IEDI na Imprensa - Indústria ‘apaga’ 1º semestre e fecha o ano em queda
Valor Econômico
Setor termina com perda de 0,3% no PIB e tem em 2022 a sexta retração em dez anos
Marcelo Osakabe
A indústria de transformação amargou o sexto resultado negativo em dez anos em 2022. Com uma queda de 1,4% apenas no quarto trimestre, o pior entre todos as subdivisões do Produto Interno Bruto (PIB), o segmento apagou a expansão vista no primeiro semestre e terminou em queda de 0,3%.
Para economistas, o resultado já era de certa forma esperado, mas reforça a perspectiva pouco animadora para o setor, que deve ter novo ano difícil em 2023.
O setor manufatureiro responde por aproximadamente 50% do PIB da indústria, que engloba ainda o segmento extrativo, construção civil e a produção e distribuição de energia e gás. No quarto trimestre, a queda foi de 0,3%, o que diminuiu o alta no ano para 1,6%.
Segundo a coordenadora de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Rebeca Palis, o resultado só não foi pior por causa da alta de 2,5% da indústria extrativa, em especial, da exploração de petróleo.
Olhando o ano fechado, no entanto, a indústria extrativa ainda registrou queda, de 1,7%. Do outro lado, ficaram a construção civil (6,9%) e as atividades de eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos (10,1%),
“O crescimento dessa atividade está muito relacionado à recuperação em relação à crise hídrica de 2021. Além do crescimento da economia, houve o desligamento das térmicas, diminuindo os custos de produção e contribui para o aumento do valor adicionado”, disse Palis.
Para Igor Rocha, economista da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), o desempenho do setor levanta mais um ingrediente no debate sobre os juros no Brasil. Para ele, “causa estranheza” o fato de o país liderar o ranking de juros reais do mundo sem que o país apresente, em sua avaliação, um cenário institucional ou fiscal pior do que pares.
“Não estou menosprezando a questão fiscal, mas Brasil vive uma situação de clara desproporcionalidade. É um pouco difícil justificar esse patamar mais alto sendo que o mundo, em meio ao esgotamento daquele processo de integração internacional no pós-pandemia, está trabalhando com metas um pouco mais flexíveis”, critica.
Ele pondera que esse problema foi parcialmente causado pelo governo anterior. “Economista tem uma regra de bolso que é: para estimular a economia, primeiro se faz do lado monetário e, caso não seja suficiente, faz do lado fiscal. O governo anterior fez o contrário e isso resultou em aumento cavalar da taxa de juros”, diz. A Fiesp projeta expansão de 0,5% do PIB em 2023. Já a indústria de transformação deve ter nova queda, de 0,4%.
A queda de 0,3% da indústria como um todo, no entanto, acabou sendo mais branda que os 0,6% projetados pela economista-chefe do Banco Bocom BBM, Cecília Machado. Ainda assim, a abertura causa preocupação, em especial, o recuo de 0,7% da construção civil, contra projeção de alta de 1,6%.
“O desempenho da construção civil mostra que o canal de crédito está batendo mais forte que o esperado, afetando as decisões de investimento e endividamento das famílias”, diz Cecília.
O segmento, assim como a parte de serviços da administração pública, é importante para o cenário do Bocom este ano, já que são atividades que tendem a se beneficiar com o novo governo. O banco prevê alta de 1,5% do PIB, número que ainda será revisado.
No caso da indústria de transformação, o canal do crédito também acaba afetando os estoques, já que as empresas preferem desovar mercadorias em um cenário de capital de giro mais salgado, diz a economista.
Com o crescimento de 1,6% em 2022, o carrego estatístico para 2023 está atualmente em 0,5%, ligeiramente acima projeção atual do Bocom para o setor no ano, de 0,3%.
Para Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), outro dado preocupante foi o investimento em máquinas e equipamentos, que teve queda de 7,3% ano passado, dado que casa com a quinta queda trimestral consecutiva da produção de bens de capital para a própria indústria.
Diante de uma perspectiva de crescimento tanto doméstico como global mais desfavorável este ano, o economista diz que um dos poucos riscos positivos a serem monitorados é a área de infraestrutura.
“Seja porque foram aprovados marcos regulatórios importantes para atração do setor privado recentemente, seja porque governo acordou para necessidade de aumentar investimento público, principalmente depois de desastres naturais como o do litoral paulista ou de Petrópolis.”
Em sua avaliação, esta situação também levanta a oportunidade de atuar para modernizar as empresas do setor em torno de uma agenda de infraestrutura mais resiliente.
“É algo que os Estados Unidos vem fazendo, integrado ao seu pacote de investimentos. E abre uma oportunidade para a as empresas locais também, já que a infraestrutura é grande mobilizadora da atividade industrial.”