Carta IEDI
Políticas fiscais na promoção de inovação e do crescimento: A visão do FMI
Em seus relatórios semestrais sobre as perspectivas da economia mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI) vem ressaltando, nos últimos anos, as modestas taxas de crescimento da economia global. Tanto as economias avançadas como as economias de mercado emergentes têm registrado baixo incremento da produtividade. Em um recente estudo, intitulado Fiscal Policies for Innovation and Growth, o Fundo trata de como a política fiscal pode contribuir para elevar o crescimento da produtividade no longo prazo favorecendo a inovação.
Na avaliação do Fundo, inovação e elevação da produtividade não resultam somente dos investimentos em P&D das grandes empresas estabelecidas, mas igualmente das pequenas empresas recém-criadas engajadas em experimentação e na assunção de risco, em outras palavras, do empreendedorismo.
Enquanto nas economias avançadas, a oportunidade relacionada à inovação é o motor do empreendedorismo, nas economias emergentes e em desenvolvimento, em contraste, o empreendedorismo é fruto da necessidade e tende a florescer quando outras opções de trabalho estão ausentes ou são insatisfatórias. Por essa razão, uma importante meta de desenvolvimento em muitas das economias de mercado emergente e em desenvolvimento é estimular o empreendedorismo motivado pela oportunidade ao invés de promover a simples elevação da taxa de entrada de novas empresas.
O estudo apresenta novas evidências empíricas de como a política fiscal afeta três pilares da inovação: a atividade de pesquisa e desenvolvimento (P&D), que inclui pesquisa básica e aplicada; a transferência de tecnologia, a qual abrange a difusão internacional de tecnologia e de conhecimento e a inovação empresarial, que implica experimentação de novos produtos e processos por novas empresas.
A importância dos três pilares de inovação varia, todavia, entre os países. Em particular, as políticas de estímulo às atividades de P&D são relativamente mais importantes nas economias avançadas que operam próximas da fronteira tecnológica mundial. Já para as economias em desenvolvimento e de mercados emergentes, as políticas para facilitar a difusão tecnológica e o empreendedorismo são também importantes.
A análise empírica busca identificar em quais áreas a política fiscal deveria fazer mais e em quais deveria fazer melhor ou menos. As principais conclusões e recomendações de política são as seguintes:
Fazer mais para encorajar as atividades privadas de P&D. Nas economias avançadas, os investimentos privados em P&D precisam ser aumentados em 40%, em média, para gerar os efeitos positivos de transbordamento de conhecimento na economia como um todo. Esses investimentos privados em P&D se traduziriam no longo prazo em elevação do PIB das economias avançadas da ordem de 5%. No âmbito da economia global, o aumento seria ainda maior como resultado do transbordamento internacional da tecnologia. Nas economias avançadas, esse resultado poderia ser alcançado mediante políticas bem-desenhadas que incluam incentivos fiscais às atividades privadas de P&D e investimento público complementar em pesquisa básica. Nas economias de mercado emergente e de renda média, o estímulo ao P&D também pode contribuir para o aumento da produtividade, desde que os países tenham uma base forte de capital humano.
Fazer melhor, desenhando políticas fiscais de estabilização. Estas políticas, segundo o Fundo, ajudam as empresas a manter seus investimentos em P&D, em particular durante as recessões. O estudo encontrou novas evidências de que a estabilização fiscal é especialmente importante para as empresas que dependem de funding externo. Nas economias avançadas, os incentivos fiscais podem ser mais bem desenhados para aumentar suas relações custo-efetividade. Os incentivos e tratamentos fiscais preferenciais devem ter como alvo empresas recém-criadas e não pequenas empresas. Nas economias de mercado emergente e em desenvolvimento, os investimentos em educação e em infraestrutura fortalecem a capacidade doméstica de absorção de tecnologias do exterior.
Fazer menos, reduzindo ou abolindo incentivos fiscais ineficazes. O tratamento fiscal preferencial para pequenas empresas deve ser evitado porque é um instrumento muito pouco efetivo para estimular de modo eficiente a atividade empresarial. Na verdade, pode prejudicar ao criar uma armadilha que compromete o crescimento dessas empresas, que evitariam crescer para preservar a elegibilidade aos benefícios fiscais. Nas economias de mercado emergente e em desenvolvimento, os incentivos fiscais comumente utilizados para atrair investimento estrangeiro direto (IED) deveriam ser eliminados porque são extremamente ineficazes e custosos.
