Carta IEDI
Desempenho da Indústria e Desafios Futuros
Segundo a Pesquisa Industrial Mensal do IBGE, a indústria eliminou, no mês de setembro de 2020, as perdas provocadas pela pandemia de Covid-19 no bimestre de março-abril. Foram necessários cinco meses de crescimento para que isso ocorresse e nem todos os seus ramos chegaram a este estágio, mas está cumprida esta etapa da recuperação. O importante agora é que o setor não caia em um padrão de baixo crescimento.
Na passagem de agosto para setembro, já descontados os efeitos sazonais, o resultado da indústria foi de +2,6%. Com isso, seu nível de produção passou a estar 0,2% acima daquele de fev/20, isto é, antes do choque da Covid-19. Como tem sido a regra deste maio, a maioria de seus ramos cresceu em set/20: 22 dos 26 acompanhados pelo IBGE, ou 84,6% do total. Apesar disso, uma fração menor destes ramos já superou o tombo de mar-abr/20: 58% do total, sugerindo que o processo de retomada segue incompleto.
Quem melhor tem se saído são os ramos de equipamentos de informática e eletrônicos (18,3% acima de fev/20), fumo (+16,1%), minerais não metálicos (+9,8%), produtos de madeira (+9,5%) e máquinas, aparelhos e materiais elétricos (+9,1%). Nos 42% da indústria ainda com defasagem estão, por exemplo, impressão e reprodução de gravações (32,1% abaixo de fev/20), vestuário (-17,1%) e veículos (-12,8%). Ao menos estes dois últimos lograram taxas mais altas de crescimento em set/20 (+16,5% e +14,1%, com ajuste).
Entre os macrossetores industriais, todos ficaram no azul na passagem de agosto para setembro, com destaque para bens de consumo duráveis, com alta de +10,7%, e bens de capital, com +7%. Ambos, contudo, permaneceram em patamar inferior a fev/20: 2,8% abaixo e 5,5% abaixo, respectivamente. Mantido o ritmo recente de crescimento, esta defasagem será eliminada em breve.
Bens intermediários e bens de consumo semi e não duráveis, encontram-se em melhor situação, pois já voltaram a patamares anteriores ao impacto da pandemia. No primeiro caso, está 3,7% acima do nível de fev/20 e no segundo caso, 0,2% acima. Em set/20 ante ago/20 cresceram 1,3% e 3,7%, respectivamente.
Além do fato de frações importantes da indústria ainda não terem eliminado o gap de mar-abr/20, há um conjunto de outros desafios a serem superados nos próximos meses. É o caso da redução do valor do auxílio emergencial às famílias no último trimestre do ano, mas também o desemprego elevado e o maior endividamento das empresas, bem como a ocorrência de uma segunda onda de contágio em certas partes do mundo, como na Europa, que pode vir a agravar o desempenho negativo de nossas exportações de bens industriais.
Há ainda sinais de fricção ao longo das cadeias com restrição de acesso a alguns insumos nacionais e importados. Isso tem se dado pela reativação da atividade econômica brasileira mais rápida do que se previa no início da pandemia e pela heterogeneidade da evolução do surto de Covid-19 em diversas partes do mundo.
Contribui para este quadro a manutenção de estoques muito baixos, o que se faz necessário diante das exigências de liquidez das empresas. Segundo pesquisa da CNI, em set/20 o nível dos estoques da indústria foi o menor da série e em 92% de seus ramos os empresários os julgaram abaixo do planejado. A expectativa é que, à medida que a pandemia seja controlada e a recuperação econômica vá ganhando mais consistência, os estoques se normalizem e os episódios de escassez de insumos deixem de existir.
Superar todos estes desafios pelo lado da demanda e pelo lado da oferta é fundamental para que a indústria acelere seu crescimento e crie melhores condições de acompanhar o ciclo de modernização pelo qual o setor passa no restante do mundo.
Cabe lembrar que a indústria brasileira tem passado nos últimos seis anos por uma sobreposição de crises, a de 2014-2016 e esta provocada pela Covid-19, intercalada por uma breve e insuficiente recuperação em 2017-2019. Em set/20, o patamar de produção industrial permanecia 16% abaixo do pico anterior a esta fase de adversidades.
