Carta IEDI
Indústria Mundial: O Brasil na contramão dos emergentes
Dados divulgados pela UNIDO para a produção da indústria de transformação mundial até 2016 revelam que, apesar do fraco ritmo de crescimento nos últimos três anos, o processo de industrialização continuou nas economias industriais emergentes. Incluindo a China, o valor adicionado da indústria nesse grupo de países aumentou consistentemente na última década, atingindo a média de 21% do PIB em 2016.
Quanto ao Brasil, o valor adicionado das manufaturas em 2016 representou 10% do PIB. De 2005 a 2016, em termos constantes, o valor da transformação industrial per capita brasileiro se reduziu de US$ 1.415 para US$ 1.081. Neste último ano, o indicador de valor adicionado da indústria de transformação (VTI) per capita do país tornou-se inferior à da média mundial, ficando também abaixo do valor das economias de renda média-alta.
Entre 2010 e 2016, o VTI brasileiro aumentou somente 0,8% ao ano, vis-à-vis uma expansão de 2% nas economias renda média-alta e de 2,4% no mundo. Vale notar que em 2005 o Brasil tinha uma fatia de 24% no VTI dos países de renda média-alta, passando para 17% em 2016. O PIB, por sua vez, cresceu menos no Brasil do que no mundo e do que nas economias de renda média. Porém, nestes últimos anos (2010-2014), a variação média anual em dólares constantes foi negativa em 3,4%, enquanto o mundo cresceu 2,3%.
No mundo, o VTI cresceu 2,6% em 2016, tendo sido 2,8% em 2015 e 2,3% em 2014, em valores constantes de 2010. A origem deste dinamismo coube aos países emergentes, já que o crescimento do VTI nas economias industrializadas foi inferior a 1% em 2016. No caso dos países emergentes e em desenvolvimento, a alta chegou a 2,5% excluindo-se a China, cujo resultado foi de 6,7%.
Com isso, teve continuidade o movimento de retração da participação das economias industrializadas, que passou de 70% do valor adicionado mundial em 2005 para 55% em 2016. Tal perda de parcela foi praticamente toda absorvida pela China (12% em 2005 e 24% em 2016).
Por essa razão, em dez anos, a hierarquia entre os países na produção mundial da indústria de transformação mudou consideravelmente. Em 2016, a liderança industrial coube à China, seguida por EUA, Japão e Alemanha. A Índia se tornou a quinta maior produtora, ultrapassando Coreia do Sul, Itália, França, Reino Unido e Brasil.
A indústria brasileira ficou em 9ª posição em 2016, o que não é de todo mal, dada as intensas adversidades que enfrenta. Entretanto, sua participação de 1,8% no VTI mundial, significa um declínio expressivo frente à participação de 2005 (2,8% do total).
Diante dessa trajetória da indústria brasileira, ao menos o país conseguiu preservar sua posição em alguns setores. O Brasil encontrava-se entre os 15 maiores produtores de todas os ramos da indústria de transformação, exceto em equipamentos de escritório, computadores e contabilidade e farmacêuticos. Suas melhores posições no ranking mundial por setores foram em couro, produtos do couro e calçados (4ª posição), coque, refino do petróleo e combustíveis nuclear (4ª posição), alimentos (5ª posição), bebidas (6ª posição) e papel e produtos do papel (6ª posição). Apesar das colocações de destaque, em 2010, em todos esses ramos industriais o país estava em posições iguais ou melhores.
Em relação ao VTI total do grupo de países emergentes, exceto China, o Brasil chega a ser líder em dois ramos industriais, segundo dados de 2015: papel e petróleo refinado. Em 2010, o país ocupava o 1º lugar no ranking em outros 9 ramos: alimentos, couro, madeira, impressão e publicação, borracha e plástico, produtos fabricados de metal, maquinas e equipamentos, veículos automotores, moveis e outras manufaturas.
Quanto ao panorama mundial dos setores industriais, uma minoria de ramos apresentou recuos do VTI em 2010-2015. Nas economias industrializadas, 7 de 22 ramos tiveram queda, principalmente, produtos do tabaco (-3,6%) e vestuário (-3,4%). Em sentido oposto, destacaram-se as elevações de 3,7% em veículos automotores, carrocerias e semi-carrocerias e de 2,3% em outros veículos de transporte.
