Carta IEDI
Perspectivas para a economia global
O FMI no seu Panorama da Economia Mundial (World Economic Outlook - WEO) de outubro prevê um crescimento de 3,6% da economia mundial em 2017 frente ao percentual de 3,2% em 2016. Esse cenário é mais otimista que o apresentado nas edições anteriores do WEO (abril e julho do ano corrente) e apontam para a maior aceleração da atividade econômica global desde a retomada após a crise financeira sistêmica e a grande recessão (2008-09). Além disso, será o melhor desempenho desde 2012 (+3,5%) e a trajetória ascendente persistirá em 2018, quando o crescimento previsto é de 3,7% (o mais elevado desde 2011). Se confirmado, esse cenário favorecerá as exportações líquidas da economia brasileira, uma das alavancas da recuperação em curso, mas ainda incipiente.
A título de comparação, no relatório do Banco Mundial, Perspectivas para a economia global (Global Economic Prospects), divulgado em junho, a projeção era de um crescimento de 2,7%, ou seja, uma desaceleração de 0,5 p.p. frente ao ano anterior. Essas perspectivas divergentes decorrem não somente das diferentes hipóteses e modelos utilizados pelas duas instituições multilaterais, mas também (e principalmente) da incorporação nas projeções do FMI de novas informações sobre a atividade econômica global divulgadas após o fechamento do cenário do Banco Mundial. Como detalhado nesta carta, a partir do segundo trimestre de 2017 tornaram-se disponíveis vários indicadores coincidentes e antecedentes indicando que a recuperação cíclica da economia global, que se iniciou no segundo semestre de 2016, se intensificou no primeiro semestre de 2017.
A melhora desse cenário para 2017 decorreu do aumento da projeção de crescimento tanto para as economias avançadas como para as emergentes e em desenvolvimento. No primeiro caso, o percentual passou de 2,0% em abril e julho para 2,2% em outubro. Este ritmo, todavia, recuará para 2,0% em 2018. No caso das economias emergentes e em desenvolvimento, o FMI também revisou para cima sua projeção, mas na passagem de abril para julho, de 4,5% para 4,6%, percentual que foi mantido no cenário de outubro. Para 2018, em contrapartida, a projeção aumentou 0,1 p.p, para 4,9% nesta última atualização do cenário. Interessante notar que enquanto a saída da grande recessão, denominada de “recuperação em velocidade dupla” (double-speed recovery), foi liderada pelas economias emergentes e em desenvolvimento, a retomada em curso está sendo puxada pelas suas congêneres avançadas (+0,5 p.p em 2017 frente a 2016 contra +0,3 p.p. no outro grupo), mas em 2018 as emergentes e em desenvolvimento assumem novamente a liderança nesse quesito.
No âmbito dos países avançados, os destaques são a aceleração do crescimento entre 2016 e 2017 nos Estados Unidos (de 1,5% para 2,2%), no Japão (de 1% para 1,5%) e na área do euro (de 1,8% para 2,1%). Neste último caso, o desempenho será superado somente pelo registrado nos Estados Unidos, ao contrário do padrão dos anos anteriores, quando o Reino Unido ou o Japão se alternaram na segunda posição. Assim, essa mudança na composição do crescimento no âmbito das economias avançadas, que resultou numa menor assimetria, está associada, sobretudo, ao maior dinamismo da atividade econômica na região da moeda única puxado pelo aumento das exportações num contexto de aceleração do comércio global e à expansão mais robusta da demanda doméstica favorecida pelas condições financeiras acomodatícias e pela redução dos riscos políticos.
Apesar da maior aceleração das economias avançadas, os países emergentes e em desenvolvimento continuarão sendo os principais responsáveis pelo crescimento global. Além disso, a assimetria de desempenho entre as principais regiões desse grupo também será menor devido à recuperação das duas regiões mais afetadas pela deflação dos preços das commodities no triênio anterior, quais sejam: a Comunidade dos Estados Independentes (CEI), cujo ritmo estimado de expansão é de 2,1% em 2017 e 2018 contra 0,4% em 2016, impulsionado pela economia russa; a América Latina e Caribe que, após a recessão no biênio 2015-2016, deve crescer 1,2% em 2017 e 1,9% em 2018, favorecida, igualmente, pela recuperação dos preços das commodities. Contudo, esses percentuais continuam bem inferiores aos registrados entre 2010 e 2013 e são insuficientes para tirar a região da posição de “lanterninha” no grupo dos países emergentes e em desenvolvimento – para a qual o desempenho da economia brasileira (recessão em 2015-2016 e baixo crescimento previsto para esse ano, de 0,7%) contribuiu decisivamente. Já as líderes em termos de ritmo de expansão continuarão sendo as regiões emergentes e em desenvolvimento da Ásia e da Europa, com percentuais de, respectivamente, 6,5% e 4,5% em 2017.
