Carta IEDI
A Indústria em Agosto de 2017: uma pedra no caminho da recuperação
O desempenho da indústria em agosto deixou a desejar, registrando declínio de 0,8% em relação ao mês de julho, já descontados os efeitos sazonais. Por mais que esta variação negativa não coloque em xeque o quadro de reativação do setor em 2017, não se pode subestimar seu significado: ainda existem dificuldades a serem superadas antes que um verdadeiro processo de recuperação industrial entre em operação.
Em boa medida, a queda de agosto foi concentrada em poucos ramos industriais, notadamente na produção de alimentos – cujo retrocesso na série com ajuste sazonal foi dos mais intensos do ano (-5,5%) – tendo a maioria deles (16 dos 24 ramos) registrado crescimento na passagem de julho a agosto.
Por isso, há uma chance de o resultado negativo de agosto vir a ser um dado isolado, à semelhança do que vimos em março de 2017 (-1,6% ante fev/17). Inclusive porque o indicador da CNI da avaliação das condições correntes dos negócios superou, pela primeira vez desde nov/12, a marca dos 50 pontos, sugerindo na visão dos empresários industriais um mês de setembro melhor que o de agosto.
Entretanto, isso não muda o fato de que este retrocesso da produção sucede dois meses de dinamismo industrial já muito baixo: +0,2% em junho e +0,7% em julho, na série com ajuste. Deste modo, uma dimensão importante para a consolidação da recuperação do setor continua ausente, qual seja, sinais claros de aceleração das taxas de crescimento.
Este é um aspecto todo especial porque estamos em um momento de recalibragem das fontes de dinamismo da indústria. Na primeira metade do ano, fatores pontuais, isto é, com efeitos positivos muito concentrados no tempo, parecem ter sido fundamentais, tais como a supersafra agrícola, que estimulou alguns ramos industriais e possibilitou um intenso recuo da inflação, aumentando poder de compra da população, e a liberação dos recursos do FGTS, que ajudou a recompor parcialmente o consumo das famílias.
Agora, em que esses fatores tendem a perder força, precisa haver uma troca de motores para que a indústria continue em trajetória ascendente. Um forte candidato a cumprir esse papel é um patamar menor de juros. Porém, a redução da taxa básica (Selic) pelo Banco Central deveria chegar mais intensamente aos juros dos empréstimos às famílias e especialmente às empresas, cujas condições de financiamento continuam restringidas. Seria conveniente ainda que mais setores industriais pudessem ter condições de elevar suas exportações, hoje muito concentradas na cadeia automobilística.
Em outros termos, é preciso construir o ambiente de crescimento dos próximos meses. A questão a ser verificada, agora, é se a trajetória industrial deslancha, de modo a começar a compensar progressivamente tudo o que foi perdido, ou se ficará muito tempo presa em um estágio de quase estagnação, isto é, de baixo dinamismo. Por essa razão, qualquer sinal de revés deve ser tomado seriamente.
Dentre os macrossetores industriais, ainda na comparação frente ao mês anterior com ajuste sazonal, bens de consumo duráveis registraram a maior alta em agosto (+4,1%) na série com ajuste, depois de também ter tido crescimento em junho (+2,9%). Neste caso, a produção do setor de veículos (+6,2%), que vem conseguindo ampliar vigorosamente suas exportações, foi decisiva.
Bens de capital, conseguiram igualmente se manter na faixa positiva, com o que já são cinco meses de crescimento. Há, porém, uma tendência de desaceleração em sua trajetória na margem desde o mês de maio. Em agosto, a alta não passou de 0,5% frente a julho com ajuste, sob influência do recuo de 3,8% em máquinas e equipamentos.
A retração da indústria como um todo decorreu, então, de bens semi e não duráveis (-0,6% ante julho com ajuste), em muito devido a alimentos, como mencionado anteriormente, e de bens intermediários, cuja produção caiu 1,0%, depois de quatro meses seguidos de alta na série com ajuste. Este é um resultado de toda importância já que o dinamismo dos bens intermediários reflete o nível de atividade das relações interindustriais. Quando bens intermediários crescem é porque o sistema industrial como um todo está em operação.
Resultados da Indústria
A indústria, em agosto de 2017, retrocedeu 0,8% na comparação com julho, já descontados os efeitos sazonais, interrompendo uma série de quatro meses consecutivos de alta na série com ajuste, quando havia acumulado crescimento de 3,3%.
