IEDI na Imprensa - Articulação do apoio à indústria com outras agendas do governo é principal dúvida de especialistas
Valor Econômico
Economistas veem pontos positivos nas medidas de incentivo à indústria
Marcelo Osakabe e Anaïs Fernandes
Economistas dizem ver pontos positivos nas medidas de incentivo à indústria brasileira que o governo pretende anunciar hoje e que foram parcialmente antecipadas ontem pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Geraldo Alckmin. Há dúvidas, porém, sobre a articulação dessas iniciativas com outras agendas de governo, como a ambiental, e sobre a capacidade de elas atacarem problemas estruturais da indústria nacional.
Para Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), as medidas de crédito são um incentivo bem-vindo, no sentido de impulsionar a inserção das indústrias brasileiras no exterior.
“A gente sabe que empresas expostas à competição internacional têm ganhos relevantes de aprendizado e produtividade ao enfrentarem novos níveis de competitividade, escala de produção e demanda dos clientes. Também costumam pagar melhor os seus trabalhadores”, diz.
Cagnin pondera, no entanto, que as informações até o momento não permitem entender como isso vai se encaixar na nova política industrial defendida pelo Mdic. “Em tese, as ações precisam se enquadrar nos compromissos sinalizados, nas ‘sete missões’”, diz.
A volta do “carro popular”, por exemplo, precisa estar articulada dentro da agenda de sustentabilidade, de transição energética, exemplifica Cagnin. “É importante saber se isso vai estar articulado para além da ideia de elevar a capacidade instalada, que também é importante”, acrescenta o economista.
Para Welber Barral, sócio da BMJ Consultores Associados, o caso da linha de crédito do BNDES à exportação “tem que ser analisado”. “Essas linhas precisariam ser majoradas e também existe a questão de financiamento da Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF)”, afirma.
Barral explica que é a ABGF quem faz os seguros dos financiamentos externos do Brasil. “Desde o governo Bolsonaro, a ABGF está parada e isso afeta muito o crédito oficial à exportação porque não tem o seguro para as vendas brasileiras. A grande mudança seria a reativação da ABGF”, diz.
Já o Convênio de Crédito Recíproco (CCR) - que o Brasil deixou em 2019, mas para o qual o país deve retornar, segundo Alckmin - é um mecanismo que funcionava “muito bem”, afirma Barral. “Tirando o caso da Venezuela, não teve nenhum default [calote]”, diz.
Barral explica que o mecanismo funcionava como um crédito recíproco entre os bancos centrais da América Latina, que compensavam entre si as exportações na região. “A volta ao CCR vem sendo discutida há algum tempo e não vai ser nenhuma revolução, mas é um mecanismo a mais que ajuda as exportações brasileiras para a América Latina.”
Em linhas gerais do que foi antecipado, “tudo parece muito inócuo”, na avaliação de Livio Ribeiro, sócio da BRCG e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre).
Isso porque, segundo ele, o problema da indústria automobilística no Brasil não é de crédito, mas de competitividade e produtividade. “Isso não se resolve com esse tipo de medida”, afirma. “Continuará beneficiando poucos, se é que alguém terá benefício.” Dessa forma, diz Ribeiro, “seguimos sem atacar as questões relevantes”.