Carta IEDI
O Brasil nas cadeias globais de valor
O Brasil continua muito mal integrado nas cadeias globais de valor, mas tem havido algum progresso, segundo os últimos dados divulgados recentemente pela OCDE. Importante reconhecer, porém, que a melhora na maioria dos indicadores não chegou a ser expressiva e, muito provavelmente, foi influenciada pela crise do mercado doméstico que forçou certo redirecionamento de nossas empresas para o mercado exterior.
Depois de cinco anos sem atualização, no final de 2018, a OCDE divulgou novos dados da TiVA (Trade in Value Added), sua base de dados sobre comércio intenacional em valor adicionado. Assim, esta importante fonte de informações sobre as cadeias globais de valor (CGV) passaram a cobrir um intervalo de tempo que vai até 2015 ou 2016, dependendo do indicador. Esta Carta IEDI tratará destes novos dados, enfatizando a posição do Brasil vis-à-vis o restante do mundo.
Três indicadores são comumente utilizados para avaliar a integração do sistema produtivo de um país às cadeias internacionais: (1) a parcela reexportada do total dos bens intermediários importados; (2) encadeamento para trás, que se refere ao valor adicionado importado contido nas exportações brutas de um país; e (3) encadeamento para frente, que se refere ao valor adicionado de um país contido nas exportações do resto do mundo como proporção e suas próprias exportações brutas.
Em 2015, na maioria destes indicadores o Brasil ficou em posição inferior à média OCDE, ilustrando nossa baixa integração nas cadeias, como resultado dos problemas de competitividade do país. No primeiro indicador, Brasil registrou 19,3% e a média OCDE ficou em 38,2%; no segundo, 12,5% no caso do Brasil e 20,1% na média OCDE. Só no terceiro indicador, o Brasil superou marginalmente a média OCDE: 19,6% contra 18%.
O documento do IEDI “Indústria e o Futuro do Brasil” assinalou os principais desafios a serem enfrentados para que possamos reverter este quadro, como desatar o nó tributário, manter o nível de juros domésticos em linha com o restante do mundo, diversificar fontes de financiamento do investimento, ampliar e renovar nossa infraestrutura, além de estabelecer uma estratégia industrial que modernize o setor e nos prepare para a indústria 4.0.
Ainda que a falta de competitividade pese muito, outros fatores também contribuem para níveis baixos nos indicadores de integração, como o fato de sermos um país continental, rico em riquezas naturais e grande produtor de matérias primas e com um grande mercado doméstico. Tanto é que os valores de nossos indicadores estão em linha com aqueles dos EUA. A média OCDE é puxada para cima, por países menores, por aqueles muito dependentes da importação de alimentos e combustíveis ou por aqueles com clara estratégia exportadora, que receberam nas últimas décadas o “chão de fábrica” de muitas empresas de países desenvolvidos.
Vejamos, com os novos dados da OCDE, como se saiu o Brasil entre 2011 e 2015. Antes, porém, é preciso ter em mente que 2011 foi um ano de forte crescimento do mercado nacional (PIB de +4%) enquanto 2015 foi de crise aberta (PIB de -3,5%), o que pressionou muitas empresas a exportar e outras a substituir por estrangeiros fornecedores nacionais que vieram à falência. Por isso, a evolução favorável de muitos dos indicadores a seguir pode, eventualmente, ser revertida. Vamos aos números:
• Alta de 16,4% para 19,3% da parcela de re-exportação de bens intermediários importados, em relação ao total de bens intermediários importados;
• Alta de 9,7% para 12,5% da parcela do valor adicionado importado nas exportações brutas totais (embora 2016 acuse queda para 10,2%).
• Alta de 13,8% para 16,2% da parcela do valor adicionado importado nas exportações brutas da indústria de transformação, devido a vários setores, sobretudo, veículos, outros equipamentos de transporte, alimentos e bebidas, papel e celulose e têxteis, roupas e calçados.
• Queda de 26,1% para 19,6% da parcela do valor adicionado doméstico nas exportações dos outros países em relação ao total das exportações brutas do Brasil.
• Queda de 21,1% para 15,2% da parcela do valor adicionado doméstico nas exportações dos outros países em relação às exportações brutas do Brasil de bens manufaturados, devido sobretudo a veículos, máquinas e equipamentos, metais básicos e coque e derivados de petroleo.
