Carta IEDI
O Recurso do Câmbio
A atividade econômica no Brasil continua em níveis historicamente baixos, a contar pelo desempenho dos principais setores, indústria, comércio e serviços, cujas atividades estão fortemente inter-relacionadas. Nesse sentido, 2016 imita o final de 2015. Porém, o resultado do primeiro trimestre do ano, posto em perspectiva, aponta para tendências distintas em cada um desses setores.
A indústria parece buscar seu “fundo de poço”. A produção industrial continua caindo, mas houve estabilização do ritmo de queda: -11,7% no primeiro trimestre de 2016 contra -11,9% no último trimestre de 2015, sempre frente ao mesmo período do ano anterior. Na série com ajuste sazonal, mais sensível às mudanças de curto prazo, a melhora relativa fica mais evidente: houve queda de -2,3% no trimestre findo em março de 2016 em relação ao trimestre anterior, contra -4,1% no quarto trimestre de 2015.
Um fator importante para esse comportamento tem sido a desvalorização da taxa de câmbio ocorrida no ano passado que, finalmente, começa a ajudar alguns setores industriais, como alimentos, têxteis e confecção, couros e calçados, produtos de madeira, farmacêuticos e outros produtos químicos, seja pelo lado das exportações, seja por meio da substituição de importações. Um grande erro será cometido se a política econômica, agora sob nova administração, promover a valorização do Real.
Regionalmente, devido ao peso de muitos desses setores em suas estruturas produtivas, os estados do sul do país conseguiram obter resultados positivos nos três primeiros meses de 2016 frente ao trimestre anterior, sem efeitos sazonais. A produção industrial do Rio Grande do Sul cresceu 2,7%, a do Paraná 0,8% e a de Santa Catarina se aproximou do terreno positivo (-0,6%).
Ainda que apresentando quedas, os resultados dos principais centros industriais do país também foram “menos ruins” nesse início de ano. São Paulo, que detém o maior e mais diversificado parque industrial, conseguiu reduzir suas perdas de -3,7% no último trimestre de 2015 para -1,8% no primeiro de 2016 frente ao trimestre anterior, com ajuste sazonal. No caso do Rio de Janeiro, a redução do patamar da queda foi de -5,5% para -1,6% no mesmo período e em Minas Gerais de -5,0% para -3,1%, mesmo sob efeitos reminiscentes do desastre de Mariana.
A situação está muito longe de ser favorável, mas esse início de 2016 pode vir a representar para a indústria um momento de transição para a tão esperada recuperação caso essa tendência do primeiro trimestre se mantenha nos próximos meses.
O mesmo, infelizmente, não pode ser dito para o comércio varejista. Depois de certo alívio no final de 2015, a retração voltou a se aprofundar em 2016. Na série com ajuste sazonal, o resultado do varejo no conceito restrito piorou de -0,4% no quarto trimestre de 2015 para -3,2% no primeiro trimestre de 2016, sempre em relação ao período anterior.
Ramos como outros artigos de uso pessoal e doméstico de continuaram em franca deterioração de vendas reais no primeiro trimestre do ano (-6,5% frente ao trimestre anterior com ajuste). Em outros segmentos, a piora de 2016 parece ter sido um retorno ao patamar de queda anterior ao final de 2015. Este foi o caso de das vendas de supermercados e alimentos (-2,3%), de móveis e eletrodomésticos (-6,2%), de tecidos, vestuário e calçados (-5,1%) e de livros, jornais, revistas e papelaria (-4,4%).
Quem abriu o ano com crescimento real das vendas foi o setor farmacêutico e de perfumaria e cosméticos (+1,0% frente ao último trimestre de 2015 com ajuste) e aqueles que já sofreram longos períodos de perdas muito acentuadas, como equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (+0,5%) e veículos, motos, partes e peças (+1,0%).
Quanto a serviços, este manteve a trajetória de aceleração de sua retração. No primeiro trimestre de 2016, a queda avançou para 5,0% frente ao mesmo período do ano anterior, depois de ter fechado o ano de 2015 em -3,6%. A contar pelo resultado de março (-5,8% frente a mar/15), a piora não deve parar por aí.
Além do agravamento, 2016 também trouxe mudança do eixo da crise em serviços. Agora, encontram-se na linha de frente das retrações aqueles ramos menos diretamente ligados ao volume de negócios das empresas e de mais difícil compressão pelas famílias.
É o caso de serviços de informação e comunicação, cujas receitas reais mergulharam 4,4% no primeiro trimestre de 2016 frente ao mesmo período de 2015 (-5,9% só em mar16/mar15), deixando claro que, em 2016, a crise chegou com força nos serviços modernos. É também o caso dos serviços administrativos e complementares prestados às empresas, que compreendem sobretudo funções terceirizadas. Aí a receita real caiu 6,4% no acumulado dos primeiros três meses deste ano.
