Carta IEDI
Indústria na reta final de 2020
Depois de liderar a retomada do PIB no 3º trim/20, a indústria manteve trajetória de crescimento na entrada do último quarto 2020, segundo os dados mensais mais recentes do IBGE para a produção industrial, o que tem justificado um resgate da confiança dos empresários do setor. A continuidade deste processo é importante pois a indústria ainda está longe de voltar a ser o que era antes da crise de 2015/2016.
A contar pelo resultado de outubro, entretanto, o setor pode passar por alguma acomodação na virada do ano, já refletindo, entre outros fatores, a redução do auxílio emergencial às famílias. Em out/20, a produção da indústria geral cresceu +1,1% ante set/20, já com ajuste sazonal. Ou seja, neste sexto mês de recuperação, o ritmo de crescimento foi reduzido pela metade em comparação com o mês anterior.
Alguma desaceleração era esperada, já que as bases de comparação estão ficando maiores, mas o fato de 42% dos ramos da indústria ainda estarem aquém dos níveis de produção pré-crise sugere que este comportamento pode ser precoce, caso se mantenha nos próximos meses.
O mês de out/20 também foi a primeira vez que nem todos os macrossetores industriais conseguiram registrar aumento de produção. Metade deles ficou no vermelho, ainda que muito próximo da linha da estabilidade. Entre os 26 ramos acompanhados pelo IBGE, 11 não cresceram com relação a set/20.
Com resultados desfavoráveis ficaram bens intermediários (-0,2%), que compreendem o núcleo do sistema industrial, produzindo insumos e componentes para as demais atividades, e bens de consumo semi e não duráveis (-0,1%), que tendem a reunir ramos mais intensivos em mão de obra e mais bem distribuídos no território nacional.
O macrossetor de bens semi e não duráveis foi bastante influenciado pelas quedas nos ramos de bebidas (-0,3%), alimentos (-2,8%) e perfumaria, sabões e produtos de limpeza (-4,2%), catalisando, além da redução do auxílio emergencial, o aumento de preços em alguns destes produtos, sobretudo de alimentos. Com isso, o macrossetor como um todo ficou praticamente no mesmo nível de fev/20 (-0,1%), isto é, anterior ao choque da Covid-19.
Em bens intermediários, a virtual estabilidade em out/20 veio em um contexto em que sua produção já havia superado os níveis pré-pandemia (+3,0% ante fev/20) e há quatro meses encontrava-se em patamares superiores ao de mesmo período de 2019. Frente a out/19, registrou +3,2%.
De fato, é em muitos ramos de intermediários que se verificam os recentes gargalos nas cadeias produtivas, decorrentes do desalinhamento entre as expectativas das empresas e a evolução efetiva de seus mercados. Isso foi agravado pela existência de níveis baixos de estoques, que reduziram a resiliência das cadeias. Entre os ramos com menores estoques estão têxteis, produtos de metal, material plástico e minerais não metálicos. Segundo dados da CNI, 92% dos ramos industriais estão com estoques abaixo do planejado.
Entre os macrossetores com aumento de produção na passagem de set/20 para out/20, bens de consumo duráveis registraram +1,4%, já descontados os efeitos sazonais, mas isso implicou importante perda de ritmo, já que havia crescido mais de +9% tanto em ago/20 como em set/20. Cabe enfatizar que esta fração da indústria ainda não voltou ao pré-crise, estando 4,2% abaixo de fev/20.
Bens de capital, por sua vez, conseguiram manter o padrão recente de crescimento, ao obter +7% na série com ajuste sazonal. Com isso, ficaram 3,5% acima do patamar pré-crise. Seu desempenho também foi positivo (+2,1%) em comparação com out/19, a despeito do efeito calendário adverso (out/20 tem 2 dias úteis a menos que out/19). Bons resultados vieram de bens de capital para a própria indústria, para construção e para agricultura.
Assim, a edição mais recente do Boletim Focus do Banco Central, com expectativas coletadas no dia 04/12, indica uma retração de -5% da produção industrial em 2020 como um todo. Caso venha a se realizar, este desempenho só não será pior do que aquele de 2015 (-8,3%) e 2016 (-6,4%). Para o PIB da indústria, a projeção recente é de -3,9% ante -3,4% no final de novembro, o que interrompeu uma sequência de sucessivas melhoras desde início de ago/20.
Resultados da Indústria
Em outubro de 2020, a produção industrial cresceu +1,1% na comparação com o mês anterior, já descontados os efeitos sazonais, dando continuidade à trajetória positiva iniciada no mês de maio, mas registrando nova desaceleração em comparação com as altas anteriores. Isso é devido a bases de comparação menos deprimidas, o que deixa de ajudar na obtenção de taxas de crescimento mais robustas, mas também pode estar representando obstáculos a um dinamismo mais robusto.
