Carta IEDI
Crise da Covid-19 e os desafios do Investimento Estrangeiro Direto
Além da retração do PIB mundial, a pandemia de Covid-19, ao lado da deterioração das expectativas dos atores econômicos, tem provocado atraso e suspensão na implementação de projetos de investimento no mundo todo, o que irá se traduzir em redução dos fluxos globais de investimento estrangeiro direto (IED), de acordo com organismos multilaterais.
Tanto as projeções da Unctad, divulgadas em março, como as da OCDE, realizadas em maio, sugerem uma queda entre -30% e -40% dos fluxos de IED em 2020, aprofundando muito a tendência de declínio que já vinha ocorrendo nos últimos cinco anos.
O principal fator por trás do recuo em 2020 será a diminuição dos lucros das empresas, cujo reinvestimento vem se tornando, desde 2013, um componente cada vez mais importante dos fluxos de IED, representando mais da metade das entradas de IED em 2018. Os setores mais prejudicados, segundo a Unctad e a OCDE serão os setores de energia, indústrias básicas, transporte aéreo e indústria automobilística.
Os fluxos de IED também poderão ser afetados pelas ações de endurecimento dos mecanismos de escrutínio do investimento estrangeiro em setores e/ou empresas considerados estratégicos para a segurança nacional dos países.
Anteriormente concentrados no setor de defesa e armamento, mecanismos cada vez mais amplos que autorizam triagem e bloqueio de investimentos estrangeiros em um número crescente de países passaram, segundo a Unctad, a incluir áreas de tecnologia de ponta, como 5G, inteligência artificial, robótica e nano e biotecnologia, além de setores como telecomunicações, transporte, energia etc.
A pandemia disparou o alerta em relação a aquisições potenciais de ativos sensíveis nas indústrias farmacêutica, de biotecnologia e de equipamentos e dispositivos médico-hospitalares, entre outros. Alguns países já começaram a adotar medidas nesse sentido, reforçando uma tendência em curso desde a segunda metade da década passada.
São alguns exemplos: nos EUA, a aprovação da Foreign Investment Risk Review Modernization Act (FIRRMA) em ago/18 e de novas regras pelo Comitê de Investimentos Estrangeiros (CFIUS) em fev/20; e na Europa, desde abr/20, um novo regulamento prevê a participação da Comissão Europeia no processo de triagem de IED nos casos em que possa afetar “projetos ou programas de interesse da União Europeia por razões de segurança ou ordem pública”.
Alemanha, Espanha, França e Itália aprovaram ou estão discutindo restrições adicionais, assim como Austrália e Japão.
Frente a este movimento, a OCDE alerta para o fato de que o endurecimento dos mecanismos de triagem do IED pode aumentar a incerteza e os custos e atrasar as transações, justamente no momento em que o investimento seria importante para assegurar a recuperação econômica dos países.
A Unctad defende que os pacotes governamentais contem com medidas de apoio ao investimento, como a depreciação acelerada dos gastos de capital no período pós-pandemia, e observa que a crise de Covid-19 poderá acelerar o afrouxamento dos laços das CGV e a realocação de atividades para o país de origem (reshoring), impulsionados por parte das multinacionais para tornar as cadeias de suprimentos mais resiliente.
Retração dos Fluxos de IED
Projeções mais recentes da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), realizadas em março de 2020, a partir de estimativas econômicas atualizadas e da revisão de lucros das 5000 maiores empresas multinacionais (EMNs), sugerem queda dos fluxos IDE de -30% a -40% durante 2020-2021.
Esta estimativa é muito mais adversa do que a anterior, realizada com dados de fevereiro e a partir das expectativas iniciais que os efeitos da covid-19 se concentrariam no Leste da Ásia, quando a retração dos fluxos de IED era estimada em -15% em um cenário de continuidade dos impactos da pandemia.
Desde então, o rápido espraiamento mundial da pandemia e a sensível piora nas estimativas de lucros em 2020 por parte de 80% das 5000 maiores EMNs, que respondem pela maior parte do IED global, fizeram a Unctad reavaliar que os impactos da Covid-19 nos fluxos de IED serão muito mais severos.