Em síntese, por enquanto, o ganho de competitividade do produto nacional frente ao estrangeiro, em função da desvalorização cambial, tem sido o principal fator a arrefecer a crise. Como a indústria tem relações mais estreitas com o mercado internacional é nela que esse fator é potencializado, ainda que sozinho não consiga reverter o quadro geral do setor. Já o varejo e os serviços encontram-se ainda presos à espiral descendente de fatores internos, como a retração do crédito, a piora do emprego e da renda das famílias e o baixo volume de negócios das empresas.
Indústria - Perspectiva Geral. A evolução do investimento, refletida na produção de bens de capital dos últimos meses, pode ter encontrado seu fundo do poço nesse início de 2016. É verdade que o poço é muito profundo e que a situação pode piorar se a crise política e econômica se aprofundar, mas o ritmo da produção dos bens de investimento tem ajudado a arrefecer a retração da indústria como um todo.
Em março de 2016, a produção industrial cresceu 1,4% frente a fevereiro, com ajuste sazonal. No primeiro trimestre de 2016, frente ao mesmo período do ano anterior, o resultado da indústria foi de -11,7%, muito próximo daquele do último trimestre de 2015 (-11,9%).
Em boa medida isso se deve ao desempenho obtido pela produção de bens de capital. Na série com ajuste sazonal, as variações em relação ao mês imediatamente anterior têm sido positivas em 2016, o que é bastante significativo. Melhor ainda porque tem havido aceleração: +0,3% em janeiro, +0,5% em fevereiro e +2,2% em março.
Em relação ao mesmo período do ano anterior, as quedas continuam graves mas recuaram para um patamar inferior a 30%. Depois dos resultados de -30,5% e -31,9% nos dois últimos trimestres de 2015, os bens de capital caíram 28,9% no primeiro trimestre de 2016 (-24,5% em março).
Bens de consumo semi e não duráveis é outro segmento que teve um início de ano menos ruim. Suas quedas continuaram se reduzindo: -7,9% e -6,5% no terceiro e quarto trimestres de 2015 e -4,5% no primeiro de 2016. Ajudaram para isso alimentos, confecções, couros e calçados e medicamentos, possivelmente devido ao câmbio mais competitivo.
Quem continua não apresentando sinais de qualquer arrefecimento da queda é a produção de bens de consumo duráveis, cujo mercado sofre com a contração do crédito e com a fraca confiança das famílias. Seu resultado de -27,3% no primeiro trimestre de 2016 repetiu aquele do último trimestre de 2015 (-27,9%).
Por fim, ao lado da indústria extrativa, os bens intermediários puxaram para baixo a produção industrial no início de 2016 ao seguir sua tendência de piora progressiva: -5,7% e -9,6% nos dois últimos trimestres de 2015 e -10,3% no trimestre findo em mar/16. O setor extrativo, por sua vez, duplicou seu patamar de queda nesse início do ano (-15,3% contra -7,4% do quarto trimestre de 2015).
Indústria Regional. O início de 2016 vem se mostrando um período em que a indústria busca seu “fundo do poço”. Tanto em janeiro (+0,4%) como em março (+1,4%) houve crescimento da produção frente ao mês anterior, com ajuste sazonal. A boa notícia em março é que a alta não só foi mais intensa, como mais disseminada, atingindo 10 das 14 localidades pesquisadas pelo IBGE. Em janeiro apenas 8 delas tinham crescido.
O desempenho no primeiro trimestre como um todo, frente ao último trimestre de 2015, com ajuste sazonal, também foi melhor para a grande maioria das regiões. Algumas delas continuaram no campo negativo, mas suas quedas tornaram-se menores. Para outras, ao menos na margem, 2016 tem significado recuperação. Vejamos como têm se saído os principais centros industriais do país.
São Paulo, que detém o maior e mais diversificado parque industrial, tem conseguido reduzir suas perdas desde o segundo trimestre de 2015. A trajetória ainda é insuficiente porque as retrações persistem, mas são cada vez menos intensas. Em relação ao trimestre imediatamente anterior, com ajuste sazonal, sua produção caiu 5,2% no segundo trimestre, recuando para -3,8% e -3,7% nos dois últimos trimestres de 2015, para atingir um índice muito inferior, embora ainda negativo, qual seja, -1,8% neste início de 2016.
