Carta IEDI
Brasil: destacado destino de IDE em 2023
A última edição do relatório World Investment Report da UNCTAD trouxe os dados de 2023 para os investimentos diretos estrangeiros (IDE) no mundo, que serão analisados nesta Carta IEDI. Atualizamos, assim, o ranking mundial dos maiores países receptores e originários destes investimentos e destacamos a performance do Brasil.
Os fluxos globais de IDE somaram US$ 1,33 trilhão em 2023, segundo a UNCTAD, implicando uma retração de -2,2% frente a 2022. Esta evolução, contudo, foi positivamente influenciada por fluxos de IDE para um pequeno número de “conduit economies” europeias, segundo o relatório. Estes são países de “trânsito” de investimentos que têm como destino outras economias.
Excluindo tal efeito, os fluxos globais de IDE recuaram -10%, num contexto de incertezas sobre o desempenho da economia mundial e do impacto potencial das tendências de fragmentação em curso. O Brasil acompanhou o ritmo agregado e registrou -10,2%.
Duas modalidades de IDE condicionaram a queda mundial: fusões e aquisições (F&A) transfronteiriças, cujo valor (US$ 378 bilhões) caiu pela metade entre 2022 e 2023, e acordos internacionais de project finance (US$ 958 milhões), que registraram -25%.
A UNCTAD pontua que fatores que explicam a redução destas modalidades de IDE: condições financeiras globais restritivas, incerteza dos investidores, volatilidade dos mercados financeiros e, no caso das F&A, regulação mais rigorosa.
Em contrapartida, a modalidade de projetos greenfield, que significam a construção de capacidade produtiva nova, aumentaram +5,4%, em valor, em 2023 ante 2022. O principal fator de alta foi a multiplicação de anúncios no setor manufatureiro, interrompendo uma década de declínio continuado. Cabe observar que na modalidade F&A, o setor manufatureiro teve operações praticamente estáveis (-0,7%) no ano passado, não contribuindo para a queda geral da modalidade.
Quem puxou o avanço do IDE greenfield foram as economias em desenvolvimento, onde os anúncios de investimentos aumentaram +20% ante 2022. Nas economias desenvolvidas houve queda de -8%. A UNCTAD destaca quatro ramos com maior expansão: energia e gás; equipamentos eletrônicos e elétricos; informação e comunicação; indústrias extrativas.
No total da entrada de IDE, contudo, as economias em desenvolvimento apresentaram declínio de -7% em 2023, para US$ 867 bilhões. Este grupo de países representou 65% dos influxos globais e os projetos greenfield mitigaram sua evolução. As economias desenvolvidas, por sua vez, tiveram alta de +9% apenas se considerarmos os investimentos recebidos pelas “conduit economies” europeias, como observado anteriormente. Sem este efeito, a queda foi de -15%, associada a reconfigurações financeiras corporativas em função da perspectiva de adoção de um imposto global mínimo sobre as grandes empresas multinacionais.
Em termos regionais, houve recuo de -8% para a Ásia em desenvolvimento (para US$ 621 milhões), mas manteve-se como a principal região recebedora de IDE no mundo em desenvolvimento e em âmbito global. Os influxos para a África caíram -3% (para US$ 53 bilhões) e a América Latina teve o melhor desempenho entre as regiões em desenvolvimento.
A entrada de IDE para os países latino-americanos variou apenas -1%, mantendo-se praticamente estável frente a 2022 (em US$ 193 bilhões). As F&A na região diminuíram -26,7% (para US$ 11 bilhões), mas os projetos greenfield envolveram um montante maior de recursos, puxados por grandes projetos no Brasil e Chile, em setores de commodities e minerais críticos.
Para o Brasil, os influxos de IDE atingiram US$ 65,9 bilhões, em 2023, o equivalente a 18,3% da formação bruta de capital fixo (FBCF) do país. Este valor, como mencionado anteriormente, foi 10,2% inferior ao montante de 2022, mas ainda assim ficou acima da média dos 5 anos anteriores à pandemia. O declínio deveu-se ao desempenho negativo dos acordos de project finance, que mais do que anulou o aumento na demais modalidades. Os projetos greenfield (US$ 36,2 bilhões) tiveram avanço de +69%.