Também para a Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), em estudo divulgado no início de maio, os fluxos de IDE em 2020 deverão cair mais de -30% em relação a 2019. Essa estimativa, porém, reflete um cenário que supõe que as medidas de contenção da pandemia e as políticas de combate à crise econômica serão são bem-sucedidas e que a economia começará a se recuperar já no 2º semestre de 2020.
Em um cenário pessimista, segundo a OCDE, a queda nos fluxos de IED seria mais acentuada (-40%) e mais duradora, com os fluxos permanecendo em um patamar baixo até o final de 2021. A OCDE ressalta que, embora os fluxos de IED estejam em diminuição constante nos últimos cinco anos, a pandemia os atingiu no momento em que estavam no segundo nível mais baixo registrado desde 2010.
O impacto imediato da Covid-19 nos fluxos de IED virá, sobretudo, da retração dos lucros. Os lucros reinvestidos vêm se tornando, desde 2013, um componente cada vez mais importante dos fluxos de IED, representando mais da metade das entradas de IED em 2018. Estimativas realizadas pelo OCDE e também pela Unctad, indicam fortes quedas nos lucros dos setores de energia, indústrias básicas, transporte aéreo, indústria automobilística. Em contraste, maiores lucros são esperados nos setores de saúde, tecnologia e comunicação.
Com a redução dos lucros das EMNs, tanto os projetos de investimento novos (greenfield) como os projetos de expansão serão afetados pelo impacto recessivo da pandemia. Como novos projetos de investimento têm longo período de gestação e um ciclo de vida que se estende por décadas, muitos projetos serão somente adiados. Outros, dependendo da gravidade da recessão, poderão ser interrompidos ou arquivados indefinidamente.
Os efeitos econômicos recessivos da pandemia também deverão afetar as fusões e aquisições transfronteiriças, que se concentram nas economias avançadas. De acordo com a Unctad, as fusões e aquisições anunciadas estão sendo adiadas e os novos anúncios de transações transfronteiriças passaram de uma média mensal de 1.200 transações em 2019 para 874 em fevereiro e para 385 em 20 de março de 2020, com retração de cerca de 70% no primeiro trimestre de 2020 em todo o mundo.
Outro impacto da pandemia sobre os fluxos globais de IED poderá ocorrer por meio dos desinvestimentos. Em geral, os desinvestimentos são uma característica frequente e natural das cadeias de suprimentos globais, permitindo que as empresas adaptem suas operações às mudanças rápidas da realidade dos negócios. Mesmo antes da eclosão do surto de coronavírus, inúmeras empresas planejavam alienar algumas operações em 2020-2021.
De acordo com a OCDE, a saúde financeira e os níveis de endividamento das EMNs são importantes impulsionadores do desinvestimento internacional. Como a pandemia ocorreu quando a dívida corporativa atingia níveis recordes é provável que muitas empresas, com severas restrições de liquidez e níveis crescentes de dívida, se veem forçadas a vender operações.
Segundo a Unctad, o declínio nos fluxos globais de IED dependerá da gravidade e duração da pandemia em diferentes regiões e países, e do escopo das medidas de contenção que os governos são forçados a implementar. É importante ressaltar que a duração da recessão e a velocidade da recuperação também dependerão da natureza e da escala dos pacotes de políticas que inúmeros governos estão montando para apoiar suas economias. Se espera que a maioria dos pacotes inclua medidas de apoio ao investimento, como a depreciação acelerada dos gastos de capital pós-pandemia.
A Unctad destaca ainda que um grau adicional de incerteza decorre dos efeitos assimétricos dos diferentes choques que o IED global absorverá. Embora se espere que o choque da demanda seja profundo, os investimentos poderão ser rapidamente retomados se as políticas de reativação da economia se mostrarem efetivas. No entanto, o impacto negativo da pandemia no investimento associado às redes globais de produção pode ser mais durável.