Já nas economias industriais emergentes, grupo que inclui o Brasil, praticamente todas indústrias cresceram, principalmente equipamentos elétricos (+3,6%), alimentos (+3,2%), produtos químicos (+3%) e farmacêuticos (+3%). Nesse grupo de países, assinalaram variação negativa somente os seguintes ramos: computadores, eletrônicos e produtos óticos (-1,4%) e máquinas e equipamentos (-0,3%).
Panorama da indústria de transformação mundial
O recém-lançado relatório anual da UNIDO de 2017 traz as principais estatísticas da produção da indústria de transformação mundial até 2016. Cabe lembrar que por “indústria de transformação” entendem-se as atividades compreendidas nas categorias C - revisão 4- ou D - revisão 3- da ISIC - International Standard Industrial Classification Soma All Economic Activities.
Em 2016, a produção da indústria de transformação cresceu mundialmente 2,6%, tendo sido 2,8% em 2015 e 2,3% em 2014. A eleição presidencial nos EUA e o BREXIT, com seus potenciais impactos sobre os acordos internacionais de investimentos e comércio, somados à reversão dos preços das commodities, foram os motivos principais para o resultado de 2016 ter sido mais fraco do que o de 2015.
A variação da produção da indústria de transformação mal chegou +1% nas economias industrializadas e de +2,5% nas economias industriais emergentes e em desenvolvimento excluindo a China, cujo desempenho marcou +6,7%. Todos estes resultados foram inferiores aos alcançados em 2015.
Conforme afirma a UNIDO, a desaceleração da indústria na passagem de 2015 para 2016 esteve intimamente relacionada à fraca recuperação da economia global, principalmente nas economias industrializadas. Nestes países, o setor industrial vem ligeiramente perdendo participação no PIB desde 2010: em 2016 representou em média 13% do PIB. Já nas economias em desenvolvimento e emergentes, desta vez incluindo a China, o valor adicionado da indústria de transformação tem aumentado consistentemente na última década, atingindo a média de 21% do PIB em 2016.
O valor adicionado da indústria de transformação pode ser divido em: salários e remunerações do trabalho, que contabiliza o custo do trabalho total pago diretamente para remunerar o trabalho, e depreciação do capital e excedente operacional. Nos países desenvolvidos, a parcela do trabalho costuma ser superior: 60% na Alemanha contra 20% na Índia, por exemplo.
Como tendência geral, nos últimos anos, principalmente desde a crise financeira internacional de 2008, tem havido uma mudança na composição do valor adicionado, com a redução da parcela do trabalho. Comparando-se 2004 a 2014 (último ano em que a informação está disponível), o Brasil é uma das poucas exceções ao apresentar uma tendência de direção oposta. Ou seja, a parcela do trabalho no valor adicionado constante da indústria de transformação brasileira subiu de 20% para 26%, embora seu patamar continue bastante aquém daquele dos países desenvolvidos e até mesmo de patamares de outros países como a Turquia. Neste período, também houve aumento da participação dos salários no valor adicionado da indústria de transformação na Turquia, França, Singapura, Malásia, Etiópia e Índia.
As economias industrializadas, que em 2016 detinham cerca de 17% da população mundial, produziram 55% das manufaturas, o que implica uma perda significativa de participação já que em 2005 eram responsáveis por 70% das manufaturas produzidas no mundo. Neste período, houve uma transferência de participação para China, que em 2005 possuía 12% do valor adicionado da industrial mundial e em 2016 de 24%. Com isso, a participação chinesa na indústria é tornou-se superior ao seu peso na população mundial (18%).
Tomando-se essa evolução da indústria dos países desenvolvidos por regiões, de 2005 a 2016 a Europa perdeu 16 pontos percentuais de parcela no valor adicionado da indústria de transformação mundial, chegando a 25%, enquanto a América do Norte passou de 22% para 17%.
Também houve queda da participação da América Latina: de 8% para 6% neste mesmo período. A África, por sua vez, manteve uma participação muito baixa (2%), mas registrou uma pequena melhora. Ásia e Pacífico passaram a deter quase metade do valor adicionado mundial da indústria de transformação: 49,5% em 2016 contra 36,5% em 2005.
Assim, em dez anos a hierarquia entre os países na produção mundial da indústria de transformação mudou consideravelmente. A China passou a ser a maior produtora, mais do que dobrando sua parcela no VTI global. Os EUA, que em 2005 eram líderes isolados, viu sua parcela se reduzir para 16% em 2016. Japão e Alemanha aparecem, em 2016, como terceiro e quarto maiores produtores de manufaturas, com parcelas de 8,7% e 6,3%, respectivamente. A Índia, por sua vez, tornou-se a quinta maior produtora, ultrapassando Coreia do Sul, Itália, França, Reino Unido e Brasil. O Brasil encontrava-se na 9ª colocação do ranking mundial, com parcela de 1,8%. Vale lembrar que a indústria brasileira já chegou a representar 2,8% do VTI mundial em 2005.
