Carta IEDI
A economia exige cuidados maiores com as exportações e o investimento
A retração da economia brasileira em 2015 e em 2016 – taxas de -3,8% e de -3,6%, respectivamente – contrastam sobremaneira com o desempenho mundial, de economias avançadas e principalmente dos países em desenvolvimento, mormente os asiáticos. O PIB per capita brasileiro se contraiu pela terceira vez consecutiva, declinando 4,4% no ano passado. Ademais, o resultado de outubro-dezembro foi de queda seja frente ao trimestre imediatamente anterior (-0,9% pela série dessazonalizada), seja frente ao mesmo trimestre de 2015 (-2,5%).
Pela ótica da despesa, o investimento fixo puxou contundentemente a queda em 2016, com o consumo das famílias e o consumo do governo também retrocedendo. Somente as exportações de bens e serviços cresceram, enquanto as importações se retraíram.
• Em 2016, o valor adicionado declinou 3,1%, enquanto os impostos líquidos sobre produtos diminuíram 6,4%.
• A formação bruta de capital fixo (FBCF) encolheu 10,2% em 2016, com o agravante de que, trimestre a trimestre na série dessazonalizada, caiu 1,6% na passagem do terceiro para o último quarto do ano. Dos últimos 13 trimestres, 12 registraram declínio da FBCF;
• Ainda pelo prisma das despesas, as exportações de bens e serviços cresceram 1,9%, um índice que pode ser considerado muito baixo, com as importações diminuindo 10,3% em 2016;
• Em termos setoriais, todos os três grandes setores se retraíram – dessa vez, nem a agropecuária se salvou;
• O retrocesso de 3,8% do setor industrial foi puxado pela indústria de transformação e pelos SIUP (Serviços Industriais de Utilidade Pública), que sofreram declínio igual, de 5,2%. A extração mineral também se retraiu, ficando a construção civil como exceção.
Frisa-se que a taxa de investimento fixo retrocedeu, de 20,9% do PIB em 2013 para 16,4% do PIB em 2016. Foi o terceiro ano seguido com diminuição na taxa de FBCF. Em paralelo, a taxa de poupança bruta também teve redução de monta, chegando em 2016 com 13,9% do PIB.
Este quadro contrasta fortemente com o desempenho mundial, como sugerem as estimativas do Fundo Monetário Internacional. Enquanto o mundo deve ter crescido 3,1% em 2016, a recessão da economia brasileira manteve-se em patamar semelhante ao de 2015 e foi mais grave do que o esperado pelo FMI (-3,3% contra -3,6%, como vimos). Frente aos demais países emergentes, a dissonância é ainda mais evidente, já que em seu conjunto devem ter logrado uma expansão econômica de 4,2% no ano passado.
O resultado do último trimestre, já descontados os efeitos sazonais, também foi desanimador. A queda de 0,9% do PIB brasileiro foi a mais intensa do ano nesta base de comparação, inserindo-se numa sequência de retração trimestre a trimestre que vem desde janeiro-março de 2015. A título de comparação, nenhum dos países OCDE, para os quais as informações já estão disponíveis, registraram taxa negativa no trimestre final de 2016.
Assim, mesmo que existam alguns sinais de recuperação, o resultado do PIB brasileiro no derradeiro trimestre de 2016 mostrou que solavancos e reversões podem ocorrer, servindo de alerta para que se engendre uma política nacional de fato em prol do setor produtivo. Políticas de ajuste, por mais necessárias que sejam, devem ser acompanhadas de sinalização contundente para oportunidades de negócio e estas como meio para a promoção do bem-estar social.
Visão geral do PIB
A retração da economia brasileira em 2016, de 3,6%, quase equiparou a de 2015. Desse modo forma, o PIB per capita do Brasil declinou pelo terceiro ano seguido, queda de 4,4%, tendo recuado 4,6% em 2015 e 0,4% em 2014. Mais amiúde:
• Pelos dados dessazonalizados, no quarto trimestre de 2016, o PIB caiu 0,9% frente a julho-setembro, configurando a maior retração nessa base de comparação ao longo do ano;
• Na comparação entre outubro-dezembro último com igual período de 2015, a retração atingiu 2,5%, declínio expressivo, mas cuja magnitude vem arrefecendo ao longo dos trimestres por essa forma de comparação;
• O decréscimo de 3,6% em 2016 decorreu de diminuição de 3,1% no valor adicionado e do recuo de 6,4% nos impostos líquidos sobre produtos.
A queda do investimento e o pouco ímpeto das exportações
Pela série dessazonalizada, trimestre a trimestre, o Brasil já completou oito períodos se retraindo ininterruptamente, tendo ainda declinado em abril-junho de 2014. Se na passagem de julho-setembro para outubro-dezembro de 2016, o PIB retrocedeu 0,9%, a queda foi ainda mais significativa no investimento: a formação bruta de capital fixo (FBCF) caiu 1,6%, sendo que, dos últimos 13 trimestres, 12 registraram declínio.