O balanço de riscos no curto prazo para o crescimento da economia global também está mais equilibrado do que nos dois cenários precedentes (quando o viés era negativo). Do lado favorável, a recuperação cíclica pode se revelar mais duradoura do que o esperado sem provocar pressões inflacionárias nas economias emergentes e em desenvolvimento, mas afastando o risco de deflação nas economias avançadas. Embora a projeção de aumento da inflação oficial tenha diminuído em relação ao cenário de abril, como reflexo da alta mais tímida dos preços do petróleo, a estimativa é de aceleração de 0,8% em 2016 para 1,7% em 2017 e 2018 no primeiro grupo de economias e de estabilidade no patamar de 4,2-4,4% no segundo grupo. Do lado desfavorável, a incerteza política aumentou em função de um conjunto de fatores, dentre os quais se destacam a maior imprevisibilidade das políticas fiscais e regulatórias nos Estados Unidos e a adoção potencial de políticas protecionistas que ameacem a integração econômica global. A maior probabilidade atribuída a essas políticas pode induzir uma correção nos preços dos ativos e aumento de sua volatilidade, que se encontra num patamar muito baixo. Esses eventos adversos nos mercados financeiros podem, por sua vez, abalar a confiança dos consumidores e empresários, especialmente em países com vulnerabilidade financeira.
Finalmente, vale mencionar que o FMI não considera um risco adicional associado à possível mudança na direção do Federal Reserve (Fed) em fevereiro (quando termina o mandato de Janet Yellen). A escolha será feita até novembro pelo presidente Trump a partir de uma lista de cinco candidatos, que inclui a presidente atual, mas também economistas críticos da gestão atual em função da lentidão do movimento de normalização da política monetária. Ou seja, a eleição desses candidatos pode resultar na aceleração desse movimento, com consequências adversas para os mercados financeiros e a atividade econômica global.
Introdução
O Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou recentemente, no Panorama da Economia Mundial (World Economic Outlook - WEO) de outubro, seu cenário atual para o desempenho econômico global. As projeções são ainda mais otimistas que as apresentadas em abril e julho de 2017 e apontam para uma melhora desse desempenho, em contraste com o tom pessimista das edições de 2016. A perspectiva agora é de ganho de impulso, com um balanço de riscos mais equilibrado no curto prazo (ao contrário do viés negativo dos cenários anteriores). Se confirmado, esse cenário favorecerá as exportações líquidas da economia brasileira, uma das alavancas da recuperação cíclica em curso, mas ainda incipiente.
Essa Carta IEDI apresenta o cenário atual do FMI e, a título de comparação, as projeções para a economia global do Banco Mundial, divulgadas em junho no seu relatório Perspectivas para a economia global (Global Economic Prospects). A primeira seção apresenta os dois cenários e detalha as projeções atuais do FMI para essa atividade e para o comércio mundial (volume e os preços das commodities). Como em todos cenários ancorados em séries temporais, essas projeções refletem o impacto, no comportamento dessas séries, da inclusão de informações sobre o desempenho das economias avançadas e emergentes e em desenvolvimento após o fechamento das edições anteriores do WEO (abril e julho). A segunda seção dessa carta sintetiza essas informações.
Cenários para a economia global
A nova projeção do FMI prevê uma expansão de 3,6% da economia mundial em 2017, cifra 0,1 ponto percentual (p.p.) superior às divulgadas no WEO de abril e na atualização do cenário em julho. Com isso, de acordo com o atual cenário básico do fundo, a atividade econômica global ganhará impulso frente a 2016, quando o crescimento foi de 3,2%. Já o Banco Mundial estima um crescimento de 2,7%, ou seja, uma desaceleração de 0,5 p.p. frente ao ano anterior.
Essas perspectivas divergentes decorrem não somente das diferentes hipóteses e modelos utilizados pelas duas instituições, mas também (e principalmente) da incorporação nas projeções do FMI de novas informações sobre a atividade econômica global divulgadas após o fechamento do cenário do Banco Mundial. Como detalhado na próxima seção, a partir a partir do segundo trimestre de 2017 tornaram-se disponíveis vários indicadores coincidentes e antecedentes indicando que a recuperação cíclica da economia global, que se iniciou no segundo semestre de 2016, se intensificou no primeiro semestre de 2017.