A pandemia da Covid-19 poderá acelerar as tendências pré-existentes de afrouxamento dos laços de CGV e de realocação de atividades para o país de origem (reshoring) impulsionados por parte das EMNs para tornar as cadeias de suprimentos mais resiliente.
Restrições ao IED em empresas de setores estratégicos
Os países anfitriões de capital estrangeiro dispõem de vários instrumentos políticos para exercer seu direito soberano de regular a entrada e o estabelecimento de investimentos estrangeiros em seu território. Esses instrumentos incluem requisitos de registro e aprovação de empresas, bem como a proibição total ou parcial de investimentos estrangeiros em certos setores da economia.
Um instrumento tem, contudo, ganhado destaque nos últimos anos: o mecanismo de triagem dos investimentos estrangeiros, empregado em 28 países, em sua maioria países de economia avançada, como Alemanha, Estados Unidos, França, Japão e Reino Unido, mas também em alguns emergentes, a exemplo de África do Sul, Índia, México e Rússia.
Inicialmente aplicada aos setores de defesa e armamento, a triagem foi estendida ao investimento estrangeiro em indústrias estratégicas domésticas e infraestrutura crítica, como produção e fornecimento de energia, abastecimento de água, transporte, telecomunicações, recursos minerais ou mídia.
Nos dias atuais, como destaca a Unctad, o escrutínio de investimentos se aplica também à aquisição por estrangeiros de tecnologia e conhecimento interno, como inteligência artificial, robótica, semicondutores, computação em nuvem, 5G, tecnologia quântica, hardware de computação, nanotecnologias, biotecnologias ou satélites e aeroespacial.
Os critérios de triagem do IED pelos quais os governos avaliam os riscos potenciais associados a fusões e aquisições estrangeiras também foram sendo ampliados, com inclusão de parâmetros que ultrapassam o conceito original de segurança nacional.
Desde 2014, têm se multiplicado as iniciativas de mudanças legislativas significativas dos mecanismos de triagem do IED relacionados à segurança nacional. Tais mudanças visam:
1) ampliar o escopo da triagem adicionando novos setores ou atividades sujeitos a revisão, diminuindo os limiares que acionam a triagem de investimento ou ampliando as definições de investimento estrangeiro sujeito a triagem;
2) estender os prazos legais do procedimento de triagem a fim de proporcionar às autoridades responsáveis mais tempo para avaliar fusões e aquisições estrangeiras complexas e transfronteiriças;
3) introduzir novas sanções civis, criminais ou administrativas para aqueles que não cumprirem ou contornarem as obrigações de notificação e triagem.
Em alguns países, as mudanças introduzidas foram motivadas por preocupações específicas com investimentos por empresas de propriedade estatal (SOEs) em empresas e setores estratégicos.
Nos Estados Unidos, por exemplo, preocupações com controle mais rígido das fusões e aquisições estrangeiras por razões de segurança nacional levaram à promulgação do Foreign Investment Risk Review Modernization Act (FIRRMA) em 13 de agosto de 2018.
Essa Lei, que introduziu modificações no Foreign Investment and National Security Act de 2007, reforçou os poderes do Comitê de Investimentos Estrangeiros (CFIUS), ampliando o escopo das transações de investimento estrangeiro que passam por escrutínio, bem como estendeu o prazo de 30 para 45 dias para avaliação dos casos que representem risco à segurança nacional.
O FIRRMA requer a triagem de qualquer investimento estrangeiro, não somente daqueles que conduzem à aquisição de controle acionário, em qualquer entidade americana que atue com tecnologias críticas, infraestrutura crítica e que colete dados pessoais. A aplicação da nova lei em sua integralidade estava prevista para ocorrer até o março de 2020.
Em 13 de fevereiro de 2020, entraram em vigor, novos regulamentos do CFIUS no que se refere às declarações obrigatórias para investimento estrangeiro em empresas norte-americanas que lidam com tecnologias críticas, infraestrutura crítica, coleta de dados pessoais, bem como em propriedades imobiliárias.