No final de 2016, também o consumo privado retrocedeu: variação de -0,6%, configurando o oitavo período consecutivo de retração. Já o consumo do governo ficou praticamente estável, taxa de 0,1%. Mesmo as exportações de bens e serviços que no ano cresceram, de julho-setembro para outubro-dezembro, declinaram 1,8%, o terceiro declínio seguido. As importações, por sua vez, cresceram 3,2% contrabalançando a queda registrada no trimestre anterior.
Na comparação entre os trimestres finais de 2016 e de 2015, a economia retrocedeu 2,5%, com o agravante dos componentes que sofreram mais terem sido a FBCF – taxa de -5,4% – e as exportações – variação de -7,6%. No caso da inversão fixa, são 11 trimestres seguidos de queda. O consumo das famílias e o consumo do governo retrocederam 2,9% e 0,1% nessa base de comparação. O primeiro completou oito trimestres de descenso, enquanto o consumo do governo, sete. Já as importações caíram 1,1% em outubro-dezembro, após queda de 6,8% no contraponto entre terceiros trimestres.
Em 2016, a retração de 3,6% do produto agregado foi puxada pela expressiva queda de 10,2% na FBCF. O consumo das famílias e o consumo do governo retrocederam 4,2% e 0,6%, respectivamente. O único dado positivo veio do intercâmbio externo de bens e serviços: as vendas para o exterior cresceram 1,9% com as importações declinando 10,3%.
Assim como no ano anterior, as exportações foram o dado positivo de 2016, porém com desempenho ruim no trimestre derradeiro e perda de ímpeto no contraponto com o crescimento real logrado em 2015, quando crescera 6,3%. E a taxa de câmbio já não tem se mostrado tão favorável quanto já foi anteriormente. Esse contexto requer outras formas de redução de custo para as empresas, o que inclui a infraestrutura física do País e a simplificação do sistema tributário.
Com as expectativas empresariais em baixa, a taxa de investimento fixo tem caído nos últimos três anos. Após alcançar 20,9% do PIB em 2013, caiu para 19,9% em 2014. Em 2015, declinou para 18,1%, chegando em 2016 ao patamar de 16,4%. Percurso similar se observa na taxa de poupança bruta, que ficou em 13,9% em 2016.
O desempenho por setor
Em 2016, o retrocesso do produto agregado ocorreu com queda de 3,1% no valor adicionado (VA) e de 6,4% nos impostos líquidos sobre produtos. A soma do valor adicionado com os impostos líquidos sobre produtos resulta no PIB a preços de mercado ou simplesmente PIB como vem sendo tratado no texto. Em termos de grandes setores, nem a agropecuária, o único dos três a crescer em 2015, conseguiu resultado positivo.
Confrontando outubro-dezembro de 2015 e o trimestre imediatamente anterior pela série livre de efeitos sazonais, o VA recuou 0,7%. Apesar da agropecuária ter crescido 1,0%, tal desempenho foi insuficiente para contrabalançar as retrações sofridas pela indústria e pelos serviços: queda de 0,7% e de 0,8%, respectivamente. Dos últimos 13 trimestres, o VA da indústria apresentou declínio em 10. Quanto aos serviços, há 8 trimestres o VA desse grande setor tem declinado.
No contraste entre o último trimestre de 2016 e igual período do ano anterior, o valor adicionado caiu 2,3%. A própria agropecuária experimentou queda, de 5,0%, sendo a mais aguda dentre os três grandes setores. Já a indústria e os serviços sofreram contração de grandeza equivalente: taxa de -2,5% e de -2,4%, respectivamente.
Na comparação entre 2016 e 2015, a agropecuária também foi o que mais se retraiu, queda de 6,6%. Quanto à indústria, seu VA retrocedeu 3,8%, enquanto o dos serviços diminuiu 2,7% vis-à-vis o ano anterior.
A indústria em detalhe
Atendo-se à indústria, suas quatro seções de atividade podem ser apreendidas em separado. Na passagem de julho-setembro para outubro-dezembro pelos dados dessazonalizados, a retração de 0,7% em seu valor adicionado decorreu da contração da produção e distribuição de eletricidade, gás e água (serviços industriais de utilidade pública – SIUP), com queda de 2,3%, e da indústria de transformação, declínio de 1,0%. A construção civil ficou praticamente estável, mas também com sinal negativo: taxa de -0,1%. Só a extração mineral cresceu por essa base de comparação: 0,7%.
Comparando último quarto de 2016 e igual período de 2015, a retração de 2,5% da indústria foi puxada novamente pelos SIUP e pela indústria de transformação, com variação de -7,5% e de -2,4%, respectivamente. A extração mineral e a construção civil lograram incremento nessa base comparativa: variações de 4,0% e de 2,4%, respectivamente.
