Carta IEDI
Um bimestre de baixo dinamismo
O segundo semestre do ano começou dando sinais de que perdeu força a trajetória que mal podia ser identificada com o início de uma recuperação. Os três grandes setores da economia, indústria, comércio e serviços, apresentaram quedas relativamente intensas em agosto, na série com ajuste sazonal, depois de um mês de julho fraco.
A produção industrial caiu 3,8% em agosto frente a julho, anulando todo o crescimento dos cinco meses anteriores (3,7%). No caso do volume de vendas do comércio varejista, em agosto houve a segunda retração consecutiva de 0,6% frente ao mês imediatamente anterior. Já o faturamento real do setor de serviços teve declínio de 1,6% frente a julho, compreendendo o pior resultado da série com ajuste sazonal.
Com isso, os indícios são de que o nível geral da atividade econômica tenha recuado substancialmente em agosto. É o que também indica o resultado do IBC-Br, índice calculado pelo Banco Central e que funciona como uma prévia do PIB, que apresentou retração de 0,9% frente a julho, já descontados os efeitos sazonais. Esse resultado é o pior de 2016 e sucede outra variação negativa em julho (-0,2% frente a junho). Esta Carta IEDI faz um panorama deste cenário em que a atividade econômica voltou a perder força.
Porque os obstáculos à recuperação parecem ter se avolumado nesse início de semestre, é muito bem-vinda a decisão do Banco Central em reduzir a taxa básica de juros (de 14,25% para 14,0%). Mas esse movimento da autoridade monetária precisa ser acelerado para que possa ter efeitos positivos sobre o nível de atividade econômica no primeiro semestre do ano que vem. Por enquanto, os juros permanecem um entrave à recuperação.
A redução mais expressiva dos juros é ainda mais importante neste momento em que os setores bastante empregadores, como o comércio e serviços, dão poucos sinais de saída da crise e reforçam o círculo vicioso com a piora do emprego e da renda das famílias, ao mesmo tempo em que a apreciação cambial tem dificultado a única rota de fuga da crise doméstica para a indústria, por intermédio das exportações e da substituição de importações. É preciso que o governo também evite elevações mais acentuadas no valor da moeda nacional.
No caso da indústria, é preciso reconhecer, todavia, que a magnitude da queda em agosto sofreu influência de fatores pontuais que, a priori, podem não se repetir nos próximos meses, a exemplo do adiantamento de férias coletivas no setor automobilístico. Mas mesmo assim pesa sobre o resultado a generalização setorial e regional das perdas. Houve queda da produção em 21 dos 24 ramos pesquisados e em 11 das 14 localidades acompanhadas.
Uma apreensão adicional advinda do mau desempenho industrial de agosto é que o declínio da produção atingiu os grandes centros industriais do país, interrompendo, em alguns casos, uma sequência de resultados positivos que vinham dando esperança de que o setor estava prestes a deixar para trás a severa recessão que o acompanhava desde 2014.
Destaca-se, assim, o estado de São Paulo, que possui o maior e mais moderno parque industrial do país, cuja queda chegou a -5,4% frente a julho, com ajuste sazonal. Mais do que o patamar dessa queda, que reflete aspectos pontuais, o preocupante é a inversão de sinal de seu desempenho. Há dois meses seguidos que a indústria paulista crescia (+1,3% em jun/16 e +2,5% em jul/16) antes do tombo de agosto.
Outros estados de peso na estrutura industrial do país também mostraram resultados negativos no mês em questão, como Paraná (-8,0%), Minas Gerais (-2,8%), Rio de Janeiro (-1,3%), Santa Catarina (-0,2%) e Rio Grande do Sul (-0,2%).
Serviços foi outro setor da economia a apresentar nível expressivo de retração, -1,6% frente a julho com ajuste, e isso a despeito da realização dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro entre os dias 5 e 21 do mês em questão. A maioria de seus segmentos acompanharam o movimento geral do setor e tiveram retração de faturamento.
O pior desempenho ocorreu em serviços prestados às famílias, com -1,6%, já descontados os efeitos sazonais. Também não teve um bom mês de agosto o segmento de outros serviços (-1,2%), que reúne uma grande diversidade de atividades, e o segmento de serviços profissionais, administrativos e complementares (-0,3%). Neste último caso, embora tenha caído, vem apresentando variações muito próximas da estabilidade desde maio.
Dois segmentos de serviços obtiveram alta de faturamento real em agosto frente a julho. Contudo, os resultados ficaram muito próximos de zero: serviços de transporte e correios (0,1%) e serviços de informação e comunicação (0,3%). Nestes casos agosto foi mais propriamente um mês de estabilidade do que de crescimento.