Política Fiscal na Promoção de Inovação
De acordo com o FMI, a economia mundial está, desde a recuperação da crise financeira global de 2008-09, presa em uma era de baixo crescimento. O lento aumento da produtividade observado nas economias avançadas e, mais recentemente, nas economias de mercado emergente, motivou o Fundo a investigar como as políticas governamentais podem efetivamente estimular a elevação da produtividade no longo prazo. Reconhecendo que a inovação é um fator-chave para o crescimento da produtividade no longo prazo, o objetivo do capítulo “Fiscal Policies for Innovation and Growth” do Fiscal Monitor de abril de 2016 foi investigar como a política fiscal pode contribuir para a elevação da produtividade por meio do estímulo à inovação.
A análise empírica do papel das inovações na dinamização do crescimento é difícil em razão das limitações conceituais e de dados. Os autores ressaltam que os indicadores quantitativos disponíveis, tais como o investimento em P&D, números de pesquisadores, números de patentes e de publicações de artigos científicos, somente capturam aspectos limitados da inovação. O processo de inovação é muito mais amplo e se refere não apenas à criação de novos processos e produtos, mas igualmente às mudanças organizacionais, melhoria de conceitos de marketing e novos modelos de negócios. Também não são capturados pelas estatísticas os benefícios sociais do progresso tecnológico, como os efeitos de mitigação das mudanças climáticas.
As políticas governamentais e as instituições exercem importante influência sobre a trajetória e a velocidade do progresso tecnológico. Segundo os autores, inúmeras economias avançadas e economias emergentes de renda média adotaram arcabouço abrangente de políticas para estimular o processo de inovação e a difusão do conhecimento por meio de três canais:
1º. Inovação se baseia em uma sólida base de capital humano e em instituições que promovem novas descobertas. Isto requer investimentos apropriados em educação superior, em pesquisa cientifica básica e parceiras entre universidades e empresas privadas.
2º. O ambiente de negócios deve propiciar incentivos adequados à inovação. Políticas para facilitar esse ambiente favorável incluem: proteção ao direito de propriedade intelectual, incentivos fiscais e políticas mais amplas relacionadas a comércio exterior, concorrência, regulação do mercado de trabalho e lei de falência.
3º. Políticas macroeconômicas que favorecem crescimento econômico elevado e sustentável são importantes porque o crescimento permite as empresas recuperar mais rapidamente os seus custos irrecuperáveis (sunk cost) e, deste modo, incentiva o investimento em P&D.
Com foco nos componentes fiscais do segundo e do terceiro canais, o estudo do FMI apresenta novas evidências empíricas de como a política fiscal afeta três pilares da inovação: a atividade de pesquisa e desenvolvimento, que inclui pesquisa básica e aplicada; a transferência de tecnologia, que inclui a difusão internacional de tecnologia e conhecimento e a inovação empresarial, que implica experimentação de novos produtos e processos por novas empresas.
Os pesquisadores do Fundo reconhecem que a importância dos três pilares de inovação varia entre os países. Em particular, as políticas de estímulo às atividades de P&D são relativamente mais importantes nas economias avançadas que operam próximas da fronteira tecnológica mundial. Já para as economias em desenvolvimento e de mercados emergentes, as políticas para facilitar a difusão tecnológica e o empreendedorismo são também importantes.
Apoio às Atividades de P&D
O gasto total com as atividades de P&D como porcentagem do PIB varia consideravelmente entre os países. A média de gasto é tipicamente mais alta nas economias avançadas (2% do PIB) que nas economias de mercado emergente e renda média (0,65%) e em desenvolvimento (0,15% do PIB).
A diferença nos gastos com P&D entre o grupo de economias avançadas e o grupo de economias de mercado emergente e em desenvolvimento é ainda mais expressiva quando se distingue os executantes dos gastos. Os gastos com P&D executados pelo setor privado e pelas universidades (públicas e privadas) são muito mais elevados no grupo de economias avançadas do que no grupo economias de mercado emergente e em desenvolvimento. Em contraste, os níveis de gasto com P&D do setor público são bastante semelhantes entre os dois grupos. Nos últimos quinze anos, os gastos governamentais com P&D permaneceram relativamente estáveis enquanto os gastos privados com P&D cresceram gradualmente.
Os gastos com P&D são amplamente considerados como um fator-chave para o crescimento da produtividade total de fatores (PTF). Porém, os investimentos pelas empresas privadas em atividades de P&D podem ser menores do que o nível socialmente eficiente em razão de duas importantes falhas de mercado: restrições de crédito e externalidades.
De acordo com o FMI, para estimular a elevação dos gastos com P&D, os governos podem investir diretamente em P&D, por meio das universidades públicas, institutos governamentais de pesquisa e centros de pesquisa relacionados à defesa, ou elaborar políticas de incentivo às empresas privadas para que realizem mais P&D. As atividades governamentais de P&D são frequentemente focadas na pesquisa científica básica, que, embora seja essencial para inovação, não é, em geral, realizada pelas empresas privadas.
