IEDI na Imprensa - Regra ambiental terá impacto na exportação da indústria
Valor Econômico
Acordo comercial com UE e aumento da competitividade interna são necessidades para exportar itens de maior valor agregado, dizem especialistas
Marta Watanabe e Álvaro Fagundes
Garantir embarques e vender bens de maior valor agregado à União Europeia (UE) demanda medidas como aumentar a competitividade da indústria doméstica, caminhar com o acordo Mercosul-UE e participar dos debates sobre a regulamentação de regras ambientais que devem entrar em vigor a partir do fim de 2024, apontam especialistas.
Há demanda cada vez maior dos europeus por alimentos e energia do Brasil, mas há ambiente de forte regulação em relação à descarbonização e desmatamento, diz Welber Barral, sócio da consultoria BMJ. No CBAM - Carbon Border Adjustment Mechanism, na sigla em inglês -, que é o mecanismo de controle de emissão de carbono na fronteira, avalia, o Brasil tem a vantagem de ter matriz energética sustentável e a busca por pegada de carbono menor já tem sido feita por alguns setores, como o do aço. Primeira taxa de carbono sobre importações no mundo, o CBAM será cobrado a partir de 2026.
Outra regra europeia importante é a proibição da entrada de itens produzidos em áreas desmatadas após 2020, mesmo que de forma legal, conforme legislação do país de origem. Essas regras entram em vigor ao fim de 2024. Essa medida, explica o ex-secretário de Comércio Exterior, não irá atingir somente produtos agropecuários, mas toda a cadeia de produção.
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), ressalta que as medidas são tendência e devem influenciar outros mercados. “Cada vez mais o comércio internacional tende a ser organizado por conjunto de normas, padrões e requisitos técnicos relativos à performance ambiental e pegada de carbono. Isso é o que vai influenciar os fluxos de comércio exterior daqui para frente”, diz. A UE busca intensificar internamente essa regulação, explica ele, e acaba impondo isso aos seus parceiros. Há tentativa de influenciar nessa direção, destaca, “evidentemente sempre sujeito aos interesses europeus. “Faz parte de uma diplomacia europeia fazer com que sua regulação e visão sobre esses critérios funcionem como paradigma ao comércio mundial. Mas isso não necessariamente contraria os interesses brasileiros. Há disposição de negociação”, diz Cagnin. Para ele, o Brasil precisa entrar na discussão da regulamentação das medidas.
“Por exemplo, o Brasil tem grande interesse no mercado de hidrogênio verde, algo que pode contribuir para a reindustrialização. Os padrões e normas sobre o que será considerado como hidrogênio verde e como será comercializado ainda estão em negociação. O Brasil precisa estar presente na definição disso, que também é de grande interesse europeu”, diz Cagnin.
“É bom lembrar também que tanto o CBAM quanto as regras de desmatamento valem para todos, não somente para o Brasil. Essas medidas vão criar novas obrigações, paralelas ao acordo comercial entre acordo Mercosul e União Europeia, inclusive à chamada ‘side letter’ proposta”, ressalta Barral, referindo-se ao documento adicional apresentado pelos europeus, com termos relacionados a metas ambientais e que o governo federal tem considerado “duros”.
A ideia da “side letter” era não reabrir negociação sobre o acordo já fechado entre os blocos, o que seria o melhor caminho, defende Barral. “Caso seja reaberto, teremos mais 20 anos de discussões para um novo acordo.” O ex-secretário ressalta que mesmo que se chegue a um meio-termo sobre a “side letter” e se mantenha o atual acordo já fechado, é preciso no mínimo cinco anos para que ele entre em vigor, porque é necessária a ratificação nos parlamentos dos países integrantes do blocos. “No próximo semestre, a assunção da presidência do Brasil no Mercosul e a da Espanha na União Europeia podem ajudar no diálogo.”
A expectativa é que o Brasil tenha habilidade e condições de prosseguir com o acordo entre os blocos e não fazer com que haja uma reabertura de negociações, diz Cagnin. Para ele, o encaminhamento do acordo e reforma tributária podem compor importante “legado” da atual gestão. Dentre as medidas internas para melhorar a competitividade doméstica, defende Cagnina, a reforma tributária deve ser considerada prioridade.
“A reforma tributária e o acordo Mercosul-UE são duas questões que já estavam relativamente engatilhadas no governo anterior e, por falta de visão nos últimos anos, não avançaram. Agora é o momento, é preciso achar um denominador comum, dar um passo importante para a integração do Brasil na economia mundial com critérios modernos do ponto de vista ambiental e de forma consensual.