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                          Carta IEDI

                          Edição 1326
                          Publicado em: 29/08/2025

                          Fora da regra: os efeitos de práticas ilícitas para a economia brasileira

                          Sumário

                          Uma das obrigações do Estado é fazer aplicar a lei a todos os agentes sociais e econômicos, de modo a garantir segurança, isonomia e um ambiente concorrencial justo. Os elevados índices de informalidade, corrupção e criminalidade em países latino-americanos, inclusive o Brasil, indicam as limitações de seus Estados cumprirem este papel.

                          Além de riscos à vida e ao patrimônio, cuja gravidade vem conferindo ao tema da segurança um peso cada vez maior no debate político, esta situação gera grandes ineficiências econômicas. Empresas que não cumprem a lei e burlam as regras ganham vantagens competitivas desleais em relação àquelas que operam em uma situação de conformidade.

                          A Carta IEDI de hoje trata deste que é um problema crescente no Brasil, inclusive pela multiplicação de evidências da penetração de grupos criminosos em atividades econômicas lícitas. A partir de uma série de estudos específicos recentes, o Instituto examina os impactos dos mercados ilícitos de produtos industriais, bem como dos roubos e furtos de energia e de cargas.

                          Embora as estimativas variem em função da base de dados e das metodologias utilizadas, a magnitude dos prejuízos econômicos causados pela produção informal, contrabando, descaminho, adulteração, falsificação, furto e roubo é considerável e está em elevação.

                          O Fórum Nacional contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), por exemplo, estima que os prejuízos econômicos causados pelos mercados ilícitos no Brasil foram multiplicados por cinco em 10 anos, passando de R$ 100 bilhões em 2014 para R$ 480 bilhões em 2024 (praticamente o PIB de SC). Entre os setores mais afetados estão vestuário, bebidas alcoólicas, combustíveis, equipamentos esportivos e de higiene.

                          Já o acompanhamento da FIESP, para São Paulo, revela que entre 2020 e 2023 os mercados ilícitos cresceram +17,5%. No estado, os setores mais afetados incluem tabaco; produtos químicos, tais como combustíveis, lubrificantes, agrotóxicos, fertilizantes etc.; automotivo; higiene e vestuário.

                          Em termos de impactos econômicos, os mercados ilícitos acarretam enormes prejuízos diretos às empresas legais que cumprem com as normas tributárias e regulatórias, podendo ocasionar o fechamento de fábricas e perda de empregos. Essa concorrência desleal pode igualmente desestimular investimentos nacionais e estrangeiros, prejudicando assim o desenvolvimento da nossa indústria.

                          De igual modo, os mercados ilícitos resultam em expressiva evasão fiscal, privando os entes federados de vultosos recursos que poderiam ser destinados à saúde, educação e à infraestrutura. Segundo o levantamento do FNCP, as perdas de arrecadação respondem por quase 30% dos prejuízos totais causados pelos mercados ilícitos. No caso do levantamento da FIESP, impostos da ordem R$ 10,5 bilhões deixaram de ser recolhidos pelo Estado de São Paulo só em 2023.

                          De um lado, a concorrência desleal causada pelo mercado ilegal pode levar à redução de postos de trabalho em setores formais da economia.

                          De outro lado, produtos falsificados, como bebidas, medicamentos, alimentos, cigarros, brinquedos ou agrotóxicos, podem representar sérios riscos à saúde e segurança dos consumidores devido à ausência de certificação e/ou controle de qualidade.

                          Ademais, os mercados ilícitos estão cada vez mais associados a redes e organizações criminosas que utilizam os lucros para financiar outras atividades ilícitas, como tráfico de drogas e armas, bem como empregam empresas de fachada em mercados formais para “lavar” os recursos obtidos no tráfico de drogas.

                          Como mostra o estudo recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), produtos de alto valor econômico, tributação elevada e de grande circulação, como ouro, combustíveis, tabaco e bebidas, entre muitos outros, emergiram como novas fronteiras do crime organizado no Brasil. Apenas esses quatro setores movimentaram cerca de R$ 147 bilhões em 2022.

                          O alto potencial de ganho e as penalidades mais brandas das atividades ilícitas de sonegação fiscal, contrabando, descaminho e falsificação, quando comparadas a crimes associados ao tráfico de armas e drogas, estimulam a reorientação das atividades do crime organizado para mercados ilícitos mais complexos, segundo o FBSP.

                          No setor de combustíveis, apontado como um dos mais lucrativos para as organizações criminosas, os roubos, as adulterações, as fraudes e a sonegação de tributos geram, em 2024, um prejuízo de aproximadamente R$ 30 bilhões, segundo os dados do Instituto de Combustível Legal (ICL).

                          Nesse setor, onde a União e demais entes federados perdem mais de R$ 14 bilhões por ano com a sonegação fiscal, é frequente a presença da figura do “devedor contumaz”, isto é, empresas que operam legalmente, por 4 a 6 anos, sonegando o imposto e acumulando débitos fiscais. Estima-se que o valor de dívida ativa registrada somente com dívidas de ICMS ultrapasse R$ 65 bilhões. Menos de 1% desse valor é recuperado pelos estados.

                          Os mercados ilícitos também podem causar graves danos ambientais. Esses são os casos, por exemplo, da mineração ilegal, que acarreta desmatamento, contaminação dos rios com mercúrio, impactos na biodiversidade etc., e dos agrotóxicos contrabandeados ou falsificados, que, além de contaminarem do solo e das águas, apresentam severos riscos à saúde humana.

                          Além da concorrência desleal na produção, empresas regulares também enfrentam desafios crescentes em suas cadeias logísticas em função do roubo de cargas. Segundo a Associação Nacional do Transporte de Carga e Logística, em 2023, foram registradas perdas estimadas em R$ 1,2 bilhão (+4,8% ante 2022), especialmente em estados como São Paulo e Rio de Janeiro.

                          Foram mais de 17 mil ocorrências, equivalente a 2 roubos de carga por hora em 2023. Em termos mundiais, o Brasil só fica atrás do México no ranking dos países com maior número de roubos de carga.

                          Por fim, vale mencionar outro mercado sob forte pressão de práticas ilegais: conexões irregulares (“gatos”) e fraudes nos medidores de energia elétrica. Além de sério ônus para as distribuidoras de energia e riscos para a segurança das redes elétricas, o roubo de energia eleva o custo das tarifas pagas pelos consumidores regulares.

                          Estimativas realizada pela FGV Energia, indicam que em um período de dez anos, o consumo irregular de energia elétrica impactou a economia brasileira em cerca de R$ 46 bilhões. Esse valor é equivalente ao custo de construção de 9.200 escolas completas.

                          A diversificação das atividades ilícitas e o crescente envolvimento das organizações criminosas exigem estratégias integradas que combinem tecnologia avançada (como GPS, blockchain, inteligência artificial), cooperação interinstitucional das autoridades públicas, parcerias público-privada e engajamento do setor privado.

                          Medidas como rastreamento de produtos, combate aos devedores contumazes, incluindo confisco de bens e destinação social dos produtos apreendidos, fortalecimento da fiscalização, combate à lavagem de dinheiro e ampliação da gravidade penal das atividades ilícitas com finalidade comercial são essenciais para desmantelar as redes criminosas que operam nesses setores.

                          O reforço da fiscalização com o emprego crescentes de sistemas digitais e inteligência artificial é um caminho de ação a ser seguido, a exemplo da completa implementação do SISFRON – Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras. Outro exemplo de ação concreta é o combate a sonegadores contumazes de impostos que propõe o PLP 164/2022.

                          Também há espaço para o aprimoramento de programas de política pública, a exemplo da adição de biodiesel ao diesel (Combustível do Futuro), cuja verificação na bomba dos postos de combustíveis é mais complexa do que a do etanol, exigindo equipamento de alto custo. A mistura deveria ser responsabilidade do produtor ou importador do combustível, simplificando o processo de fiscalização da ANP.