A despeito da queda, melhoramos nossa posição no ranking global de entrada de IDE. Em 2022 ocupamos a 6ª posição e em 2023 subimos para a 5ª posição, ultrapassando a França, para quem os influxos recuaram -81% no ano passado. As primeiras posições foram ocupadas pelos EUA (1º), apesar da queda de -6% (para US$ 311 bilhões) e China (2º), com queda de -14%, seguidos por Cingapura (3º e +13,5%) e Hong Kong (4º e +2,7%).
Cabe destacar que temos uma posição de destaque no mundo quando se trata de atrair investimentos externos. Outros países da região ficaram muito atrás no ranking global, como o México, em 9º lugar, muito embora tenha progredido bastante em relação a 2022 (12º) com influxos estáveis no período, e o Chile, em 20º lugar, também com progressão em relação ao ano anterior (26º e alta de +23,5% dos influxos).
Para 2024, o contexto internacional para os fluxos de IDE continua desafiador, segundo o relatório da UNCTAD. Além de as projeções atuais não indicarem aceleração do crescimento global (2,6% em 2024 contra 2,7% em 2023), um conjunto de fatores está provocando uma reconfiguração da produção internacional e um comportamento mais cauteloso das empresas multinacionais em relação aos investimentos transfronteiras, o que tende a afetar negativamente o IDE. Dentre estes fatores, a UNCTAD menciona:
• tendências de fragmentação da economia global,
• tensões comerciais e geopolíticas,
• políticas industriais que afetam setores estratégicos e
• niciativas de diversificação das cadeias globais de valor.
Todavia, há também elementos que podem mitigar os fatores acima. A UNCTAD pontua, por exemplo, que os lucros destas empresas se mantiveram elevados em 2023, mesmo que um pouco menores do que no biênio anterior. Por isso, avalia que o reinvestimento de lucros, que é um importante componente do IDE, deve se manter robusto em 2024.
Outro aspecto favorável destacado no relatório é a perspectiva de melhora das condições financeiras globais, que podem estimular os acordos internacionais de project finance. As F&A também devem se recuperar e o aumento dos anúncios de novos projetos de greenfield, em 2023, ainda deve afetar positivamente os fluxos de IDE em 2024.
Introdução
Esta carta IEDI apresenta o desempenho dos fluxos globais de investimento direto estrangeiro (IDE) em 2023 com base nas informações da última edição do World Investment Report, relatório da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, na sigla em inglês) divulgado agora em 2024.
A primeira seção apresenta as tendências globais do IDE. A segunda seção sumariza as tendências por grupo de países (desenvolvidos e em desenvolvimento) e regiões, enquanto a terceira seção resume as tendências por modalidade e setor. A quarta seção detalha o desempenho do IDE no Brasil e a quinta traça as perspectivas para 2023.
Tendências globais
Os fluxos globais de IDE somaram US$ 1,33 trilhão em 2023, cifra 2,2% inferior à registrada em 2022. De acordo com a UNCTAD, esse desempenho foi influenciado por amplas flutuações dos fluxos de IDE para um pequeno número de “conduit economies” europeias, que são países de trânsito de significativos fluxos de IDE que têm como destino outras economias, constituindo um canal de evasão fiscal por partes das empresas multinacionais (Multinational Enterprises - MNEs). Excluindo o efeito desses fluxos, os fluxos globais de IDE recuaram ainda mais, cerca de 10%, num contexto de incertezas sobre o desempenho da economia mundial e o impacto potencial das tendências de fragmentação em curso.
As fusões e aquisições (F&A) transfronteiriças caíram pela metade em 2023 frente a 2022. Os acordos internacionais de project finance também tiveram um fraco desempenho, registrando recuo de 25%, tanto em valor como em número de transações. Um conjunto de fatores explica esses resultados, segundo a UNCTAD, dentre os quais condições financeiras globais restritivas, incerteza dos investidores, volatilidade dos mercados financeiros e, no caso das F&A, regulação mais rigorosa.
Em contrapartida, os projetos greenfield, aumentaram 5,4% em valor e 2,1% em número devido ao aumento dos anúncios no setor manufatureiro, interrompendo uma década de declínio. Projetos anunciados por corporações chinesas contribuíram significativamente para esse desempenho. Contudo, os anúncios foram positivos somente nas economias em desenvolvimento, avançando 20% em valor e 15% em número. No caso das economias desenvolvidas, houve queda de 8% e 6%, respectivamente.
