendo um pouco menos significativa na Malásia e no Brasil. Na Malásia, as indústrias principais são de telecomunicações (22%), petróleo refinado e etc. (11,8%), alimentos e bebidas (11,6%), borracha e plástico (10,9%) e químicos (9,6%). Na Tailândia, primeiramente vem equipamentos de escritório, mensuração e contabilidade (computadores) (28%), alimentos e bebidas (15,2%), vestuário (8,6%) e veículos automotores (7,0%). Finalmente, no Brasil percebe-se uma distribuição melhor entre as indústrias, com destaque para alimentos e bebidas (13,7%), petróleo etc. (11%) e químicos (9,9%).
Contrastando a composição da indústria desses países com a do mundo, constata-se que a da Malásia é a mais alinhada – principalmente no que se refere à importância da indústria de alta tecnologia de telecomunicações (equipamentos de comunicação, televisão e rádio) – que no mundo é de 27% (e no Brasil apenas 6%).
Fatores Competitivos. Nesta seção se examinam alguns fatores competitivos como mão-de-obra – em termos de alocação e salários na indústria, o investimento, os juros, a taxa de câmbio e o preço da energia elétrica. O objetivo é comparar com o Brasil para entender melhor algumas das causas para o desempenho dos SEANICs ser relativamente melhor nas exportações de manufaturas do que o Brasil.
Mão-de-obra. Na Indonésia, os subsetores que mais empregam são de têxteis e vestuário, tabaco e alimentos: somam cerca de 1,7 milhões de empregados. Em vestuário, a parcela dos salários no valor agregado era de 23,5% em 2009, e nos outros quatro subsetores mais importantes era inferior a 14%, em um contexto no qual o salário / empregado anual ficou entre US$ 1122 e U$ 1825 (dados UNIDO).
Na Malásia, os cinco subsetores que mais empregam são outros: válvulas e tubos, plástico, móveis, carnes e gorduras processadas e borracha. Juntos, somam cerca de 600 mil empregados, ou pouco mais de um quinto da força de trabalho. O salário médio é quase cinco vezes maior aos dos principais setores da Indonésia, tomando como referência o segmento de gorduras processadas (que inclui o óleo de palmeira, produto de exportação importante dos SEANICs). Isso explica a maior parcela dos salários no valor agregado, que chega a 55% em móveis. No principal subsetor exportador, de telecomunicações, o salário médio anual é superior a US$ 8mil.
Os maiores subsetores empregadores da Tailândia, com 1,3 milhões de trabalhadores em 2009, reúne alguns dos principais setores da Malásia e da Indonésia: têxteis, carnes e gorduras processadas, válvulas e tubos e plástico. Os salários médios são baixos, mas ainda superiores aos indonésios, cerca de US$ 1900 anuais em têxteis Em válvulas e tubos, os salários são mais de 3 vezes inferiores aos malaios, constituindo 25% do valor agregado (versus 28%) na Tailândia. Em vestuário, a despeito do baixo salário seu valor correspondeu a 42% do valor agregado na produção em 2009.
No Brasil, os maiores subsetores em termos de emprego são alimentos, vestuário, calçados e produtos de metais, com quase 2,3 milhões de trabalhadores. Os salários são consideravelmente maiores do que nos SEANICs, mais de duas vezes superior ao da Tailândia em vestuário, por exemplo. Por isso constituem quase 40% do valor agregado na produção. Mas em carnes e gorduras processadas, o peso dos salários no valor agregado (21%) é inferior ao tailandês (25%), similar ao malaio (18%) e bem acima do indonésio (7%).
Taxa de Juros. A taxa real de juros real no Brasil é bem superior à dos SEANICs. Enquanto entre 2005 e 2009, os juros (SELIC) médios real por ano foram 9,1, corresponderam em média a 2,8% na Malásia e na Tailândia e 1,1% na Indonésia. A Indonésia teve um pouco de inflação na última década, em média 13% entre 2005 e 2009 e a Malásia e a Tailândia não. O Brasil teve uma índice médio de inflação moderado (WDI e IPEA).
Taxa de Câmbio. O gráfico abaixo ajuda a visualizar os movimentos das taxas de câmbio do Sudeste Asiático e do Brasil em relação ao dólar entre 2000 e 2010. Os SEANICs, principalmente a Indonésia, mantiveram um patamar de câmbio desvalorizado e estável, através de um regime de flutuação administrada. As taxas cambiais da Malásia e da Tailândia apresentaram comportamentos reflexivos, que em ambos registraram leve apreciação real ao longo da década. Mesmo assim, o ringgit e o bath no começo de 2012 figuravam entre as moedas mais desvalorizadas do mundo (ver índice Big Mac). Finalmente, a taxa de câmbio brasileira valorizou progressivamente de 2003 a 2010, em grau comparativamente mais profundo do que os SEANICs, chegando em 2012 bastante sobrevalorizada.