Apesar disso, o setor conseguiu superar em 1,4% o nível de produção de fev/20, sobrepujando o impacto negativo da Covid-19 nos meses de mar-abr/20. Vale mencionar, porém, que a indústria permanece 15% abaixo do pico de produção anterior à crise de 2014-2016.
A indústria também evitou o terreno negativo na comparação com o mesmo período do ano anterior, embora não tenha exatamente conseguido crescer, ao registrar variação de apenas +0,3% em out/20. Cabe observar que no presente ano outubro (21 dias) teve dois dias úteis a menos do que em 2019 (23 dias). De todo modo, foi a segunda vez seguida que não caiu nesta comparação no contexto na pandemia; em set/20 havia crescido +3,7%.
O saldo geral no acumulado de janeiro a outubro de 2020, contudo, permaneceu no vermelho, em -6,3%, embora o nível de queda venha se reduzindo. A maior parte desta retração está concentrada no segundo trimestre do ano, com resultado de -19,4% frente ao mesmo período do ano passado.
Já no acumulado dos últimos doze meses findos em out/20, a indústria registrou -5,6%, em uma trajetória desfavorável em que não apresenta uma variação positiva desde mar/19. Este indicador tem oscilado em torno deste patamar desde jun/20.
Em relação aos macrossetores, na comparação de outubro com setembro de 2020, descontados os efeitos sazonais, houve crescimento em metade dos quatro macrossetores acompanhados pelo IBGE. A reação mais intensa coube a bens de capital, com +7%, sendo seguidos por bens de consumo duráveis, com+1,4%. Registraram variações negativas, embora muito próximas da linha da estabilidade, os bens de consumo semi e não duráveis (-0,1%) e bens intermediários (-0,2%).
Na comparação de outubro de 2020 com outubro de 2019, por sua vez, variações positivas marcaram igualmente o desempenho de metade dos macrossetores industriais. Enquanto o total da indústria pouco cresceu (+0,3%) nesta comparação, bens de capital e bens intermediários conseguiram apresentar dinamismo superior: +2,1% e +3,2%, respectivamente. Registraram perdas bens de consumo duráveis (-8,3%) e bens de consumo semi e não duráveis (-3,4%).
O macrossetor de bens intermediários foi quem melhor se saiu na comparação com out/19, registrando alta de +3,2%, devido principalmente à produção de intermediários de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+17,7%), de produtos alimentícios (+7,9%), de produtos de minerais não-metálicos (+9,8%), de produtos de borracha e de material plástico (+7,2%) e de produtos de metal (+7,5%), entre outros. As principais pressões negativas vieram de indústrias extrativas (-6,0%), veículos automotores, reboques e carrocerias (-18,1%) e outros produtos químicos (-1,6%).
O aumento interanual de +2,1% na produção de bens de capital derivou, sobretudo, do crescimento da fabricação de bens de capital agrícolas (+27,9%), para fins industriais (+4,9%) e para construção (+6,4%). Por outro lado, o grupamento de equipamentos de transporte (-7,9%) apontou o principal impacto negativo, pressionado, principalmente, pela menor fabricação de aviões. As demais taxas negativas vieram de bens de capital para energia elétrica (-5,1%) e de uso misto (-1,1%).
Já bens de consumo semi e não duráveis, cujo resultado foi de -3,2%, receberam contribuição negativa dos grupamentos de carburantes (-12,6%), pressionado pela menor produção de álcool etílico e gasolina automotiva, de semiduráveis (-3,2%), de não-duráveis (-2,5%) e de alimentos e bebidas elaborados para consumo doméstico (-1,1).
Quanto a bens de consumo duráveis, sua produção caiu -8,3% em out/20, em grande parte, devido à retração observada na fabricação de automóveis (-22,1%) e de motocicletas (-14,3%). Em sentido oposto, os impactos positivos vieram de eletrodomésticos da “linha marrom” (+19,4%) e da “linha branca” (+17,0%) e dos grupamentos de móveis (+7,6%) e de outros eletrodomésticos (+3,6%).
No acumulado de janeiro-outubro de 2020, frente a igual período do ano anterior, os bens de consumo duráveis continuam sendo os que pior se saíram: -24,6%. Bens de capital apresentaram a segunda maior queda, com -15,6%, seguidos por bens de consumo semi e não duráveis (-7,1%) e bens intermediários (-2,4%). Todos tiveram perdas muito concentradas no 2º trim/20, que esteve integralmente sob efeito da pandemia de Covid-19.