O estudo destaca a relação positiva entre os gastos com P&D público e privado que reflete a complementariedade existente entre eles. Algumas formas de P&D governamental buscam apoiar ativamente esta complementaridade. Um exemplo é o suporte à colaboração de pesquisa entre universidades e empresas privadas.
Uso de politica fiscal de estabilização para promover P&D. Segundo o FMI, as políticas fiscais de estabilização podem incentivar os investimentos privados em P&D ao amortecer as recessões. As empresas podem enfrentar dificuldade na obtenção de funding para os investimentos em P&D porque esses investimentos implicam elevado nível de risco, custos fixos significativos e retornos que só se concretizam no médio e longo prazo. Durante as recessões, a capacidade das empresas em obter financiamento fica, em geral, bastante comprometida, uma vez que os riscos de iliquidez aumentam. Ao reduzir a volatilidade do ciclo de negócios, uma política fiscal anticíclica pode viabilizar maiores gastos privados em P&D e maior crescimento estrutural da produtividade.
Análise empírica realizada pelos autores do estudo a partir de dados de vinte e quatro indústrias em dezesseis economias avançadas encontrou evidências que política fiscal fortemente anticíclica amplia significativamente mais os gastos com P&D naquelas indústrias que são mais dependentes de recursos de terceiros. Quanto mais intensa é a ação anticíclica da política fiscal, medida pela sensibilidade do orçamento fiscal ao crescimento do PIB ou gap do produto, maior é o incremento do P&D privado nas indústrias dependentes de recursos de terceiros (aumento entre 10% e 16%), enquanto a PTF produtividade total dos fatores sobe, em média, 6% a mais nessas indústrias.
Correção de subinvestimento estrutural em P&D privado. Segundo o FMI, a taxa de retorno dos investimentos privados em P&D, isto é, a receita extra obtida pela empresa por cada dólar investido em P&D, é relativamente alta, se situando entre 20 e 30%. Essa taxa de retorno é superior àquela obtida sobre o capital físico em razão do maior prêmio de risco do P&D.
Os retornos sobre o P&D privado variam entre os países, dependendo de como o conhecimento tecnológico é criado, comercializado e difundido. As taxas de retorno tendem a ser mais elevadas naqueles países que estão mais distantes da fronteira tecnológica. Embora a maior disponibilidade de evidências empíricas seja para as economias avançadas, estudos recentes indicam que os retornos sobre o P&D privado são, em média, menores nas economias de mercado emergente e em desenvolvimento, nas quais a base de capital humano é o determinante crucial da capacidade de absorver, assimilar e aplicar tecnologias desenvolvidas em outros países. Porém, em países emergentes e de renda média, com força-de-trabalho suficientemente educada, como é o caso da China, a taxa de retorno do P&D supera a das economias avançadas.
Os investimentos em P&D realizados por uma empresa podem gerar aumento de produtividade em outras empresas de uma mesma indústria ou de outras indústrias por meio do efeito de transbordamento do conhecimento. Em razão dessas externalidades positivas, as taxas domésticas de retorno social dos investimentos privados em P&D são, geralmente, estimadas entre duas a três vezes a taxa de retorno privada. A existência dessas externalidades positivas implica que as forças de mercado conduzirão a um subinvestimento em P&D comparado com o nível socialmente eficiente.
De acordo com o FMI, essa tendência ao subinvestimento pode ser corrigida por instrumentos fiscais de estímulo ao investimento privado em P&D. Incentivos fiscais como crédito tributário e subsídios diretos podem reduzir o custo do P&D, encorajando as empresas a investir mais, o que é socialmente desejável uma vez que outras empresas se beneficiarão. Estudos empíricos sugerem que o custo para o investimento extra em P&D deveria ser reduzido a 50 centavos por dólar. Atualmente, contudo, as taxas de subsídio efetivo na maioria dos países são muito menores: média de 12% em 2015 para um conjunto de 36 países de economia avançada e de mercado emergente. A elevação dos subsídios para um nível socialmente eficiente poderia resultar em um aumento da ordem de 40% dos investimentos privados em P&D.
Os efeitos de transbordamento internacional do P&D são igualmente importantes. Análises recentes mostram que os investimentos em P&D realizados nos países integrantes do G7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido) geram um ganho de produtividade em outros países da ordem de 25% do retorno do próprio G7. Considerando esse efeito transbordamento, alcançar o nível mundialmente eficiente de P&D acarretaria um aumento do PIB mundial de quase 8% no longo prazo.
De acordo com Fundo, as evidências empíricas apontam para um dividendo de crescimento potencialmente grande associado à expansão do P&D, o que fortalece os argumentos em prol do uso da política fiscal na promoção do gasto em P&D. Reconhecendo essa importância, vários países estão adotando políticas para estimular o aumento dos investimentos em P&D. A União Europeia, por exemplo, estabeleceu uma meta ambiciosa de elevar do gasto privado com P&D do seu nível atual de 1,3% do PIB para 2% do PIB em 2020, o que corresponde a um incremento de mais de 50%.
