IEDI na Imprensa - Para indústria e comércio, não é hora de subir juro
Valor Econômico
Apesar de reconhecerem pressões inflacionárias, atividade fraca preocupa entidades empresariais
Estevão Taiar
A desaceleração da atividade econômica faz com que entidades empresariais ligadas à indústria e ao comércio vejam com preocupação a alta da taxa Selic que provavelmente será realizada hoje pelo Banco Central (BC). Apesar de reconhecerem a existência de pressões inflacionárias, essas organizações consideram precipitado o início de um novo ciclo de aperto em meio à imposição de lockdowns pelo país.
“A demanda está muito fraca, não é o momento de subir os juros”, afirma Carlos Thadeu de Freitas, chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e ex-diretor da autoridade monetária. Na visão dele, elevar a Selic agora só é bom para o BC mostrar ao mercado [que está atuando]”.
Desde agosto de 2020, a Selic está em 2% ao ano. Pesquisa conduzida pelo Valor na semana passada ouviu 87 instituições financeiras e consultorias sobre a reunião de hoje do Comitê de Política Monetária (Copom), das quais 76 esperavam alta de 0,5 ponto da Selic; sete, aumento de 0,25 ponto; duas, alta de 0,75 ponto e outras duas, estabilidade.
O economista da CNC lembra que o varejo vem apresentando desempenho fraco desde dezembro. Os lockdowns impostos recentemente, de acordo com ele, agravarão esse quadro. Já os R$ 44 bilhões do auxílio emergencial serão insuficientes para impulsionar a demanda neste ano, segundo Freitas. A CNC calcula que o Produto Interno Bruto (PIB) terá alta de, “no máximo”, 3,4% em 2021. Em 2020, o PIB deixou uma herança estatística de 3,8% para este ano. Isso significa que, caso a projeção da CNC se confirme, a atividade econômica terminará 2021 em nível menor do que terminou em 2020.
No entanto, Freitas reconhece que há fortes pressões inflacionárias do lado da oferta, com origem, por exemplo, na desvalorização do câmbio. Essas pressões devem fazer o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) alcançar 7% em junho e terminar 2021 em aproximadamente 5,1% - a meta do BC para este ano é 3,75%. Mas ele destaca que a inflação de serviços, responsável por aproximadamente 50% do IPCA, está baixa, assim como o quadro inflacionário para o ano que vem ainda não está claro, dadas as conjuntura fiscais e cambial. Atualmente, o horizonte relevante do BC para a política monetária leva em conta principalmente 2022, para o qual a meta é 3,5%.
Por esses fatores, Freitas considera precipitada uma elevação da Selic hoje. “O BC terá que subir os juros, o problema é quando”, diz.
Na indústria, avaliação é semelhante. “É uma decisão difícil para o Banco Central, mas aumentar agora em março pode ser muito cedo”, afirma Renato da Fonseca, gerente-executivo da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Ele também reconhece que, de um lado, há pressões de custos “muito fortes”, como apontam o Índice de Preços ao Produtor (IPP) e o Índice de Preços no Atacado (IPA) - movimento que pode acabar disseminado para outros setores por causa da ampla indexação da economia brasileira.
Mas lembra que a piora da pandemia neste ano, ao contrário de 2020, “vem atingindo todos os Estados ao mesmo tempo”. “Pode haver uma contração significativa agora em março e abril, e isso seria suficiente para controlar os preços”, diz.
Rafael Cagnin, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), afirma que no ambiente atual de “forte incerteza” as empresas “não têm muita condição de repassar as pressões para o preço final”. “O empresário pensa duas vezes. Mesmo que tenha pressão de custos e aumente os preços, o concorrente pode não aumentar, e ele perde mercado”, afirma.
Cagnin destaca ainda que as empresas sairão mais endividadas da pandemia e que uma sequência de elevações da Selic dificultará que as companhias “abram espaço em seus balanços para um novo ciclo de investimentos”.
Também para o economista-chefe do IEDI, a aceleração da inflação é consequência não de uma demanda aquecida, mas de choques de ofertas ou efeitos temporários, como o pagamento do auxílio emergencial de 2020. “Respeitando os princípios do regime de meta da inflação, em que um aumento da taxa de juros tem o papel de esfriar a demanda, [a alta da Selic] me parece um pouco forte neste momento”, afirma.
Por sua vez, o economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Rubens Sardenberg, destaca que a elevação hoje da Selic é “aparentemente inevitável”. Ele lembra que a curva de juros já precifica esse movimento.
“Embora isso não seja desejável do ponto de vista da atividade, estamos falando de pressões de inflação muito fortes”, diz o economista, cuja avaliação pessoal é de que a taxa básica de juros terminará o ano em 4,5%. “Vejo pouca chance de ser um número menor do que esse e uma chance razoável de ser um número maior.”
No Boletim Focus divulgado na segunda-feira, houve alta na mediana das projeções do Top 5 para o IPCA deste ano (de 4,04% para 4,96%) e do ano que vem (3,5% para 3,56%). Fazem parte do Top 5 os economistas de instituições financeiras e consultorias que mais acertam as projeções compiladas pelo BC.
Também houve alta na mediana para a Selic: de 4,13% para 4,75% em 2021; e de 5,5% para 6% em 2022. No caso do câmbio, por sua vez, o ponto médio das expectativas subiu de R$ 5 para R$ 5,40 neste ano, mas caiu de 5,25 para R$ 5,18 em 2022.