Em relação ao comércio varejista, por sua vez, se a magnitude da retração em agosto (-0,6%) das vendas reais não foi das mais intensas do ano, sua disseminação entre os segmentos do varejo foi elevada, atingindo 6 das 8 atividades pesquisadas pelo IBGE. Tomado em seu conceito ampliado (que considera de veículos e material de construção), o declínio em agosto foi mais forte: -2,0% frente a julho, devido ao segmento de veículos e autopeças (-4,8%).
Ainda sobre o varejo, entre os piores resultados de agosto, encontram-se aqueles segmentos cujas vendas dependem geralmente de algum tipo de financiamento. Além de veículos e autopeças, como vimos acima, são os casos de equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (-5,0%), móveis e eletrodomésticos (-2,1%) e outros artigos de uso pessoal e doméstico (-1,2%), que incluem as lojas de departamento.
Já as vendas reais de supermercados, alimentos, bebidas e fumo (+0,8%) voltaram a crescer depois de uma queda em julho (-0,7%) que havia interrompido uma sucessão de três resultados positivos. No caso desse segmento, algum alívio da inflação em alimentos e a essencialidade desses bens podem estar contribuindo favoravelmente, ainda que não o suficiente para tirar o setor da zona de quase estabilidade.
Indústria
A retração da produção industrial em agosto, que atingiu -3,8% frente a julho já descontados os efeitos sazonais, anulou a alta acumulada nos cinco meses anteriores (+3,7%). Se for considerada a quase estabilidade de julho frente a junho (+0,1%), chega-se à conclusão de que o segundo semestre do ano não começou bem. Além disso, os resultados negativos foram generalizados em termos setoriais (21 dos 24 ramos pesquisados) e também em termos regionais (11 das 14 localidades acompanhadas).
Isso não quer dizer que a magnitude da queda de agosto não tenha sido influenciada por fatores pontuais que, a priori, podem não se repetir nos próximos meses, a exemplo do adiantamento de férias coletivas no setor automobilístico. De qualquer forma, o que temos nesse início de segundo semestre é um quadro de apreensão, com o risco de o desempenho industrial tornar-se claudicante daqui para frente.
Entre os macrossetores da indústria, a maior retração da produção frente a julho foi sentida por bens de consumo duráveis, de -9,3% com ajuste sazonal. Este resultado interrompeu uma trajetória que vinha se mostrando promissora com três meses sucessivos de crescimento. Os bens intermediários, por sua vez, caíram 4,3% em agosto, depois de dois meses consecutivos de alta de produção.
Já a produção de bens de consumo semi e não duráveis caiu menos que a dos dois macrossetores supracitados: -0,9%. Mas nesse caso é preciso ter em mente que em julho também houve queda, de -2,4%, a mais intensa de 2016 na série com ajuste. O único macrossetor industrial a apresentar crescimento da produção foi o de bens de capital, em que os resultados positivos têm marcado quase todos os meses de 2016 na série com ajuste sazonal. Em agosto, a alta foi de 0,4%, o que consiste em um resultado muito fraco, especialmente se considerarmos que houve queda em julho de -2,1% frente a junho.
A apreensão advinda do mau resultado de agosto também se deve ao fato que o declínio da produção atingiu os grandes centros industriais do país, interrompendo, em alguns casos, uma sequência de resultados positivos que vinham dando esperança de estar em curso o início de uma recuperação do setor.
Dentre as 11 localidades com declínio na produção na série com ajuste, destaca-se São Paulo, o maior e mais moderno parque industrial do país, com -5,4%. Mais do que o patamar dessa queda, que reflete aspectos pontuais, o preocupante é a inversão de sinal de seu desempenho. Há dois meses seguidos que a indústria paulista crescia (+1,3% em jun/16 e +2,5% em jul/16) antes desta queda em agosto.
Pior ainda, São Paulo não está sozinho nesse retorno ao terreno negativo, outras 4 localidades passaram pela mesma mudança. Após as altas nos meses de junho e julho, a produção industrial caiu em agosto no Paraná (-8,0%), em Minas Gerais (-2,8%), Pernambuco (-2,7%) e no Ceará (-2,4%).
Dois estados que já vinham apresentando resultados negativos, ainda que muito próximos de zero, ampliaram suas perdas entre julho e agosto: Amazonas passou de -0,5% para -5,7% e Goiás, de -0,6% para -2,9%, sempre na comparação frente ao mês anterior com ajuste sazonal. Outros três estados também tiveram quedas reincidentes em agosto, mas um pouco menores do que em julho. Foram os casos do Rio de Janeiro (-1,3%), Santa Catarina (-0,2%) e Rio Grande do Sul (-0,2%).