No Rio de Janeiro, o primeiro trimestre de 2016 significou a reversão da trajetória de piora do ritmo de produção, para a qual contribuiu fatores pontuais como a greve de petroleiros no final do ano passado. Entre o segundo e o quarto trimestre de 2015, sempre com ajuste sazonal, os resultados foram de: -0,8%, -4,0% e -5,5%, respectivamente. Em 2016, a produção continua caindo, mas muito menos: -1,6% no primeiro trimestre.
Minas Gerais, por sua vez, segue na mesma direção. Seu último trimestre de 2015 foi muito ruim devido ao desastre de Mariana, chegando a -5,0% frente ao trimestre anterior com ajuste. No início de 2016, esse fator continua operando em alguma medida, mas mesmo assim seu patamar de queda recuou um pouco, para -3,1%.
Se nos casos acima a situação desse início de ano é de um quadro “menos ruim”, no Rio Grande do Sul pode ser constatada uma recuperação na margem. As retrações de 2015 deram lugar a um crescimento de 2,7% no primeiro trimestre de 2016, frente ao último de 2015. Os demais estados do sul do país também experimentaram melhora, com Paraná voltando ao terreno positivo (+0,8%) e Santa Catarina caminhando para ele (-0,6%).
Por fim, no Nordeste o desempenho da indústria também foi menos desfavorável no primeiro trimestre de 2016 (-0,7%) frente ao trimestre anterior, mas sua trajetória tem sido mais errática (-0,5%, +1,1%, -4,3% entre o segundo e o quarto trimestre de 2015), em função de fatores específicos em cada uma das localidades que compõem a região.
Seria muito bem-vindo que esse movimento se mantivesse nos próximos meses, significando um momento de transição para a tão esperada recuperação da indústria brasileira.
Comércio Varejista. Para o comércio varejista, 2016 não começa bem. É visível o contraste com o ano passado, quando as vendas reais do comércio no conceito restrito caíam módicos 0,8% no primeiro trimestre com relação ao mesmo trimestre de 2014. Agora, no primeiro trimestre de 2016, a retração do varejo gira em torno a 7,0% frente ao mesmo período do ano anterior. Por isso, são grandes as chances de o resultado acumulado em 2016 superar a queda de 4,3% registrada no ano como um todo de 2015.
No conceito ampliado, que inclui vendas de automóveis e autopeças e materiais de construção, a diferença entre as quedas dos primeiros trimestres de 2015 e 2016 também é expressiva: -5,3% e -9,4%, respectivamente. Neste conceito, o varejo teve variação no ano passado de -8,5%, apresentando também tendência de aceleração da queda no corrente ano.
A piora verificada nas vendas em volume do varejo ao longo do segundo semestre do ano passado adentrou o início de 2016, atingindo a maioria dos seus segmentos. Mostramos a seguir como isso se processou em alguns dos principais segmentos, segundo nos indicam as variações trimestre contra trimestre anterior com ajuste sazonal.
O pior desempenho nesses três meses iniciais do ano coube às vendas reais de outros artigos de uso pessoal e doméstico, em que pesam muito as lojas de departamento. Frente ao último trimestre de 2015, a retração foi de 6,5%, muito superior ao ritmo de queda dos dois trimestres anteriores (-2,8% e -2,1%), sugerindo clara deterioração da evolução das vendas.
Em outros segmentos do comércio foi constado também agravamento de seus resultados neste primeiro trimestre de 2016, mas nesses casos, predominantemente a piora parece representar um retorno ao padrão de quedas anteriores ao último trimestre de 2015, quando houve melhora significativa de desempenho. Nesse sentido, a melhora do final do ano passado funcionou mais como um alívio passageiro do que como uma mudança de rota.
Foram os casos:
1. Das vendas de hiper e supermercados, alimentos, bebidas e fumo, cujo declínio de 2,3% no primeiro trimestre de 2016 mais do que compensou a alta de 0,4% no trimestre anterior, aproximando-se de -2,2% do terceiro trimestre de 2015.
2. Das vendas de móveis e eletrodomésticos, cuja queda expressiva de 6,2% também mais do que compensou o crescimento de 0,3% do quarto trimestre de 2015. Voltamos, de fato, a ver um resultado que retoma aqueles dos três primeiros trimestres do ano passado: -6,0%, -7,0% e -4,8%, respectivamente.
3. O mesmo ocorre para as vendas de tecidos, vestuário e calçados: redução de -5,1% no primeiro trimestre de 2016, contra -1,1% no quarto trimestre de 2015 e -4,3% e -4,1% nos dois trimestres anteriores, respectivamente.