Aperfeiçoamento dos incentivos fiscais para obter melhores relações qualidade/custo. Na avaliação do FMI, enfrentar o subinvestimento privado nas atividades de P&D requer uma abrangente combinação de políticas, incluindo incentivos fiscais bem-desenhados. As duas principais medidas corretivas que reduzem o custo privado do P&D são os subsídios e os incentivos fiscais, tais como crédito tributário, depreciação acelerada, deduções especiais de impostos sobre trabalho ou de contribuições à seguridade social.
Os incentivos fiscais diferem do subsídio ao P&D de maneira importante. Os incentivos fiscais são oferecidos, em geral, a todas as empresas que investem em P&D. Essa abordagem baseada no mercado é atraente porque todas as atividades privadas de P&D são tratadas da mesma maneira, o que nivela o terreno do jogo concorrencial.
Em contraste, os subsídios assumem frequentemente a forma de suporte governamental específico a projetos selecionados de P&D, tendo, portanto, uma natureza discricionária. Segundo o Fundo, se os governos são capazes de orientá-los com base em informações apropriadas sobre o tamanho e a natureza do efeito transbordamento, os subsídios podem ser mais eficientes do que incentivos fiscais. Ademais, os subsídios podem igualmente considerar vantagens não mercantis, como por exemplo, um meio-ambiente mais limpo. Em vários países de economia avançada tanto as pesquisas como a adoção de tecnologias limpas pelas famílias (automóveis de baixa emissão de carbono) e pelas empresas (energia eólica) são fortemente subsidiadas.
Os resultados encontrados pelos autores na análise empírica realizada a partir de dados de empresas e setores industriais indicam que tanto os incentivos fiscais como os subsídios diretos contribuíram para elevar a produtividade total dos fatores (PTF) nas economias avançadas. Todavia, os efeitos dos dois instrumentos variam entre indústrias e empresas. Por exemplo, maiores subsídios ao P&D aumentam mais a PTF em indústrias dependentes de recursos de terceiros, nas quais os gastos com P&D não podem ser acomodados com as receitas correntes, e no setor de tecnologia de informação. Já os incentivos fiscais têm um efeito maior nas indústrias com alta intensidade de P&D e para empresas pequenas, com menos de 50 empregados.
Esses resultados tão variados tornam difícil concluir, em termos gerais, qual instrumento é o mais efetivo para a promoção da inovação e da produtividade. Cada um deles parece ter seus próprios pontos fortes e podem se complementar de maneira eficaz. Subsídios diretos são especialmente úteis no suporte aos componentes de pesquisa do P&D, dado que na fase inicial do processo de inovação os efeitos transbordamento do conhecimento tendem a serem maiores. Os incentivos fiscais podem complementar esses subsídios fornecendo estímulos a todas as empresas que investem em P&D.
Ao longo dos últimos anos, vários países aumentaram seu suporte fiscal ao P&D privado. Os incentivos fiscais, em particular, ganharam popularidade e atualmente são utilizados tanto por economias avançadas como por várias das economias de mercado emergente, incluindo Brasil, China, Índia e África do Sul. Em 2013, as economias avançadas gastaram aproximadamente 0,15% do PIB com suporte fiscal ao P&D. Um pouco mais da metade desse gasto ocorreu sob a forma de subsídios diretos, embora a combinação de instrumentos varie entre os países.
De acordo com o estudo, avaliações do suporte fiscal concedido aos investimentos em P&D nas economias avançadas oferecem as seguintes lições:
• Orientação para pequenas e novas empresas. Em países como Canadá, Holanda, Noruega e Reino Unido, os incentivos fiscais concedidos às pequenas empresas são duas ou três vezes mais efetivos na promoção dos investimentos em P&D do que para empresas de tamanho médio. Isto ocorre em razão da dificuldade que as pequenas empresas, e em particular as novas, enfrentam para obter financiamento. Nove economias avançadas fornecem incentivos fiscais mais generosos para as pequenas empresas. Países como Bélgica, França, Holanda e Itália privilegiam as empresas recém-criadas.
• Crédito tributário reembolsável. Novas empresas em suas fases iniciais (start-up) operam frequentemente com lucros negativos, o que impede que beneficiem de credito tributável que só podem ser usados para abater um passivo fiscal positivo. Para essas empresas, crédito tributário reembolsável em caso de passivo fiscal negativo é um instrumento mais eficaz. Esse instrumento é utilizado em treze economias avançadas na promoção de P&D, casos da Bélgica, França. Holanda e Espanha.