O Espírito Santo, por sua vez, teve uma retração importante da produção, de -6,4%, mas nesse caso tem havido, já há alguns meses, alternância de resultados positivos e negativos. O mesmo acontece com o Pará, exceto pelo fato de que em agosto houve alta de 1,2% frente a julho.
O único estado com aumento expressivo da produção industrial em agosto, na série com ajuste sazonal, foi a Bahia, mas a alta de 10,4% neste mês vem logo após um declínio igualmente expressivo no mês anterior (-11,4%). Foi muito devido ao desempenho da indústria baiana, que a região Nordeste apresentou crescimento de 0,8% em agosto.
Comércio
Em agosto, as vendas reais do comércio varejista caíram 0,6% frente ao mês anterior, já descontados os efeitos sazonais. Como em julho já havia ocorrido uma queda, também de -0,6%, vale para o varejo a mesma observação feita para a Indústria, a saber, que o segundo semestre não começou bem.
Se forem consideradas as vendas de automóveis, autopeças e materiais de construção, isto é, tomado o varejo em seu conceito ampliado, o desempenho foi ainda pior. Na série com ajuste sazonal, as vendas reais caíram 1,0% em julho e 2,0% em agosto, frente ao mês anterior.
Os resultados negativos na entrada do segundo semestre, inclusive com um perfil disseminado entre os diferentes segmentos do comércio, a despeito da melhora recente da confiança dos consumidores, sugerem que esta, por si só, não é suficiente para reverter o quadro adverso das vendas do varejo. Além de mais confiantes, é preciso que os consumidores tenham de fato poder de compra para dispender, vindo da recuperação de seus rendimentos do trabalho e do crédito, o que ainda não ocorre.
Por isso, parece mais adequado dizer que o varejo (restrito) atingiu ou se aproxima do seu “fundo do poço”, já que fica muito difícil falar de melhora quando o nível das vendas até agosto de 2016 é 6,6% menor do que aquele do final do ano passado. Mesmo apresentando um arrefecimento, o resultado do último trimestre móvel, ou seja, daquele findo em ago/16, também é expressivo: -5,3% frente ao mesmo período do ano anterior. Vale lembrar que o declínio das vendas em 2015 foi de -4,3%.
Essa moderação que mostra a comparação entre o acumulado de 2016 (-6,6%) e o trimestre findo em ago/16 (-5,3%) deve-se muito ao desempenho das vendas de supermercados, alimentos, bebidas e fumo. De fato, este segmento conseguiu arrefecer o ritmo de queda de suas vendas: -3,0% no acumulado de 2016 e -1,6% no trimestre findo em ago/16, frente ao mesmo período do ano anterior.
O corrente ano tem sido pior do que 2015 para a grande maioria dos segmentos do varejo, mas em alguns casos a situação neste último trimestre se deteriorou ainda mais. É o caso de automóveis e autopeças, que no acumulado dos oito meses de 2016 teve declínio de 14,7% enquanto no trimestre findo em ago/16 caiu 16,6%, e também de artigos farmacêuticos, médicos, perfumaria e cosméticos, cujo resultado nessas comparações foi de -0,7% e -3,1%, respectivamente.
Em contrapartida, em dois segmentos do varejo a passagem do primeiro para o segundo semestre parece não ter trazido uma mudança importante no quadro das vendas, como em combustíveis e lubrificantes (-9,9% no acumulado de 2016 e -9,7% no trimestre findo em ago/16) e em livros, jornais, revistas e papelaria (-16,8% em ambas as comparações).
Os demais segmentos passaram por alguma moderação nos últimos meses. Mas cabe observar que em alguns casos o patamar de queda ainda é muito superior àquele de 2015 como um todo. É o que ocorre com outros artigos de uso pessoal, que incluem as lojas de departamento: -12,0% no acumulado de 2016 e -10,2% no trimestre findo em ago/16, mas em 2015 a retração foi de apenas 1,3%.
Este também é o caso de materiais de escritório e equipamentos de comunicação e informática, cujo recuo das vendas foi de -15,1% no acumulado do ano e de -13,7% no trimestre findo em ago/16, configurando uma situação muito pior que a de 2015, quando logrou declínio de 1,8%.