Se o cenário mais otimista do FMI se confirmar, a economia global registrará em 2017 a maior aceleração do crescimento (+0,4 pontos percentuais – p.p.) desde a retomada após a grande recessão, ancorada nas políticas contracíclicas adotadas pelas economias avançadas e emergentes e em desenvolvimento. Além disso, será o melhor desempenho desde 2012 (+3,5%) e a trajetória ascendente persistirá em 2018, quando o crescimento previsto é de 3,7% (o mais elevado desde 2011). Contudo, o ritmo de expansão continuará num patamar inferior ao registrado no boom que precedeu a crise financeira global e a grande recessão (2003 a 2007), bem como no biênio imediatamente posterior (2010-2011).
A melhora desse cenário para 2017 decorreu do aumento da projeção de crescimento tanto para as economias avançadas como para as emergentes e em desenvolvimento. No primeiro caso, o percentual passou de 2,0% em abril e julho para 2,2% em outubro. Este ritmo, todavia, recuará para 2,0% em 2018. As projeções do Banco Mundial apontam para o mesmo movimento, mas em menor intensidade: 1,9% em 2017 e 1,8% em 2018. No caso das economias emergentes e em desenvolvimento, o FMI também revisou para cima sua projeção, mas na passagem de abril para julho, de 4,5% para 4,6%, percentual que foi mantido no cenário de outubro. Para 2018, em contrapartida, a projeção aumentou 0,1 p.p, para 4,9%, na atualização do cenário em outubro. Neste caso, o Banco Mundial aponta para um movimento oposto, de desaceleração, na passagem de 2016 para 2017 (4,3% para 4,1%), mas converge com o FMI na direção da tendência, indicando aceleração para 2018, mas em menor intensidade (+4,5%, 0,4 p.p inferior que o estimado pelo Fundo). Interessante notar que enquanto a saída da grande recessão, denominada de “recuperação em velocidade dupla” (double-speed recovery), foi liderada pelas economias emergentes e em desenvolvimento, a retomada em curso está sendo puxada pelas suas congêneres avançadas (+0,5 p.p em 2017 frente a 2016 contra 0,3 p.p. no outro grupo), mas em 2018 as emergentes e em desenvolvimento assumem novamente a liderança nesse quesito.
A aceleração das economias avançadas reflete, sobretudo, o crescimento de 2,2% estimado para os Estados Unidos, que significará um avanço de 0,7 p.p frente ao ano anterior (+1,5%). No cenário de julho, o FMI tinha reduzido essa projeção de crescimento para 2,1% contra 2,3% em abril diante da frustração em relação aos efeitos dinamizadores esperados do estímulo fiscal (expectativa de corte nos impostos) anunciado pelo presidente Donald Trump, eleito em novembro de 2016. Diante da elevada incerteza política, a hipótese subjacente ao cenário básico atual é de que não haverá mudanças na política fiscal. Todavia, em outubro essa cifra foi ligeiramente elevada para 2,2% em resposta aos indicadores coincidentes e antecedentes favoráveis (como os índices de confiança dos consumidores e empresários) divulgados após o fechamento do cenário de julho (ver próxima seção). Para 2018, os ajustes nos cenários de julho e outubro foram na mesma direção: 2,5% em abril para 2,1% em julho e 2,3% em outubro. Ou seja, a projeção é de uma suave aceleração (+ 0,1 p.p) da maior economia do mundo no próximo ano, movimento oposto aos previstos para as demais economias avançadas (com exceção da França). Em contrapartida, considerando um horizonte mais longo, a expectativa é de moderação desse ritmo de expansão. O crescimento potencial estimado da economia estadunidense é de 1,8%, ancorado nas hipóteses de lento crescimento da produtividade total dos fatores e redução do crescimento da força de trabalho devido ao envelhecimento da população.
As perspectivas para as outras importantes economias ou regiões avançadas em 2017 também melhoraram, com exceção do Reino Unido. No caso do Japão, as duas sucessivas revisões para cima da projeção de crescimento (em julho e outubro) conduziram a taxa esperada para o patamar de 1,5%. Com isso, a economia nipônica registrará um ganho de impulso da mesma intensidade que a estadunidense (+0,5 p.p) e atingirá a maior taxa de crescimento desde 2013, impulsionada pelas exportações num contexto de fortalecimento da demanda global e de estímulos fiscais. Todavia, o Japão seguirá na posição de “lanterninha” nesse grupo, a qual ocupa desde 2014. Além disso, em 2018 seu diferencial negativo de crescimento frente às suas congêneres se ampliará no cenário atual do FMI, que projeta uma desaceleração para 0,7%, bem mais intensa que a estimada para a área do euro e o Reino Unido. As hipóteses subjacentes são o fim desses estímulos, a moderação do consumo privado e a neutralização dos efeitos positivos do aumento dos investimentos para as olimpíadas de 2020 devido ao seu impacto expansionista sobre as importações e à desaceleração projetada da demanda externa. No médio prazo, o encolhimento da força de trabalho comprometerá o crescimento, embora em termos per capita o desempenho deve se manter próximo às médias recentes.