Por dentro da Indústria de Transformação
O aumento de +1,1% da produção industrial geral em outubro de 2020 ante set/20, já realizado o ajuste sazonal, foi acompanhado de variação de +1,2% na indústria de transformação e de -2,4% do ramo extrativo.
Em relação a outubro de 2019, tal como a indústria geral (+0,3%), o desempenho da indústria de transformação voltou a ficar positivo, tal como ocorrera em set/20. Registrou alta de +1,1%, isto é, superior ao total do setor. No caso do ramo extrativo, porém, houve contração de -6,0%, mais intensa do que no mês anterior.
Frente a set/20, na série com ajuste sazonal, o acréscimo de +1,1% da indústria geral foi acompanhado por 15 dos 26 ramos pesquisados. As principais influências positivas foram registradas por veículos automotores, reboques e carrocerias (+4,7%), metalurgia (+3,1%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (+4,5%), máquinas e equipamentos (+2,2%), produtos de metal (+2,8%), couro, artigos para viagem e calçados (+5,7%) e produtos de minerais não-metálicos (+2,3%), entre outros.
Entre os ramos no vermelho, destacaram-se produtos alimentícios (-2,8%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-1,2%), produtos do fumo (-18,7%) e outros produtos químicos (-2,3%), além do ramo extrativo.
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou variação de +0,3% na produção em out/20, variações positivas marcaram o desempenho de 16 dos 26 ramos, 45 dos 79 grupos e 50,8% dos 805 produtos pesquisados. Vale lembrar que out/20 (21 dias) teve dois dias úteis a menos do que igual mês do ano anterior (23 dias).
As maiores influências positivas nesta comparação interanual vieram de: coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+7,2%), máquinas e equipamentos (+9,4%), bebidas (+9,9%), produtos de minerais não-metálicos (+9,8%), borracha e de material plástico (+8,4%) e produtos de metal (+8,2%), entre outros.
Em direção oposta, ainda na comparação com out/19, ficaram no vermelho: veículos automotores, reboques e carrocerias (-14,6%), outros equipamentos de transporte (-33,0%), impressão e reprodução de gravações (-36,7%), manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos (-15,9%) e confecção de artigos do vestuário e acessórios (-8,1%).
Exportação
Segundo os dados da Funcex, divulgados pelo IBGE conjuntamente com os resultados da produção industrial, o quantum das exportações de manufaturados no mês de outubro de 2020 declinou -8,8%. Desde a segunda metade do ano passado, os resultados têm sido majoritariamente negativos, mas a pandemia trouxe um aprofundamento expressivo das perdas. Outubro trouxe a primeira amenização deste quadro recente. No acumulado dos dez meses de 2020 há queda de -17,4%.
Por sua vez, as importações em quantum de matérias-primas para a indústria recuaram -21,4% na comparação com outubro de 2019, na esteira do retrocesso da demanda interna, em função da pandemia, e da desvalorização da taxa de câmbio. Com isso, as importações acumuladas em 2020, que deixaram o terreno positivo no mês de maio, registraram recuo de -8,9% em janeiro-outubro.
Utilização de Capacidade
Depois de o nível de utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, ter despencado com a paralisação de muitas unidades produtivas, para 57,3% em abril de 2020, o desenho de protocolos de segurança sanitária nas empresas, o recurso a programas emergenciais do governo e, mais recentemente, a progressiva flexibilização do isolamento social vêm possibilitando a retomada de atividade, elevando a utilização da capacidade instalada para 79,8% em outubro. Com esta melhora e sua manutenção no mês de novembro (79,7%), o nível de utilização atingiu a média histórica anterior à Covid-19, que é de 79,5%.
Esta trajetória de retomada da utilização da capacidade é verificada também nos dados da CNI. Após atingir o vale de 66,9% em abr/20, progrediu a partir de maio chegando a 80,3% em outubro, já descontados os efeitos sazonais. Assim, neste caso, o indicador voltou a se aproximar muito da média histórica do indicador (80,7%) antes do impacto da crise de Covid-19.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, o indicador da evolução dos estoques de produtos finais da indústria em outubro de 2020 subiu 0,8 ponto em relação a setembro, para 45,5 pontos, mas permaneceu inferior ao patamar de agosto. Por ainda estar abaixo da marca de 50 pontos, o indicador continua sugerindo estoques em queda, embora menos pronunciada que no mês anterior. No caso do segmento da indústria de transformação, o indicador também registrou 45,5 pontos (+0,9 ponto frente a set/20) e na indústria extrativa ficou em 43,7 pontos (-5,7 pontos).