As tendências divergentes entre projetos greenfield e project finance decorrem dos determinantes específicos dos investimentos na indústria (projetos greenfield) e no setor de infraestrutura (acordos de project finance). Adicionalmente, elas também refletem a sensibilidade dos diferentes investidores às condições financeiras vigentes.
Os lucros das MNEs foram expressivos nos últimos anos, o que ampliou a capacidade dessas corporações de financiar a aquisição de ativos, o que também explica o aumento dos anúncios de projetos greenfield. Os project finance, por sua vez, dependem mais de recursos de investidores institucionais e de endividamento, que são mais sensíveis ao custo de capital e tendências dos mercados financeiros. Taxas de juros elevadas podem também levar os governos a adiarem grandes projetos de infraestrutura.
Entrada de IDE por grupo de países e regiões
Os fluxos de entrada de IDE para a economias desenvolvidas somaram US$ 464 bilhões em 2023, um avanço de 9% frente a 2022, devido às transações financeiras da MNEs envolvendo as “conduit economies” europeias. Excluindo os fluxos para essas economias, houve queda da 15% devido, sobretudo, a reconfigurações financeiras corporativas – associados à perspectiva de adoção de um imposto global mínimo sobre as grandes MNEs – e à forte queda nas F&A transfronteiriças, que afetam principalmente os fluxos de IDE para as economias desenvolvidas
A trajetória de queda gradual da participação das economias desenvolvidas nos fluxos globais de IDE manteve-se em 2024. Essa participação atingiu 35% contra um percentual de mais de 50% em 2018.
As F&A transfronteiriças caíram significativamente: 50% em valor (para US$ 300 bilhões) e 13% em número de acordos. A queda foi generalizada, atingindo todas as regiões desenvolvidas num contexto de condições financeiras globais restritivas. Praticamente metade dessas operações teve como destino os Estados Unidos e Reino Unido. Alemanha, Canadá, Suíça e França responderam por 30% dos acordos.
As demais modalidades de IDE também recuaram: o número de anúncios de projetos greenfield caiu 6%, provocando uma queda de 8% no seu valor para US$ 631 bilhões. No caso dos acordos de project finance, os recuos foram, respectivamente, de 21% e 23%, sendo que praticamente todas as economias desenvolvidas foram atingidas.
Os fluxos de IDE para a Europa sofreram uma forte mudança, passando de uma saída líquida de US$ 106 bilhões em 2022 para uma entrada líquida de US$ 16 bilhões em 2023. Contudo, considerando o biênio, várias economias, incluindo Irlanda, Países Baixos, Suíça, Luxemburgo e Reino Unido, registraram grandes fluxos negativos. Excluindo esses países, os fluxos de entrada diminuíram 14%.
Os fluxos para a América do Norte, assim como na maioria das economias desenvolvidas, caíram em 2023, em função do desempenho do IDE para os Estados Unidos (EUA) que somou US$ 311 bilhões, cifra 6% inferior na base de comparação interanual. Este recuo decorreu, sobretudo, da queda de 40% das F&A transfronteiriças, devido a menores acordos no setor de comunicação e tecnologia.
Apesar desse desempenho desfavorável, os EUA seguiram no primeiro lugar do ranking dos principais países receptores de IDE e foram líderes no quesito “números de projetos” tanto de anúncios de investimentos greenfield (que se mantiveram estáveis na comparação interanual) como de acordos de project finance internacionais.
Já os fluxos para o Canadá aumentaram 9%, na contramão de outros países desenvolvidos que registraram forte recuo da entrada de IDE incluindo Austrália, Japão e Coréia do Sul. Tanto os anúncios de projetos de greenfield e de acordos de project finance recuaram na maioria desses países.
No caso das economias em desenvolvimento, os fluxos de IDE recuaram 7%, para US$ 867 bilhões ou 65% dos fluxos globais. O avanço de 15% no número de anúncios de projetos de greenfield e de 20% em valor não foi suficiente para compensar a queda de 26% no número de acordos de project finance e de 31% em valor, que foi generalizado entre as regiões em desenvolvimento. As F&A, que representam uma pequena parte dos fluxos de IDE para essas economias, também caíram: -19% em número e -29% em valor, para somente US$ 76 bilhões.