                          Por fim, é igualmente importante a realização de campanhas públicas para sensibilizar a população sobre os impactos negativos dos mercados ilícitos e dos furtos de eletricidade na economia e na segurança pública. A implementação dessas recomendações pode reduzir significativamente os prejuízos socioeconômicos causados por esses mercados ilícitos.

                          Introdução

                          A Carta IEDI de hoje examina os impactos dos mercados ilícitos de produtos industriais, bem como dos roubos e furtos de energia e de roubos de cargas. As atividades ilícitas nesses mercados têm crescido e se diversificado, afetando empresas regulares tanto do setor industrial como do setor de comércio e serviços. 

                          Embora as estimativas variem em função da base de dados e metodologias utilizadas, a magnitude dos prejuízos econômicos causados pela produção informal, contrabando, descaminho, adulteração, falsificação, furto e o roubo é considerável. 

                          Por exemplo, segundo o Fórum Nacional contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), os prejuízos econômicos causados pelos mercados ilícitos no Brasil saltaram de R$ 100 bilhões em 2014 para R$ 410 bilhões em 2022, e atingiram R$ 480 bilhões em 2024. Desse total, R$ 140,2 bilhões referem-se à perda de arrecadação estimada.

                          Já os dados coletados pela Federação das Indústrias de São Paulo (FIESP) revelam que, em 2023, somente no estado de São Paulo, os mercados ilícitos movimentaram R$ 22, 5 bilhões, registrando um crescimento de 17,5% em relação ao ano de 2020, último ano pré-pandemia. Impostos da ordem R$ 10,5 bilhões deixaram de ser recolhidos, mais de 1,9 milhões de empregos formais não foram criados, os quais poderiam ter gerado R$ 4,8 bilhões em renda para os trabalhadores. 

                          Em termos de impactos econômicos, os mercados ilícitos acarretam enormes prejuízos diretos às empresas legais que cumprem com as normas tributárias e regulatórias, podendo ocasionar o fechamento de fábricas e perda de empregos. 

                           

                          Essa concorrência desleal pode igualmente desestimular investimentos diretos estrangeiros, prejudicando assim o desenvolvimento da indústria doméstica. De igual modo, os mercados ilícitos resultam em expressiva evasão fiscal significativa, privando os entes federados de vultosos recursos que poderiam ser destinados à saúde, educação e à infraestrutura. 

                          Do ponto de vista social, as atividades ilícitas de produção e comercialização de produtos industriais trazem riscos de desemprego, riscos à saúde pública e à segurança da população. 

                          De um lado, a concorrência desleal causada pelo mercado ilegal pode levar à redução de postos de trabalho em setores formais da economia. De outro lado, produtos falsificados, como bebidas, medicamentos, alimentos, cigarros, brinquedos ou agrotóxicos ilegais, podem representar sérios riscos à saúde e segurança dos consumidores devido à ausência de certificação e/ou controle de qualidade. 

                          Ademais, os mercados ilícitos estão cada vez mais associado a redes e organizações criminosas que utilizam os lucros para financiar outras atividades ilícitas, como tráfico de drogas e armas, bem como empregam empresas de fachada em mercados formais para “lavar” os recursos obtidos no tráfico de drogas. 

                          Como mostra o estudo recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), produtos de alto valor econômico, tributação elevada e grande circulação no mercado legal, como ouro, combustíveis, tabaco e bebidas, entre muitos outros, emergiram como novas fronteiras do crime organizado no Brasil. 

                          Apenas esses quatro setores movimentaram cerca de R$ 147 bilhões em 2022. O alto potencial de ganho e as penalidades mais brandas das atividades ilícitas de sonegação fiscal, contrabando, descaminho e falsificação, quando comparadas a crimes associados ao tráfico de armas e drogas, estimulam a reorientação das atividades do crime organizado para mercados ilícitos mais complexos.  

                          Os mercados ilícitos também podem causar graves danos ambientais. Esses são os casos, por exemplo, da mineração ilegal do ouro na região Amazônica, que acarreta desmatamento, contaminação dos rios com mercúrio, impactos na biodiversidade, etc., e dos agrotóxicos contrabandeados ou falsificados, que, além de contaminarem do solo e das águas, apresentam severos riscos à saúde.

                          Essa Carta IEDI foi elaborada com informações coletadas em fontes variadas, tais como notas, relatórios e bancos de dados de associações empresariais, como a FIESP, Fierj, CNI, ABRADEE, de organizações da sociedade civil, como o Fórum Nacional contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Instituto Escolhas, Instituto Combustível Legal (ICL), de empresas de consultorias, como a FGV Energia, empresas de monitoramento e segurança logística, como a Nstech e a OVERHUL, bem como matérias e artigos publicados em jornais, revistas e em websites. A relação do material consultado é apresentada no anexo.

                          Além dessa breve introdução, a presente Carta é composta de quatro seções. A primeira delas examina os mercados ilícitos de produtos de setores industriais diversos. A segunda seção analisa os mercados ilícitos de energia, aí incluídos combustíveis e energia elétrica. A terceira seção tem como foco os roubos e furtos de carga que afetam o setor de logística. A última seção, apresenta à guisa de conclusão, breves considerações finais.

                          Mercados ilícitos de produtos industriais 

                          Os mercados ilícitos no Brasil têm se expandido e diversificado, afetando diversos setores como mineração, vestuário, combustíveis, tabaco, bebidas, alimentos, medicamentos e transporte de cargas, entre outros. O contrabando, a fraude, a falsificação e o roubo de produtos industriais geram impactos socioeconômicos significativos. 

                          Além da concorrência desleal e dos prejuízos econômicos diretos nas empresas regulares, essas atividades afetam a arrecadação tributária dos entes federados, privando o governo de recursos que poderiam ser investidos em infraestrutura, saúde e educação, bem como trazem riscos à saúde e à segurança dos consumidores. 

                          Ainda que a pirataria pareça uma alternativa inofensiva para quem compra produtos mais baratos, suas consequências são severas. Combater essa prática é essencial para garantir um mercado mais justo e seguro.

                          Em 2024, de acordo com o Fórum Nacional contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), o Brasil registrou perdas econômicas da ordem de R$ 480 bilhões, em razão das atividades ilícitas nos mercados informais de produtos industriais. 

                          Esse montante representa as perdas consolidadas dos setores industriais brasileiros (R$ 327,8 bilhões) somadas ao montante estimados dos impostos federais e estaduais que deixaram de ser arrecadados (R$ 140 bilhões). 

                          Como pode ser observado no gráfico abaixo, os prejuízos econômicos causados pelos mercados ilícitos saltaram de R$ 100 bilhões em 2014 para R$ 410 bilhões em 2022, e se mantêm em trajetória de expansão. 

                           

                          Os dados do FNCP sobre os prejuízos econômicos causados mercados ilícitos, além da produção interna ilegal, das fraudes e da adulteração, incluem também o contrabando, o descaminho e a pirataria. É importante entender a diferença entre essas três atividades ilícitas:

                               •  O contrabando é a exportação ou importação de mercadorias proibidas por lei, tais como os produtos falsificados, agrotóxicos, medicamentos sem autorização da Anvisa. 

                               •  O descaminho é a entrada ou saída de mercadorias legais, mas sem o pagamento dos impostos devidos. Exemplos são produtos eletrônicos, roupas, alimentos importados sem o pagamento dos impostos.

                               •  A pirataria refere-se à reprodução e comercialização de mercadoria que não tem autorização da marca ou do direito autoral, nem certificação legal pela Anvisa, Anatel e pelo Inmetro. Essa atividade ilícita não necessariamente envolve uma mercadoria estrangeira, podendo ser fabricada igualmente Brasil. Exemplos são softwares, filmes, músicas, livros, medicamentos para tratamento de disfunção erétil e obesidade, produtos de marca falsificados.