• Promoção do P&D incremental. Os incentivos concedidos aos investimentos incrementais de P&D, acima de montantes pré-determinados, são menos onerosos do que aqueles concedidos a todas as despesas com P&D porque evitam os ganhos excepcionais para os investimentos existentes em P&D abaixo do patamar mínimo. Esquemas de promoção ao P&D incremental são utilizados na Coreia do Sul, Estados Unidos, Japão, Espanha e Portugal. Outros países abandonaram esse instrumento devido a sua complexidade e elevado custo de compliance como porcentagem do suporte total.
• Regime fiscal preferencial para propriedade intelectual. Esses regimes que isentam de impostos parcelas significativas das receitas com ativos intangíveis foram adotados por treze países europeus, com o propósito de estimular inovação. Avalição empírica realizada pelo Fundo concluiu que tais regimes são, em geral, pouco vantajosos na promoção de inovação.
• Expansão gradual dos incentivos fiscais. A expansão gradual dos incentivos pode ser preferível a um aumento imediato. Os aumentos imediatos podem simplesmente acarretar elevação dos salários dos pesquisadores, cuja oferta é fixa no curto prazo.
• Administração eficaz. Para evitar abusos na utilização dos incentivos ficais é crucial ter uma administração eficaz. As empresas podem renomear gastos comuns como despesas com P&D para obter incentivos fiscais. Para prevenir esse tipo de conduta, o suporte de outras agências governamentais com conhecimento técnico especializado é frequentemente necessário, o que acarreta maior custo administrativo. Ao mesmo tempo, os governos devem atuar em prol da redução do custo de compliance das empresas, que diminuem a eficácia dos incentivos. Com esse propósito, alguns países adotam “balcão único” e permitem solicitações online.
Estímulo à Transferência de Tecnologia
Os países do G-7 respondem por 60% dos investimentos mundiais em P&D, concentrando a criação da maior parte das novas tecnologias, as quais são disseminadas para os demais países por meio da imitação e da absorção. A transferência de tecnologia é essencial para a elevação da produtividade, sobretudo, nas economias de mercado emergente e em desenvolvimento.
De acordo com o estudo, os dois principais canais de transferência tecnológica são: o comércio exterior e o investimento externo direto (IED). Por meio da importação de bens de capital e bens intermediários estrangeiros, as empresas adquirem conhecimento tecnológico de forma muito mais intensa do que interagindo diretamente com seus clientes estrangeiros no processo de exportação.
Já no canal do IED, a extensão e a velocidade da difusão tecnológica depende da propriedade da empresa e dos vínculos entre as empresas. Em geral, as empresas multinacionais transferem tecnologia a suas filiais no exterior mediante IED de modo a realizar integralmente os ganhos com suas invenções. Nos países receptores, os influxos de IED podem gerar efeito positivo de transbordamento de produtividade para outras empresas por meio das interações entre as filiais das multinacionais e as empresas locais, da rotação dos trabalhadores ou de aperfeiçoamento de praticas de organização e gestão.
Os autores destacam que a difusão tecnológica por meio do comércio exterior e do investimento direto não é, contudo, automática. Os efeitos positivos de transbordamento de produtividade associado ao IED são maiores nos países que possuem elevado capital humano. Ademais tanto o comércio exterior como o IED requerem, usualmente, um nível adequado de infraestrutura. Investimento governamental em capital humano e físico é, portanto, essencial para a obtenção dos ganhos de produtividade associado às inovações.
Adaptação da política fiscal para atrair investimento estrangeiro direto. Segundo o Fundo, os países enfrentam um dilema ao determinar políticas tributárias que maximizem os benefícios do IED, como ganhos de produtividade, empregos de alta qualidade, funding estável para novos investimentos (greenfield). De modo geral, as economias de mercado emergente e em desenvolvimento adotam isenção ou redução fiscal em zonas econômicas especiais para atrair maior volume de IED. Tais incentivos erodem a base tributária, sobretudo, no que se refere ao imposto de renda das sociedades corporativas.
Análise empírica realizada pelos técnicos do Fundo sobre os custos e benefícios dos incentivos fiscais concedidos ao IED em uma amostra de 103 países de economias de mercado emergente e em desenvolvimento entre 1990 e 2013 sugere que os efeitos das alíquotas do imposto de renda das sociedades corporativas sobre os influxos de IED são negativos, como esperado, porém a magnitude dos efeitos é menos da metade do que é observado nas economias avançadas.
Esse resultado é consistente com pesquisas realizadas junto às empresas na África, América Latina e Ásia, as quais mostram que, muito frequentemente, os incentivos fiscais não têm impactos nas decisões de investimentos das multinacionais. Para as multinacionais, a qualidade institucional do país é um fator muito mais importante do que os incentivos fiscais oferecidos.