Resultados da Indústria
Em setembro de 2020, a produção industrial cresceu +2,6% na comparação com o mês anterior, já descontados os efeitos sazonais, dando continuidade à trajetória positiva iniciada no mês de maio, mas registrando nova desaceleração em comparação com as altas anteriores. Isso é devido a bases de comparação menos deprimidas, o que deixa de ajudar na obtenção de taxas de crescimento mais robustas. Apesar disso, o setor conseguiu superar em 0,2% o nível de produção de fev/20, eliminando o impacto negativo da Covid-19 nos meses de mar-abr/20. Vale mencionar, porém, que a indústria permanece 16% abaixo do pico de produção anterior à crise de 2014-2016.
O resultado da indústria em comparação com o mesmo período do ano anterior foi também positivo em set/20, é a primeira vez que isso ocorre desde outubro de 2019. A alta foi de +3,4%. Cabe observar que set/20 teve o mesmo número de dias úteis do que set/19 (21 dias).
Entretanto, o saldo geral no acumulado de janeiro a setembro de 2020 não escapou do vermelho: -7,2%. A maior parte desta retração está concentrada no segundo trimestre do ano, com resultado de -19,4% frente ao mesmo período do ano passado. No 3º trim/20, houve importante amenização do quadro, com a obtenção de variação de -0,6% nesta mesma comparação.
Já no acumulado dos últimos doze meses findos em set/20, a indústria registrou -5,5%, em uma trajetória desfavorável em que não apresenta uma variação positiva desde mar/19. Set/20 foi o primeiro mês em que este indicador apontou alguma amenização das quedas.
Em relação aos macrossetores, na comparação de setembro com agosto de 2020, descontados os efeitos sazonais, houve recomposição das perdas passadas em todos os quatro macrossetores acompanhados pelo IBGE. A reação mais intensa coube a bens de consumo duráveis, com +10,7%, sendo seguidos por bens de capital (+7%) e bens de consumo semi e não duráveis (+3,7%). Bens intermediários foram o macrossetor que menos cresceu em setembro, registrando apenas +1,3% na série com ajuste.
Na comparação de setembro de 2020 com setembro de 2019, por sua vez, variações positivas marcaram o desempenho de quase todos os macrossetores industriais, acompanhando o total da indústria (+3,4%). O único resultado adverso foi verificado em bens de capital, com -2,0%; foi seu oitavo mês consecutivo de declínio da produção. Em alta, ficaram os bens intermediários, com +5,5%, bens de consumo duráveis, com +2,2%, e bens de consumo semi e não duráveis, com +1,8%.
O declínio interanual de -2,0% em bens de capital derivou, sobretudo, do encolhimento da fabricação de bens de capital para equipamentos de transporte (-15,0%), pressionado, principalmente, pela menor fabricação de aviões e caminhões. Também recuou a produção de bens de capital de uso misto (-5,1%) e para energia elétrica (-3,5%). Impactos positivos foram registrados por bens de capital para fins industriais (+7,5%), agrícolas (+18,2%) e para construção (+6,8%).
O macrossetor de bens intermediários, por sua vez, foi quem melhor se saiu na comparação com set/19, registrando alta de +5,5%, devido principalmente à produção de intermediários alimentícios (+20,6%), de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+13,1%), de produtos de minerais não-metálicos (+9,5%) e de produtos de borracha e de material plástico (+7,4%), entre outros. Em contrapartida, assinalaram variação negativa os intermediários para veículos automotores, reboques e carrocerias (-15,8%), indústrias extrativas (-4,1%) e metalurgia (-2,1%).
Já bens de consumo duráveis, cujo resultado foi de +2,2%, interrompendo sete meses de queda ante o mesmo período do ano anterior, receberam contribuição positiva de eletrodomésticos da “linha marrom” (+33,7%) e da “linha branca” (+31,1%), de motocicletas (+15,6%) e dos grupamentos de móveis (+13,8%) e de outros eletrodomésticos (+24,3%). Registrou queda a fabricação de automóveis (-14,9%).
Quanto a bens de consumo semi e não duráveis, cuja produção aumentou +1,8% em setembro de 2020, em grande parte, pela expansão observada no grupamento de alimentos e bebidas elaborados para consumo doméstico (+4,9%).
No acumulado de janeiro-setembro de 2020, frente a igual período do ano anterior, os bens de consumo duráveis continuam sendo os que pior se saíram: -26,7%. Bens de capital apresentaram a segunda maior queda, com -17,9%, seguidos por bens de consumo semi e não duráveis (-7,6%) e bens intermediários (-3,1%). Todos tiveram perdas muito concentradas no 2º trim/20, que esteve integralmente sob efeito da pandemia de Covid-19.
