IEDI na Imprensa - Setor de veículos supera patamar pré-pandemia e puxa produção industrial em novembro
O Globo
Indústria avança 1,2% ante outubro, sétima alta seguida. Mas ritmo de recuperação ainda é lento, com perda de 5,5% no ano, diz IBGE
Carolina Nalin
O setor automotivo superou o patamar pré-pandemia pela primeira vez e puxou mais uma vez a produção industrial, que cresceu 1,2% em novembro, em comparação com outubro. É a sétima alta seguida, segundo dados divulgados pelo IBGE nesta sexta-feira, indicando que a indústria segue em recuperação, mas em ritmo lento.
O resultado da produção industrial veio um pouco abaixo da expectativa de mercado, que projetava alta de 1,3% na variação mensal, segundo pesquisa da Reuters com economistas. Em relação a novembro de 2019, a produção industrial avançou 2,8%.
A indústria já havia zerado as perdas da pandemia em setembro. No acumulado do ano, porém, ainda registra queda de 5,5%%. E, em 12 meses, a retração acumulada é de 5,2%.
— O avanço em novembro é quase o mesmo do mês anterior e faz com que o setor siga ampliando o aumento com relação ao patamar pré-pandemia. Mas ainda há um espaço importante a ser recuperado — afirma o gerente da Pesquisa Industrial Mensal (PIM) do IBGE, André Macedo.
Ele continua:
— Não é que a indústria esteja crescendo vigorosamente e esteja se aproximando dos seus níveis mais elevados da série histórica, ela está recuperando as perdas desse período mais recente.
Setor de veículos puxa outro segmentos
Todas as grandes categorias apresentaram alta frente a outubro, com destaque para Bens de capital (7,4%), que reúne máquinas e equipamentos, e Bens de consumo duráveis (6,2%), como eletrodomésticos e veículos.
O setor de veículos automotores, reboques e carrocerias continua puxando o desempenho da indústria, com a alta de 11,1% em novembro frente a outubro. Com isso, superou o patamar pré-pandemia pela primeira vez. Ficou 0,7% acima do nível alcançado em fevereiro.
A recuperação já levou a Anfavea a prever aumento de 15% nas vendas de automóveis em 2021, após o tombo de mais de 20% no ano passado.
A disseminação do coronavírus fez as montadoras fecharem as fábricas em abril, levando o setor a praticamente paralisar a produção. O mês foi considerado o pior desde a instalação da indústria automotiva no Brasil, em 1957. Agora, o segmento acumula sete altas seguidas, com expansão de 1.203% nesse período.
— Essa atividade praticamente paralisou o seu processo produtivo em março e abril, inclusive temos relatos de que algumas plantas industriais não produziram nada. Agora, é o sétimo mês seguido em que essa atividade avança na produção em um movimento semelhante ao do setor industrial como um todo — explica André Macedo.
Projeção de queda no ano
A magnitude do crescimento e a importância desse setor na indústria também se reflete em outros ramos, já que a produção de veículos influencia atividades como metalurgia, com estímulo da produção de aço, e outros produtos químicos, área que engloba tintas de pintura, por exemplo.
Ambas tiveram alta em novembro, de 1,6% e 5,9%, respectivamente.
— Mais do que o peso industrial em si, o setor de veículos automotores tem uma correlação importante com outros segmentos industriais e traz, a reboque, um comportamento positivo de setores que tem uma relação com essa atividade e que acabam avançando junto com esse resultado — diz Macedo.
Na avaliação da economista da XP Investimentos, Lisandra Barbero, o resultado da indústria veio ligeiramente abaixo da expectativa, uma alta de 1,5%. Ainda assim, o crescimento dos bens de capital (7,4%) e dos bens de consumo duráveis (6,2%) indicam parte dessa retomada consistente, mesmo que lenta:
— A demanda nacional aquecida, a recuperação das economias internacionais e os estímulos fiscais implementados nos últimos meses justificam a indústria estar apresentando bons números. Os bens de consumo duráveis e os insumos típicos para construção civil foram dois dos maiores destaques do resultado, e dizer que essas duas categorias continuaram performando bem significa que os investimentos na indústria continuaram fortes.
Apesar do bom desempenho do setor de veículos, a indústria como um todo tem enfrentado gargalos para responder ao aumento da demanda.
Segundo levantamento da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), em novembro, 75% das indústrias de transformação no país enfrentaram dificuldades para conseguir insumos.
Para Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), a falta de insumos na indústria tende a ser normalizada a depender do desencademanento da crise sanitária:
— Houve uma estagnação dos bens intermediários em outubro e novembro, e esse segmento é considerado o núcleo da indústria porque é responsável por produzir insumo para o resto dos setores. O resultado sugere que essas ausências de insumos continuaram bem presentes até o fim do ano, mas a expectativa é que esse problema seja sanado em 2021 ou pelo menos reduzido se não houver nenhuma nova fase de lockdown — analisa.
Especialistas estimam que o setor deve crescer também em dezembro, mas com perda de fôlego por conta da redução no valor do auxílio emergencial desde setembro. No acumulado do ano, a expectativa do mercado, segundo o Boletim Focus, elaborado pelo Banco Central, é que o setor registre uma queda de 5%.
— Estamos falando de um setor que mesmo antes da pandemia já enfrentava dificuldades estruturais. O que tem justificado o número forte da indústria são as questões pontuais de auxílios, demanda aquecida e recuperação internacional, mas passados os efeitos e as causas, há um risco de como o setor vai se comportar depois da interrupção desses benefícios — diz Lisandra.
A retirada de medidas como o auxílio emergencial às famílias e outros programas do governo como o de manutenção do emprego, por meio de redução de jornada ou suspensão de contrato, devem indicar uma acomodação da indústria em 2021:
— O fim abrupto dessas medidas pode trazer uma acomodação do ritmo de atividade, em um momento em que precisaríamos estar acelerando ou pelo menos mantendo um ritmo de atividade. Estamos sobrepondo crises pois a indústria não se recupera bem desde 2015. Temos dinamismo econômico hoje suficiente para conseguir ter vida sem nenhuma das medidas emergenciais? Isso precisa ser discutido — aponta Cagnin. (*) Estagiária, sob supervisão de Danielle Nogueira