Na avaliação do Fundo, esses resultados indicam que os incentivos fiscais sozinhos não são provavelmente um instrumento economicamente eficiente para atração de IED. Para obter ganhos de produtividade a partir de novas tecnologias, os países deveriam priorizar investimentos em instituições, conhecimento e infraestrutura. Reconhecendo a dificuldade, sobretudo, no curto prazo, de abolir os incentivos fiscais ao IED, o Fundo recomenda que os governos aperfeiçoem o desenho, aplicação e transparência desses incentivos.
Promoção do Empreendedorismo
Na avaliação do FMI, inovação e elevação da produtividade não resultam somente dos investimentos em P&D das grandes empresas estabelecidas, mas igualmente das pequenas empresas recém-criadas engajadas em experimentação e na assunção de risco, em outras palavras, empreendedorismo. A entrada de novas empresas inovadoras está associada, em geral, à noção de destruição criadora, descrita por Joseph Schumpeter em sua obra Teoria do Desenvolvimento Econômico, publicada em 1911, segundo a qual novas empresas entram no mercado e estimulam maior concorrência e mais inovação.
Um amplo conjunto de evidências comprova que novas empresas são especialmente relevantes para expandir a fronteira tecnológica porque tendem a desenvolver inovações mais radicais, enquanto as empresas incumbentes tendem, em geral, a priorizar a inovação incremental para aperfeiçoar produtos e processos existentes. De acordo com o Fundo, mais da metade do crescimento da produtividade total de fatores ao nível da indústria decorre da entrada de novas empresas enquanto o restante resulta de ganhos de produtividade das empresas incumbentes. A intensificação da concorrência dos novos participantes estimula a inovação por parte das empresas já instaladas, em particular, nas indústrias de alta tecnologia.
As tendências de empreendedorismo, medida pela proporção da entrada de novas empresas no total de empresas ativas, variam entre os países. Na Europa, em uma amostra de vinte e cinco países, a taxa de entrada de novas empresas vem registrando declínio desde a crise financeira de 2008 em quatorze países, enquanto nos demais tem aumentado. Nos Estados Unidos, país para o qual há uma série mais longa de dados disponíveis, observa-se um declínio gradual na taxa de entrada desde o final da década de 1970.
A taxa de entrada de novas empresas é, tipicamente, mais elevada nas economias de mercado emergente e em desenvolvimento do que nas economias avançadas. Porém, a natureza do empreendedorismo é bastante diferente nos dois grupos. Nas economias emergentes e em desenvolvimento o empreendedorismo é fruto da necessidade e tende a florescer quando outras opções de trabalho estão ausentes ou são insatisfatórias. Em contraste, nas economias avançadas, a oportunidade relacionada à inovação é o motor do empreendedorismo. Por essa razão, uma importante meta de desenvolvimento em muitas das economias de mercado emergente e em desenvolvimento é estimular a ampliação da parcela de empreendedorismo que é motivada pela oportunidade ao invés da simples elevação da taxa de entrada.
O estudo destaca que a experimentação empresarial eficaz requer arranjos institucionais que facilitem a entrada de novos participantes, o crescimento e a saída. Um obstáculo bastante frequente é o acesso a fontes de financiamento. Em vários países, programas governamentais apoiam a provisão de capital-semente, de financiamento nas etapas iniciais e de capital de risco. Outro obstáculo é o peso sobre as empresas das políticas não fiscais, tais como as licenças e permissões, as leis de falência e a legislação trabalhista.
Políticas tributárias para encorajar novas empresas. A decisão de iniciar um empreendimento envolve uma escolha entre trabalhar sob um contrato seguro de emprego com um salário determinado e assumir o risco de buscar um ganho financeiro potencialmente maior, porém incerto. Na avaliação do Fundo, o sistema de tributação da renda pode influenciar os custos, benefícios e riscos envolvidos nessa escolha.
O imposto de renda pessoal é importante para os empreendedores cujas empresas iniciam atividade como empresa sem fins lucrativos. Se o sistema tributário permite a compensação integral no imposto de renda pessoal de perdas com outras atividades, o risco da variabilidade da renda se reduz e o empreendedor é encorajado a incorrer riscos. Porém, a maioria dos sistemas de tributação da renda pessoal restringe a compensação de perdas, o que desincentiva a atividade empresarial.
Quando o negócio sobrevive e cresce, a empresa se transforma em uma empresa comercial com fins lucrativos, a receita gerada passa a estar sujeito ao imposto sobre renda das sociedades e quando distribuída ao proprietário sujeita a tributação de dividendos ou ganhos de capital. Esses tipos de tributos podem também influenciar a entrada e o crescimento de novas empresas na medida em que alteram os riscos e os retornos esperados.