O desempenho dos setores industriais no mundo
Tomando-se o desempenho médio em dois períodos, 2005-2010 e 2010-2015, a indústria mundial como um todo e a grande maioria de seus setores se saíram melhor nestes últimos cinco anos do que no quinquênio anterior, quando teve o estopim da crise financeira internacional. Os setores que registraram as maiores taxas médias de crescimento anual real entre 2010 e 2015 foram:
• veículos automotores, carrocerias e semi-carrocerias (+4,3%),
• metais básicos (+4,2%),
• computadores, eletrônicos e produtos óticos (+3,6%) e
• têxteis (+3,4%).
Somente impressão e publicação assinalou variação real negativa em 2010-2015 (-0,3%),
Entretanto, os resultados setoriais variaram bastante de um grupo de países para outro. O período 2010-2015 apresentou expansão bem mais significativa nas outras economias em desenvolvimento e nos países menos desenvolvidos, comparativamente às economias industrializadas e às economias industriais emergentes.
No grupo das economias indusrializadas, 7 de 22 setores registraram queda anual média de VTI em 2010-2015, principalmente produtos do tabaco (-3,6%) e vestuário (-3,4%). Em oposição, destacaram-se as elevações no VTI médio anual dos seguintes setores: veículos automotores, carrocerias e semi-carrocerias (+3,7%) e outros veículos de transporte (+2,3).
Já no grupo das economias industriais emergentes, que inclui o Brasil, destacaram-se positivamente: equipamentos elétricos (+3,6%), alimentos (+3,2%), produtos químicos (+3%) e farmacêuticos (+3%). As variações negativas, por sua vez, ficaram a cargo de: computadores, eletrônicos e produtos óticos (-1,4%) e máquinas e equipamentos (-0,3%).
Sendo assim, a composição do VTI desses grupos de países se modificou. Nas economias industrializadas, os três setores com maior peso se tornaram ainda mais relevantes para o valor adicionado total: o ramo de máquinas e equipamentos passou de 9,7% do VTI do grupo das economias industrializadas, em 2005 para 9,8%, em 2015; veículos automotores, carroceiras e semi-carrocerias evoluiu de 8,5% para 9,1% e computadores, eletrônicos e produtos óticos de 7,5% para 9,8%. Ou seja, os países avançados apontaram uma especialização ainda maior em setores de média alta e alta intensidade tecnológica, muito embora continue havendo uma primazia do setor de alimentos, com 10,5% do VTI total.
Já nas economias em desenvolvimento e emergentes, o setor alimentos registrou uma leve redução do seu peso no VTI total do grupo: de 13,4% em 2005 para 12,5% em 2015. Apesar disso, ainda ocupava a primeira posição dentre os setores industriais. O setor de metais básicos veio em segundo lugar com um ganho de participação entre 2005 (9,8%) e 2015 (10,7%). A participação de produtos químicos no VTI total do grupo desses países também evoluiu positivamente, de 8,1% para 8,8%, ocorrendo o mesmo com veículos auto-motores, de 6,4% para 6,8% entre 2005 e 2015. Pelo efeito preço, o setor de coque, petróleo refinado e combustível nuclear, que em 2005 respondia por 7,2% do VTI desse grupo de países, passou a ter uma participação de apenas 4,9% em 2015.
Tomando-se a participação dos grupos de países no valor adicionado de cada divisão industrial, em 2005, as economias industrializadas representavam em geral mais de dois terços da produção total de cada indústria, o que passou a ser de 50% em 2015. Todavia, há exceções notáveis. Em tabaco, têxteis, vestuário, couro – isto é, em industrias trabalho-intensivas –, as economias industrializadas respondem por cerca de 30% do total mundial em 2015, ficando para as economias industriais emergentes mais da metade da produção total dessas industrias. Por outro lado, as economias industrializadas ainda mantêm mais de 70% do VTI em máquinas e equipamentos e outros equipamentos de transporte, e impressão e publicação.