                          Setores-alvo. Os setores industriais mais afetados pelas atividades ilícitas são os de vestuário, com perda direta estimada de R$ 87,4 bilhões, seguido de perto pelo setor de bebidas alcoólicas (R$ 85,6 bilhões). Como pode ser visto na tabela abaixo, na terceira posição aparece o setor de combustíveis (R$ 29 bilhões). 

                           

                          O setor de vestuário sofre o impacto das atividades ilícitas de descaminho e de falsificação com produção e comercialização de imitações de marcas famosas, bem como de furto e roubo de carga. As empresas regulares enfrentam a concorrência desleal de empresas ilícitas, que muitas vezes atuam por meio de pequenas oficinas informais terceirizadas, com exploração da mão de obra barata, inclusive de estrangeiros vítimas do tráfico humano, em ambientes insalubres e com condições de trabalho precárias. 

                          Além dos prejuízos econômicos diretos e da evasão fiscal, o mercado ilícito de vestuário acarreta também prejuízos para o consumidor, que adquire produtos de baixas qualidade e durabilidade. Mencione-se ainda os riscos relacionados à não observância de especificações técnicas de saúde na produção. 

                          O setor de bebidas alcoólicas tem sido igualmente um dos mais afetado por diversas atividades ilegais, prejudicando a economia formal, a competitividade da indústria, e a arrecadação fiscal. Tais atividades abrangem:

                               •  Falsificação - fabricação de bebidas com marcas falsificadas e/ou com reutilização de garrafas de marcas legítimas (refil);

                               •  Descaminho - importação ilegal de bebidas que entram no Brasil sem o pagamento de impostos;

                               •  Produção artesanal ilegal - fabricação de bebidas sem observar as regulamentações sanitárias e fiscais adequadas, comercializando seus produtos sem registro formal. 

                               •  Sonegação fiscal - venda de bebidas legais sem recolher os tributos obrigatórios, como IPI, PIS, COFINS e ICMS, resultando em grande perda de arrecadação tributária. 

                          De acordo com o estudo Follow the products: rastreamento de produtos e enfrentamento ao crime organizado no Brasil, publicado em fevereiro de 2025 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), que examinou as atividades das organizações criminosas em quatro setores __ ouro, combustíveis, bebidas e tabaco __, houve crescimento expressivo e alarmante na produção e distribuição de bebidas ilegais e nos montantes da sonegação fiscal relacionados. 

                          Por exemplo, entre 2016 e 2022, o volume de bebidas produzidas de forma ilícita saltou de 2 bilhões de litros para 5,3 bilhões de litros, e as perdas fiscais somaram cerca de R$ 78 bilhões no período.

                          Esse aumento foi impulsionado pela descontinuação do Sistema de Controle de Produção de Bebidas (SICOBE) da Receita Federal, que havia sido implementado em conjunto com a casa da Moeda em 2009, com o propósito de rastrear a produção de bebidas no Brasil e combater práticas como a sonegação fiscal, descaminho e o contrabando. Sob alegação de alto custo de manutenção, em torno de R$ 1,4 bilhão ao ano, a Receita Federal desativou SICOBE em 2016. 

                          Na avaliação da Receita Federal, o SICOBE foi superado por tecnologias mais modernas e eficazes, como a Nota Fiscal Eletrônica e o Bloco K, que monitoram a produção de maneira mais eficiente e a um custo bem menor. Contudo, a reativação do SICOBE ou a criação de um sistema similar, que permita o rastreamento eficiente da produção e a distribuição de bebidas no Brasil, permanece na pauta de reivindicações do setor junto ao Governo e ao Congresso. 

                          Em meados de agosto de 2024, o Tribunal de Contas da União (TCU) chegou a determinar que a Receita Federal, em conjunto com a Casa da Moeda, responsável pela fabricação dos selos e pela operacionalização do sistema, reativasse o SICOBE. Porém, essa decisão foi suspensa por liminar concedida à União pelo STF no início de abril de 2025.  

                          O mercado de bebidas ilícitas, que se beneficia da fragmentação dos canais de venda, com a crescente popularidade do comércio eletrônico e das mídias sociais, tornou-se um dos principais alvos de organizações criminosas que exploram esse mercado ilegal para práticas como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, contrabando e falsificação. 

                          Segundo o FBSP, as organizações criminosas já dominam a produção, distribuição e comercialização de bebidas. Em 2023, o mercado ilícito de bebidas movimentou R$ 56,9 bilhões no Brasil, o que corresponde a 25,7% do mercado nacional (legal e ilegal). A atuação das organizações criminosas nesse mercado resultou em sonegação fiscal estimada em R$ 28,2 bilhões.

                           

                          Na visão do FBSP, o envolvimento de facções criminosas brasileiras, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), no comércio ilegal de bebidas alcoólicas é uma realidade preocupante. Essas organizações diversificaram suas atividades ilícitas, incluindo o contrabando, descaminho e a distribuição de bebidas falsificadas.

                          No Rio de Janeiro, as milícias também têm se envolvido no comércio ilegal de bebidas. Esses grupos controlam a distribuição de produtos em áreas sob sua influência, impondo taxas a comerciantes locais e monopolizando a venda de determinadas mercadorias, incluindo bebidas alcoólicas. Essa prática não apenas gera lucros significativos para as milícias, mas também contribui para a manutenção de seu poder territorial e influência sobre a população local.

                          A ampliação dos prejuízos econômicos causados pelo mercado ilícito de bebidas indica que uma parte significativa do mercado está sendo abastecida por produtos fora dos canais legais. Embora isso possa resultar em preços mais baixos para o consumidor, uma vez que esses produtos escapam de tributos e regulamentações, também significa maior risco de adquirir bebidas de qualidade duvidosa, sem controle sanitário ou garantia de segurança.

                          O setor de combustíveis, que ocupa a terceira posição em termos dos prejuízos econômicos causados pelas atividades ilegais no ranking da FNCP, será objeto da sessão de Mercados Ilícitos de Energia. Contudo, é possível adiantar que diversos tipos de fraudes e crimes que têm gerado prejuízos bilionários ao setor, como a evasão fiscal, a adulteração de combustíveis e o uso de empresas de fachada. 

                          Segundo o estudo do FBSP, o setor de combustível tem se tornado de forma crescente alvo das organizações criminosas, como o PCC e o Comando Vermelho. Em 2022, o setor de combustíveis e lubrificantes foi a principal fonte de receita do crime organizado, gerando o equivalente a R$ 61,5 bilhões, montante muito superior do que o lucro estimado obtido com o tráfico e comercialização de cocaína: R$ 15 bilhões.

                          No setor de mineração de ouro, o crime organizado tem igualmente forte presença. De acordo com o FBSP, o vínculo da extração de ouro com o crime organizado é significativo e se dá principalmente por meio da lavagem de dinheiro, evasão fiscal e do controle ilegal de áreas de mineração. 

                          Os “narcogarimpos” conectam os garimpos ilegais ao tráfico de drogas e armas, compartilhando insumos como mercúrio, combustível, geradores, aeronaves e maquinário pesado. Operando em regiões remotas e com fiscalização limitada, esses grupos utilizam os lucros do ouro ilegal para financiar outras atividades ilícitas. 

                          O estudo do FBSP aponta que, entre 2015 e 2020, cerca de 38% da produção nacional total de ouro (da ordem de 611 toneladas) têm fortes indícios de ilegalidade. Nesse período, R$ 40 bilhões foram movimentados no mercado ilícito de ouro. Mais da metade (54%) desse ouro suspeito foi extraído de áreas protegidas e terras indígenas da Amazônia, com impacto significativo na devastação da floresta tropical. 

                          Nas terras indígenas, o crescimento do garimpo ilegal tem gerado impactos profundos. As consequências vão além da devastação ambiental e comprometem a saúde e o bem-estar das comunidades ribeirinhas e indígenas. Essas populações enfrentam a contaminação de suas terras e águas por substâncias tóxicas, como o mercúrio, amplamente utilizado na separação do ouro, que causam danos cerebrais, problemas de aprendizagem e desenvolvimento cognitivo em crianças, além de sérios distúrbios renais, cardiovasculares e imunológicos.