4. Idem para livros, jornais, revistas e papelaria, cujas vendas caíram 4,4% neste início de 2016.
Há também indicações de trajetórias positivas ganhado força, como em:
1. Artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, de perfumaria e cosméticos, com vendas crescendo 2,0% e 1,0% no último trimestre de 2015 e no primeiro de 2016.
2. O quadro também perece estar melhorando em segmentos que já sofreram longos períodos de perdas importantes. É o caso de equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação, cujo desempenho trimestral do segundo trimestre de 2015 ao primeiro trimestre de 2016 foi o seguinte: -11,8%, -6,5%, -2,6% e +0,5%.
3. O mesmo vale para as vendas de veículos, motos, partes e peças, que depois de cair 10,5% no primeiro trimestre de 2015, reduz suas perdas para algo como 5% nos demais trimestres do ano para voltar a crescer 1,0% no trimestre findo em março de 2016.
Já os que estão “menos ruins” nesse início de ano no varejo brasileiro incluem combustíveis e lubrificantes e materiais de construção, ambos com retrações menores em suas vendas. Os resultados no quarto trimestre de 2015 e no primeiro de 2016 foram, respectivamente, de -3,9% e -2,6% no primeiro caso, e de -3,7% e -1,4%, no segundo caso.
Serviços. Na esteira do baixo volume de negócios das empresas, do desemprego e da queda do rendimento das famílias, a receita real do setor de serviços manteve a trajetória de aceleração de sua retração.
De fato, no primeiro trimestre de 2016, a queda avançou para 5,0% frente ao mesmo período do ano anterior, depois de ter fechado o ano de 2015 em -3,6%. A contar pelo resultado de março, a piora não deve parar por aí. Com relação a março de 2015, a declínio atingiu 5,8%, indicando um cenário bastante adverso nesse início de ano.
Além do agravamento, 2016 também trouxe mudança do eixo da crise em serviços. Agora, encontram-se na linha de frente das retrações aqueles ramos menos diretamente ligados ao volume de negócios das empresas e de mais difícil compressão pelas famílias.
Os resultados dos principais segmentos de serviços neste primeiro trimestre de 2016, frente ao mesmo trimestre do ano passado, permitem tratar três situações. A primeira reúne segmentos em que se assiste uma piora acentuada de desempenho.
É o caso de serviços de informação e comunicação, cujas receitas reais mantiveram-se estáveis em 2015, mas mergulharam 4,4% no primeiro trimestre de 2016 (-5,9% só em mar/16 contra mar/15). Tal resultado é revelador de que, em 2016, a crise chegou com força nos serviços modernos.
Foi o caso também dos serviços administrativos e complementares prestados às empresas, que compreendem sobretudo funções terceirizadas. Aí a receita real mergulhou 6,4% nos primeiros três meses deste ano; no ano como um todo de 2015 o declínio tinha sido de 2,4%.
A segunda situação reúne ramos que acusaram no primeiro trimestre de 2016 desaceleração das quedas que vinham sofrendo desde o ano passado. São exemplos, transportes e afins, cujas receitas reais caíram 6,1% no acumulado de 2015, desacelerando para -5,2% no primeiro trimestre de 2016, e nos serviços de alojamento e alimentação prestados às famílias, com retração de 5,3% em 2015 e de 3,1% neste primeiro trimestre.
Cabe assinalar, contudo, o risco de que essa melhora relativa tenha sido algo passageira, concentrada apenas no primeiro bimestre do ano. Isso porque os dados de mar/16 frente a mar/15 apontam quedas maiores: de -7,2% para os transportes e de -4,6% para alojamento e alimentação das famílias.
A terceira situação agrupa os segmentos de melhora recente, como outros serviços prestados às famílias (educação, lazer, cultura etc), que conseguiram reduzir suas perdas de -4,0% no acumulado de 2015 para -1,7% no primeiro trimestre de 2016 frente ao mesmo período do ano passado.
Outros serviços também tiveram melhora surpreendente, passando de um revés de -9,0% em 2015 para uma queda mais moderada de -3,8% no primeiro trimestre de 2016. No mês de março, este ramo chegou a registrar aumento de receita real de 2,6%. A diversidade de serviços (financeiros, imobiliários, agropecuários etc) que compõem esse segmento dificulta, contudo, a identificação das razões específicas da mudança de trajetória.
Vale sublinhar ainda o bom desempenho das atividades de turismo que, muito em função da desvalorização do real, conseguiram obter crescimento de suas receitas reais em jan/16 (+0,5% frente a jan/15) e fev/16 (+1,4% frente a fev/15). Em março, porém sofreu nova queda (-2,2%), com o que fechou o trimestre em -0,1%. Mesmo assim, 2016 tem sido mais favorável do que 2015, cuja queda acumulada chegou -2,1%.