IEDI na Imprensa - Indústria inicia mal o ano e guerra piora cenário
Valor Econômico
Mesmo com reação prevista para fevereiro, quadro do ano é desfavorável
Lucianne Carneiro e Marta Watanabe
Depois de expansão inesperada de 2,9% em dezembro, a produção industrial caiu 2,4% em janeiro, na comparação mensal, com ajuste sazonal, retomando as surpresas negativas. Ainda que se espere melhora do indicador em fevereiro, na margem, a indústria tem um quadro desfavorável em 2022.
O cenário adverso, com a demanda fraca já esperada, pode ser agravado pelo impacto da guerra na Ucrânia, retardando o ajuste global nas cadeias logísticas. O descompasso entre oferta e demanda gera novas pressões de preços e de custos de produção, com efeitos maiores que os projetados anteriormente para a inflação doméstica e juros.
Segundo a Pesquisa Industrial Mensal (PIM) do IBGE, além do recuo no índice cheio, a contração da indústria veio disseminada, com queda em todas as grandes categorias, tanto na comparação com o mês anterior quanto na interanual. Na margem, 20 das 26 atividades analisadas tiveram taxas negativas, o maior espalhamento desde abril de 2020.
Janeiro veio pior que a queda de 1,9% esperada conforme a mediana das estimativas de 34 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor Data. Na comparação interanual, o IBGE mostrou queda de 7,2%, também pior que a expectativa mediana do Valor Data, de queda de 6,1%.
“Janeiro de 2022 fica muito marcado por uma base de comparação mais alta, avanço maior da ômicron, e alguns fatores pontuais, como as chuvas mais intensas em Minas Gerais, que afetam o setor extrativo, especificamente o minério de ferro”, afirmou o gerente da pesquisa, André Macedo.
“Não só o resultado da indústria veio pior que o esperado, mas a abertura do dado mostra um cenário ruim, com bens de consumo duráveis e bens de capital muito para baixo”, diz o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez.
A produção de bens de capital e de bens duráveis teve queda de 5,6% e de 11,5% em janeiro, frente a dezembro, respectivamente. A categoria bens duráveis é a que está mais distante do nível pré-pandemia, 26,4% abaixo do que era em fevereiro de 2020. Na média, a indústria está 3,5% abaixo. O maior destaque em duráveis foi a queda de 17,4% veículos automotores, reboques e carrocerias, embora o comportamento tenha sido disseminado dentro do grupo.
Livio Ribeiro, economista e sócio da BRCG Consultores, destaca que a forte redução nos bens duráveis resulta da combinação de choques na oferta, com desorganizações adicionais nas já confusas cadeias globais de suprimentos, como ajustes a uma demanda bem mais fraca, com queda da renda e encarecimento do crédito. O cenário difícil de 2002 ganhou nuances negativas com a guerra na Ucrânia, levando à explosão de custos de insumo se aumento do risco de estagflação global. A BRCG projeta expansão da indústria de 0,2% em 2022, com viés de baixa.
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), diz que ainda não é possível avaliar o impacto do conflito na indústria, mas reforça que a alta de commodities agrícolas e metálicas afeta “de forma transversal” o setor. A alta do petróleo pressiona também a indústria petroquímica e seus derivados, como plásticos e borracha. Commodities metálicas - níquel, alumínio, minério de ferro - são insumos importantes.
Com o conflito da Ucrânia, diz Marina Garrido, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre FGV), a normalização do descompasso global entre oferta e demanda e os gargalos logísticos esperada para meados de 2022 deve ocorrer só no começo de 2023.
Alberto Ramos, economista do Goldman Sachs, diz que se espera ligeira recuperação do setor em fevereiro, mas daqui para frente a indústria deve enfrentar ventos contrários, como condições financeiras mais apertadas, demanda fraca, inflação, alta em custos logísticos, energéticos e de insumos.
O Índice Gerente de Compras do setor industrial da IHS Markit (PMI) mostrou ligeira melhora: subiu de 47,8 em janeiro para 49,6 em fevereiro, mas ainda está abaixo de 50, sinalizando a quarta deterioração consecutiva na saúde geral do setor.
O corte de IPI sobre bens industriais e debates sobre ICMS para amenizar o impacto dos combustíveis não devem se sobrepor a esse cenário diz Rafael Cardoso, economista-chefe da Daycoval Asset.