                          Pelos dados do FNCP, em 2024, as atividades ilícitas no mercado de ouro geraram prejuízos econômicos da ordem de R$ 12,7 bilhões. Grande parte desse ouro ilegal entra no mercado formal por meio de práticas de “lavagem”, com a utilização de documentos falsos que indicam uma origem legal, o que facilita sua comercialização e perpetua os impactos socioambientais negativos dessa cadeia produtiva. Essas práticas eram facilitadas pela presunção de boa-fé na comercialização do ouro, prevista na Lei 12.844 de 2013, que isentavam as empresas compradoras de ouro da obrigação de checar a real origem do metal. 

                          Segundo estudo do Instituto Escolhas, publicado em setembro de 2024, o pressuposto da boa-fé “criava uma situação de crime perfeito, pois o garimpeiro ilegal dizia que o ouro tinha origem lícita e a empresa compradora fingia que acreditava, e era muito difícil responsabilizar os envolvidos, pois tudo era considerado sendo feito de ‘boa-fé’”, 

                          Em março de 2023, a Receita Federal estabeleceu a obrigatoriedade de emissão da nota fiscal eletrônica para as transações de ouro, Em abril do mesmo ano, liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal suspendeu a presunção de boa-fé na comercialização do ouro. Ambas as medidas dificultaram a “legalização” de ouro ilegal. 

                          Como mostra o Instituto Escolhas, em 2022, quando a regra de presunção de ainda estava em vigor, os garimpos brasileiros produziram oficialmente 31 toneladas de ouro. Já em 2023, após a suspensão da regra pela liminar do STF, esse número caiu para 17 toneladas, uma queda de 45% sobre o ano anterior.

                          Mais recentemente, no dia 20 de março de 2025, o STF formou maioria pelo fim definitivo da presunção de boa-fé na comercialização do ouro. A partir dessa data, quem comprar ouro terá que comprovar a origem legal do minério, o que deve dificultar a comercialização do metal extraído de áreas ilegais. como terras indígenas e reservas ambientais.

                          O setor de tabaco é outro setor industrial que enfrenta sérios problemas com a concorrência desleal do contrabando, falsificação e produção e comercialização de produtos ilegais. Também é significativa, a presença e atuação do crime organizado no mercado ilícito de tabaco, do qual extraem receitas da ordem de R$ 10,5 bilhões. Em onze anos, as atividades ilícitas no mercado de cigarros geraram um prejuízo fiscal de R$ 94,4 bilhões.

                          De acordo com os dados do FBSP, os produtos ilegais já representam mais de 40% de toda a produção (legal e ilegal) do setor. Em São Paulo, enquanto um maço legal de cigarros é vendido por no mínimo R$ 6,50, é possível encontrar maços de cigarros falsificados a R$ 4. 

                          Os dados sobre apreensão e destruição de cigarros ilegais pela Polícia Rodoviária Federal evidenciam tanto os esforços contínuos de combate ao contrabando de cigarros quanto as respostas adaptativas das redes criminosas que operam esse mercado. Em 2019, houve apreensão de 11,5 milhões de maços de cigarros, volume que caiu para 7,5 milhões em 2021, e que deu um salto extraordinário no ano seguinte para 67,7 milhões de maços. Desde então, os volumes apreendidos declinaram para 61,8 milhões em 2023 e 58,6 milhões de maços em 2024.

                          Os prejuízos do crime organizado com o aumento das apreensões de cigarros contrabandeados e falsificados estimularam a fabricação local de marcas paraguaias. O PCC chega a trazer do Paraguai o papel e o selo usados nas embalagens dos cigarros de lá para aprimorar a falsificação feita em seus laboratórios aqui no Brasil. O crime organizado também busca mão de obra no país vizinho com know-how na fabricação de cigarros. Há denúncia de tráfico de pessoas e registros de imigrantes trabalhando em regime análogo à escravidão. 

                          De acordo com reportagem da TAB UOL, a fabricação local de cigarros no Brasil é peculiar porque reúne oficinas irregulares e empresas legais, mascarando irregularidades. No Rio de Janeiro, onde o cigarro da marca paraguaia Gift é o mais consumido, é possível encontrar o Gift paraguaio contrabandeado, o Gift fabricado clandestinamente pelo crime organizado e o Gift legal produzido pela empresa Quality In Tabacos, de Duque de Caxias (RJ).

                          Nas favelas, tal como acontece com a venda de bebidas, os comerciantes são forçados a vender apenas as marcas de grupos criminosos. Comercializados por unidade, os cigarros alcançam preço superior ao do atacado ou do varejo. 

                          No estado de São Paulo, o setor de tabaco foi o principal alvo das atividades ilícitas em 2023, como mostra a Tabela abaixo elaborada a partir dos dados do Anuário Mercados ilícitos transacionais em São Paulo produzido pela FIESP em 2024. Embora tenha como foco apenas o estado, esse anuário fornece informações adicionais sobre as atividades ilícitas, que afetam nove setores da indústria de transformação. 

                           

                          No estado de São Paulo, as atividades ilícitas no setor de tabaco movimentaram R$ 7,41 bilhões, o equivale a uma participação no total de mercado (legal + ilícito) de 30%. A perda de arrecadação tributária, federal e estadual, foi da ordem de R$ 4,3 bilhões. Quase a totalidade dos produtos ilegais comercializados no estado tem origem em outros países, em particular o Paraguai, como expresso na taxa de transnacionalidade (99,3%). Como consequência das atividades ilícitas nesse mercado, deixaram de ser gerados 1.127.624 empregos formais e R$ 3,17 bilhões em renda para os trabalhadores. 

                          De acordo com o Anuário da FIESP, o setor de químicos, que inclui combustível, lubrificantes, fertilizantes e defensivos agrícolas, é o segundo mais afetado pelas atividades criminosas. Em 2023, as atividades ilícitas nesse setor movimentaram R$ 3,89 bilhões, enquanto a perda de arrecadação totalizou R1,23 bilhões. No caso dos agrotóxicos, a participação da produção e comercialização ilícita corresponde a 25% da produção total. Não há informação disponível para a participação no mercado de combustíveis e lubrificantes. 

                          Na terceira posição, em termos de movimentação, aparece o setor de automóveis e autopeças (R$ 3,73 bilhões). Contudo, a participação dos produtos ilícitos no total do mercado é bem pequena: apenas 1,6%. De acordo com a FIESP, o mercado ilícito de automóveis e autopeças é alimentado por meio de roubos e furtos, e posterior adulteração de numeração e características dos veículos e venda de peças avulsas após o desmanche dos veículos, bem como tráfico de veículos. O percentual de veículos ou peças traficados pelas fronteiras, onde redes criminais operam especialmente com Paraguai e Bolívia, é de 28,77% do valor total, o que indica a alta participação do descaminho.

                          No setor de higiene, que inclui tantos os produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos como os de produtos de Higiene, Limpeza e Saneamento de Uso Doméstico e de Uso Profissional, o mercado ilícito movimentou no mínimo R$ 2,21 bilhões em 2023, o que representa, aproximadamente, 9,96% do total do setor (lícito e ilícito), com uma taxa transacional de 9,44%. Nesse setor, deixaram de ser recolhidos R$1,2 bilhão, deixaram de ser criados 86.532 empregos formais, que poderiam ter gerado renda de R$ 149,58 milhões para os trabalhadores.

                          Além dos prejuízos econômicos para as empresas legais, a produção e comercialização de produtos ilícitos de higiene traz risco à saúde dos consumidores. Como são elaborados com matérias-primas fora dos padrões exigido pela Anvisa, esses produtos podem acarretar inúmeros problemas, tais como alergia, irritação cutânea, avermelhamento, coceira, inchaço, etc..