Cabem dois outros comentários a respeito da evolução das CGV no mundo, que, em função do surgimento de novas tecnologias aplicadas à produção, estão em processo de transformação, como discutido no livro virtual do IEDI “A indústria do futuro no Brasil e no Mundo”. Segundo os dados da OCDE:
1. Aproxidamente 70% do comércio internacional advém de cadeias produtivas globais, mas desde 2011 alguns indicadores mostram redução na fragmentação global da produção, com consideráveis diferenças regionais e setoriais. O índice de encadeamento para trás das CGV, por exemplo, assinalou queda no total da OCDE, devido à evolução nas grandes economias mundiais, como EUA, Japão e China, além de outros países.
2. É crescente a participação dos serviços nas exportações de diferentes países e setores. Na média OCDE, o valor adicionado de serviços incorporados nas exportações brutas totais subiu de 52,4% para 54,8% entre 2011 e 2015. O Brasil não fica atrás, tendo registrado avanço ainda maior, de 41,4% para 48,3%. A exportação de manufaturados é uma importante alavanca deste processo, contendo em 2015, 37,1% de serviços incorporados no caso do Brasil, ou seja, acima dos 32% da média OCDE.
Em um contexto mundial de retomada do protecionismo e de reafirmação das políticas industriais, tecnológicas e de inovação, diante da ascensão de um novo paradigma tecnológico baseado na indústria 4.0, é importante refletir sobre as diferentes possibilidades de inserção nas CGV.
Introdução
Recentemente a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) atualizou o banco de dados TiVA (Trade in Value Added, Comércio em Valor Adicionado), cobrindo 64 países – incluindo todos da OCDE e do G20, para o período de 2000 a 2015, incluindo 36 atividades econômicas (ISIC Rev. 4).
De acordo com a TiVA/OECD, existe uma tendência de arrefecimento na fragmentação global da produção desde 2011, apesar das diferenças regionais e setoriais. Em outro documento, intitulado “Trade policy implications of global value chains” a OCDE, argumenta que alguns dos fatores que explicam essa reversão são o fato da China estar mais voltada ao seu mercado interno, o crescimento dos salários na Ásia, bem como as alterações nas estratégias das firmas relacionadas à economia digital, robotização e servitização. Destaca-se, ainda, a importância dos serviços nas exportações de produtos manufaturados e a queda nos empregos domésticos associados à demanda externa final.
De acordo com a OCDE, atualmente 70% do comércio internacional advém de cadeias produtivas globais. Ou seja, somente 30% das exportações globais de bens finais contém valor adicionado totalmente advindo de um país, o restante depende de trocas internacionais de matérias-primas, partes e componentes, serviços, etc. Portanto, os acordos comerciais e demais medidas associadas ao fluxo internacional de bens, serviços e capitais não podem deixar de levar em conta a forma como se organiza a produção mundialmente.
A seguir, apresentam-se os novos dados da TiVA/ OCDE sobre estas tendências em detalhes, para em seguida analisar a inserção brasileira nas CGV, derivando, enfim, alguns aprendizados para políticas públicas e privadas.
A evolução das cadeias globais de valor no mundo
Três indicadores são comumente utilizados para avaliar a integração do sistema produtivo de um país às cadeias internacionais: (1) a parcela reexportada do total dos bens intermediários importados; (2) encadeamento para trás, que se refere ao valor adicionado importado contido nas exportações brutas de um país; e (3) encadeamento para frente, que se refere ao valor adicionado de um país contido nas exportações do resto do mundo como proporção e suas próprias exportações brutas.
Quanto ao primeiro indicador, embora em valores absolutos as exportações de bens intermediários importados tenha crescido desde a crise financeira internacional até 2014 nos países da OCDE e de fora da OCDE da amostra, incluindo a China, em 2015 houve uma queda significativa. Tomando-se as parcelas de re-exportacao de bens intermediários importados sobre o total de bens intermediários importados, constata-se que o índice permaneceu praticamente estável em torno de 38% nos países da OCDE, mas registrou declínio entre 2011 para 2015 nos países de fora da OCDE, saindo de 35,4% para 32,2%.