Para a área do euro, as projeções tiveram um avanço de 0,2 p.p nas duas últimas atualizações, conduzindo a taxa de crescimento para 2,1% (contra 1,7% em abril), o maior ritmo desde 2010. De acordo com o FMI, a retomada a partir de 2014 (após o biênio recessivo de 2012-13 provocado pela crise do euro) aumentou de velocidade esse ano, mas perderá ritmo em 2018, para quando é prevista uma expansão de 1,9%. Mesmo assim, seu desempenho em 2017 e 2018 será superado somente pelo registrado nos Estados Unidos, ao contrário do padrão dos anos anteriores, quando o Reino Unido ou o Japão se alternaram na segunda posição. Essa mudança na composição do crescimento no âmbito das economias avançadas está associada ao aumento das exportações na região da moeda única num contexto de aceleração do comércio global, bem como à expansão mais robusta da demanda doméstica favorecida pelas condições financeiras acomodatícias e pela redução dos riscos políticos.
Essas fontes de dinamismo beneficiaram as quatro principais economias da região (Alemanha, França, Itália e Espanha), que ganharão dinamismo frente a 2016. Além disso, houve uma revisão para cima na comparação com o cenário de julho nos três primeiros casos. No caso da Espanha, se o cenário atual se confirmar, o crescimento estimado será de 3,1%, o mais elevado nesse grupo, mas também apresentará a maior desaceleração, para 2,5% em 2018. Em segundo lugar, está a Alemanha, com 2% de crescimento, mas perda de ritmo para 1,8% em 2018. Em terceiro lugar, a França, com percentuais de, respectivamente, 1,6% e 1,8%; e, em quarto lugar, a Itália (1,5% e 1,1%). Outros dados positivos, que indicam uma menor assimetria entre essas economias, são: a maior aceleração em 2017 frente a 2016 nos dois últimos casos (0,4 p.p na França e 0,6 p.p na Itália), que registraram as menores taxas de crescimento no ano passado; em 2018, ao contrário dos demais países, projeta-se uma aceleração da economia francesa para 1,8%, cifra equivalente à estimada para a Alemanha. O cenário de médio prazo para a área do euro, contudo, não é otimista. O crescimento potencial previsto pelo FMI será afetado negativamente pelo baixo crescimento da produtividade, demografia desfavorável e, em alguns países, excessivo de endividamento público e privado.
Em contrapartida, para o Reino Unido a previsão é de desaceleração por dois anos consecutivos: de 1,8% em 2016 para 1,7% em 2017 e 1,5% em 2018. O percentual estimado para 2017 sofreu revisão para baixo em 0,3 p.p no cenário de julho diante do desempenho pior que o esperado nos dois primeiros trimestres. Esse resultado decorreu da perda de ritmo do consumo privado associada ao efeito adverso da depreciação cambial sobre a renda real das famílias. Essa depreciação, por sua vez, foi provocada pelo “Brexit” (a decisão de saída da União Europeia - UE, que recebeu a maioria dos votos no referendo realizado em 23 de junho de 2016), que também traz incertezas para as perspectivas de médio prazo. Como destaca o fundo, estas dependerão do novo formato das relações econômicas com a UE após a entrada em vigor do “Brexit” e da intensidade das barreiras que serão erigidas sobre o comércio, os fluxos migratórios e as atividades financeiras.
Se, por um lado, as economias avançadas serão as principais responsáveis pela aceleração do crescimento, por outro lado, as emergentes e em desenvolvimento continuarão dando a maior contribuição para crescimento global, também com uma redução na assimetria entre as principais regiões. Essa redução decorrerá, por sua vez, da melhora de desempenho das duas regiões mais afetadas pela deflação dos preços das commodities no triênio anterior, quais sejam, Comunidade dos Estados Independentes (CEI) e América Latina e Caribe.
Na primeira região, a projeção é de aceleração do crescimento (de 0,4% em 2016 para 2,1% em 2017 e 2018), impulsionada pela economia russa. Após dois anos de recessão, o FMI projeta uma expansão de 1,8% dessa economia (+0,4% frente à estimativa de abril e julho) favorecida pelo aumento do preço do petróleo, pelo relaxamento das condições financeiras e pela melhora na confiança. O maior ritmo de expansão do volume do comércio global (2,4% em 2016 para 4,2% em 2017) também contribuiu positivamente tanto nessa região como na América Latina e Caribe. Neste caso, após a recessão no biênio 2015-2016, o crescimento projetado é de 1,2% em 2017 e 1,9% em 2018, favorecido, igualmente, pela recuperação dos preços das commodities (energéticas, metálicas e agrícolas). Contudo, esses percentuais continuam bem inferiores aos registrados entre 2010 e 2013 e são insuficientes para tirar a região da posição de “lanterninha” no grupo dos países emergentes e em desenvolvimento.