                          O setor do vestuário é um dos mais afetados pela falsificação e descaminho. Como visto acima, esse setor registra, os maiores prejuízos causados pelas atividades ilícitas em termos nacionais. No estado de São Paulo, ele aparece na 5ª posição em termos de movimentação anual: R$ 2,9 bilhões, o que corresponde a 11,91% do total do setor. Em consequência das atividades criminosas, deixam de ser arrecados quase R$ 1 bilhão de tributos, bem como deixam de ser criados cerca de 524.320 empregos formais

                          De acordo com a FIESP, as organizações criminosas que operam nesse mercado estão cada vez mais sofisticadas, terceirizando e segmentando as linhas de produção de falsificações de marcas consagradas, atuando como fábricas ilegais. O setor ilícito de vestuário setor opera com uma taxa de transnacionalidade de cerca de 98,73%. Nesse mercado transnacional vasto e dinâmico, destacam-se como principais fornecedores externos dos operadores ilícitos a China e o Paraguai.

                          No setor de medicamentos, embora apareça em última posição em termos de movimentação em 2023 (R$ 232,63 milhões) no Anuário da FIESP, o mercado ilícito tem crescido, estimulado pelo surgimento de novos fármacos com preços elevados, o que gera oportunidade para a falsificação, pirataria e roubo de farmácias e cargas com estes produtos. 

                          Com o avanço descontrolado das redes sociais nas plataformas online, as organizações criminosas ampliaram seus canais de venda de medicamentos falsificados, pirateados e/ou provenientes de furtos e roubos farmácias e de cargas, aproveitando a falta de informação da população sobre os efeitos do uso de medicamentos não regularizados e, principalmente, a possibilidade de ter medicamentos de difícil acesso legal, como antibióticos, anti-inflamatórios anabolizantes, psicofármacos e outros estimulantes, e/ou de alto custo, como tratamento de câncer, mal de Alzheimer, diabetes e obesidade. 

                          Cada vez mais sofisticados, os criminosos têm utilizado, impunimente, as tecnologias de inteligência artificial generativa para criar anúncios com vídeos falsos (deepfakes) com personalidades midiáticas e médicos renomados fazendo propaganda de falsos medicamentos.

                          É grande a lista de medicamentos comercializados no mercado ilícito, mas os principais destaque são os medicamentos para disfunção erétil e os remédios para emagrecer. Muitos desses produtos são fabricados, com matéria-prima vinda da China e da Índia, em laboratórios clandestinos, sem nenhum controle higiênico e, principalmente, sem o princípio ativo na dose certa. 

                          Segundo a FIESP, as atividades ilícitas no setor de medicamentos, que apresentam uma alta taxa de transnacionalidade (88%), impediram a geração de 8.837 empregos formais e de R$ 48,42 milhões em renda dos trabalhadores. Também deixaram de ser recolhidos R$ 59,39 milhões em impostos.

                          Os mercados ilícitos causam evidente prejuízo à competitividade das empresas industriais brasileiras, que incorrem em elevado custo de autoproteção, com contratação de segurança privada e de seguro contra furtos e roubos. 

                          Na avaliação da FIESP, o controle e enfrentamento das atividades ilícitas passa pela construção de soluções incrementais, na forma de novas políticas públicas de controle do crime economicamente motivado, centrada em melhoria da governança, que: i) aumentem os custos de transação dos mercados ilícitos; desestruturem a cadeia logística ilícita; e, iii) descapitalizem, sobretudo, os operadores atacadistas dos mercados ilícitos. 

                          Também é essencial adotar uma estratégia de integração público-privada, com ênfase em mercados específicos, e promover a modernização da legislação penal e da regulação fiscal e sanitária, de modo a aumentar o custo do crime, por meio da dissuasão e incapacitação dos criminosos que operam e lucram com mercados ilícitos.

                          Mercados ilícitos de energia

                          As atividades ilícitas no setor de energia geram vultosos prejuízos econômicos, tanto em termos de perdas diretas de receita para as empresas de distribuição de combustível e distribuidoras de energia elétrica como em termos de perdas de arrendação tributária. Ademais, o mercado ilícito de combustíveis, como já mencionado, é o mais lucrativo para o crime organizado no Brasil.

                          Roubos, furtos e adulteração de combustíveis. O setor de combustível é um dos mais impactados por roubos, fraudes, adulteração e outras práticas ilícitas que, além de gerar danos aos consumidores, comprometem a arrecadação tributária e afetam a concorrência no mercado. 

                          Estima-se que a comercialização ilegal atinja 13 bilhões de litros anuais, causando perdas fiscais de R$ 23 bilhões. A extensão do mercado brasileiro, no qual operam cerca de 43 mil postos de revenda, na prática impedem uma atuação frequente e integrada no combate às fraudes identificadas. 

                          De acordo com o Instituto de Combustível Legal (ICL), entidade criada e mantida pelas grandes empresas distribuidoras de combustíveis com o intuito de combater fraudes e promover a legalidade no setor, as fraudes e a sonegação de tributos geram, em 2024, um prejuízo anual de aproximadamente R$ 30 bilhões. Apenas com a sonegação fiscal, a União e demais entes federados perdem mais de R$ 14 bilhões por ano.

                          Segundo o relatório do banco Bradesco de Investimento (BBI), “Fight vs. Fuel Informality Gains Momentum – Assessing Upside for Public Revenues and Distributors”, divulgado pela imprensa em setembro de 2024, o mercado ilegal de combustíveis reduz em quase 15% os lucros das grandes companhias que atuam regularmente no setor. 

                          Anualmente, mais de R$ 1,5 bilhão em perdas impactam direto no Ebitda (lucro antes de impostos, juros, depreciações e amortizações) das três dos maiores players do mercado - Vibra, Raízen e Ultrapar/Ipiranga -, que concentram pouco mais de 40% do setor.

                          Práticas como importações fraudulentas, roubos e furtos de cargas e dutos, adulteração de produtos, endividamentos contínuos (devedores contumazes) e empresas que são utilizadas como “barrigas de aluguel”, mistura clandestina e postos de gasolina irregulares estão entre as principais atividades ilegais que afetam o mercado brasileiro de combustíveis. Também são problemas do setor, a sonegação fiscal, inadimplência e uso irregular de benefícios fiscais.

                          Para os governos, uma das práticas mais danosas é a da “barriga de aluguel”, que, segundo o relatório, é mais comum no mercado de etanol, onde a usina vende direto aos postos, se utilizando de uma distribuidora fictícia, que emite notas fiscais “frias”. Essas empresas de fachada acumulam dívidas fiscais entre R$ 500 milhões e R$ 1 bilhão por ano. Além da sonegação e o acúmulo de dívidas, essas empresas de fachada também deixam de pagar mais de R$ 173 milhões em créditos de carbono por ano.

                          Outra irregularidade frequente no setor de combustível é a do devedor contumaz: empresas que operam legalmente, por 4 a 6 anos, sonegando o imposto e acumulando débitos fiscais. Para fugir das cobranças, essas companhias recorrem de autuações fiscais e obtêm liminares que permitem a manutenção da operação até que o mérito do caso seja julgado. Terminam por fechar as portas antes da falência e outras assumem as operações anteriores, geralmente com sócios que possuem conexões com as operações pretéritas. Estima-se que o valor de dívida ativa registrada somente com dívidas de ICMS ultrapasse R$ 65 bilhões. Menos de 1% desse valor é recuperado pelos estados.

                          A importação fraudulenta também afeta a arrecadação tributária. No caso de importações via Zona Franca de Manaus, por exemplo, mais de R$ 230 milhões são desviados por ano. As empresas importam diesel e gasolina, misturam com biocombustíveis e classificam o produto como industrializados, aproveitando a isenção de impostos federais para os industrializados vendidos na Zona Franca. Essas empresas repassam o combustível para outros estados e operam com liminares judiciais para postergar a análise dos processos. 