Examinando-se os países de cada grupo, contata-se que este indicador varia bastante entre eles, e que não houve uma tendência geral. Economias de maior porte como EUA e Japão possuem indicadores bastante baixos (e que até decresceram, no caso dos EUA, de 2011 para 2015), enquanto outras como China e Alemanha têm indicadores medianos. As economias com maiores indicadores em geral são plataformas de exportação ou “fábricas” de esquemas regionais de integração, como Luxemburgo, Irlanda, Malta, Singapura e Taiwan, no primeiro caso, ou Tailândia, Malásia, Vietnã, Eslováquia, Hungria, República Tcheca, Estônia e México, no segundo.
Por sua vez, a tendência de redução na internacionalização da produção pode ser mais facilmente observada no indicador de encadeamento para trás das CGV, que se refere ao valor adicionado importado contido nas exportações brutas de um país. Neste sentido, as grandes economias mundiais, como EUA, Japão e China (em especial), mas também Argentina, Indonésia e Israel tiveram quedas notáveis no indicador de endadeamento para trás entre 2011 e 2015.
Os indicadores para os países de fora e de dentro da OCDE apresentaram uma variação alta, sendo em geral menores para economias de grande porte e mais voltadas para o mercado interno, e maiores nas economias que atuam como plataforma de exportação ou fábricas de esquemas regionais.
Assim, após ascensão até 2011, o valor adicionado importado nas exportações brutas totais vem caindo consistentemente tanto nos países da OCDE quanto nos de fora, incluindo a China. Vale notar, que os indicadores dos grupos de países e dos países individualmente referente apenas às exportacoes de manufaturas em geral foram mais elevados do que o das exportações totais nos três casos, e também que a queda entre 2011 e 2015 foi ainda mais expressiva.
Deste modo, os EUA apresentaram indicadores para trás nas exportações brutas totais de 12,7% e 9,5% em 2011 e 2015, respectivamente; no caso das manufaturas assinalaram 20,4% e 15,6% nestes anos. A China, registrou 21,7% e 17,3% de valor adicionado importado nas exportações totais em 2011 e 2015, respectivamente, e 23,3% e 18,7% nas de produtos manufaturados.
No que concerne o indicador de encadeamento para frente nas CGV, isto é o valor adicionado por um país (total ou de uma determinada atividade econômica) contido nas exportações de outro país (ou do resto do mundo) como proporção das exportações brutas do primeiro, observou-se uma tendência geral de retração entre 2011 e 2015 somente para os países da OCDE. Já a contribuição do valor adicionado dos países de fora da OECD, em especial da China, nas exportações do resto do mundo em relação ao total exportado aumentou no período.
Observando o indicador para frente por país, nota-se que embora a maioria tenha retraído entre 2011 e 2015, houve diversos movimentos contrários, como no caso de Brunei, Taiwan, Hungria, Eslováquia, Coreia do Sul e Eslovênia. Aqueles que apresentaram os maiores indicadores, entre 25% e 45%, são ou economias de menor porte e especializadas nas exportações de recursos naturais, como Noruega, Chile, Austrália, Brunei, Arábia Saudita e Casaquistão, ou economias grandes que dinamizam o mercado internacional através de suas exportações diversificadas, como Japão, Rússia, Reino Unido, EUA e Alemanha.
Examinando as diferenças entre as indústrias de transformação para os indicadores para frente e para trás das CGV em 2015, salientam-se algumas mais marcantes.
Primeiramente, o setor de coque e petróleo refinado apresentou os maiores indicadores para trás, principalmente nos países da OCDE, devido à necessidade de importação de petróleo cru e matérias-primas para sua produção. Também se verificaram índices altos para algumas indústrias de média-alta e alta tecnologia em certos países, como veículos automotores e carrocerias (acima de 50% na Bélgica, República Tcheca, Portugal, Eslováquia, Bulgária, Vietna), equipamentos elétricos (Estônia, Hungria, Islândia, Eslováquia, Bulgária, Hong Kong, Malásia, Malta, Tailândia, Vietna) e computadores/ eletrônicos e produtos óticos (República Tcheca, Estônia, Hungria, México, Holanda, Eslováquia, Malásia, Malta, Tailândia, Vietna).
Cabe mencionar, também, que alguns países mantém uma certa homogeneidade nos índices para trás a despeito do setor, como no caso dos baixos percentuais de valor adicionado importado nas exportações do Japão, EUA, Argentina, Brasil, Nova Zelândia, Indonésia, Casaquistão, Rússia e até mesmo a China, ou altos percentuais em Estônia, Hungria, Luxemburgo, México, Lituânia, Eslováquia, Eslovênia, Bulgária, Malta, Singapura, Hong Kong, Taiwan, Malásia, Tailândia, Vietnã.