O desempenho das duas principais economias latino-americanas explica esses resultados. No caso do México, o crescimento projetado para 2017 é de 2,1%, 0,4 p.p superior ao estimado em abril, diante do desempenho mais favorável do que o esperado no início do ano. Contudo, mesmo com essa revisão para cima, a economia mexicana sofrerá desaceleração frente aos 2,3% registrados em 2016, tendência que persistirá em 2018 se a previsão de 1,9% de crescimento se confirmar. Essa perda de dinamismo está associada, sobretudo, às incertezas em relação às atuais negociações do NAFTA deslanchadas no governo Trump. As perspectivas para a economia brasileira também melhoraram desde abril, passando de um crescimento previsto de 0,2% para 0,7% em outubro, ou seja, uma taxa muito baixa e insuficiente para elevar o dinamismo da região como um todo. Os principais fatores subjacentes a essa revisão foram o ótimo desempenho da safra agrícola e os efeitos dinamizadores sobre o consumo das famílias dos saques das contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) autorizados pelo governo em maio. Contudo, a projeção para 2018 foi rebaixada de 1,7% em abril para 1,5% em função do desempenho medíocre do investimento e das incertezas políticas.
Se a CEI e a América Latina e Caribe devem registrar o maior diferencial de crescimento frente a 2016, a Ásia emergente e em desenvolvimento, seguida pela Europa emergente e em desenvolvimento, continuarão sendo os destaques em termos de ritmo de expansão. Na Ásia, a aceleração será bem suave (de 6,4% em 2016 para 6,5% em 2017 e 2018, percentuais 0,1 p.p superiores aos estimados em abril) e disseminada pela região, mas se ancora, sobretudo, no desempenho das duas principais economias, China e índia.
No caso da China, o melhor desempenho no primeiro semestre de 2016 associado às políticas expansionistas resultou na revisão para cima da projeção para 2017 em julho e outubro (totalizando 0,2 p.p), que passou para 6,8% (contra 6,7% em 2016). O crescimento previsto para 2018 também aumentou para 6,5% no cenário atual (contra 6,2% em abril) diante da expectativa de manutenção dessas políticas (especialmente mediante investimentos públicos) para o alcance da meta oficial de dobrar o PIB real entre 2010 e 2020. As taxas de crescimento da principal economia da região e segunda maior do mundo no médio prazo (2019-2022) também foram elevadas em 0,2 p.p, em média, refletindo a hipótese de retirada lenta e com atraso dos estímulos. O custo dessa estratégia será o aumento adicional do endividamento, aumentando os riscos de um evento adverso nesse maior lag temporal. Já o desempenho da economia indiana em 2017, a segunda maior da região, foi revisto para baixo, de 7,2% em abril para 6,8% em outubro em função do impacto negativo da reforma monetária de novembro de 2016 (ver Carta IEDI n. 786), bem como dos custos de transição associados à adoção de um imposto nacional sobre bens e serviços em julho. Essa medida faz parte de um conjunto de reforma estruturais em curso que, segundo o FMI, devem conduzir a taxa de crescimento para o patamar de 8% no médio prazo.
Na Europa emergente e em desenvolvimento, a revisão para cima entre abril e outubro foi bem mais expressiva (+1,5 p.p), conduzindo a projeção de crescimento para 4,5% em 2017. A região como um todo tem sido beneficiada pela recuperação da área do euro devido à forte integração produtiva entre as duas regiões (via comércio e fluxos de investimento direto externo), mas essa revisão foi induzida, sobretudo, pelo ajuste do cenário para duas importantes economias emergentes da Europa. A maior revisão ocorreu no crescimento estimado para a Turquia (de 2,5% em abril para 5,1% em outubro) diante da expansão muito mais intensa do que a esperada no primeiro semestre ancorada no aumento das exportações líquidas e numa política fiscal mais expansionista. O desempenho da Polônia também aumentou para 3,8% em 2017, como reflexo da surpresa positiva com o crescimento no primeiro semestre e a expectativa de aumento dos projetos financiados pela UE.