                          Outra irregularidade que afeta o mercado formal de distribuição destacada no relatório do BBI é a venda de nafta, óleo de petróleo parcialmente refinado, como gasolina. As empresas distribuidoras regulares perdem R$ 3,2 bilhões por ano em receitas devido essa prática. 

                          O estado do Amapá, que adota um regime especial de importação, é a principal porta de entrada desse derivado de petróleo. De acordo com a imprensa, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) vem tentando, desde abril de 2024, coibir a instalação desses regimes especiais. No entanto, no caso da nafta, há uma brecha normativa, já que ela não é considerada combustível durante o ato de importação, apesar de ser um insumo para a fabricação de gasolina. 

                          O aumento dos casos de fraudes ligadas ao teor de biodiesel na mistura do diesel comercializado, sobretudo na região Nordeste, tem igualmente preocupado executivos de grandes e médias distribuidoras de combustíveis do País. O combustível tem sido fornecido sem a adição obrigatória do bicombustível (14% desde março de 2024) a postos de abastecimento ou aos chamados transportadores revendedores-retalhistas (TRR), que abastecem grandes consumidores como indústrias e hospitais.

                          As fraudes têm aumentado, principalmente, nos estados onde há importação de diesel ou que são irrigados pelas cargas estrangeiras, provenientes da Rússia, Kuwait e Emirados Árabes. Boa parte desse diesel importado vem sendo levado puro diretamente aos clientes finais a preços abaixo do mercado regular. Com essa prática de concorrência desleal, os agentes irregulares conquistam fatias de mercado em detrimento das empresas legítimas do setor.

                          A adulteração (ou redução da qualidade) do produto é ainda uma prática constante no mercado ilícito de combustíveis. Mesmo com bombas de combustível mais automatizadas e capazes de detectar fraudes no produto, o consumidor é ludibriado e compra, neste caso, um combustível fora das especificações técnicas ou em volume inferior ao registrado na bomba, com prejuízos para si próprio, para seus veículos e para a economia.

                          O setor de combustíveis no Brasil tem atraído o interesse de diversas organizações criminosas, que exploram oportunidades nessa cadeia produtiva não apenas para a lavagem de dinheiro, mas também para a maximização de lucros por meio de esquemas de fraude fiscal e adulteração. Essas práticas criminosas têm implicações significativas para a economia formal e a arrecadação tributária.

                          Além da fraude nas bombas e adulteração de produtos, inúmeros donos de postos de gasolina de varejo ampliam seus lucram com o uso seus pontos de venda para lavar dinheiro para organizações criminosas. Como já mencionado, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o crime organizado lucra mais com o comércio de combustíveis do que com o tráfico de cocaína. Entre 2022 e 2023, o crime organizado lucrou R$ 61,5 bilhões com atividades ilícitas com combustíveis e lubrificantes, enquanto o lucro com cocaína foi de R$ 15 bilhões. 

                          Um exemplo relevante é a “Operação Rei do Crime”, deflagrada em 2020 pela Polícia Federal, e que revelou um esquema bilionário de lavagem de dinheiro operado pelo PCC. A investigação identificou que o grupo utilizava uma complexa rede de empresas de fachada, incluindo postos de combustíveis e distribuidoras, para movimentar aproximadamente R$ 32 bilhões em um período de quatro anos.

                          Em fevereiro de 2024, a “Operação Boyle”, desencadeada pela Polícia Federal, encontrou novas evidências do envolvimento do crime organizado no mercado de combustível. Nessa operação, os policiais federais desvendaram uma rede de mais de 1.100 postos vinculados ao PCC, supostamente utilizada para lavar dinheiro oriundo do tráfico de drogas.

                          As investigações identificaram organizações criminosas atuantes no setor de combustíveis, especialmente por meio da adulteração de etanol e gasolina com metanol, prática que inclui também a constituição de empresas de fachada para lavagem de dinheiro e a corrupção de agentes públicos visando à manutenção do esquema criminoso, nem como manipulação de notas fiscais e operações interestaduais fraudulentas para evitar a tributação.

                          Em meados de abril de 2025, Polícia Federal em São Paulo, em conjunto com o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público de São Paulo (GAECO-SP), deflagrou a segunda fase da “Operação Boyle”. O objetivo dessa segunda fase é combater uma organização criminosa suspeita de utilizar álcool metílico (metanol) de forma irregular na adulteração de combustíveis fornecidos aos consumidores.

                          Segundo informações divulgadas pela Folha de S. Paulo no dia 21 de abril de 2025, estão atualmente sendo investigados por autoridades federais e estaduais 941 postos de combustíveis localizados em 22 estados. Em São Paulo, foram identificados 290 postos sob suspeita, seguido por Goiás com 163, Rio de Janeiro (146), Bahia (103) e Rio Grande do Norte (88). Há indícios de atuação do PCC, Comando Vermelho e Família do Norte no setor, bem como de milícias.

                          Medidas recomendadas pelos representantes das empresas lícitas do setor, incluem: 

                               •  Fortalecimento da tributação monofásica, na qual o recolhimento de tributos é feito na fase inicial da cadeia produtiva, ou seja, o recolhimento é feito pela indústria ou do importador responsável pelo produto.

                               •  Implementação de sistemas nacionais integrados para rastreamento logístico.

                               •  Cooperação entre ANP, Receita Federal e forças policiais.

                               •  Aprovação da legislação contra devedores contumazes.

                          Fraudes e furtos de energia elétrica. O consumo irregular de energia representa um dos principais desafios do setor elétrico brasileiro. Esse consumo pode resultar de:

                               •  Furtos (“gatos”): uma conexão paralela (ou by-pass) é feita para se obter energia da rede elétrica da concessionária, sem registro do consumo; ou

                               •  Fraudes: quando o consumidor rompe o lacre do medidor e manipula o consumo marcado no medidor com o objetivo de reduzir o valor a pagar.

                          Essas práticas ilícitas afetam diretamente a economia, a segurança das redes elétricas e a qualidade do fornecimento de energia para milhões de consumidores, bem como eleva o custo das tarifas de energia. 

                          A energia furtada sobrecarrega a rede elétrica, aumentando a probabilidade de falhas e danos aos equipamentos. Além disso, oscilações e interrupções no fornecimento prejudicam tanto residências quanto empresas, bem como hospitais e escolas, que dependem de um suprimento estável de eletricidade.

                          Os furtos e fraudes de eletricidade integram, junto com os erros de medição, as denominadas perdas não técnicas (PNT) reais, as quais são parcialmente repassados aos consumidores por meio dos processos de revisão tarifária. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e os órgãos reguladores estaduais estabelecem metas de redução dessas perdas para cada área de concessão tendo em vista características socioeconômicas dessas regiões. 

                          A regulação reconhece que uma parcela das PNT reais, a chamada de perdas regulatórias (PNT regulatória), não é passível de redução por parte das empresas distribuidoras de energia, portanto, seus custos são impostos a todos os consumidores por meio da tarifa de energia elétrica. Isso significa que, indiretamente, todos os consumidores brasileiros acabam arcando com os custos do consumo irregular de energia.

                          A diferença entre o total de PNT reais e as PTN regulatórias são custeados pelas distribuidoras. Na medida em que, as PNT aumentam, a sustentabilidade econômica e financeira das empresas concessionárias de distribuição de energia pode ser ameaçada. 

                          Em 2023, como se observa no gráfico abaixo, a meta de perdas regulatórias passíveis de transferência para os consumidores foi de 10,6%, enquanto as perdas reais atingiram 16,9%. Isso significa que cerca de 6,3% do total de energia furtada se traduziu em prejuízo direto para as distribuidoras.

                           

                          De acordo com os dados da Aneel, as perdas não técnicas totalizaram 40,7 Terawatt-hora (TWh) em 2023, um aumento de 19,3% em comparação a 2022 (34,2 TWh). Esse volume do consumo irregular de energia representa 17% da energia elétrica consumida no país, e equivale ao suficiente para abastecer 13 estados e o Distrito Federal. Segundo a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), essas perdas geraram um impacto financeiro da ordem de R$ 10,1 bilhões. 