Os efeitos da tributação da renda sobre a criação de empresas foram objeto de inúmeras investigações empíricas, incluindo uma nova análise realizada pelo FMI com dados de 25 países europeus de economia avançada e no período 2004-2013. De acordo com o estudo, os resultados encontrados são os seguintes:
• Tributação de renda pessoal. Os efeitos das alíquotas de imposto de renda pessoal sobre a taxa de entrada foram mistos. Para os Estados Unidos, algumas evidências sugerem uma relação negativa entre a progressividade do imposto e a entrada de novas empresas, enquanto outros mostram que alíquotas mais elevadas encorajam o risco empresarial. Para Europa, a análise empírica encontrou evidências robustas que os efeitos progressividade do imposto sobre a entrada de empresas são insignificantes.
• Imposto de seguridade social. A decisão de iniciar um negócio pode depender da diferença entre a elegibilidade de empregados e empregadores nos programas de seguridade social. De um lado, alíquotas elevadas de contribuições podem gerar os mesmos efeitos de distorção sobre o empreendedorismo que a tributação de renda pessoal. Por outro lado, a garantia de elegibilidade à seguridade universal pode encorajar à assunção de risco empresarial.
• Tributação de renda corporativa. A maioria dos estudos empíricos encontrou evidência que alíquotas elevadas de imposto sobre a renda das sociedades corporativas têm influência negativa sobre a atividade empresarial. A análise realizada pelo Fundo também encontrou tal correlação inversa. O tamanho dos efeitos é, contudo, modesto. Uma redução em 1 ponto percentual (p.p.) do imposto de renda se traduziria em um aumento de 0,1 a 0,3 p.p. na taxa de entrada de novas empresas.
• Tributação de ganhos de capital. Dado que parte significativa da renda dos empresários ocorre sob a forma de ganhos de capital, uma menor tributação de ganhos de capital pode encorajar projetos empresariais. Todavia, reduzir as alíquotas para todos os tipos de ganho de capital para alcançar esse objetivo não seria de modo algum adequado. Ademais, uma menor tributação estimularia a realização de arbitragem fiscal, encorajando os empresários a realizar ganhos de capital ao invés de distribuir dividendos.
Os autores concluem que, no conjunto, embora o imposto sobre renda possa ter algum efeito desencorajador na entrada de empresas, há importantes forças compensatórias. Para assegurar que essas forças sejam efetivas seria necessário assegurar a provisão generosa no sistema tributário de mecanismos de compensação das perdas.
Alguns países adotam medidas especiais de redução de imposto para estimular atividade o empreendedorismo, como a oferta de abatimento fiscal para capitalistas de risco para estimular a oferta de recursos paras as empresas nos estágios iniciais. Porém, na prática, como a maior parte do capital de risco é originário de investidores institucionais isentos de imposto, esse instrumento tem sido pouco efetivo. Suporte fiscal diretamente focado nas empresas recém-criadas pode ser mais eficaz, especialmente se tal suporte assume a forma de reembolso do imposto quando a receita é negativa.
Novo é mais importante do que pequeno. De acordo com o Fundo, o sistema tributário também pode afetar o crescimento das empresas. Em particular, tratamentos fiscais preferenciais com base no tamanho das empresas e tributação diferenciada de distintas formas legais de negócio podem afetar os incentivos das empresas a crescer.
Vários países oferecem tratamento fiscal preferencial para pequenas empresas. Por exemplo, entre os países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), dez praticam alíquotas menores de imposto sobre a renda de sociedades corporativas para pequenas empresas, com lucros abaixo de um determinado nível. Contudo, como a maioria dessas pequenas empresas não é nem nova e nem inovadora, esse tipo de incentivo fiscal não contribui para estimular a inovação empresarial.
Evidências indicam que a taxa de crescimento das empresas, a criação de empregos e as atividades de exportações estão muito mais relacionadas com o tempo de atividade do empreendimento do que com o tamanho da empresa. Ademais, preferência baseada em tamanho da empresa cria desincentivo para ampliação do negócio, conhecido como “armadilha da pequena empresa”. Por essa razão, o Fundo considera que o estímulo à criação e ao crescimento das empresas pode ser bem mais efetivo se o suporte fiscal estiver orientado às novas empresas.
No que se refere à tributação diferenciada de distintas formas legais de negócio, o estudo ressalta que muitos sistemas tributários não oferecem um tratamento fiscal neutro das rendas corporativa geradas mediante várias estruturas legais. Em consequência, os empresários são induzidos a conduzir seus negócios de modo a minimizar suas obrigações tributárias, o que pode resultar em distorções organizacionais e comprometer o crescimento. Uma ligeira redução da tributação das sociedades corporativas em comparação com as empresas não corporativas poderia, na visão do Fundo, encorajar a assunção de risco empresarial ou estimular o registro formal do empreendimento.