Outros segmentos que se encontram nessa situação de certo arrefecimento no período mais recente compreendem tecidos, vestuário e calçados, com queda de -11,4% no acumulado de 2016 e de -9,4% no trimestre findo em ago/16, material de construção (-12,2% e -9,7%, respectivamente) e móveis e eletrodomésticos (-13,6% e -10,3%, nessas mesmas comparações).
Serviços
Influenciado pelo baixo nível da atividade econômica e pela contração do rendimento real das famílias, o desempenho do setor de serviços custa a dar indícios consistentes de melhora ou mesmo de arrefecimento. Em agosto a queda de suas receitas reais atingiu 1,6% frente a julho, compreendendo o pior resultado da série com ajuste sazonal.
O ano de 2016 tem sido de agravamento da crise dos serviços, que se revela desde o início de 2015 para o total do setor. É verdade, porém, que alguns de seus segmentos, como os serviços prestados às famílias e os serviços técnicos profissionais prestados às empresas, entram em recessão muito antes. Entre janeiro e agosto de 2016, o setor de serviços como um todo acumula perdas de 4,7% contra uma queda de 3,6% em 2015 como um todo.
A trajetória mais recente, que será captada nesta Análise por meio da média do trimestre findo em agosto, mostra uma pequena moderação da queda para serviços no período junho-agosto deste ano: -4,0% frente ao mesmo período do ano anterior. Entretanto, é interessante notar que os diferentes segmentos estão seguindo trajetórias distintas.
Em primeiro lugar, vejamos aqueles segmentos que acompanham o comportamento do setor como um todo, ou seja, que depois de uma deterioração adicional em 2016 vis-à-vis 2015 mostram um arrefecimento moderado no último trimestre disponível (jun-ago/16), mas que ainda assim se encontram em uma situação mais grave que a de 2015.
Este é o caso de serviços profissionais, administrativos e complementares, cujo faturamento real caiu 4,3% em 2015, mas que já acumula retração de 6,0% nos oito meses de 2016. Isso ocorre a despeito da moderação no trimestre findo em ago/16, com queda de -4,9%, frente a igual período do na anterior. Esses dados indicam que o começo de 2016 foi muito ruim para esses serviços, mas que a virada do semestre tampouco trouxe melhora substantiva.
Vale, aqui, um comentário sobre um dos componentes desses de serviços profissionais, o subsegmento de serviços técnico profissionais, que incluem profissionais liberais e aqueles serviços de maior qualificação contratados pelas empresas. A entrada no segundo semestre de 2016 foi acompanhada de um agravamento adicional do resultado neste caso. É o que mostra a queda de -13,1% no trimestre findo em ago/16, um patamar próximo ao pior da crise neste subsegmento. No acumulado de 2016, o tombo alcança -10,4%, sendo de -9,7% em 2015.
O segundo segmento a apresentar um comportamento próximo ao setor como um todo foi o de serviços de informação e comunicação, que conseguiu resistir à crise por vários meses em 2015, quando fechou o ano com crescimento zero em seu faturamento real. Em 2016, entrou em recessão, ainda que moderada, acumulando perda de 2,7% nos oito meses do ano, caindo menos no trimestre findo em ago/16 (-1,1%).
Já serviços prestados às famílias, em crise desde 2014, logrou um declínio menos intenso no início de 2016, mas pode estar caminhando para uma nova rodada de deterioração: seu faturamento real, que caiu 5,3% em 2015, atinge -4,1% no acumulado de 2016, embora avance para -4,6% no trimestre findo em ago/16.
O possível “retorno a 2015” dos serviços prestados às famílias é mais evidente para seu subsegmento de serviços de alojamento e alimentação, alvo recorrente das decisões de corte de gasto das famílias em dificuldades financeiras. Seu patamar de queda no trimestre findo em ago/16, de -5,5%, já é praticamente o mesmo daquele de 2015 como um todo (-5,6%).
Agregando-se ao rol de más notícias, o segmento de transportes e correios só dá indícios de piora. Seu faturamento real caiu 6,1% em 2015 e 6,7% no acumulado de janeiro a agosto de 2016, com direito a forte deterioração no trimestre findo em ago/16: -7,2%. Relativiza essa piora a estabilização “no fundo do poço” dos transportes terrestres (-9,8% em 2016 e -9,5% no trimestre findo em ago/16).
O único segmento a dar sinais de uma trajetória de saída da crise é o de outros serviços, cuja diversidade de atividades contempladas é tão grande que dificulta a identificação das causas específicas. Tais serviços reduziram perdas de -9,0% em 2015 para -3,0% no acumulado dos oito meses de 2016, chegando a -1,1% no trimestre findo em ago/16, mostrando nítidos sinais de melhora.