O controle mais rígido das fusões e aquisições estrangeiras devido a questões de segurança nacional e interesse público está se tornando igualmente uma preocupação regional. Em 10 de abril de 2019, entrou em vigor na União Europeia (UE) o regulamento que estabelece padrões comuns de escrutínio do IED entre os Estados-Membros e cria um mecanismo de cooperação para troca de informação entre diferentes autoridades nacionais acerca de investimentos específicos que suscitem preocupação.
Aprovado pelo Parlamento Europeu e adotado pelo Conselho Europeu em março de 2019, o regulamento prevê a participação da Comissão Europeia no processo de triagem nos casos em seja provável que um investimento estrangeiro “afete projetos ou programas de interesse da União por razões de segurança ou ordem pública”.
Entre os projetos de interesse da UE que podem exigir parecer da Comissão Europeia estão o programa Galileu, voltado ao desenvolvimento do sistema europeu de navegação por satélite, e o programa Horizonte 2020, que financia pesquisa e inovação na EU.
Nos últimos anos, houve numerosos casos em que o investimento estrangeiro foi rejeitado pelos países anfitriões-alvo por razões de segurança nacional e interesse público. A Unctad identificou pelo menos 20 casos de tomadas de controle estrangeiras planejadas com um valor superior a US$ 50 milhões que foram bloqueadas ou retiradas por razões de segurança nacional no período de 2016 a setembro de 2019. O ano de 2018 concentra 12 destes casos, com um valor total de US$ 150,6 bilhões, equivalente a 11,6% dos fluxos globais de IED daquele ano.
Um dos casos de bloqueio de investimento estrangeiro ocorridos em 2018 foi o da aquisição de uma participação minoritária de 20% da empresa alemã 50Hertz, uma operadora de rede com 18 milhões de usuários conectados, pela empresa estatal State Grid Corporation da China. Segundo a Unctad, embora a transação planejada não alcançasse o limiar de triagem, o governo alemão agiu para impedir a operação por meio do banco federal de fomento KfW que assumiu participação acionária na empresa-alvo.
Como destaca Baker McKensie (Impact on Governmental Foreign Investment Screening, Insight, Baker McKenzie, 31 March 2020), escritório de advocacia norte-americano especializado em fusões e aquisições, a pandemia da Covid-19 deu novo ímpeto à tendência de endurecimento dos mecanismos de triagem de investimentos estrangeiros em setores considerados estratégicos, com expansão do escopo e aumento da profundidade dos procedimentos de filtragem. Para proteger empresas que se tornaram vulneráveis à tomada de controle estrangeiro, alguns países estão adotando medidas para impedir aquisição estrangeiras de ativos sensíveis.
Os primeiros movimentos nesse sentido foram observados na Europa. Na Espanha, por exemplo, no dia 17 de março, foram introduzidas modificações na Lei 19/2003, que constitui o marco legal para movimentação de capitais e investimento estrangeiro no país. Desde então é necessário obter autorização prévia para todos os investimentos estrangeiros de entidades fora da UE em empresas espanholas, que resultarem em participação acionária a partir de 0% ou em participação efetiva no conselho de administração da empresa espanhola.
Essas restrições se aplicam a uma ampla gama de setores, tais como: energia, transporte, água, saúde, comunicações, mídia, processamento ou armazenamento de dados, infraestrutura aeroespacial, de defesa, tecnologias críticas e de dupla utilização (robótica, inteligência artificial, semicondutores, cibersegurança, aeroespacial, defesa, armazenamento de energia, tecnologias quânticas e nucleares, bem como nanotecnologias e biotecnologias, entre outros.
No dia 25 de março, a Comissão Europeia emitiu novas diretrizes para a triagem de investimentos estrangeiros em resposta à atual crise econômica e de saúde, com vistas a preservar as empresas e ativos críticos da UE, especialmente em áreas como saúde, pesquisa médica, biotecnologia e infraestruturas essenciais para a segurança e a ordem pública. Ademais, a Comissão instou os catorze Estados-Membros que já dispõem de um mecanismo de triagem a utilizar plenamente essas ferramentas para proteger ativos e tecnologias estratégicos contra aquisições estrangeiras neste momento crítico que possam comprometer a segurança ou a ordem pública da Europa.