Investimento Direto Externo e Formação Bruta de Capital Fixo. O modelo de industrialização seguido pelos SEANICs desde o pós-guerra, combina a substituição de importações com a plataforma de exportações. Neste último caso, houve intensa presença das empresas multinacionais, frequentemente instaladas em Zonas Econômicas Especiais, que aportaram massivos investimentos diretos estrangeiros (IDE).
Contudo, recentemente, o Brasil recebeu mais IDE do que os SEANICs, notadamente em 2011. Enquanto entre 2006 e 2010 a entrada de IDE no Brasil representou, em média, 2,3% do fluxo mundial, nos SEANICs foi em média 0,5%. Analisando a relação IDE/PIB, porém, as proporções foram: 2,2% no Brasil, 1,5% na Indonésia e 3,3% na Tailândia e na Malásia (WDI).
O IDE é também uma pequena parte da formação bruta de capital fixo (FBCF), sendo maior na Malásia (15,8%) e menor na Indonésia (5,5%) em média, entre 2005 e 2010. A relação IDE/FBCF no Brasil é de 12,3%, similar à tailandesa, 13,0%.
Mas o principal ponto é que, a despeito do maior influxo de IDE, o investimento (FBCF + variação de estoques) na economia brasileira foi significativamente inferior à dos SEANICs. A FBCF brasileira equivaleu em média 17,7% entre 2006-2010, tendo registrado 20,5% na Malásia, 26,2% na Tailândia e 28,0% na Indonésia.
Balanço das Experiências. Está bem claro o expressivo crescimento da economia dos SEANICs, com diversificação produtiva e exportadora. Mas o que explica as melhores posições relativas dos países desses países? Por um lado, as políticas industriais e o regime macroeconômico (vide o estudo do IEDI de meados de 2011, “Indústria e política industrial no Brasil e outros países”). De outro lado, as estratégias das empresas multinacionais diante do contexto internacional de globalização produtiva e financeira. Os governos dos SEANICs aproveitaram esse contexto para ativamente transformarem de economias especializadas em RN em economias diversificadas, ainda que remanesçam problemas estruturais, como a má distribuição de renda.
Analisando os SEANICs e o Brasil, é evidente que a Malásia é o caso de maior sucesso de transformação industrial. O país hoje possui produto per capita superior aos outros, inclusive o nosso. A sua configuração das exportações é bastante semelhante à mundial, com maior peso dos produtos de média e alta intensidade tecnológica (Malásia 39%,Tailândia 28%, Indonésia 10%, e no Brasil 9%). A Malásia também promoveu uma rápida urbanização, processo ainda incompleto nos outros SEANICs.
Em todos os SEANICs, a participação da indústria da transformação no valor agregado é bastante alta relativamente ao mundo, o que sustenta empregos e salários. Porém também em todos houve crescimento do setor primário nas exportações e no valor agregado entre 2005 e 2010, por conta do aumento do preço das commodities. Não obstante, o crescimento das exportações dos SEANICs foi espetacular na primeira década do milênio, da ordem de 60% na Malásia, e praticamente dobrando na Indonésia e na Tailândia – enquanto a do Brasil é de apenas 20% (comparando as exportações em US$ corrente, médias 2001-2005 vs. 2006-2010). Há uma aparente divisão de produção setorial entre os três “mini-tigres” no sudeste asiático: produtos do primeiro estágio de industrialização – têxteis, alimentos, minérios – na Indonésia, eletroeletrônicos e telecomunicações na Tailândia e na Malásia. Destarte, a intensidade tecnológica e de capital do valor agregado industrial da produção e das exportações da Indonésia é inferior ao dos outros SEANICs, mas superior ao do Brasil em alguns casos.
Para finalizar, cabe ressaltar que tanto o Brasil quanto os SEANICs têm de enfrentar no curto e médio prazo o duplo desafio de não permitir excessiva valorização das moedas e nem a reprimarização da economia. Ao contrário, para sustentar o processo de desenvolvimento econômico, precisam criar instituições facilitadoras e investir em indústrias mais intensivas em tecnologia e conhecimento, avançando no processo de sofisticação da matriz industrial e da pauta exportadora.