IEDI na Imprensa - Saldo comercial pode superar US$ 60 bi no ano
Valor Econômico
Soma de exportações e importações, porém, deve ficar abaixo de US$ 400 bilhões em 2020
Marta Watanabe e Mariana Ribeiro
O Brasil deve terminar 2020 com superávit da balança comercial acima dos US$ 48 bilhões do ano passado. Algumas projeções indicam saldo acima dos US$ 60 bilhões, contribuição considerada por analistas importante para o balanço de pagamentos. A corrente de comércio, porém, medida do dinamismo comercial e da integração do país no mercado internacional, deve mergulhar para um nível abaixo de US$ 400 bilhões em 2020. Com isso, o país pode perder na média dos últimos cinco anos boa parte do que ganhou de 2011 a 2015 na corrente de comércio (a soma de exportações e importações).
A projeção mais recente da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) ligada ao Ministério da Economia, indica superávit de US$ 55 bilhões em 2020, resultado de US$ 210,7 bilhões em exportações e US$ 155,7 bilhões em importações. Uma corrente de comércio, portanto, de US$ 366,4 bilhões, 9% abaixo dos US$ 402,7 bilhões do ano passado e 13% abaixo dos US$ 420,5 bilhões de 2018.
Caso a estimativa da Secex se confirme, o país fechará 2020 com corrente de comércio média de US$ 376,2 bilhões anuais nos últimos cinco anos. De 2011 a 2015 essa média foi de 449,2 bilhões. Embora 13,5% maior que a corrente de US$ 322,8 bilhões de 2015, a soma de exportação e de importações de 2020 deve ficar comparável à corrente de 2016, também ano de recessão da economia brasileira, e à de 2017, quando se iniciou a recuperação, lembra José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
Ele pondera que de 2011 a 2015 o país bateu recordes de corrente de comércio, com pico em US$ 482,2 bilhões em 2011. A entidade estima um número de US$ 363 bilhões em 2020 e superávit de US$ 59 bilhões, com recuo de 5,5% nas exportações e de 15% nas importações.
A balança comercial em outubro fechou com superávit comercial de US$ 5,47 bilhões, mais que o dobro dos US$ 2,55 bilhões de igual período de 2019, pela média diária, segundo dados da Secex. De janeiro a outubro, o saldo acumulado foi de US$ 47,66 bilhões, aumento de 25,5% sobre iguais meses de 2019. As exportações do período somaram US$ 174,38 bilhões, com queda de 6,5%. As importações ficaram em US$ 126,72 bilhões, com recuo de 14,7%, sempre na média diária, contra iguais meses de 2019.
Herlon Brandão, subsecretário de Inteligência e Estatísticas de Comércio Exterior, avalia que a queda de 20% nas importações em outubro em reação a igual mês de 2019 ainda é grande, mas há recuperação gradual. A trajetória, ressalta, é ascendente desde junho, quando a queda, também pela média diária, foi de 35%.
Silvio Campos Neto, economista da Tendências Consultoria, avalia que as importações devam continuar reduzindo as perdas, no embalo da gradual da retomada da atividade doméstica, mas o real desvalorizado e a menor demanda por combustíveis limitam a recuperação. Já as exportações seguem se beneficiando do crescimento da China, que também tem impulsionado a alta de preços, como do minério de ferro. A segunda onda de covid-19 na Europa e nos EUA, diz Campos Neto, pode afetar as exportações de 2020, mas de forma marginal. A Tendências projeta superávit de US$ 62,5 bilhões neste ano.
O quadro de superávit robusto com queda maior de importações do que de exportações está dado, diz Welber Barral, estrategista de comércio exterior do Banco Ourinvest. O desafio para o próximo ano, diz ele, é manter a exportação de commodities e recuperar o embarque de manufaturados. Os maiores riscos para o início de 2020, segundo Barral, estão justamente nos mercados que absorvem manufaturados, como a Europa e a América Latina, já que a recuperação dessas regiões depende ainda da evolução da pandemia, além do fator Argentina, que tem uma crise doméstica a vencer. Na balança de outubro, em que a exportação total subiu levemente, em 0,3% contra igual mês de 2019, o ex-secretário de Comércio Exterior destaca o aumento de 4,7% da exportação da indústria de transformação, mantendo igual critério.
Apesar de ter base de comparação muito baixa, a alta disseminada para destinos diversos como Europa, América Central, América do Sul e países da Ásia, avalia Barral, pode refletir retomada das economias. Há incerteza, porém, aponta, sobre a sustentabilidade da alta. No acumulado de janeiro a outubro, há queda de 13,2% na exportação da indústria de transformação contra igual período de 2019.
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), tem análise semelhante. Ainda que a base de comparação seja baixa, uma variação “no azul” ou mesmo uma estabilidade no desempenho da exportação de bens industriais no último trimestre do ano seria uma boa notícia. Mas há risco, diz, de que a alta de 4,7% de outubro seja algo pontual em meio aos efeitos das apreensões em relação ao uma nova onda da covid-19.
De qualquer forma, diz ele, o resultado do ano, com queda na exportações de bens industriais, já está selado, considerando o desempenho registrado no decorrer do ano. Ele lembra que os recuos de exportação já começaram no primeiro trimestre, com queda de 10,4%. Depois seguiram-se reduções mais intensas, de 19,1% e 13,1% no segundo e terceiro trimestres, respectivamente, sempre em comparação com igual período de 2019, no critério da média diária.
Ao mesmo tempo, há continuidade na perda de espaço dos bens da indústria na exportação brasileira, algo que está relacionado à perda de corrente de comércio, já que os manufaturados permitem maior integração aos mercados internacionais. Essa fatia, ressalta, que era de 63,3% em 2010, caiu para 58% no ano passado e no acumulado de doze meses encerrados em outubro, encolheu para 54,8%.