IEDI na Imprensa - Commodities impulsionam saldo e exportação recordes na balança
Valor Econômico
Governo prevê superávit de US$ 105 bi no ano, mas analistas veem excesso de otimismo
Marta Watanabe e Mariana Ribeiro
Impulsionadas por commodities, principalmente minério de ferro e petróleo, as exportações somaram US$ 28,1 bilhões em junho, novo recorde da série histórica, desde 1997, para qualquer mês. O superávit do mês, de US$ 10,4 bilhões também é recorde absoluto. No acumulado do primeiro semestre, o superávit somou US$ 37,5 bilhões. O governo passou a projetar saldo positivo de US$ 105,3 bilhões para o ano. O valor é considerado otimista por analistas.
As exportações avançaram 60,8% em junho contra igual mês de 2020, com alta em todas as grandes atividades econômicas. A indústria extrativa liderou o avanço, com US$ 9,16 bilhões embarcados e alta de 175,8%. Dentro da indústria extrativa, minério de ferro avançou 172,1% e petróleo, 208,9%, segundo dados divulgados ontem pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex). Também entre os itens mais importantes da pauta, já no setor agropecuário, a exportação de soja aumentou em junho, mas a uma taxa menor, de 23,6%. Variações sempre pelo critério da média por dia útil. As importações totais alcançaram US$ 17,7 bilhões em junho, com alta de 61,5% na comparação interanual.
As projeções para o saldo da balança comercial são baseadas em modelos econométricos e não consideram possíveis fatores de incerteza, como riscos políticos e financeiros e inflação crescente no mundo, destacou o subsecretário de Inteligência e Estatísticas de Comércio Exterior, Herlon Brandão. “Não consideramos cenários futuros, apesar de termos uma perspectiva de aquecimento ainda maior da economia na medida em que a atividade econômica vai se normalizando, que os efeitos da pandemia têm se arrefecido e a imunização avança nos países.”
A nova estimativa de superávit comercial para 2021 do governo, de US$ 105,3 bilhões, resultaria de US$ 307,5 bilhões em exportação e US$ 202,2 bilhões em importações. “Será a primeira vez que a exportação brasileira ultrapassa a marca dos US$ 300 bilhões”, diz Brandão. O recorde em superávit anual hoje é de US$ 67 bilhões.
Para José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), a nova estimativa do governo é surpreendente. A entidade, cuja estimativa atual é de superávit de US$ 69 bilhões para 2021, deve fazer revisão de projeção em julho. “Para se chegar ao saldo estimado pelo governo o superávit médio mensal deverá ser US$ 11,5 bilhões, em princípio muito alto. Mas não podemos esquecer que petróleo e minério estão com preços muito elevados e eles continuam subindo.” Já na soja, avalia, não deve haver aumento de quantidade e o preço pode subir entre 30% e 35%.
Em junho, destaca Castro, o aumento de quantidades embarcadas também impulsionou mais as exportações. Além do avanço de 44% no preço médio dos embarques no mês, houve aumento da quantidade em 11,4%, em variação maior que a média de 7,8% do primeiro semestre, sempre na comparação interanual. Castro destaca que, com exceção da soja, houve elevação de quantidade nos principais itens da pauta de exportação de junho, com destaque para alta de 12,2% no minério de ferro e de 53,7% no petróleo, na comparação com igual mês do ano passado. Os preços desses produtos mantiveram alta, com avanço de 142,5% para o minério e de 101% no petróleo, na mesma comparação.
Os preços historicamente elevados das commodities em contexto de recuperação econômica global seguem favorecendo a exportação, indica Yasmin Riveli, economista da Tendências Consultoria. No terceiro trimestre as receitas de exportação, diz ela, devem seguir em forte alta na métrica anual. “No entanto, para os próximos meses, esperamos uma queda gradual dos preços das commodities na margem, o que deve implicar em saldos comerciais mais modestos do que o observado na primeira metade do ano”, aponta.
A perspectiva, avalia a economista, é de que o governo chinês intensifique o controle sobre o setor siderúrgico, com o intuito de limitar os níveis de produção e atingir as metas de redução de emissão de gases poluentes. Tal movimento deve arrefecer as pressões sobre as cotações do minério de ferro. Além disso, do lado do petróleo, o cenário de expansão na margem da produção americana atua como fator baixista.
A Tendências projeta atualmente superávit para 2021 de US$ 70,8 bilhões, resultado de exportações de US$ 257,5 bilhões e de importações de US$ 186,7 bilhões. Yasmin explica que após a incorporação dos últimos resultados e a análise de outras variáveis, as estimativas da consultoria poderão passar por revisão, com viés de alta para o saldo. “Ainda não temos os exercícios fechados, mas com base no nosso cenário de arrefecimento dos preços das commodities no segundo semestre de 2021, e no aspecto sazonal do período, nossas estimativas para o saldo não devem atingir superávit da magnitude citada pelo governo”, diz.
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), considera a projeção do governo “muito otimista”. De qualquer forma, diz, o superávit robusto do primeiro semestre é um resultado que retira preocupações em relação ao setor externo.
Ele destaca que os dados da Secex mostram desempenho positivo das exportações da indústria de transformação, com alta de 38,1% em junho e de 22,6% no primeiro semestre, sempre contra iguais períodos de 2020. Ele pondera, porém, que a elevação dos preços de commodities e a base baixa de comparação contribuíram para o resultado. Entre itens importantes com maior variação de exportação da indústria de transformação, exemplifica, estão açúcar, ferro e aço e farelo de soja. São produtos, diz, muito próximos dos setores primários e cujos preços são rapidamente afetados pela recuperação do comércio mundial, na qual se destaca a demanda da China.
Além disso, diz ele, é preciso destacar o efeito base no avanço de embarques de meios de transporte, como veículos e aeronaves, muito atingidos pela pandemia no início de 2020. Por isso, avalia, não se trata do melhor desempenho da indústria, embora seja um início de recuperação.