Em termos regionais, a queda dos fluxos para as economias em desenvolvimento decorreu, sobretudo, do recuo de 8% dos fluxos para a Ásia em desenvolvimento para US$ 621 milhões. Contudo, essa região sustentou sua posição de principal recipiente de IDE não somente na Asia, mas também no mundo em desenvolvimento e em âmbito global.
As F&A, que representam em geral 10% a 15% do IDE para a Ásia em desenvolvimento, caíram 34,5% para US$ 57 bilhões, sendo responsáveis por metade do recuo dos fluxos totais. Em contrapartida, a região continua atraindo grandes projetos greenfield, com 6 dos 10 maiores projetos em âmbito global se localizando na Ásia em desenvolvimento. Estes aumentaram de forma significativa em 2023, tanto em número como valor dos anúncios de projetos (44% e 22%, respectivamente).
O leste e sul da Ásia foram os principais recipientes. Contudo, no primeiro caso, os fluxos recuaram devido uma queda significativa da entrada de IDE na China, após uma década de trajetória ascendente. Já os fluxos para o sul da Asia mantiveram-se estáveis num contexto de crescimento robusto e vínculos intensos com as cadeiras globais de valor.
Os fluxos para a África caíram 3% para US$ 53 bilhões. Tanto o número como o valor dos acordos de project finance recuaram. No caso dos anúncios dos projetos greenfield, houve recuo em valor, mas o número de projetos aumentou 7% para mais de 800 projetos e envolveu a maioria dos países da região. Os principais setores de destino foram químicos e eletrônicos.
A região atraiu alguns megaprojetos, com destaque para o projeto em hidrogênio verde na Mauritânia, que deve gerar US$ 34 bilhões em investimentos. Outros países da região também serão destino de projetos nesse setor em 2024. Outro importante setor de destino de projetos de greenfield foi o de veículos elétricos e componentes.
Os fluxos para o norte da África recuaram 12% frente a 2022, mas a região manteve-se como principal recipiente. Contudo, a maior queda (17%) foi registrada na África central. Houve aumento da entrada de IDE (22%) somente na região sudeste, que se tornou a 4ª principal região receptora, ultrapassando a África central.
A entrada da IDE na América Latina teve o melhor desempenho entre as regiões em desenvolvimento, se mantendo praticamente estável frente a 2022 (-1%) no patamar de US$ 193 bilhões. As F&A, que usualmente respondem por uma pequena parcela do IDE para a região, diminuíram 26,7% para US$ 11 bilhões.
No caso dos projetos greenfield, embora tenha havido queda no número de anúncios, seu valor aumentou, puxado por grandes projetos no Brasil e Chile nos setores de commodities e minerais críticos. Projetos em energia renovável também se destacaram (4 dos 10 maiores projetos), ainda que tenham recuado frente a 2022 (US$ 16 bilhões a menos).
Cabe ressaltar que a heterogeneidade entre os países da região foi considerável. Na América do Sul, os fluxos para a Argentina, Chile e Guiana aceleraram, compensando a queda do IDE para o Peru e Brasil. Mesmo com a queda de 10,2% para US$ 65,9 bilhões, a economia brasileira seguiu como principal recipiente de IDE nessa região, subindo para a 5ª posição no ranking dos países com maior entrada de IDE.
Apesar do declínio em 2023, os fluxos de IDE continuaram sendo a principal modalidade de financiamento externo para as economias em desenvolvimento, respondendo por 44% do total, seguidos por remessas de imigrantes, assistência oficial ao desenvolvimento e investimento de portfólio.
No caso do grupo de economias classificadas pela ONU como “países menos desenvolvidos” (Least Developed Countries, LDCs), apesar de o IDE ter avançado 17% (passando 2% para 2,4% dos fluxos globais), continuou a menor fonte de financiamento, respondendo por 20% do total, ficando atrás dos investimentos de portfolio (39%) e da assistência oficial ao desenvolvimento (41%), que é a principal fonte de financiamento externo para esses países.
