IEDI na Imprensa - Produção industrial avança 7% em maio, após tombo histórico em abril
O Globo
Resultado interrompe dois meses seguidos de queda e foi puxado pela fabricação de automóveis. Mas setor está longe da recuperação
Gabriel Martins
A atividade industrial do Brasil avançou 7% em maio deste ano, divulgou o IBGE nesta quinta-feira. O resultado positivo, puxado pela produção de automóveis, vem após o tombo histórico de 18,8% registrado em abril e a queda de 9,2% em março. Em maio, muitas fábricas de veículos retomaram a atividade.
O desempenho de maio foi o melhor para o mês de toda a série histórica e o percentual mais elevado desde junho de 2018 (12,9%). Mas foi insuficiente para conter a retração de março e abril, meses mais afetados pelas medidas de isolamento social. Nestes dois meses, o setor acumulou queda de 26,3%.
No acumulado em 12 meses, a indústria ainda opera com perda de 5,54%, a mais intensa desde dezembro de 2016.
— A produção industrial volta a crescer em maio, após dois meses negativos. Mas o crescimento é observado sobre uma base de comparação muito baixa. Assim, é natural ter esse avanço — explica André Macedo, gerente da pesquisa de indústria do IBGE.
Em comparação com maio de 2019, a indústria teve queda de 21,9%, sétimo resultado negativo seguido nesse tipo de comparação e a segunda perda mais acentuada desde o início da série histórica, atrás apenas do resultado de abril deste ano (-27,3%).
A influência positiva mais relevante para maio veio do segmento de veículos automotores, reboques e carrocerias, que apresentou crescimento de 244,4%, interrompendo dois meses seguidos de queda na produção.
Mesmo assim, o segmento encontra-se 72,8% abaixo do patamar de fevereiro, período anterior às medidas de restrição e isolamento. Em abril deste ano, a indústria automotiva do Brasil teve queda de 99% na produção, o pior resultado desde a instalação da indústria automotiva no país em 1957, durante o governo Juscelino Kubitschek.
— A alta de maio é explicada pela base deprimida do mês anterior e pela recuperação do setor automotivo. O avanço da indústria era esperado, mas o número positivo não é o suficiente para vislumbrar uma recuperação rápida do setor, em formato "V" — indica Lisandra Barbero, economista da XP Investimentos. — O cenário ainda mostra uma indústria fragilizada, com alguns segmentos apresentando comportamento positivo.
Outros destaques positivos na comparação com o mês anterior foram os segmentos de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (16,2%) - que voltou a crescer após acumular perda de 20% em três meses - e bebidas (65,6%).
Os segmentos de veículos automotores, derivados do petróleo e bebidas representam cerca de 25% da totalidade da indústria. O desempenho em maio para cada um deles foi o maior da série histórica, iniciada em janeiro de 2002.
Na outra ponta, indústrias extrativas (-5,6%); celulose, papel e produtos de papel (-6,4%); perfumaria, sabões, produtos de limpeza e de higiene pessoal (-6%) foram os destaques negativos do mês de maio.
— Limpeza e perfumaria tiveram uma aceleração na produção no início da pandemia. Agora, é esperada uma acomodada. A indústria extrativa é afetada pelo cenário externo, que ainda não está favorável para o comércio global, uma vez que a pandemia ainda não foi superada — indica Renata de Mello Franco, economista do Ibre/FGV.
De acordo com o Indicador Diário de Atividade (Idat), lançado nesta quinta pelo Itaú, O pior momento da atividade econômica no país, causado pela pandemia de Covid-19, já passou e a retomada da atividade econômica, embora não seja linear em todos os setores, já começou. O banco estima que a economia brasileira tenha um encolhimento entre 10% e 11%.
Retomada da indústria
Entre as grandes categorias da indústria, todas registraram resultados positivos na passagem de abril para maio. Os percentuais elevados, porém, são reflexo de uma base de comparação muito baixa do mês anterior.
Na comparação mensal, a produção de bens de capital subiu 28,7%. Bens intermediários teve avanço de 5,2%.
Já os bens de consumo duráveis e os semiduráveis avançaram, respectivamente, 92,5% e 8,4%. A alta expressiva dos bens duráveis se explica, em boa parte, pelo avanço do setor automobilístico.
Entretanto, na comparação entre fevereiro e maio deste ano, os níveis de produção seguem baixos. Bens de capital operam com capacidade 36,1% abaixo do nível de fevereiro, enquanto bens intermediários e semiduráveis estão, respectivamente, 14% e 16,2% inferiores ao nível pré-medidas de restrição. O pior quadro é dos bens duráveis, com capacidade 69,5% abaixo.
— Mesmo com o resultado positivo de maio, não é possível dizer que o pior para a indústria já passou. Não sabemos quando e qual será o perfil da recuperação do setor. A alta de 7% reflete a retomada d algumas linhas de produção que estavam paradas, não um crescimento da indústria — pondera Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).
Renata, do FGV/Ibre, também avalia que é cedo para falar que a indústria brasileira está em um processo de retomada do crescimento:
— De acordo com os dados que temos até então, o fundo do poço para a indústria foi em abril, mas a alta de 7% em maio não significa que saímos dele. Os níveis de produção seguem muito baixos, não apontando para um cenário de melhora por enquanto. A alta de maio foi em decorrência de algumas flexibilizações que começaram em maio. A indústria segue no poço, mas em um cenário não tão ruim quanto abril.
Ano em queda
Os especialistas acreditam que a indústria vai reduzir o percentual de queda nas comparações feitas entre os meses de 2019 e 2020. Entretanto, avaliam que é pouco provável que o setor termine este ano com saldo positivo.
— A indústria brasileira já vinha apresentando fragilidade antes da pandemia do novo coronavírus. Em médio e longo prazos, a perspectiva é que o setor continue frágil. As reformas que estão sendo debatidas, principalmente as que têm referência a relações de trabalho, são importantes para o setor. Mas enquanto elas não forem concretas, é difícil que o setor se recupere de forma mais consistente — acrescenta Lisandra, da XP, que estima uma queda de 16,8% da indústria no segundo trimestre de 2020 contra igual período do ano anterior.
O IEDI não trabalha com projeções, mas Cagnin estima que o resultado se 2020 seja pior do que os observados durante a crise econômica de 2014 a 2016.
— A partir dos resultados deste ano, talvez vamos redefinir o que é crise recorde — disse o economista.