                          Segundo estudo __ “Panorama das perdas não técnicas no Brasil e o potencial de aplicação dos sistemas de medição centralizada para mitigação dos impactos” __ publicado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) Energia em 2024, com dados de 2022, em dez anos, o consumo irregular de energia impactou a economia brasileira em cerca de R$ 46 bilhões. Esse valor é equivalente ao custo de construção de 9.200 escolas completas. 

                          Os furtos e fraudes de energia são motivados por uma combinação de fatores econômicos, sociais e de segurança pública. Embora o furto de energia seja classificado como crime pelo artigo 155 do Código Penal brasileiro, com pena de até quatro anos de reclusão e multa, enquanto a fraude é classificada, como crime de estelionato, pelo artigo 171, o número de condenações é pequeno. 

                          A prática é amplamente difundida e não se limita a regiões com alta vulnerabilidade social. Os furtos e as fraudes também ocorrem em áreas de maior poder aquisitivo e em estabelecimentos comerciais e industriais, onde as distribuidoras possuem maior capacidade de intervenção e fiscalização.

                          Dentre as regiões brasileiras, a Norte é a mais atingida pelos furtos, com 46,2% de perdas sobre o seu mercado de baixa tensão em 2023. Na sequência, aparece a região Sudeste, com 18,8% do total, seguida pela Nordeste, com 13,5%, ocupando o terceiro lugar no ranking.

                          No que se refere aos estados, os dados de 2023 mostram que o Rio de Janeiro lidera o ranking de furtos de energia no Brasil, seguido por São Paulo, Amazonas, Amapá, Pará e Rondônia. O problema do consumo irregular de energia se agrava em locais onde o crime organizado impede a fiscalização e a correção das ligações clandestinas, dificultando a atuação das distribuidoras no sentido de reduzir os furtos e as fraudes nos medidores.

                          No Rio de Janeiro, as maiores distribuidoras do estado, Light e Enel Distribuição Rio, são players que mais sofrem com os as fraudes e os “gatos” de energia. A área de concessão da Enel RJ é o interior do estado, Niterói e São Gonçalo, enquanto a Light tem a concessão para a capital e a maior parte da região metropolitana. 

                          No estado do Rio, onde o consumo ilegal de energia atingiu 11,27 milhões de MWh em 2023, os furtos e fraudes não são praticados, contudo, apenas por consumidores residenciais de baixa renda. As classes média e alta, o segmento comercial e indústrias também cometem irregularidades. Inúmeras empresas eletrointensivas, como fábricas de sorvete e gelo, instalam-se na parte alta dos morros por ser área de difícil acesso e mais fácil para praticar ilegalidades. 

                          Já no caso do Amazonas, o consumo irregular de energia elétrica não só está enraizado na cultura da população como também recebe apoio político. De acordo com a FGV Energia, em julho de 2022, foi aprovada a Lei estadual nº 5.981, que vetava a instalação de medidores inteligentes com vistas à redução das fraudes e furtos. Contudo, essa lei foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal de Justiça, dada a interferência indevida na relação contratual estabelecida entre concessionária de energia elétrica e a União. 

                          Os efeitos do consumo irregular de energia permeiam diversos aspectos da conjuntura socioeconômica brasileira. Além dos custos diretos do furto de energia pagos na conta de luz, os furtos e as fraudes impactam as finanças das concessionárias e a qualidade de vida da população que sofre com custo com interrupções do fornecimento, bem como a arrecadação fiscal. 

                          A perda de arrecadação tributária decorrente da eletricidade consumida e não registrada devido as práticas ilegais foi da ordem de R$ 1,8 bilhão em 2022. O estado do Rio de Janeiro sozinho registrou um prejuízo tributário de R$ 780 milhões, dos quais R$ 550 milhões correspondem às perdas de arrecadação do ICMS.

                          As distribuidoras de energia têm investido em tecnologias avançadas, como os Sistemas de Medição Centralizado (SMC), para enfrentar o problema do consumo irregular. Os SMC utilizam medidores inteligentes instalados externamente às unidades consumidoras, permitindo o monitoramento contínuo do consumo, facilitando a identificação de perdas, seja por defeitos no equipamento ou por fraudes, e a suspensão automática do fornecimento em casos de inadimplência. Atualmente o Brasil conta com mais de 3 milhões de unidades do SMC instaladas em residências de pelo menos 16 estados. 

                          Ao adotarem os sistemas de medição centralizada, as distribuidoras tendem a realizar adequações também na estrutura das redes elétricas, que melhoram a disponibilidade de energia para o consumidor mediante a redução de interrupções de fornecimento. Com isso, as concessionárias de energia conseguem coibir conexões fraudulentas e/ou clandestinas e melhorar a qualidade do serviço. 

                          Porém, a implementação desses sistemas enfrenta desafios, como a resistência de grupos criminosos e a necessidade de investimentos expressivos na modernização da infraestrutura elétrica. O combate às perdas não técnicas no setor elétrico reforça a necessidade de ações coordenadas para mitigar os prejuízos econômicos e sociais

                          O estudo da FGV Energia, mencionado acima, apontou que uma expansão estruturada do uso dos Sistemas de Medição Centralizada poderia resultar em uma redução dos custos das perdas não técnicas, na ordem de R$ 1 bilhão ao ano.

                          A ampliação do uso de novas tecnologias, como a inteligência artificial (IA), também pode contribuir para a redução dos furtos e fraudes. As imagens de satélite já possibilitam o monitoramento de grandes áreas, tornando possível a identificação de regiões suspeitas de fraudes ou furtos. Com utilização de IA, essas imagens podem ser analisadas de forma rápida e eficaz, gerando padrões e previsões de comportamento, viabilizando ações mais direcionadas pelas distribuidoras para reduzir as perdas não técnicas.

                          A conscientização da população sobre o uso correto da energia elétrica é uma outra medida eficaz para reduzir as PNT de energia. Programas educativos que ensinem os consumidores sobre a importância de evitar fraudes e desperdícios podem ter um impacto significativo na redução das perdas não técnicas. Com uma maior compreensão das consequências financeiras e ambientais das perdas de energia, a tendência é que os consumidores colaborem de forma mais proativa.

                          Logística e Roubo de cargas

                          O roubo de cargas é um desafio crescente para as cadeias logística no Brasil, especialmente em estados como São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo dados da Associação Nacional do Transporte de Carga e Logística, divulgados pela imprensa, em 2023, foram registradas perdas estimadas em R$ 1,2 bilhão, um aumento de 4,8% em relação a 2022, devido a mais de 17 mil ocorrências, equivalente a 2 roubos por hora. Em termos mundiais, o Brasil só fica atrás do México no ranking dos países com maior número de roubos de carga.

                          No Brasil, o roubo de cargas durante o trajeto em ruas e rodovias é o principal tipo evento, representando 81% das ocorrências. Em seguida, vem o furto (14%), o roubo de armazéns e centros de distribuições (4%) e as fraudes (1%). Ou seja, 84% dos roubos de carga ocorrem com uso de violência. 

                          Entre 2019 e 2023, o mercado segurador desembolsou mais de R$ 2 bilhões em indenizações por cargas roubadas no país, de acordo com a Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg).

                          As empresas de logísticas têm investido pesadamente em segurança, com custos que chegam a 2-3% da receita bruta. Além de seguro contra roubos, as medidas incluem rastreamento em tempo real e câmeras de vigilância, entre outras. No entanto, o problema persiste. E, o mercado de logística reage ao aumento as despesas, repassando os custos para os consumidores, o que afeta os preços em geral. 

                          De acordo com o Relatório anual de 2024 sobre roubo de cargas no Brasil da OVERHAUL, empresa de serviços de avaliação de riscos na cadeia de logística, 95% dos roubos de carga registrados em nível nacional no ano de 2024 ocorreram em dez estados. 