No acumulado do ano, a retração de 3,8% foi puxada pelos mesmos segmentos: a indústria de transformação e os SIUP. Ambos experimentaram recuo de 5,2%. Nesse caso, a indústria extrativa também retrocedeu, queda de 2,9%. Só a construção civil cresceu em 2016: 4,7%.
O Brasil frente a outras economias – o desempenho no trimestre
Pelas estimativas do FMI, o mundo cresceu 3,1% em 2016, menos do que crescera em 2015 e em 2014. O Brasil, que já estagnara em 2014, afundou no biênio 2015-2016, descolando do desempenho mundial. Dessa forma, vale contrapor o comportamento do produto agregado brasileiro com o de outras economias.
O contraponto frente a países membros da OCDE pela variação trimestre contra trimestre imediatamente anterior (dados dessazonalizados) asseveram o quão aquém tem ficado o Brasil. Como visto, o PIB brasileiro caiu 0,9% numa sequência de retração trimestre a trimestre que vem desde janeiro-março de 2015. Todos os países americanos da OCDE apresentados no gráfico – Canadá, EUA, México e Chile – ou tiveram taxas positivas ou ficaram estagnados em outubro-dezembro. Aliás, nenhum dos países selecionados registraram taxa negativa no quarto final de 2016.
Passando para o investimento fixo, o Brasil sofreu queda de 1,6% em outubro-dezembro. Holanda, com queda de 2,9%, e Canadá, com taxa de -1,5%, foram os países com pior ou quase equiparável ao do Brasil em termos da FBCF no trimestre. Todavia ambos lograram aumento no produto agregado. Chile e México também têm registrado sinais negativos ao longo de 2016, mas ainda não estão disponíveis dados do quarto trimestre para ambos. Ressalte-se, por outro lado, a continuidade do incremento da inversão fixa nos EUA.
O Brasil frente a outras economias – projeções
As expectativas de mercado, apuradas no relatório Focus do Banco Central em 10/03/2017, são de incremento de 0,5% em 2017 e de recuperação em 2018, expansão de 2,4%. As expectativas constantes do relatório Focus se apresentam mais otimistas que as projeções divulgadas ou atualizadas no começo do ano tanto pela OCDE em seu Interim Economic Outlook, quanto pelo FMI, na atualização do World Economic Outlook. Segundo o Fundo, as taxas ficariam em 0,2% em 2017 e 1,5% em 2018. A OCDE projetou crescimento nulo em 2017 e mesma expansão para 2018. O World Economic and Social Prospects da ONU, divulgado em janeiro, projetou expansão de 0,6% em 2017 e de 1,6% em 2018.
No caso da atualização de janeiro último do World Economic Outlook do FMI, estas trazem também projeções para outros países. Assim, embora anteriores à divulgação dos dados mais recentes do Brasil, permitem um comparativo entre taxas de crescimento projetadas de vários países para 2017 e 2018.
O fato é que o Brasil destoa no cenário internacional. Enquanto são projetadas taxas de 0,2% e 1,5% para o Brasil, a Área do euro, todos os países do G7 e a Espanha terão taxas positivas em ambos os anos.
O hiato entre o Brasil e o mundo pode ser visto na expansão projetada para este de 3,4% em 2017 e de 3,6% em 2018, variações bem acima do que se projeta para o Brasil. As Outras Economias Avançadas deverão crescer, segundo o FMI, 2,2% e 2,4% para 2017 e 2018, respectivamente. Esse subconjunto das economias avançadas engloba as novas economias avançadas asiáticas. Quanto aos países emergentes e em desenvolvimento, as taxas projetadas do PIB são ainda maiores, de 4,5% e 4,8%, respectivamente, puxadas principalmente pelas economias em desenvolvimento da Ásia (exclusive Oriente Médio), com taxas projetadas de 6,4% em 2017 e de 6,3% no ano subsequente. A África Subsaariana possui taxas projetadas de 2,8% e de 3,7%, respectivamente. O Fundo projetou para a América Latina & Caribe incremento de 1,2% em 2017 e de 2,1% no ano seguinte. A Comunidade dos Estados Independentes, a seu turno, tem projetadas variações de 1,5% em 2017 e de 1,8% em 2018.
O contraste maior se encontra na comparação entre as projeções para o Brasil vis-à-vis as da China e Índia. Para o primeiro, o Fundo projetou incremento de 6,5% e de 6,0%, ratificando o fôlego do País, porém com desaceleração, ensejando dificuldades para as commodities brasileiras. Para a Índia, as taxas projetadas também chamam a atenção: 7,2% e 7,7% para 2017 e 2018, respectivamente. No âmbito dos BRICS, a Rússia é o país com desempenho mais próximo ao do Brasil, mas devendo crescer mais em 2017. Já para a África do Sul, é projetado incremento superior, de 0,8% e de 1,6%, para 2017 e 2018, respectivamente. Saindo dos BRICS, o México tem expansão projetada de 1,7% no ano em curso e de 2,0% no próximo.