Por dentro da Indústria de Transformação
O aumento de +2,6% da produção industrial geral em setembro de 2020 ante ago/20, já realizado o ajuste sazonal, foi acompanhado de variação de +3,9% na indústria de transformação e de -3,7% do ramo extrativo.
Em relação a setembro de 2019, tal como a indústria geral (+3,4%), o desempenho da indústria de transformação voltou a ficar positivo, algo que não ocorria desde jan/20. Registrou alta de +4,4%. No caso do ramo extrativo, porém, houve contração de -4,1%.
Frente a ago/20, na série com ajuste sazonal, o acréscimo de +2,6% da indústria geral foi acompanhado por 22 dos 26 ramos pesquisados. As principais influências positivas foram registradas por veículos automotores, reboques e carrocerias (+14,1%), máquinas e equipamentos (+12,6%), confecção de artigos do vestuário e acessórios (+16,5%), couro, artigos para viagem e calçados (+17,1%), produtos alimentícios (+1,2%) e metalurgia (+3,5%), entre outros.
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou crescimento de +3,4% na produção em set/20, variações positivas marcaram o desempenho de 17 dos 26 ramos, 54 dos 79 grupos e 58,0% dos 805 produtos pesquisados. Vale lembrar que setembro de 2020 teve o mesmo número de dias úteis que set/19 (21 dias).
As maiores influências positivas nesta comparação interanual vieram de: produtos alimentícios (+11,1%); coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+7,8%); bebidas (+13,8%); máquinas e equipamentos (+8,1%); equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (+15,4%); e produtos de borracha e de material plástico (+8,6%), entre outros.
Em direção oposta, ainda na comparação com set/19, entre as atividades em queda estão: veículos automotores, reboques e carrocerias (-13,7%); confecção de artigos do vestuário e acessórios (-11,6%), impressão e reprodução de gravações (-39,2%), manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos (-19,8%) e outros equipamentos de transporte (-19,3%), além das indústrias extrativas (-4,1%).
Exportação
Segundo os dados da Funcex, divulgados pelo IBGE conjuntamente com os resultados da produção industrial, o quantum das exportações de manufaturados no mês de setembro de 2020 declinou -25,6%. Desde a segunda metade do ano passado, os resultados têm sido majoritariamente negativos, mas o desempenho recente trouxe um aprofundamento expressivo das perdas. No acumulado dos nove primeiros meses de 2020 há queda de -18,3%
Por sua vez, as importações em quantum de matérias-primas para a indústria caíram -8,9% na comparação com setembro de 2019, na esteira do forte retrocesso da demanda interna, em função da pandemia. Com isso, as importações acumuladas em 2020, que deixaram o terreno positivo no mês de maio, registraram recuo de -7,1% em janeiro-setembro.
Utilização de Capacidade
Depois de o nível de utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, ter despencado com a paralisação de muitas unidades produtivas, para 57,3% em abril de 2020, o desenho de protocolos de segurança sanitária nas empresas, o recurso a programas emergenciais do governo e, mais recentemente, a progressiva flexibilização do isolamento social vêm possibilitando a retomada de atividade, elevando a utilização da capacidade instalada para 78,2% em setembro. Com esta melhora e sua continuidade no mês de outubro (79,8%), o nível de utilização atingiu a média histórica anterior à Covid-19, que é de 79,5%.
Esta trajetória de retomada da utilização da capacidade é verificada também nos dados da CNI. Após atingir o vale de 66,9% em abr/20, progrediu a partir de maio chegando a 79,4% em setembro, já descontados os efeitos sazonais. Ainda assim, neste caso, o indicador continuou abaixo da média histórica do indicador (80,7%) antes do impacto da crise de Covid-19.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, o indicador da evolução dos estoques de produtos finais da indústria em setembro de 2020 caiu -1,6 ponto em relação a agosto, para 44,7 pontos. Por ter continuado abaixo da marca de 50 pontos, voltou a indicar queda de estoques. No caso do segmento da indústria de transformação, o indicador registrou 44,6 pontos (-1,8 ponto frente a ago/20) e na indústria extrativa ficou em 49,4 pontos (+1,4 ponto).