O balanço de riscos no curto prazo no cenário básico do FMI para o crescimento da economia global, sintetizado acima, está mais equilibrado do que nas duas edições anteriores do WEO (nas quais o viés era negativo). Isto porque, o desempenho da atividade econômica nos dois grupos de economias revelou-se muito melhor do que o previsto na edição de primavera do WEO. Antes de detalhar esse desempenho, é importante apresentar esses riscos. Do lado favorável, a recuperação cíclica pode se revelar mais duradoura do que o esperado sem provocar pressões inflacionárias nas economias emergentes e em desenvolvimento, mas afastando o risco de deflação nas economias avançadas. Embora a projeção de aumento da inflação oficial tenha diminuído em relação ao cenário de abril, como reflexo da alta mais tímida dos preços do petróleo (ver próxima seção), a estimativa é de aceleração de 0,8% em 2016 para 1,7% em 2017 e 2018 no primeiro grupo de economias e de estabilidade no patamar de 4,2-4,4% no segundo grupo. Do lado desfavorável, a incerteza política aumentou em função de um conjunto de fatores, dentre os quais: a maior imprevisibilidade das políticas fiscais e regulatórias nos Estados Unidos; a adoção potencial de políticas protecionistas que ameacem a integração econômica global; a negociação da relação entre o Reino Unido e a União Europeia no pós-Brexit; e riscos geopolíticos. A maior probabilidade atribuída a essas políticas pode induzir uma correção nos preços dos ativos e o aumento da sua volatilidade, que se encontra num patamar muito baixo. Esses eventos adversos nos mercados financeiros podem, por sua vez, abalar a confiança dos consumidores e empresários, especialmente em países com vulnerabilidade financeira. Além disso, o furacão Harvey cria incertezas para a economia estadunidense no médio prazo já que o efeito-líquido sobre o PIB dependerá da velocidade de recuperação das regiões afetadas e, assim, da dimensão e rapidez do esforço de reconstrução.
Finalmente, vale mencionar que o FMI não considera um risco adicional associado à possível mudança na direção do Federal Reserve (Fed) em fevereiro (quando termina o mandato de Janet Yellen). A escolha será feita até novembro pelo presidente Trump a partir de uma lista de cinco candidatos, que inclui a presidente atual, mas também economistas críticos da gestão atual em função da lentidão do movimento de normalização da política monetária (alta de taxa de juros básica e redução do balanço do Fed mediante venda dos títulos privados adquiridos durante a política de afrouxamento quantitativo). Ou seja, a eleição desses candidatos pode resultar na aceleração desse movimento, com consequências adversas para os mercados financeiros e a atividade econômica global.
O desempenho recente da atividade econômica global
A recuperação da atividade econômica global, que se iniciou em 2016, ganhou impulso no primeiro semestre de 2017, puxada pelo crescimento da demanda doméstica nas economias avançadas e na China, bem como pela melhora no desempenho em outras importantes economias emergentes e em desenvolvimento. O dinamismo do investimento estimulou a atividade manufatureira e o comércio global (cujo crescimento, contudo, desacelerou no segundo trimestre após a forte expansão no trimestre anterior). O índice de gerentes de compra e outros indicadores antecedentes divulgados em julho e agosto indicam que a trajetória ascendente teve continuidade no terceiro trimestre.
Nas economias avançadas, o crescimento da demanda doméstica e do Produto Interno Bruto (PIB) foi mais intenso no primeiro semestre de 2017 na comparação com o segundo semestre de 2016. Nos Estados Unidos, a fraqueza do consumo no primeiro trimestre revelou-se temporária e o investimento empresarial continuou se fortalecendo, como reflexo, em parte, da recuperação do setor de energia. Na área do euro e no Japão, os três componentes privados da demanda agregada (consumo, investimento e exportações líquidas) impulsionaram o crescimento no primeiro semestre do ano. O crescimento nas demais economias desse grupo, com exceção do Reino Unido, também se acelerou nesse período na mesma base de comparação, impulsionado pelas demandas doméstica e externa.
Nas economias emergentes e em desenvolvimento, a demanda doméstica robusta na China e a recuperação cíclica em outras economias de maior peso impulsionaram o crescimento no período em tela. A exceção foi a Índia em função dos efeitos da reforma monetária e fiscal, mencionadas na seção precedente. No Brasil, o dinamismo das exportações e a redução do ritmo de contração da demanda doméstica conduziu a economia para um patamar positivo de crescimento após oito trimestres de contração. O México manteve sua trajetória de expansão a despeito das incertezas em relação ao futuro do NAFTA e ao viés contracionista da política monetária nos dois últimos anos. Na Rússia e Turquia, o crescimento ancorou-se nas demandas doméstica e externa. Em contrapartida, em regiões do oriente médio conflitos interfronteiras continuaram prejudicando a atividade econômica e a Venezuela enfrenta uma crise política e humanitária e uma intensa recessão.
O maior ritmo de expansão das economias avançadas e emergentes e em desenvolvimento exerceu pressão altista sobre os preços das commodities primárias, o que, por sua vez, favoreceu o desempenho exportador dos países exportadores desses bens. Contudo, embora as cotações estejam bem acima do patamar registrado em 2016, a trajetória ascendente foi revertida entre fevereiro e agosto (datas de fechamento dos cenários de abril e outubro) nos mercados de commodities energéticas e agrícolas, enquanto os preços metais registraram alta moderada.