Como dito anteriormente, o ganho de participação na produção mundial dos países industriais emergentes se deveu, em boa medida, à ascensão chinesa. De 2010 para 2015, a China foi líder em 10 dos 22 setores industriais acompanhados pela UNIDO, enquanto os EUA foram líderes nos outros 12. No ranking dos maiores produtores industriais, nota-se ascensão de Indonésia, Vietnã, Malásia, Filipinas e Tailândia em alguns setores, em prejuízo de países europeus. Tomando-se apenas os países emergentes industriais exceto a China, em 2015, o Brasil foi líder apenas nos setores de papel e petróleo refinado, perdendo o 1º lugar no ranking de 2010 em outras 9 industrias: alimentos, couro, madeira, impressão e publicação, borracha e plástico, produtos fabricados de metal, maquinas e equipamentos, veículos automotores, móveis e outras manufaturas.
O desempenho da indústria de transformação do Brasil comparativamente ao mundo
O Brasil é considerado uma economia industrial emergente, de renda média-alta, que, em 2016, ocupava a 36ª posição no índice de Performance da Competitividade Industrial (CPI, que analisa 148 países). O valor adicionado da indústria de transformação, em 2016, representava 10% do PIB brasileiro.
Entre 2005 e 2010, o valor adicionado de transformação industrial cresceu em média 4,7% por ano, em dólares de 2010 – ritmo mais veloz do que o das economias de renda média-alta exceto China (4%) e do mundo (2,3%). Contudo, entre 2010 e 2016, o VTI brasileiro aumentou somente 0,8% ao ano, vis-à-vis uma expansão de 2% nas economias renda média-alta e de 2,4% no mundo. Desse modo, o Brasil, que em 2005 possuía uma fatia de 24% no valor adicionado da indústria de transformação dos países de renda média-alta, passou a ter apenas 17%, em 2016.
Em termos constantes, o valor da indústria de transformação per capita no Brasil se reduziu de US$ 1.415 para US$ 1.081, de 2005 para 2016. Neste último ano, o indicador de VTI per capita do país tornou-se inferior ao do mundo e ao das economias de renda média-alta exceto China. O PIB, por sua vez, cresceu menos no Brasil do que no mundo e do que nas economias de renda média tanto no período 2005-2010 como 2010-2016. Neste último período, a variação média anual em dólares constantes do PIB brasileiro foi negativa em 3,4%, enquanto o mundo cresceu 2,3%.
Os setores com maior participação na indústria de transformação brasileira, em 2015, foram alimentos e bebidas (21%), produtos químicos (12%), coque, petróleo refinado e combustível nuclear (10%), veículos automotores, carrocerias e semi-carroceiras (8%) e maquinas e equipamentos (7%). Os dois primeiros aumentaram a participação em relação a 2005, enquanto o terceiro diminuiu. No caso de coque e petróleo refinado, assim como metais básicos, a redução nos preços explica a retração significativa de sua participação no valor adicionado total da indústria de transformação.
A produção da indústria de transformação brasileira alcançou seus níveis mais elevados em 2010 e 2012, considerado o período analisado pela UNIDO de 2003 a 2014. Outros equipamentos de transporte foi o setor que mais expandiu sua produção, seguido de coque, petróleo refinado e combustível nuclear e farmacêuticos – sendo que estes três conseguiram continuar crescendo até 2014. Por outro lado, a maior parte dos setores industriais detinha um nível de produção em 2014 inferior ao de 2010, notadamente têxteis, veículos automotores, carrocerias e semi-carrocerias, vestuário e couro.
Em 2015, o Brasil encontrava-se entre os 15 maiores produtores de todos os ramos da indústria de transformação acompanhados pela UNIDO, exceto equipamentos de escritório, computadores e contabilidade e farmacêuticos. As indústrias em que o Brasil alcançou posições mais notáveis neste ano foram: couro, produtos do couro e calçados (4ª posição), coque, refino do petróleo e combustíveis nuclear (4ª posição), alimentos (5ª posição), bebidas (6ª posição) e papel e produtos do papel (6ª posição). Contudo em todos esses setores industriais suas posições eram iguais ou melhores em 2010.
De outro modo, as indústrias em que o Brasil angariou colocações entre 2010 e 2015 foram produtos de madeira, impressão e publicação e outros equipamentos de transporte. Por sua vez, as perdas relativas de participação em relação aos outros países de 2010 a 2015 foram mais expressivas em têxteis (de 8º para 13º colocado), vestuário (4º para 8º), farmacêuticos (14º para fora do ranking do top 15), máquinas e equipamentos (7º para 10º), equipamentos elétricos (8º para 11º), veículos automotores (5º para 8º) e móveis (6º para 9º).