Já o desempenho industrial em comparação com agosto de 2016 registrou crescimento de 4,0%. Esta foi a segunda melhor marca em 2017, ficando atrás apenas do mês de maio. Com isso, a trajetória que oscilava entre resultados positivos e negativos desde janeiro deu lugar a um movimento mais consistente, de altas sucessivas: +4,4%, +0,9%, +2,9% e +4,0% entre maio e agosto.
Deste modo, a expansão no acumulado do ano avançou mais um pouco. No primeiro semestre do ano o crescimento havia atingido 0,6%; agora no total dos oito meses de 2017 o desempenho ficou em +1,5%. Mesmo assim, continua-se muito aquém do necessário para recompor as perdas que a indústria sofreu entre 2014 e 2016, algo próximo de -20%.
A trajetória de redução das perdas no acumulado em 12 meses também foi preservada. Em agosto o setor ficou praticamente estável nesta comparação, registrando variação de -0,1% frente ao mesmo período do ano anterior, o que consistiu no menor ritmo de queda desde junho de 2014 (-0,5%).
Em relação aos macrossetores, na comparação com julho, descontados os efeitos sazonais, metade deles registrou crescimento: bens de consumo duráveis (+4,1%) e bens de capital (+0,5%). Em contraste, caíram bens de consumo semi e não duráveis (-0,6%), e bens intermediários (-1,0%).
Os resultados de agosto de 2017 frente a agosto de 2016 foram positivos para todos os macrossetores: bens de consumo duráveis (+18,5%), bens de capital (+9,1%), bens de consumo semi e não duráveis (+3,5%) e bens intermediários (+2,0%).
O crescimento de 18,5% de bens de consumo duráveis se deveu, em grande medida, ao crescimento obtido pela fabricação de automóveis (+33,3%) e dos grupamentos de eletrodomésticos da “linha marrom” (+15,1%) e de móveis (+6,5%). Em sentido oposto, registraram recuos motocicletas (-13,1%) e outros eletrodomésticos (-4,9%).
Já o avanço em bens de capital de 9,1% ante agosto de 2016 foi alavancado pela produção de bens de capital para equipamentos de transporte (+19,8%), de capital para uso misto (+30,4%) e para construção (+58,0%). Por outro lado, os impactos negativos foram assinalados pelos grupamentos de bens de capital para fins industriais (-3,8%), agrícola (-8,7%) e para energia elétrica (-7,9%).
O setor de bens de consumo semi e não-duráveis, que cresceu 3,5% ante agosto de 2016, teve seu desempenho explicado, em grande parte, pela alta observada no grupamento de alimentos e bebidas elaborados para consumo doméstico (+4,0%) e os subsetores de semiduráveis (+4,7%), de carburantes (+3,8%) e de não-duráveis (+1,5%).
Por fim, o macrossetor de bens intermediários, por sua vez, cuja alta foi de 2,0% frente a agosto de 2016, viu avanços nos produtos associados às atividades de veículos automotores, reboques e carrocerias (+15,3%), de indústrias extrativas (+2,6%), de produtos alimentícios (+3,8%), de produtos de borracha e de material plástico (+5,1%), de máquinas e equipamentos (+10,0%), de metalurgia (+1,6%), de celulose, papel e produtos de papel (+2,6%), de produtos têxteis (+3,2%), de produtos de minerais não-metálicos (+0,6%) e de outros produtos químicos (+0,1%). Em sentido oposto ficaram os produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-7,3%), produtos de metal (-3,5%), insumos típicos para construção civil (-1,9%).
No acumulado dos primeiros oito meses de 2017, em relação ao mesmo período de 2016, houve expansão da produção em três dos macrossetores e estabilidade em um deles: bens de consumo duráveis (+11,1%), seguido por bens de capital (+4,4%), bens intermediários (+0,7%) e bens de consumo semi e não duráveis (0%).
