IEDI na Imprensa - Com avanço do dólar, economistas já projetam alta nos preços de viagens e alimentos, e efeitos até nas compras de Natal
O Globo
Indefinição sobre medidas do governo para conter gastos volta a afetar o mercado. Moeda já subiu 20,96% no ano
Isa Morena Vista e Paulo Renato Nepomuceno
A indefinição sobre o corte de gastos e um cenário externo incerto levaram o dólar a fechar ontem com a maior cotação desde 13 de maio de 2020. A moeda avançou 1,53% e atingiu R$ 5,869. É o segundo maior valor nominal da História, o mais alto desde a pandemia e o maior do terceiro mandato de Lula.
O mercado reagiu à notícia de que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, viajará na próxima semana para a Europa, um sinal de que a decisão sobre o formato final da aguardada proposta de corte de gastos ficará para a segunda semana de novembro. No ano, o dólar já subiu 20,96%.
A alta da moeda americana preocupa por seus efeitos na inflação, no consumo doméstico, no planejamento de empresas e nos juros. Economistas já projetam alta nos preços de viagens e alimentos, podendo afetar até as compras de Natal.
O diretor da Casa Flora Importadora, Adilson Carvalhal Junior, afirma que, caso a moeda siga em patamares altos, o consumidor poderá sentir mudanças nos preços dos alimentos já em dezembro deste ano.
Produtos típicos do Natal mais caros
A forte demanda — impulsionada por uma economia aquecida — consumiu boa parte dos estoques de segurança dos varejistas, o que pode acelerar a necessidade de reposição de produtos importados, que serão comercializados com base em um dólar mais caro.
Segundo Aloísio Campelo Júnior, superintendente do FGV/Ibre, três dos alimentos que podem ser mais afetados são típicos do Natal: panetone, bacalhau e vinhos.
Carvalhal Junior pondera, por outro lado, que o varejo costuma relutar para aumentar os preços na época das festas de fim de ano, já que os consumidores esperam ver valores mais baixos neste período:
— Todo mundo quer ser competitivo em preço. É difícil alterar o preço no meio dessa campanha.
Estímulo à exportação
O economista André Braz, coordenador do Índice de Preços do Ibre/FGV, acrescenta que a alta da taxa de câmbio leva produtores brasileiros a se voltarem para a exportação, o que acaba restringindo a oferta de alguns alimentos no mercado nacional:
— Quando a nossa moeda fica muito desvalorizada, é como se o Brasil entrasse em promoção. Os produtos brasileiros estão mais baratos. Então, o volume maior de exportação, com uma oferta que está a um custo mais alto, resulta num aumento de preço aqui.
Apesar do possível aumento nos preços dos alimentos, Campelo Júnior acredita que dificilmente a cotação atual do dólar impactará os preços das compras no fim de ano. Ele avalia que os estoques foram adquiridos com meses de antecedência, já prevendo as compras da Black Friday, no fim de novembro.
Entretanto, o efeito no preço de viagens e passagens aéreas deve ser imediato, afirma Silvio Campos Neto, economista e sócio da Tendências Consultoria. Além do dólar turismo estar mais caro, os pacotes de viagens também podem sofrer reajustes de preços. O aumento no valor do combustível de aviação — que é comercializado em dólar — também pode encarecer passagens aéreas internacionais e nacionais, diz Campelo Júnior, do FGV/Ibre.
A forte valorização do dólar também impacta a indústria. Os produtos manufaturados brasileiros possuem, em média, 22% de insumos importados. No setor de tecnologia, podem chegar a 40%.
— Uma volatilidade do câmbio é prejudicial. O mercado produtivo prefere estabilidade ao longo do tempo para poder ancorar suas decisões por meses e anos — diz Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos de Desenvolvimento Industrial (IEDI), acrescentando que a incerteza leva empresas a adiar planos de investimentos em máquinas e equipamentos.
Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda, afirma que as incertezas sobre o resultado da eleição nos Estados Unidos, com uma possível vitória do republicano Donald Trump, são responsáveis por uma parcela do avanço do dólar.
Mas o economista afirma que as dúvidas sobre condução da política fiscal pelo governo Lula e o desequilíbrio das contas públicas são o principal fator da disparada do dólar.
Ajuste necessário
O ex-ministro diz que a resistência do entorno do presidente atrasa o ajuste e aumenta os problemas da equipe econômica comandada pelo ministro Fernando Haddad. Maílson afirma que medidas estruturais de ajuste no Orçamento são fundamentais para minimizar a atual gravidade da situação fiscal. Mas, opina, é pouco provável que as medidas que serão anunciadas sejam capazes de reverter o pessimismo no mercado.
No turismo, dólar acima de R$ 6
- O dólar turismo acompanhou o ritmo da cotação da moeda americana no segmento comercial e subiu ontem 1,37%.
- A cotação do dólar turismo, usado por quem pretende viajar para o exterior, superou a barreira dos R$ 6 e era encontrado a R$ 6,08 para venda.
- Algumas casas de câmbio do Rio chegaram a vender a moeda americana a R$ 6,27 no cartão.
- Em São Paulo, o dólar turismo era vendido a R$ 6,21, e a R$ 6,36 com pagamento no cartão.
- As cotações já incluem a taxa de 1,1% correspondente ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sob o valor total emitido em espécie.
- Para a compra no cartão, o IOF incidente é de 4,38%.
- A cotação do euro também acompanhou o movimento de disparada do dólar.
- O euro comercial fechou ontem com alta de 1,14%, e era encontrado a R$ 6,36 para venda.
- No segmento turismo, o valor da moeda da União Europeia variou de R$ 6,73 para pagamento em espécie e até R$ 6,93 para quem opta pelo cartão pré-pago.
- As cotações de venda de dólares e euros nas casas de câmbio já incluem a taxa de 1,1% correspondente ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sob o valor total emitido em espécie. Para a compra no cartão, o IOF incidente é de 4,38%.