No primeiro caso, a cotação do petróleo recuou apesar dos anúncios dos países produtores de extensão do corte de produção até o primeiro trimestre de 2018. Exerceram pressões baixistas sobre os preços a produção maior do que a esperada de gás de xisto nos Estados Unidos e a recuperação mais intensa da produção na Líbia e Nigéria. As cotações do gás natural também cederam devido, sobretudo, a fatores sazonais e à oferta robusta nos Estados Unidos e Rússia. Em contrapartida, as cotações do carvão aumentaram devido à combinação de uma forte demanda com corte da oferta na China (decorrente da imposição de barreiras à importação para conter o impacto negativo dos preços baixos vigentes até junho) e na Austrália (associada a greves nas minas de carvão). O índice de produtos agrícolas, após ter aumentado no primeiro semestre, também recuou a partir de agosto diante da revisão para cima das safras de grãos na virada do ano. No mercado de metais, a alta dos preços do cobre e do alumínio induzida pela demanda chinesa mais do que compensou a queda na cotação do minério de ferro num contexto de aumento da produção na Austrália, Brasil e China
A dissipação do efeito da alta do preço do petróleo em 2016 e descompressão desses preços em 2017 tiveram como contrapartida o recuo da inflação ao consumidor a partir de maio. Com isso, as expectativas para essa inflação em 2017 recuaram para os dois grupos de países, mas em maior intensidade nos emergentes e em desenvolvimento. No que diz respeito ao núcleo da inflação, nas economias avançadas ele se manteve relativamente estável, num patamar inferior à meta de 2% (implícita ou explícita) dos respectivos bancos centrais, a despeito da retomada da demanda doméstica. Além disso, a inércia desse núcleo tem coincidido com uma lenta transmissão das menores taxas de desemprego para os salários reais. Estes têm se movido em sintonia com a produtividade do trabalho, o que transparece na estabilidade da participação dos salários na renda. O FMI também destaca que o aumento dos salários tem sido especialmente moderado nos países com maior desemprego e maior parcela de trabalhadores com jornada de trabalho reduzida.
Nas economias emergentes e em desenvolvimento, o núcleo da inflação também cedeu sob influência, em especial, de eventos favoráveis na Índia e no Brasil, respectivamente, uma forte queda dos preços dos alimentos em junho e o excesso de capacidade após dois anos de recessão. Todavia, dois fatores adicionais também contribuição para essa trajetória benigna, quais sejam, a redução do pass-through das depreciações cambiais dos anos anteriores e as apreciações de algumas moedas emergentes associadas ao clima de otimismo nos mercados financeiros globais.
Esse clima, se iniciou no segundo semestre de 2016, teve continuidade ao longo de 2017, resultando, igualmente, em queda dos prêmios de risco, redução da volatilidade e alta dos preços dos ativos. Nos mercados acionários, as cotações seguiram em alta num contexto de lucros ascendentes, melhora da confiança de consumidores e empresas e indicadores macroeconômicos positivos. As políticas monetárias nas economias avançadas atuaram favoravelmente, se mantendo estáveis (ou seja, expansionistas) na maioria dos países. As exceções foram o Canadá – que elevou sua taxa de juros básica em 0,25 p.p em julho e setembro – e os Estados Unidos. Neste último caso, a influência sobre as condições monetárias e financeiras globais é mais decisiva devido ao papel do dólar como divisa-chave. O Fed aumentou essa taxa em junho, de 1% para 1,25%. Todavia, a partir de setembro, os mercados passaram a prever uma política fiscal menos expansionista no atual governo e, assim, um movimento mais gradual de normalização da política monetária estadunidense do que o esperado no segundo trimestre de 2017. Com isso, os rendimentos dos títulos soberanos de longo prazo recuaram.
A redução do diferencial de juros em relação aos títulos de menor risco denominados na divisa-chave contribuiu, por sua vez, para a depreciação do dólar em 7% em termos efetivos entre março e agosto, que mais do que anulou os ganhos registrados após as eleições presidenciais (entre novembro de 2016 e março de 2017). No âmbito das moedas das demais economias avançadas, o iene e franco suíço também perderam valor pelo mesmo critério, enquanto o dólar canadense e o euro se apreciaram. No caso das economias emergentes, como já mencionado, algumas registraram apreciações cambiais, mas em pequena intensidade, exceto o peso mexicano (que se valorizou em torno de 10% entre março e agosto) devido à política monetária contracionista e o alívio das preocupações em relação a potenciais tensões comerciais com os Estados Unidos. Contudo, algumas importantes moedas desse grupo depreciaram no mesmo período em função de fatores domésticos, dentre as quais o real brasileiro (corte na taxa de juros básica e dúvidas em relação à implementação agenda de reformas), o rand sul-africano (incertezas políticas) e o rublo russo (queda do preço do petróleo).