Por dentro da Indústria de Transformação
A retração da produção industrial geral em agosto (-0,8%) foi resultado do declínio de 1,1% da indústria extrativa, frente a julho de 2017, com ajuste sazonal, e da estabilidade da indústria de transformação, nesta mesma comparação. Em relação a agosto de 2016, o resultado da indústria de transformação foi de +4,2% e o do setor extrativista, de +2,6%. O avanço de 4,0% da indústria geral foi, então, produzido por ambos segmentos. Em agosto, depois de três anos seguidos de retração, a produção da indústria de transformação manteve crescimento no acumulado de 2017: +0,8% frente janeiro-agosto de 2016. Nesta mesma comparação a indústria extrativa registrou crescimento de 6,6%.
Frente a julho, na série com ajuste sazonal, o declínio de 0,8% da indústria geral foi acompanhado por poucos segmentos: apenas 8 dos 24 ramos pesquisados, com destaque para produtos alimentícios (-5,5%), máquinas e equipamentos (-3,8%) e coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-1,6%), além das indústrias extrativas (-1,1%). Entre os dezesseis ramos que ampliaram a produção nesse mês, os desempenhos de maior relevância foram veículos automotores, reboques e carrocerias (+6,2%), perfumaria, sabões, produtos de limpeza e de higiene pessoal (+5,5%), metalurgia (+1,9%), produtos do fumo (+15,2%) e produtos farmoquímicos e farmacêuticos (+2,1%).
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou alta de 4,0%, variações positivas marcaram o desempenho de 20 dos 26 ramos, 54 dos 79 grupos e 55,7% dos 805 produtos pesquisados. Os destaques positivos ficaram a cargo de: veículos automotores, reboques e carrocerias (+28,2%), produtos alimentícios (+4,7%), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (+22,1%), produtos do fumo (+63,0%), produtos de borracha e de material plástico (+4,9%), perfumaria, sabões, produtos de limpeza e de higiene pessoal (+11,0%), produtos diversos (+14,2%) e móveis (+12,0%), além das indústrias extrativas (+2,6%). Em sentido oposto ficaram: coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-3,7%), outros equipamentos de transporte (-14,3%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-5,8%) e produtos farmoquímicos e farmacêuticos (-5,8%).
No acumulado dos oito primeiros meses de 2017, frente a igual período do ano anterior, o crescimento de 1,5% da indústria geral foi acompanhado de resultados positivos em 15 dos 26 ramos, 45 dos 79 grupos e 52,4% dos 805 produtos pesquisados. Dentre as altas encontram-se veículos automotores, reboques e carrocerias (+13,9%), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (+20,7%), produtos do fumo (+22,4%), metalurgia (+2,4%), máquinas e equipamentos (+2,7%) e confecção de artigos do vestuário e acessórios (+4,9%), além das indústrias extrativas (+6,6%). Já as principais contribuições negativas compreenderam: coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-6,6%), outros equipamentos de transporte (-12,3%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-6,6%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (-6,0%), produtos de minerais não-metálicos (-4,0%) e impressão e reprodução de gravações (-11,0%).
Exportação
Segundo os dados da Funcex, divulgados pelo IBGE conjuntamente com os resultados da produção industrial, o quantum das exportações de manufaturados no mês de agosto de 2017 cresceu 4,0% frente a agosto do ano passado. Com disso, o resultado no acumulado do ano que vinha se desacelerando voltou a melhorar: +2,7% frente a janeiro-agosto de 2016. Esta foi a segunda aceleração do quantum de manufaturados desde março de 2017.
Em agosto, as importações em quantum de matérias-primas cresceram novamente, porém, menos que nos meses anteriores: +0,8% frente ao mesmo mês de 2016. No acumulado de janeiro-agosto, houve, então, aumento de 8,6% frente a igual período do ano anterior. Em parte, este desempenho reflete, a taxa de câmbio em patamar mais apreciado do que em 2016 e a fase de crescimento da produção industrial, mas também está associado ao melhor desempenho de alguns setores, especialmente os de bens duráveis, com maior participação de insumos importados.
Utilização de Capacidade
O nível de utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, foi de 74,1% em agosto de 2017, recuando 0,6 pontos percentuais em relação ao mês anterior. O atual nível de utilização continua inferior à média histórica do próprio indicador (80%).
O indicador da CNI, a seu turno, também continua registrando um nível historicamente baixo da utilização da capacidade em julho de 2017: 77,8%, contra 81,3% na média desde jan/03. Na passagem de julho (77,5%) para agosto houve, pela segunda vez consecutiva, um aumento de 0,3 ponto percentual, já descontados os efeitos sazonais.
