IEDI na Imprensa - Enchente no RS afeta indústria nacional, mas queda fica aquém do previsto
Valor Econômico
Retração foi de 0,9% em maio, 0,4 ponto abaixo das projeções; economistas se dividem sobre reação do setor em junho
Marsílea Gombata e Lucianne Carneiro
Puxada pelas inundações no Rio Grande do Sul, a produção industrial brasileira caiu em maio. Mesmo assim, a queda ficou abaixo do previsto pelos analistas. Economistas ouvidos pelo Valor se dividem sobre como o setor deve reagir no curto prazo. Parte dos analistas prevê recuperação do setor em junho, enquanto alguns creem que os sinais positivos do início do ano começam a dar lugar a condições econômicas mais incertas.
A produção da indústria brasileira caiu 0,9% em maio ante abril, segundo a Pesquisa Industrial Mensal - Produção Física (PIM-PF), do IBGE. O desempenho de maio ficou acima da mediana das estimativas de 24 instituições financeiras e consultorias reunidas pelo Valor Data, de recuo de 1,3%.
Na comparação com maio de 2023, a produção industrial caiu 1%, também acima da expectativa mediana do mercado, de queda de 1,6% do indicador.
Nos 12 meses até maio, a produção industrial acumula alta de 1,3%. No resultado acumulado em 2024, o ganho é de 2,5%. Com esses resultados, o setor industrial está 17,8% abaixo do nível recorde alcançado em maio de 2011 e 1,4% abaixo do patamar pré-pandemia, em fevereiro de 2020.
A indústria de transformação recuou 2,2% em maio, ante abril. Foi a primeira queda desde janeiro e a mais intensa desde março de 2021, quando contraiu-se 3,1%.
Em maio, as quatro grandes categorias e 16 das 25 atividades do setor tiveram queda.
A produção de bens duráveis caiu 5,7% em maio, frente a abril, e a de bens de capital retraiu-se 2,7%. A de bens intermediários, que representa 55% da indústria, teve perda de 0,8%, enquanto a de bens semi e não duráveis recuou 0,1%.
Veículos automotores, reboques e carrocerias e produtos alimentícios foram as principais influências negativas para a indústria em maio. A produção de veículos caiu 11,7% em maio ante abril, e produtos alimentícios, 4%.
Tiveram queda ainda produtos químicos (-2,5%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-6,3%), produtos do fumo (-28,2%), metalurgia (-2,8%), máquinas e equipamentos (-3,5%), impressão e reprodução de gravações (-15%) e produtos diversos (-8,5%).
Por outro lado, das nove atividades que tiveram alta na produção, as maiores influências vieram de indústrias extrativas (2,6%) e coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (1,9%).
O resultado da indústria em maio teve perfil disseminado de quedas e também impactos diretos e indiretos das chuvas no Rio Grande do Sul, segundo André Macedo, responsável pela PIM-PF.
“[A chuva no Rio Grande do Sul] é um fator importante a ser considerado para o resultado de maio, com sua capilaridade e reflexo em diferentes setores”, disse.
De acordo com Rodolfo Margato, economista da XP, as enchentes do Rio Grande Sul retiraram o equivalente a 1,5 ponto percentual do crescimento da indústria em maio, na comparação com o mesmo mês do ano anterior.
“Não fossem as enchentes em maio, a indústria brasileira teria crescido algo em torno de 0,5% na base anual, em vez dos números reportados de queda na base anual”, diz Margato, em relatório.
Queda da produção industrial pode ser atribuída em boa parte a efeitos das enchentes no Sul
— Rodrigo Nishida
Para o economista Rodrigo Nishida, da LCA Consultores, a queda da produção industrial de maio, tanto na comparação com abril quanto na comparação com maio de 2023, pode ser atribuída em boa parte a efeitos das enchentes no Rio Grande do Sul.
“Se olhamos os segmentos mais atingidos, vemos quedas mais expressivas em veículos automotores, reboque e carroceria, produção alimentícia, produtos químicos, máquinas, aparelhos e materiais elétricos e produtos do fumo”, diz. “Com exceção de máquinas, aparelhos e materiais elétricos, todos têm produção significativa no Estado. A chuva teve efeitos sobre esses setores.”
Nishida diz que fábricas em São Paulo, por exemplo, tiveram problemas na produção em maio porque não tinham insumos vindos do Rio Grande do Sul. Uma fábrica em São Paulo, por exemplo, deu férias coletivas como forma de mitigar os efeitos das paralisações ocorridas em unidades produtoras de peças no Rio Grande do Sul.
Ele afirma que as consequências das chuvas no Sul devem ser vistas ainda nos dados de junho, mas que o esforço de reconstrução deve compensar os efeitos negativos.
A reconstrução do Rio Grande do Sul também foi apontada pelo economista João Savignon, da gestora Kinitro Capital, como um dos motores para a volta do crescimento da indústria. A retomada é esperada por Savignon para junho, também por causa da demanda doméstica resiliente, do crédito mais acessível e de estímulos do governo.
Caio Dianin, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), lembra que o Rio Grande do Sul responde por cerca de 7% da indústria nacional e que os números positivos devem vir de setores como construção civil decorrente das obras no Sul.
Para Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos de Desenvolvimento Industrial (IEDI), os dados de maio colocam em xeque a conjuntura mais favorável para a indústria que havia no início do ano.
“Os sinais promissores na entrada do ano que apontavam para um desempenho mais robusto vão dando lugar a um cenário mais nebuloso, não apenas pelo bloqueio de atividades produtivas devido às chuvas no Sul do país, mas também pela interrupção da fase de redução da taxa básica de juros”, afirma. “Soma-se a isso maior aversão a risco dos mercados financeiros, que tem provocado movimentos bruscos de desvalorização da taxa de câmbio, renovando incertezas em relação à trajetória da inflação e elevando custos de produção de muitos setores.”