Ou seja, frente à paralisação de unidades e à forte redução da produção em meses anteriores com uma reativação não integral das atividades, parte da demanda das empresas foi suprida por seus estoques sem que fossem restaurados totalmente. A necessidade de fazer caixa também concorreu para a redução de estoques. Este quadro aumentou a vulnerabilidade das cadeias a repiques inesperados de comandas, gerando gargalos em diversos elos e, consequentemente, aumento de preços em alguns insumos.
Na avaliação dos empresários, os estoques efetivos da indústria geral ficaram, mais uma vez, abaixo do nível planejado (50 pontos), com um indicador de satisfação em 43,3 pontos em out/20, isto é, mesmo patamar de set/20 e redução de -6,3 pontos em relação ao patamar pré-crise (fev/20). Este é o nível mais baixo da série histórica desde jan/10. No caso do setor extrativo e no caso da indústria de transformação, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 47,6 pontos e 43,1 pontos, respectivamente, isto é, ambos abaixo do nível de equilíbrio (50 pontos), mas de modo mais intenso no segundo caso.
No grupo da indústria de transformação, 24 dos 26 ramos acompanhados pela CNI, isto é, 92% do total, tiveram estoques menores do que o planejado (50 pontos) em out/20, mesma fração verificada no mês de set/20. É a proporção mais elevada do ano e os dois ramos restantes ficaram exatamente na linha de equilíbrio. Isso indica um forte espalhamento do processo de redução de estoques. Como dito anteriormente, este quadro faz com que eventuais aumentos de demanda, se não antecipados, não encontrem a oferta necessária, provocando pressão nos preços de atacado.
Dentre os ramos mais distantes da marca dos 50 pontos, estão: outros equipamentos de transporte (35,4 pontos), veículos (37,2 pontos), têxteis (37,8 pontos), máquinas e equipamentos (38,2 pontos) e produtos de metal (38,5 pontos), entre outros. Os únicos que ficaram com estoques no nível planejado foram: calçados (50 pontos) e manutenção e reparação (50 pontos).
Confiança e Expectativas
O Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI (ICEI), depois de recuar intensamente em abril, para 34,3 pontos, vem dando sinais de melhora desde junho. Em agosto ultrapassou a marca dos 50 pontos, entrando na zona de otimismo ao registrar 57,5 pontos. Em novembro atingiu 63 pontos, abrindo perspectivas favoráveis para os próximos meses.
O estado da confiança em novembro de 2020 resultou menos de seu componente de expectativas em relação ao futuro, que de 64,7 pontos em out/20 variou para 64,8%, estancando a clara trajetória de melhora a partir de jun/20. O quadro continua de otimismo, mas de forma menos pronunciada do que no mês de set/20 (66,1 pontos). A percepção da realidade presente, porém, registrou progresso, com o indicador passando de 56,7 pontos em out/20 para 59,5 pontos em nov/20. Também neste caso, o quadro é de otimismo, ao permanecer acima a marca dos 50 pontos.
Por sua vez, o Índice de Confiança da Indústria de Transformação (ICI) da FGV, que recuou para apenas 58,2 pontos em abr/20, passou a apresentar alguma recomposição a partir de maio. Em novembro atingiu 113,1 pontos. Para este indicador é a marca de 100 pontos que indica neutralidade, sendo que abaixo dela temos a região de pessimismo e acima dela, de otimismo. Assim, os empresários industriais mantiveram o estado de otimismo reconquistado em setembro.
Tal resultado, assim como no indicador da CNI, foi influenciado pelas avaliações da situação atual, que viram progresso neste último mês, como reflexo da retomada mais rápida do que o previsto no início da crise de Covid-19. Este componente passou de 113,7 pontos em outubro para 118,2 pontos em novembro, dando sinalização favorável para a evolução da produção industrial neste mês. Já as expectativas sobre o futuro retrocederam, ao passar de 108,8 pontos para 107,9 pontos no mesmo período. Mesmo assim, continuaram na região de otimismo.
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Este indicador, que declinou para um nível inferior a 40 pontos em abr-mai/20, voltou a ficar acima dos 50 pontos desde então, indicando melhora das condições de negócio nestes últimos meses. Em novembro, registrou 64,0 pontos, trazendo alguma acomodação frete a outubro. É o sexto mês seguido acima da marca de 50 pontos e, por isso, o quadro geral apontado pelo indicador sugere clara reação na segunda metade do ano.
Anexo Estatístico
Mais Informações
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)