Já no caso dos indicadores de encadeamento para frente, os setores com menores efeitos foram produtos da madeira, papel/ impressão, coque e petróleo refinado, borracha e produtos do plástico, outros produtos não-metálicos. Contudo, alguns países marcaram percentuais altos nestes produtos, como no caso de petróleo na Noruega, Brunei, Rússia, Arábia Saudita, Colômbia, Casaquistão.
Tomando-se outras indústrias, destacam-se os indicadores de Austrália, Peru e Chile para metais básicos; Japão, Coreia do Sul, Filipinas e Taiwan para computadores e eletrônicos; República Tcheca e Eslováquia para veículos automotores.
Os serviços nas cadeias globais
Outro fato enfatizado pela OCDE é maior participação dos serviços nas exportações brutas de diferentes setores de atividade econômica em 2015, de 54,8% na OCDE e 39% nos países de fora da OCDE da amostra, contra 52,4% e 34,1% em 2011, respectivamente. Somente na indústria de transformação, oscilou entre 15% a 55% – sendo que o Brasil está entre aqueles com maior indicador, juntamente com Luxemburgo, Holanda, Noruega, Bélgica, Áustria. Em alguns países, mais da metade do conteúdo de serviços nas exportações de manufaturados eram importados, como Luxemburgo, Bélgica, Irlanda, Hungria, Eslováquia.
Os indicadores de cadeias globais de valor no Brasil
Os novos indicadores de CGV para o Brasil confirmam um cenário geral já conhecido: baixos índices de re-exportação de bens intermediários importados, da participação do conteúdo importado nas exportações domésticas e de conteúdo doméstico nas exportações estrangeiras, em relação tanto aos países desenvolvidos como aos em desenvolvimento.
Contudo, de 2011 a 2015, houve algum progresso desse quadro, já que, à revelia do que se notou na maior parte dos demais países da amostra, no Brasil diversos indicadores apontaram crescimento (com exceção do indicador de encadeamento para frente nas CGV):
• Parcela de re-exportação de bens intermediários importados, em relação ao total de bens intermediários importados: passou de 16,4% para 19,3%.
• Parcela do valor adicionado importado nas exportações brutas totais: subiu de 9,7% para 12,5% (entretanto, em 2016 este indicador apontou uma nova queda, para 10,2%, seguindo a tendência mundial de “menor fragmentação” nas CGV).
• Parcela do valor adicionado importado nas exportações brutas da indústria de transformação: passou de 13,8% para 16,2%.
• Parcela do valor adicionado doméstico nas exportações dos outros países em relação ao total das exportações brutas do Brasil: regrediu de 26,1% para 19,6%.
• Parcela do valor adicionado doméstico nas exportações dos outros países em relação às exportações brutas do Brasil de bens manufaturados: caiu de 21,1% para 15,2%.
• Participação dos serviços no valor bruto total das exportações: progrediu de 41,4% para 48,3% (sendo que parte deste aumento se deveu ao acréscimo nos serviços importados de 3,7% para 6,1%).
• Participação dos serviços no valor bruto das exportações de manufaturados: subiu de 32,7% para 37,1% (sendo que parte desse aumento se deveu ao acréscimo nos serviços importados (de 5% para 7,3%).
O perfil “menos integrado” do Brasil está associado não somente às dificuldades de participação nas CGV, mas também ao grande porte do mercado doméstico e à alta presença de commodities nas exportações. Essas e outras características exigem que a interpretação dos dados de CGV seja cautelosa.
Nesse sentido, ressalta-se também que existem diferenças setoriais importantes que precisam ser consideradas na análise da inserção brasileira nas CGV. Por exemplo, o aumento observado no período de 2011 a 2015 no conteúdo importado das exportações brasileiras esteve associado essencialmente aos setores de veículos automotores e outros equipamentos de transporte. Aliás, em 2015, as indústrias de transformação que apresentaram maior indicador para trás nas CGV foram outros equipamentos de transporte (26,5%), computadores, eletrônicos e produtos óticos (25,2%), coque e petróleo refinado (24, 5%) e veículos automotores (19,6%).