Saídas de IDE por grupo de países e regiões
Em termos de saída de IDE, isto é, da origem do investimento, as multinacionais das economias desenvolvidas aumentaram seus investimentos no exterior em 4%, para US$ 1,1 trilhão. Assim como no caso da entrada de IDE, restruturações corporativas na Europa tiveram influência nesse desempenho.
Excluindo os fluxos para as “conduit economies” europeias, a saída global de IDE recuou 10% frente a 2022 devido, sobretudo, à queda de 53% nas F&A transfronteiriças num contexto de condições financeiras globais restritivas. O recuo dessas operações foi generalizado nesse grupo de países. Já o desempenho dos projetos greenfield foi heterogêneo, com recuo na América do Norte, estabilidade na Europa e aumento nas demais economias.
Os principais países investidores no exterior foram os Estados Unidos e o Japão tanto no grupo das economias desenvolvidas como em âmbito global. A saída de IDE desses dois destinos aumentou 10% e 14% frente a 2022, respectivamente. No caso da França, o crescimento foi ainda maior, de 35,8%. Em contrapartida, os fluxos de saída de IDE da Alemanha, Suécia e Espanha recuaram. Considerando toda a Europa, esses fluxos caíram 11% (excluindo as “conduit economies”).
Os investimentos no exterior pelas MNEs das economias em desenvolvimento também recuaram em 2023, mas em maior intensidade do que as das economias desenvolvidas, somando US$ 491 bilhões, cifra 11% inferior à registrada em 2022. O desempenho dos investimentos chineses no exterior teve influência decisiva nesse resultado.
A saída de IDE da China caiu 9,2%, somando US$ 148 bilhões, o que resultou no seu deslocamento da 2ª para a 3ª posição no ranking global. Contudo, o número de anúncios de projetos greenfield pelas MNEs chinesas praticamente dobrou em 2023 e responderam por metade do crescimento registrado para os países em desenvolvimento. A outra metade explica-se pelo aumento de 18% do número desses anúncios pelas MNEs da Ásia em desenvolvimento (excluindo a China), de 21% pelas MNEs da Africa e de 19% pelas MNEs da América Latina e Caribe.
A queda da saída de IDE foi praticamente generalizada entre as regiões em desenvolvimento. A única exceção foi sudeste asiático, que foi o principal receptor do IDE chinês, que se direcionou para o setor manufatureiro, com destaque para os ramos de computadores, equipamentos eletrônicos, motores de veículos e outros transportes.
Tendências do IDE por modalidade e setor
Em 2023, os acordos de project finance internacionais e as F&A transfronteiriças foram negativamente afetadas pela guerra na Ucrânia, pela deterioração nas condições financeiras globais e pela incerteza nos mercados financeiros, segundo a UNCTAD. Em contrapartida, os projetos greenfield anunciados tiveram melhor desempenho do que no ano anterior, como detalhado a seguir.
Os investimentos greenfield anunciados somaram US$ 1,38 trilhão em 2023, um avanço de 5,4% frente a 2022. Em número de transações, a alta foi menos significativa, de 2,1%. Os investimentos anunciados na indústria de transformação foram os responsáveis por esse desempenho, totalizando US$ 611 milhões, cifra 26% superior à registrada no ano precedente. O aumento do número de projetos também foi significativo, de 22,5%.
Em contrapartida, nos demais setores, o valor dos investimentos anunciados diminuiu. A maior queda foi registrada no setor primário, onde esses investimentos somaram US$ 66 bilhões, um recuo interanual de 38,9% devido ao desempenho do ramo de metais básicos e produtos de metais. Já o número de projetos aumentou 16,4%. No caso do setor de serviços, após o ótimo desempenho em 2022, os investimentos anunciados recuaram 1,7% para US$ 703 bilhões. Contudo, o setor manteve-se como líder em termos de número de projetos – 10.772 ou 58% do total (contra 65% em 2022).
Entre os diferentes ramos identificados pela UNCTAD, os quatro que receberam mais investimentos greenfield foram os mesmos de 2022: fornecimento de energia e gás; equipamentos eletrônicos e elétricos, seguidos pelos ramos de informação e comunicação e indústrias extrativas. Contudo, sua participação no total recuou de 60% para 54,3%.