A ação da Comissão Europeia foi, segundo analistas, uma resposta à oferta norte-americana de US$ 1 bilhão, em meados de março, para a empresa alemã de biotecnologia CureVac transferir suas atividades de P&D para o laboratório em Boston, de modo a assegurar exclusividade aos Estados Unidos no acesso a vacina contra a Covid-19. Essa empresa é proprietária da tecnologia RNA mensageiro (mRNA), em desenvolvimento desde 2011, com potencial de aplicação em terapias contra o câncer, terapias com anticorpos, tratamento de doenças raras e vacinas profiláticas. Sob pressão do governo alemão, o laboratório CureVac finalmente rejeitou os avanços financeiros norte-americanos, e trocou o seu principal executivo, de nacionalidade norte-americana, pelo biólogo alemão Ingmar Hoerr, um dos fundadores da empresa.
A ameaça norte-americana sob uma das empresas líderes no desenvolvimento de vacina contra a Covid-19 levou, igualmente, o governo da Alemanha a reforçar o controle sobre os planos de aquisição de negócios estratégicos por empresas estrangeiras. No dia 8 de abril de 2020, o governo Merkel apresentou uma proposta de atualização da Lei de Comércio Exterior e Pagamentos (AGW), que endurece os critérios de triagem para os investimentos estrangeiros em setores críticos.
Esse projeto de lei, que ainda depende de aprovação do Parlamento alemão, permite que as autoridades responsáveis suspendam as transações pendentes de sua decisão, a fim de impedir qualquer transferência de tecnologia crítica durante o período de análise.
Também amplia o poder das autoridades em proibir um investimento, que não será mais limitado a investimentos estrangeiros que “coloquem em perigo” a ordem ou a segurança pública. Em vez disso, bastará que haja uma suspeita de que o investimento estrangeiro "provavelmente” afetará os interesses públicos.
Fechar uma transação ou trocar informações confidenciais antes da aprovação obrigatória do investimento estrangeiro será um crime com multas ou prisão de até cinco anos, se o projeto for aprovado pelo Parlamento alemão.
No dia 20 de maio de 2020, com vistas a proteger o setor da saúde, o governo alemão aprovou uma modificação ao Regulamento do Comércio Exterior e Pagamentos (AWV) proposta pelo Ministério da Economia, que amplia a lista de empresas com restrição de compra por investidor estrangeiro. A partir da data de publicação oficial da nova versão do AWV, a aquisição por investidor estrangeiro não-europeu de participação acionária de 10% ou mais em empresas produtoras de EPI, vacinas, medicamentos e equipamentos médicos para tratamento de doenças infecciosas deverá ser previamente notificada e estará sujeita a investigação futura.
Também na Itália, o governo está contemplando a introdução de emendas nas atuais regras italianas de triagem de investimentos estrangeiros para proteger empresas em setores estrategicamente importantes. Segundo Baker McKensie, o primeiro-ministro e o governo estão analisando a possibilidade de qualificar todas as empresas italianas listadas na Bolsa de Valores de Milão como "estratégicas" para fins de aplicação das regras existentes de poderes especiais.
Atualmente, o primeiro ministro italiano tem o poder de vetar ou impor condições em relação a certas transações com empresas dos setores de defesa / segurança nacional, telecomunicações, telecomunicações, entre outros. Se aprovada, tais poderes serão estendidos ao investimento estrangeiro em todas as entidades listadas em bolsa na Itália.
Na França, onde, desde 1º de abril de 2020, vigora um novo regime de triagem de investimentos, que ampliou o escopo dos investimentos cobertos pelo regime e requisitos para fornecer informações substanciais para receber aprovação, também houve mudanças específicas como resultado direto da Covid-19 .