                          Como zonas econômicas mais importantes do país, e, portanto, com maior movimentação de mercadorias, São Paulo e Rio de Janeiro concentram 72% das incidências, com, respetivamente, 43% e 29% dos roubos de cargas. O estado de Minas Gerais ocupa a terceira posição, com 6% das ocorrências.

                          Segundo o estudo da Nstech - “Report nstech de roubo de cargas”, versão anual 2024 -¸ considerada a maior plataforma de software para cadeias de suprimento da América Latina, a região Sudeste foi, disparadamente, a recordista em prejuízos envolvendo o roubo de cargas no ano de 2024. Mais de 80% do valor sinistrado ficou concentrado na região. Na classificação das demais regiões, o Nordeste somou 11,7% dos sinistros, à frente do Sul (2%), Centro-oeste (1,8%) e Norte (0,9%).

                          De acordo com os dados das operações monitoradas pela BRK, Buonny e Opentech, empresas do grupo Nstech, o estado de São Paulo totalizou 45,8% dos sinistros. Em seguida, aparecem Rio de Janeiro (25%) e Minas Gerais (12,1%). Os demais estados brasileiros registraram, individualmente, menos de 4% dos prejuízos. O relatório destaca o forte aumento prejuízo causo pelo roubo de cargas no Rio de Janeiro, que subiu de 18,9% para 25% na comparação entre 2023 e 2024.

                          Ainda que, no Brasil, o roubo de cargas seja um problema de longa data, refletindo deficiências de infraestrutura, a ampliação do comércio eletrônico contribuiu significativamente para o aumento dos roubos de carga. Com o surgimento das compras pela Internet e, consequentemente, a maior exposição de cargas nas operações de transferência e distribuição, as quadrilhas têm explorado esse crescimento, intensificando os ataques. 

                          Segundo a Nstech, o segmento de cargas fracionadas é o que registra a maior incidência de roubos. Em 2024, as cargas fracionadas, pequenas quantidades de mercadorias de vários clientes, em geral compradas online, transportadas em um mesmo veículo, responderam por 52,3% dos roubos (ver tabela abaixo), seguidas por gênero alimentício (20,1%), eletrônicos e componentes (11,7%) e higiene e limpeza (4,5%). 

                           

                          De acordo com a Overhaul, o Sudeste é responsável por impressionantes 96% dos roubos de cargas fracionadas, seguido pelo Nordeste. O Sul e o Norte são a terceira e quarta regiões com mais ocorrências e, por último, a região Centro-Oeste. 

                          Esta repartição regional reforça a necessidade de medidas de segurança específicas nas áreas mais vulneráveis para mitigar o risco de roubo. Ao tomar medidas proativas para melhorar a segurança, as empresas podem proteger os seus ativos, manter a confiança do consumidor e garantir o crescimento contínuo e o sucesso das operações de comércio eletrônico.

                          Em termos espaciais, os maiores prejuízos por roubo de cargas são registrados nas áreas urbanas. Em 2024, a sinistralidade nos trechos urbanos subiu significativamente, alcançando 34,1% (ante 24,3% em 2023). Nos trechos urbanos, as operações mais visadas foram aquelas com cargas fracionadas (50,8%), alimentos (34,6%) e cigarros (6,3%).

                          No estado de São Paulo, o prejuízo com roubos de carga nos trechos urbanos representou 32,8% do total em 2024. Os principais alvos das quadrilhas foram as cargas fracionadas (58,9%), alimentos (16,1%) e componentes eletrônicos (11,1%). As demais cargas - como eletrônicos, cigarros, siderúrgicos, têxtil etc. - não passaram de 4% cada.

                          No estado do Rio de Janeiro, mais de 60% do valor sinistrado foi registrado em trechos urbanos em 2024. O tipo de carga mais roubada foi a fracionada, que somou 47% dos prejuízos, seguidos por alimentos (27,1%). Entre as cidades do estado do Rio de Janeiro, a capital concentrou um total de 59,4% dos sinistros, bem à frente de Duque de Caxias (13,7%) e São Gonçalo (6,3%).

                          Em Minas Gerais, os maiores sinistros ficaram com cargas fracionadas (61,8%) e alimentos (21,9%), seguidos por higiene e limpeza (8,9%). Os trechos urbanos aparecem com 13,1% do total em 2024 (ante 4% em 2023). Em Minas Gerais, a rodovia mais crítica para os roubos de carga é a BR-38, que liga São Paulo ao Espírito Santo. Também conhecida como Fernão Dias, essa rodovia concentrou 32,2% do valor dos prejuízos de roubo de cargas no estado. 

                          De acordo com as Nstech, em primeiro lugar, entre as rodovias com maior percentual de sinistros, aparece a BR-116, uma das rodovias mais longas do País, com 4.385 km de extensão e que corta 10 estados, ligando Fortaleza, no Ceará, a Jaguarão, no Rio Grande do Sul. Essa rodovia concentra 12,0% dos prejuízos totais. As quadrilhas que atuam na BR-116 tiveram como alvo, além das cargas fracionadas (65,4%), produtos de higiene e limpeza (19,8%), que juntos somaram 84,8% do valor sinistrado na BR-116 em 2024. 

                          O trecho de 410 km entre São Paulo e Rio de Janeiro da BR-116, conhecido como Rodovia Presidente Dutra, foi responsável por 73% da incidência de roubo de carga nessa estrada em 2024. Na Dutra, os principais alvos dos criminosos foram: carga fracionada (22%), veículos e autopeças (18%), alimentos e bebidas (16%), tabaco (10%) e eletrônicos (9%).

                          Em segundo lugar, aparece a BR-101, outro importante eixo rodoviário do Brasil, que concentra 7,0% dos sinistros totais. Nessa rodovia, que liga a cidade de Touros, no Rio Grande do Norte, até São José do Norte, cidade localizada no Rio Grande do Sul, as cargas fracionadas corresponderam a 46,3% do total dos prejuízos. Na sequência, aparecem os roubos de cargas de alimentos e medicamentos, representando, cada uma, cerca de 15% dos prejuízos.

                          Em terceiro lugar, a Anhanguera (SP-330), que liga São Paulo à região noroeste do estado, é a rodovia de maior risco para o transporte de cargas do estado. No 2024, a SP-330 concentrou do 7,0% do total dos valores sinistrados no País. 

                          Os especialistas da Overhaul e da Nstech sugerem que para combater a ameaça crescente do roubo de cargas, as empresas de logística devem investir em estratégias de segurança abrangentes. Estas devem incluir tecnologia avançada, como localização por GPS e monitoramento em tempo real, inteligência operacional para antecipar e mitigar riscos, análise de dados para identificar padrões e vulnerabilidades, e múltiplas camadas de proteção, incluindo medidas de segurança física e colaboração com as autoridades responsáveis pela aplicação da lei. 

                          Considerações finais

                          Os mercados ilícitos no Brasil geram impactos significativos na economia formal, na arrecadação tributária e na segurança pública. A diversificação das atividades criminosas e o crescente envolvimento das organizações criminosas, como PCC, Comando Vermelho e milícias, exigem estratégias integradas que combinem tecnologia avançada (como GPS, blockchain, inteligência artificial), cooperação interinstitucional das autoridades públicas, parcerias público-privadas e engajamento do setor privado. 

                          Medidas como rastreamento de produtos combate aos devedores contumazes, incluindo confisco de bens e destinação social dos produtos apreendidos, fortalecimento da fiscalização, combate à lavagem de dinheiro e ampliação da gravidade penal das atividades ilícitas com finalidade comercial são essenciais para desmantelar as redes criminosas que operam nesses setores. 

                          Também é importante a realização de campanhas públicas para sensibilizar a população sobre os impactos negativos dos mercados ilícitos, sobretudo das falsificações, bem como dos furtos de eletricidade na economia e na saúde pública. A implementação dessas recomendações pode reduzir significativamente os prejuízos socioeconômicos causados por esses mercados ilícitos. 

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