No IDE decorrente de F&A transfronteiriças, houve uma queda de 46,5% em valor para US$ 378 bilhões e de 13,5% em número das transações na comparação de 2023 com 2022. Em valor, os investimentos diminuíram em todos os setores, com destaque para o setor primário (-70,5%) e de serviços (54,5%). Este setor manteve sua posição de principal receptor dessas transações, mas sua participação no valor total recuou de 63% em 2022 para 53% em 2023. Já na indústria de transformação, o recuo de F&A foi de somente 0,7%. Em contrapartida, em termos de número de projetos, somente o setor de serviços apresentou recuo (-19%) contra avanços de 29,8% no setor primário e 1,8% na indústria de transformação.
O ramo de informação e comunicação manteve-se na liderança, apesar da queda de quase 60% no valor investido, sendo destino de US$ 67 bilhões de investimentos. Os demais setores de destaque foram indústrias extrativas, finanças e seguros e transporte e armazenagem.
Por sua vez, os acordos internacionais de project finance totalizaram US$ 958 bilhões em 2023, um recuo de 26,4% frente a 2022. O número de transações recuou 23,2%. Os três principais ramos contemplados foram os mesmos que em 2021 e 2022: energia renovável (US$ 368 bilhões), atividades imobiliárias industriais (US$ 146 bilhões) e atividades imobiliárias residenciais (US$ 79 bilhões), valores 12%, 45% e 41% inferiores aos registrados em 2022. Entre os 10 maiores ramos, houve aumento em valor somente na petroquímica. Em termos de números de transações, a queda foi generalizada.
IDE no Brasil em 2023
Os fluxos de IDE para o Brasil atingiram US$ 65,9 bilhões em 2023, 10,2% inferior que o resultado de 2022, mas ainda acima da média dos 5 anos anteriores à pandemia (US$ 59 bilhões). Como percentual da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), a entrada de IDE atingiu 18,3% em 2023 contra 21,1% no ano precedente.
Os fluxos de saída – ou seja, os investimentos das MNEs brasileiras no exterior - somaram US$ 29,9 bilhões, um recuo de 6,8% na base de comparação interanual. Como percentual da FBCF, a saída de IDE recuou de 9,2% em 2022 para 8,3% em 2023.
O estoque de IDE no Brasil, por sua vez, atingiu US$ 997,6 bilhões (ou 45,9% da FBCF), 13,6% superior ao valor registrado em 2022. O estoque de IDE no exterior cresceu mais na comparação interanual (+22,9%), mas somou US$ 365,8 bilhões (ou 16,8% da FBCF), cifra quase 3 vezes inferior ao estoque de IDE no país.
A queda nos fluxos de entrada de IDE decorreu do desempenho negativo dos acordos de project finance, que mais do que anulou o aumento na demais modalidades. As F&A transfronteiriças atingiram US$ 8,5 bilhões, cifra mais de 5 vezes maior do que em 2022. Já os projetos greenfield somaram US$ 36,2 bilhões, um avanço de 69% frente a 2022.
No que se refere aos fluxos de saída, as F&A transfronteiriças foram negativas em US$ 3,35 bilhões, ou seja, as MNEs brasileiras liquidaram ativos no exterior. Já os projetos greenfield aumentaram 66,4%, somando US$ 4,5 bilhões.
Perspectivas para 2024
O contexto internacional para os fluxos de IDE continua desafiador em 2024, segundo o relatório da UNCTAD. As projeções atuais são de estagnação do crescimento global (2,6% em 2024 contra 2,7% em 2023). Além disso, um conjunto de fatores está provocando uma reconfiguração da produção internacional e um comportamento mais cauteloso das MNEs em relação aos investimentos transfronteiras, dentre os quais: tendências de fragmentação da economia global, tensões comerciais e geopolíticas, políticas industriais que afetam setores estratégicos e iniciativas de diversificação das cadeias globais de valor.
Todavia, os lucros das MNEs mantiveram-se elevados em 2023, mesmo que menores do que no biênio anterior. Assim, o reinvestimento de lucros, um importante componente do IDE, deve se manter robusto, avalia a UNCTAD.
Outro fator favorável na visão da UNCTAD é a melhora das condições financeiras globais, que pode estimular os acordos internacionais de project finance em 2024. As F&A também devem se recuperar neste ano e o aumento dos anúncios de novos projetos de greenfield em 2023 ainda deverá afetar positivamente os fluxos de IDE em 2024.