No dia 29 de abril, o ministro francês de Economia e Finanças anunciou uma adaptação dos procedimentos de controle do investimento estrangeiro para incluir as biotecnologias na lista de tecnologias críticas sujeitas a controle específico. O ministro também decidiu abaixar, temporariamente, o limiar de 25% para 10% de participação estrangeira com direito de voto em empresas listadas em bolsa que exige notificação prévia à Direção Geral do Tesouro (DGT). Esse rebaixamento, que irá vigorar até o final de 2020, se aplica exclusivamente a investidores não-europeus.
De acordo com Baker McKensie, embora os países europeus tenham sido os primeiros a anunciar uma triagem de investimento estrangeiro mais restritiva em resposta às implicações econômicas decorrentes da Covid-19, outras jurisdições estão começando a seguir o exemplo.
Esse é o caso, por exemplo, da Austrália, aonde o governo anunciou mudanças temporárias, em vigor a partir de 29 de março de 2020, em sua estrutura de análise de investimentos estrangeiros, a fim de proteger o interesse nacional.
Desde então, todos os investimentos estrangeiros propostos na Austrália, sujeitos à Lei de Aquisições e Aquisições no Exterior de 1975, exigirão aprovação prévia do Conselho de Revisão dos Investimentos Estrangeiros (FIRB), independentemente do valor do investimento ou da natureza do investidor estrangeiro. O período para análise das transações pelo FIRB foi ampliado de 30 dias para até seis meses.
No Japão, com vistas a impedir que empresas estrangeiras assumam o controle de empresas domésticas críticas, a Dieta Nacional aprovou, em novembro de 2019, uma revisão da Lei de Câmbio e Comércio Exterior. Com essa revisão, que acompanha a já mencionada tendência de endurecimento do escrutínio do IED, o limiar de investimento estrangeiro sujeito a triagem foi reduzido de 10% para 1%.
Assim, os investidores estrangeiros que comprarem uma participação acionária de 1% ou mais em uma empresa japonesa estarão sujeitos a uma autorização prévia se a empresa-alvo estiver incluída em 12 setores especificados considerados críticos para a segurança nacional, como armas, aeronaves e indústrias relacionadas ao espaço, energia nuclear, gás, cibernética, tecnologia e produtos de uso dual, entre outros. Estão excluídos da pré-triagem, os bancos, corretoras de valores, seguradoras, fundos de hedge.
Com o avanço da pandemia, o governo japonês decidiu proteger as indústrias farmacêutica e de equipamento médico de aquisição estrangeira. Foi proposta uma ementa ao regulamento, com vistas a impedir que empresas estrangeiras adquiram empresas nacionais que operam nas áreas de vacinas, medicamentos e equipamentos médicos avançados, como ventiladores, máquinas de pulmão-coração, bombas de infusão e dialisadores artificiais.
No dia 8 de maio, o Ministério das Finanças do Japão divulgou uma lista com 518 empresas, nas quais o investimento estrangeiro estará sujeito a escrutínio prévio mais rigoroso a partir do dia 7 de junho de 2020. Entre as empresas classificadas como estratégicas está a Fujifilm Holdings do Japão, que ganhou atenção mundial recentemente pelo fato do seu medicamento antigripal Avigan estar sendo testado como um tratamento para a Covid-19. O Ministério das Finanças pretende atualizar a lista de tempos em tempos, mas ainda não decidiu o cronograma.
Na avaliação da OCDE, em um momento como o atual em que as economias precisam de investimento estrangeiro para uma recuperação rápida e sustentada, o endurecimento dos mecanismos de triagem do IED pode aumentar a incerteza e os custos e atrasar as transações.
Nesse contexto, considera como primordial que o desenho e a implementação de políticas relativas ao IED sejam guiados por princípios de não discriminação, transparência, previsibilidade, proporcionalidade e responsabilidade. A OCDE sugere ainda que “as medidas adotadas sejam estritamente adaptadas às ameaças específicas aos interesses essenciais de segurança”.