Este ambiente de otimismo nos mercados financeiros globais impulsionou o apetite por riscos dos investidores e os fluxos de capitais para as economias emergentes. Estes mantiveram sua nova fase de boom iniciada no segundo semestre de 2016, após o forte declínio no ano anterior, que foi mais intenso do que o registrado durante a crise financeira global. De acordo com os cálculos do FMI, no bust de 2015, os ingressos líquidos de capitais de não-residentes atingiram o patamar mais baixo desde os anos 1990 (1,6% do PIB), e os fluxos líquidos de capitais (esses ingressos menos a saída líquida de capitais de residentes, excluindo o acúmulo de reservas cambiais) se tornaram negativos (em cerca de 1% do PIB). Tanto o forte declínio como a retomada recente estão associados a dois principais fatores.
O primeiro fator refere-se ao desempenho da conta financeira da China. Os ingressos líquidos de capitais de não-residentes recuaram expressivamente entre o terceiro trimestre de 2015 e o primeiro de 2016. Isto porque, receios quanto à possibilidade de uma forte depreciação do renminbi induziram as empresas residentes a quitar suas dívidas em dólar, ao mesmo tempo em que investidores estrangeiros procuraram reduzir sua exposição em ativos denominados na moeda chinesa, em especial depósitos bancários offshore em filiais dos bancos chineses. Esses fundos, por sua vez, foram repassados para filiais sediadas na China, que também tiveram que pagar esses empréstimos, reduzindo ainda mais a dívida externa. Neste contexto, como em outros episódios de turbulência cambial em economias emergentes, as expectativas se auto-realizaram: a saída de capitais resultou em pressões de depreciação cambial. Contudo, a existência de um imenso “colchão de segurança” em moeda estrangeira, muito superior ao passivo de curto prazo do país, permitiu ao banco central chinês conter essas pressões mediante vendas de divisas no mercado de câmbio. O retorno dos fluxos de capitais iniciou-se no final de 2015 com a redução do passivo externo chinês e foi reforçado a partir do segundo trimestre de 2016 pela entrada de recursos de não-residentes. A partir do início de 2017, a saída de capitais de residentes também desacelerou devido à maior rigidez na aplicação dos controles de capitais, à depreciação do dólar e ao maior dinamismo da atividade econômica. Com isso, no segundo trimestre de 2017, o banco central acumulou reservas cambiais pela primeira vez desde o mesmo trimestre de 2015.
O segundo fator subjacente aos bust e boom recentes dos fluxos de capitais para os países emergentes foi o comportamento dos investimentos de portfólio de não-residentes, que se tornaram ainda mais voláteis a partir do chamado “taper tantrum” de meados de 2013 - ou seja, a sinalização pelo Fed de que iniciaria a desmontagem da política de afrouxamento quantitativo mais cedo do que o esperado até então. A reação dos investidores globais foi súbita, resultando na redução das posições em ativos dos mercados emergentes. Entre meados de 2015 e o primeiro trimestre de 2016, outra onda de liquidação desses ativos foi acionada pelos receios de que a depreciação do renmimbi poderia se intensificar, revelando a influência crescente da China sobre os mercados financeiros globais. Após uma breve retomada em 2016, esses investimentos sofreram um novo abalo após a eleição de Donald Trump. Neste caso, o aumento dos rendimentos dos títulos soberanos dos Estados Unidos foi provocado pelas expectativas de maior estímulo fiscal e desregulação financeira, que impulsionariam o crescimento e, com isso, culminariam num aperto da política monetária. No início de 2017, contudo, diante das perspectivas favoráveis em relação ao desempenho da economia global e das condições monetárias e financeiras favoráveis no centro, essa modalidade de fluxo de capitais iniciou um movimento de recuperação ancorado nas compras de ações e de títulos de renda fixa de economias emergentes, que totalizaram cerca de US$ 205 bilhões no acumulado até agosto (mais que o dobro do total registrado no biênio 2015-2016), segundo as estimativas do FMI.
Bibliografia
IMF (2017a) World Economic Outlook, October. Washington D.C.: International Monetary Fund. Disponível em: http://www.imf.org.
______(2017b) World Economic Outlook Database, October. Washington D.C.: International Monetary Fund. Disponível em: http://www.imf.org.
World Bank (2017) Global Economic Prospects. Washington D.C.: World Bank Group. Disponível em : http://www.worldbank.org