Simplicidade do sistema tributário. O empreendedorismo pode ser igualmente afetado pela complexidade do sistema tributário. As empresas incorrem em custo elevado para gerenciar o pagamento e o cumprimento das obrigações tributárias, denominado compliance tributário.
De acordo com o estudo, nas economias de mercado emergente e em desenvolvimento, o custo do compliance tributário é estimado em aproximadamente 15% do volume de negócio das pequenas empresas, o que impõe uma barreira significativa ao empreendedorismo. Todavia, alguns países estão simplificando seus regimes tributários para empresas com volume de negócios abaixo de certo patamar, permitindo o pagamento de um único imposto ao invés de um conjunto de impostos e com menor frequência. Essa simplificação encorajou empresas informais a formalizar os seus negócios. Esse foi o caso do Brasil, onde a introdução de esquemas de simplificação para micro e pequenos empresa elevou significativamente a formalização, o volume de negócios e o nível de emprego. Outros países que adotaram esquemas simplificados de tributação foram o Chile, Geórgia, Índia e México.
Entre as economias avançadas, vários países adotam sistemas tributários simplificados para empresas com volume de negócios baixo de determinado patamar. Em geral, nesses regimes simplificados, as empresas estão dispensadas de se registrarem no imposto sobre valor adicionado (VAT, na sigla em inglês). Quanto mais alto é o limiar do VAT maior é a taxa de entrada de novas empresas. Segundo o Fundo, em alguns países, o limiar do VAT poderia ser elevado para estimular o empreendedorismo.
Recomendações de Política
O estudo conclui que a política fiscal pode auxiliar a elevação da produtividade mediante a promoção de inovações. As principais conclusões e recomendações de política são as seguintes:
• Boas políticas de estabilização fiscal estimulam o P&D. Essas políticas podem ajudar as empresas a manter suas atividades de P&D durante recessões. O estudo encontrou novas evidências que a estabilização fiscal é especialmente importante para as empresas que dependem de funding externo.
• Governos deveriam fazer mais para encorajar o P&D. Nas economias avançadas, os investimentos privados em P&D precisam ser aumentados em 40%, em média, para alcançar os níveis que são eficientes em perspectiva nacional. Alcançados esses níveis, o crescimento do PIB poderia alcançar 5% no longo prazo. O custo fiscal associado é estimado em 0,4% do PIB por ano. No âmbito global, os benefícios da ampliação dos investimentos privados em P&D seriam maiores em razão do efeito de transbordamento do conhecimento. Nas economias avançadas, esse resultado poderia ser alcançado mediante políticas bem-desenhadas que incluam incentivos fiscais às atividades privadas de P&D e investimento público complementar em pesquisa básica. Nas economias de mercado emergente e de renda média, o estímulo ao P&D também pode contribuir para o aumento da produtividade, desde que os países tenham uma base forte de capital humano.
• Desenho cuidadoso dos incentivos fiscais ao P&D é imperativo. Os governos podem investir mais em P&D público, tais como pesquisas científicas de base que irão impulsionar as atividades de pesquisas das próprias empresas. O estudo encontrou evidências de que subsídios às pesquisas e os incentivos fiscais aos gastos com P&D podem efetivamente promover o crescimento da produtividade. Todavia, alguns desses incentivos, como o tratamento fiscal favorável aos rendimentos de propriedade intelectual, têm elevado custo fiscal e fornecem, na prática, pouco estímulo à inovação. Em alguns casos, esses incentivos são apenas parte de uma estratégia agressiva de concorrência fiscal.
• Transferência tecnológica em economias em desenvolvimento e de mercado emergente requer melhores instituições, infraestrutura e educação. A análise mostrou que os incentivos fiscais comumente utilizados para atrair IED são extremamente ineficazes e custosos. Boas instituições são mais eficazes na atração de investimento externo. Ademais, esses países necessitam fortalecer suas capacidades de absorção de tecnologia do exterior mediante a melhora do seu capital humano e de sua base de infraestrutura.
• Os incentivos e preferências devem ter como alvo empresas recém-criadas e não pequenas empresas. A análise empírica realizada mostrou que a tributação da renda tem um efeito apenas modesto sobre a taxa de entrada das empresas. O tratamento fiscal preferencial de pequenas empresas deve ser evitado, porque é um instrumento muito pouco efetivo para estimular de modo eficiente a atividade empresarial. Na verdade, pode prejudicar ao criar uma armadilha que compromete o crescimento dessas empresas, que evitariam crescer para preservar a elegibilidade aos benefícios fiscais. Um bem-desenhado programa de alívio fiscal para novas empresas poderia promover o empreendedorismo e inovação.