Estes dados sugerem uma tênue melhora do quadro em relação ao final do ano passado, estando longe de retomar aos níveis de utilização pré-crise. Ademais, ao longo de 2017 não tem havido nenhuma tendência de aumento sucessivo da utilização da capacidade, tanto no caso do indicador da FGV, como no da CNI, que também tem sido marcado por alguma volatilidade.
A permanência da utilização da capacidade em níveis historicamente baixos e sem uma trajetória clara de melhora não é um bom indício para a evolução futura do investimento, isso porque máquinas e equipamentos atualmente ociosos deverão ser postos em funcionamento antes de os empresários pensarem em ampliar sua capacidade de produção. Em contrapartida, a existência de capacidade ociosa significa que existem plenas condições de oferta para garantir uma recuperação da atividade econômica sem pressões inflacionárias.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, os estoques de produtos finais da indústria em agosto de 2017 assinalaram índice de 49,5 pontos, depois de ter atingido em julho o patamar mais elevado desde junho de 2015 (51,1 pontos). Vale lembrar que o indicador abaixo de 50 pontos indica redução dos estoques e acima, aumento deles.
Este resultado em agosto de 2017 foi condicionado pela indústria de transformação, cujo indicador de estoques ficou abaixo da marca dos 50 pontos, em 49,3 pontos. Já a indústria extrativa, que em julho havia ficado abaixo dos 50 pontos pela primeira vez em 2017 (47,8 pontos) voltou a apresentar elevação de seu indicador para 54,8 pontos.
Na avaliação dos empresários, os estoques efetivos da indústria geral ficaram, em agosto, no nível planejado, o índice de satisfação da CNI marcando 50 pontos. No caso do setor extrativo, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 52,4 pontos e no caso da indústria de transformação, em 49,9 pontos.
Neste último grupo industrial, isto é, na indústria de transformação, 19 dos 27 ramos tiveram estoques iguais ou menores do que o planejado (50 pontos) em agosto de 2017, como em outros equipamentos de transporte (41,7 pontos), impressão e reprodução (43,9 pontos), borracha (44,2 pontos) e derivados de petróleo (45,0 pontos), entre outros. Cabe observar que antes do resultado de agosto, o número de setores com índice igual ou abaixo de 50 vinha caindo entre abril e julho (19 em abril, 16 maio, 14 em junho e 7 em julho). Em contraste, constataram estoques efetivos acima do planejado os setores de máquinas e equipamentos (57,0 pontos), couros (57,0 pontos), máquinas e materiais elétricos (54,7 pontos), entre outros.
Confiança e Expectativas
O Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI (ICEI) atingiu em setembro de 2017 o nível mais elevado desde março de 2013: 56,4 pontos, abrindo boas perspectivas para o desempenho do setor. Mais importante, esse desempenho resultou não apenas da melhora do componente de expectativas para o futuro, mas também de uma avaliação positiva das condições atuais dos negócios, que pela primeira vez desde novembro de 2012 ultrapassou a marca dos 50 pontos em setembro de 2017 (51,6 pontos).
Por sua vez, o Índice de Confiança da Indústria de Transformação da FGV também indicou um quadro menos pessimista, evoluindo de 92,2 pontos em agosto para 92,8 pontos em setembro de 2017. Observa-se que, como o indicador ainda permanece abaixo da marca dos 100 pontos, a partir da qual a avaliação torna-se positiva, continua havendo certa insatisfação dos empresários com seus negócios. Neste caso, a elevação do indicador também se deve tanto a seu componente expectacional (de 94,4 para 94,9 pontos) como pelas avaliações da situação atual, que passou de 90 pontos para 90,6 pontos entre agosto e setembro, já descontados os efeitos sazonais, a melhor marca desde maio de 2014 (92,3 pontos).
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Seu nível manteve-se estável entre agosto e setembro de 2017 em 50,9 pontos, indicando melhora das condições de negócio já que se manteve acima da marca de 50 pontos.
Em síntese, depois da deterioração do quadro político do país no mês de junho, que impactou negativamente quase todos os indicadores de confiança, a expectativa e a avaliação da situação corrente da indústria vem mostrando recuperação nos meses de julho, agosto e setembro. O avanço dos indicadores de avaliação corrente é importante porque ratifica as expectativas positivas (ou menos negativas) em relação ao futuro.
Anexo Estatístico
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)