Quanto à composição da parcela do valor adicionado nacional nas exportações de outros países em relação às exportações da indústria de transformação do Brasil (15,2%), em 2015 as maiores contribuições vieram, por ordem de relevância, de metais básicos (2,4%), alimentos (1,9%), veículos automotores e carrocerias (1,7%), químicos e farmacêuticos (1,3%) e máquinas e equipamentos (1,3%).
Embora a parcela de serviços nas exportações brutas do Brasil tenha aumentado consideravelmente desde 2005 até 2015, atingindo 48,3%, este indicador permanece abaixo da média dos países das OCDE (54%). Na indústria de transformação, o valor adicionado de serviços nas exportações, de 37,5%, ficou acima da média da OCDE (32%), contando com variações consideráveis entre suas divisões: 47,6% em computadores, eletrônicos e produtos óticos; 41% em veículos automotores e carrocerias; 40,7% em químicos e farmaceticos. Por outro lado as parcelas de serviços são mais baixas em produtos da madeira 27,5%, metais fabricados 29,2% e até mesmo têxteis, vestuários e couro 30%.
Em publicação sobre os indicadores TiVA do Brasil, a OCDE (Trade in Value added Brazil. Country Notes) destaca ainda que os principais destinos das exportações brasileiras totais, tanto em valores brutos quanto adicionados, em 2015 foram China, EUA, Argentina, Japão e Alemanha, em ordem de importância. Já os países que detinham maior parcela das importações brasileiras foram EUA, China, Holanda, Alemanha e Argentina.
Observando-se a origem do valor adicionado importado das exportações brasileiras em 2015, destacaram-se EUA (2,5%), China (1,4%), Alemanha (0,6%) e Argentina (0,4%). Em especial, na indústria de transformação, EUA chega a deter 3,1%, China 2%, Holanda 1,0% e Alemanha 0,8%. Ou seja, o fato dos EUA serem os principais exportadores para o Brasil encontra ressonância em sua participação no valor adicionado das exportações brasileiras, notadamente nas exportações industriais, seguido cada vez mais de perto pela China.
Reflexões para políticas comerciais
Na realidade de cadeias de valor internacionalizadas, aumentar as exportações necessariamente requer conteúdos importados. As cadeias globais, principalmente das indústrias de transformação, continuam bastante fragmentadas e crescentemente dependente de serviços industriais. Porém, considerando o cenário de desaceleração na internacionalização produtiva por parte principalmente das economias líderes – como EUA, China, Japão – as políticas de comércio precisam ser coerentes às tendências em vigor.
Como salienta a OCDE em documentos tais como “TiVA introductory flyer. The changing nature of international production: Insights from Trade in Value Added and related indicators” (2018) e “Trade policy implications of global value chains” (2018), o desafio começa com a coordenação das tarifas, principalmente em evitar efeitos cascata sobre a cadeia produtiva, passando pelos acordos comerciais estratégicos, pela modernização dos portos e dos controles aduaneiros para aumentar sua eficiência e rapidez nos processos, e também pela melhoria da qualidade da infra-estrutura e da padronização/ certificação dos processos que aumentam a confiabilidade entre fornecedores, clientes e consumidores finais.
Sobre os acordos comerciais, embora a OCDE defenda que se priorize o multilateralismo, alerta que eles devem cobrir suficientemente as diferentes dimensões das cadeias globais de valor, desde tarifas às regras de origem. Os acordos regionais, que aumentaram nos últimos dois anos, estabelecem relações que podem prejudicar trabalhadores dos países envolvidos, de forma que é preciso políticas ara mitigar eventuais efeitos negativos, como desemprego e quedas nos salários reais. O processo de ajuste requer, desse modo, políticas consistentes em relação aos mercados de trabalho e dinâmicas internas de circulação da renda.
No que concerne padronizações e certificações, a OCDE lembra ainda que a complexidade e a heterogeneidade de padrões podem se tornar uma barreira ao comércio, principalmente para exportadores com pequena escala, de forma que seria necessária maior cooperação internacional para se obter convergência sobre tais padrões e aliviar o peso de compliance.
Assim, as discussões atuais sobre como melhorar a inserção do Brasil nas CGV precisam considerar diversos pontos para além da redução de tarifas ou do estabelecimentos de acordos comerciais, principalmente em um momento que as tendências de internacionalização produtiva estão mudando. Assim, é preciso entender as dinâmicas setoriais e as possibilidades de sofisticar as atividades desempenhadas localmente para as cadeias globais – levando-se em conta também as regionais.