Ou seja, frente à paralisação de unidades e à forte redução da produção em meses anteriores com uma reativação não integral das atividades, parte da demanda das empresas foi suprida por seus estoques sem que fossem restaurados totalmente. Além disso, a necessidade de fazer caixa também concorre para a redução de estoques para níveis inferiores aos normais.
Entretanto, é importante notar que estoques menores em uma etapa de retomada mais rápida que o esperado no início da crise da Covid-19 podem significar para alguns setores restrição no acesso a determinados insumos.
Na avaliação dos empresários, os estoques efetivos da indústria geral ficaram, mais uma vez, abaixo do nível planejado (50 pontos), com um indicador de satisfação em 43,4 pontos em set/20, isto é, redução de -1,8 ponto ante o patamar de agosto. É o patamar mais baixo da série histórica desde jan/10. No caso do setor extrativo e no caso da indústria de transformação, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 50,9 pontos e 43,1 pontos, respectivamente, isto é, pouco acima do planejado no primeiro caso e muito abaixo do nível de equilíbrio (50 pontos) no segundo caso.
No grupo da indústria de transformação, 24 dos 26 ramos acompanhados pela CNI, isto é, 92% do total, tiveram estoques menores do que o planejado (50 pontos) em setembro de 2020. Esta proporção é a mais elevada do ano e os dois ramos restantes ficaram exatamente na linha de equilíbrio. Isso indica um forte espalhamento do processo de redução de estoques. Eventuais repiques de demanda, se não antecipados, podem não encontrar a oferta necessária e provocar pressão nos preços.
Dentre os ramos mais distantes da marca dos 50 pontos, estão: outros equipamentos de transporte (36,4 pontos), bebidas (38,1 pontos), madeira (38,8 pontos), químicos (38,8 pontos), material plástico (39,6 pontos) e produtos de metal (39,7 pontos), entre outros. Os únicos que ficaram com estoques no nível planejado foram: calçados (50 pontos) e manutenção e reparação (50 pontos).
Confiança e Expectativas
O Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI (ICEI), depois de recuar intensamente em abril, para 34,3 pontos, vem dando sinais de melhora desde junho. Em agosto ultrapassou a marca dos 50 pontos, entrando na zona de otimismo ao registrar 57,5 pontos. Em setembro avançou para 62,6 pontos, mas em outubro se estabilizou em 62,0 pontos.
O estado da confiança em outubro de 2020 resultou basicamente de seu componente de expectativas em relação ao futuro, que regrediu de 66,1 pontos em set/20 para 64,7 pontos. Vale notar que o quadro continua de otimismo, mas de forma menos pronunciada do que no mês anterior. A percepção da realidade presente, porém, registrou progresso, com indicador passando de 55,5 pontos em set/20 para 56,7 pontos em outubro. Também neste caso, o quadro é de otimismo, ao permanecer acima a marca dos 50 pontos.
Por sua vez, o Índice de Confiança da Indústria de Transformação (ICI) da FGV, que recuou para apenas 58,2 pontos em abr/20, passou a apresentar alguma recomposição a partir de maio. Em setembro, registrou 106,7 pontos e agora em outubro, 111,2 pontos. Para este indicador é a marca de 100 pontos que indica neutralidade, sendo que abaixo dela temos a região de pessimismo e acima dela, de otimismo. Assim, os empresários industriais mantiveram o estado de otimismo reconquistado em setembro.
Tal resultado foi influenciado por seus dois componentes, mas o progresso mais substancial neste último mês veio das avaliações da situação atual, como reflexo da retomada mais rápida do que o previsto no início da crise de Covid-19. Este componente passou de 107,3 pontos em setembro para 113,7 pontos em outubro, dando sinalização favorável para a evolução da produção industrial neste mês. Já as expectativas sobre o futuro também avançaram, ao passar de 105,9 pontos em setembro para 108,5 pontos em outubro.
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Este indicador, que declinou para um nível inferior a 40 pontos em abr-mai/20, voltou a ficar acima dos 50 pontos desde então, indicando melhora das condições de negócio nestes últimos meses. Em setembro, registrou 64,9 pontos e avançou para 66,7 pontos em outubro. É o quinto mês seguido acima da marca de 50 pontos e, por isso, o quadro geral apontado pelo indicador sugere clara reação na segunda metade do ano.
Anexo Estatístico
Mais Informações
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)