Carta IEDI
A indústria na virada de 2021-2022
Desde o início do ano passado a indústria brasileira não consegue apresentar sequer dois meses seguidos de expansão da sua produção. Cada passo adiante é sucedido por novas perdas, distanciando-a cada vez mais do patamar em que se encontrava antes do choque provocado pela Covid-19 no país. 2022 começou nesta mesma toada.
Em jan/22, já descontados os efeitos sazonais, a indústria geral teve queda de -2,4% em sua produção, anulando a maior parte do crescimento de dez/21 (+2,9%), que havia surpreendido por sua intensidade. Como resultado, o setor voltou a ficar 3,5% abaixo do pré-pandemia, isto é, do nível de produção de fev/20.
Frente a jan/21, o retrocesso se manteve: -7,2%, que consiste no sexto mês seguido no vermelho e um agravamento em comparação com a intensidade da queda do último trimestre de 2021 (-5,8%). Ou seja, sem indícios de reação.
Como resultado, isso vem minando o estado da confiança dos empresários do setor. O indicador da FGV permaneceu na região de pessimismo tanto em jan/22 como em fev/22, atingindo neste mês o nível mais baixo desde jul/20. Neste mesmo quadro se encontra o índice da CNI quanto à avaliação dos empresários das condições atuais de mercado, que voltou a ficar abaixo dos 50 pontos em fev/22.
Sinais negativos também marcaram a maioria dos ramos industriais em jan/22. Segundo o IBGE, dos 26 ramos pesquisados, 20 registraram queda frente a dez/21, com ajuste sazonal, o equivalente a uma parcela de 77% do total. Quanto a seus macrossetores, nenhum escapou de ficar no vermelho.
A maior perda foi em bens de consumo duráveis (-11,5% ante dez/21 com ajuste), anulando as variações positivas de nov/21 e dez/21 e registrando o patamar mais baixo desde jun/20. Muito disso deveu-se à indústria automobilística, particularmente afetada por gargalos nas cadeias de fornecedores.
Entre dez/21 e jan/22 a produção de veículos caiu -17,5%, já descontados os efeitos sazonais. Outros ramos de duráveis, que viram elevação de estoques no final do ano passado, também pisaram forte no freio: -4,5% em informática e eletrônicos e -5,0% em móveis, por exemplo. Todos estes são produtos cujos mercados sentem mais a elevação recente das taxas de juros, em função do combate à inflação realizado pelo Banco Central.
Bens de capital, que também são muito prejudicados por níveis maiores de juros, assim como pelo maior grau de incerteza, que na entrada de 2022, entre outros fatores, contou com o surto da variante ômicron, registraram um declínio da produção de -5,6% em jan/22, com ajuste. Neste caso, assim como em bens de consumo duráveis, caíram mais do que o suficiente para compensar a alta de dez/21.
O macrossetor de bens intermediários, por sua vez, depois de crescer +1,4% no último mês do ano passado, recuou -1,9% agora em jan/22, retomando uma longa sequência de variações negativas que havia sido interrompida em nov-dez/21.
Bens de consumo semi e não duráveis foram os que menos perderam produção: -0,5% em jan/22, resguardando um pouco da expansão obtida em dez/21 (+1,5%). Produtos farmacêuticos e farmoquímicos (-5,4%) e bebidas (-4,5%) foram dois de seus ramos com resultados bastante negativos nesta entrada de ano.
Resultados da Indústria
Em janeiro de 2022, a produção industrial assinalou declínio de -2,4% frente ao mês anterior, já descontados os efeitos sazonais. Com isso, voltou à trajetória que assumiu ao longo da maior parte de 2021, quando na comparação com ajuste sazonal, só cresceu em três meses. Frente ao nível de produção pré-pandemia, isto é, de fev/20, o setor industrial manteve defasagem, de -3,5% agora em jan/22.
Em comparação com um ano antes, as variações têm sido negativas desde ago/21 e isso incluiu o mês de jan/22, quando a produção industrial recuou -7,2% ante jan/21. Este foi seu pior resultado desde out/21 e agravou, assim, a queda de -5,8% no acumulado do último trimestre do ano passado, o que indica claramente uma deterioração do desempenho da indústria na virada do ano.
Quanto às grandes categorias industriais, na comparação entre jan/22 e dez/21, na série com ajuste sazonal, houve variação negativa em todos os macrossetores. Bens de consumo duráveis foi o que menos cresceu: -11,5%, anulando os avanços dos meses anteriores (+2,0% em nov/21 e +7,5% em dez/21). Retomou, assim, a longa série de declínio que marcou a maior parte de 2021.
Os bens de capital, desta vez, também não resistiram e tiveram queda de -5,6% ante dez/21, o segundo pior resultado na comparação com ajuste sazonal de jan/22, anulando o avanço mais forte que havia registrado em dez/21 (+5,4%).
Bens intermediários (-1,9%) e bens de consumo semi e não duráveis (-0,5%) perderam menos produção neste início de ano, mas no primeiro caso foi o suficiente para compensar o crescimento de dez/21.
Com esta evolução recente, três dos quatro macrossetores industriais voltaram a patamares de produção inferiores ao pré-pandemia, isto é, abaixo de fev/20: -26,4% no caso de bens de consumo duráveis, -7,0% no caso de bens de consumo semi e não duráveis e -1,8% no caso de bens intermediários. A única exceção continua sendo bens de capital, que em jan/22 ficaram 12,2% acima de fev/20.
Já frente o mesmo mês do ano anterior (jan/21), pela primeira vez depois de muitos meses, todos os macrossetores ficaram no vermelho. Bens de capital, cuja produção progrediu em todos os meses de 2021 na comparação interanual, assinalaram -8,1% em jan/22. As maiores quedas, contudo, mais uma vez ficaram a cargo de bens de consumo: -25,8% no caso de duráveis e -8,4% no caso de semi e não duráveis. Já bens intermediários registraram sua sexta variação negativa consecutiva: -5,0%.
O macrossetor de bens de consumo duráveis, que registrou recuo de -25,8% ante jan/21, foi negativamente influenciado sobretudo pela redução na fabricação de automóveis (-29,8%) e de eletrodomésticos da “linha branca” (-28,1%) e da “linha marrom” (-20,1%), mas também de outros eletrodomésticos (-29,9%) e móveis (-41,6%). Em oposição, o principal impacto positivo veio da produção de motocicletas (+56,9%).
Ainda no confronto com igual mês do ano anterior, a queda de bens de consumo semi e não duráveis (-8,4%), muito influenciada por semiduráveis (-24,3%), foi pressionada, em grande parte, pela menor fabricação de calçados e roupas, e pelo grupamento de não-duráveis (-13,6%). Do lado positivo, o grupamento de carburantes cresceu +12,1%, impulsionado, pela maior fabricação de gasolina automotiva.
Já o declínio de -8,1% da produção de bens de capital frente a jan/21, foi explicado, principalmente, pela redução observada nos grupamentos de bens de capital para equipamentos de transporte (-17,7%) e para fins industriais (-12,5%). Os impactos positivos foram assinalados por bens de capital de uso misto (+9,1%), para energia elétrica (+15,2%), agrícolas (+8,8%) e para construção (+4,6%).
Por fim, os bens intermediários, cuja produção encolheu -5,0% entre jan/21 e jan/22, foram negativamente impactados pela evolução das atividades associadas a indústrias extrativas (-6,7%), veículos automotores, reboques e carrocerias (-17,5%), borracha e plástico (-18,0%), produtos de metal (-18,1%), metalurgia (-6,8%), produtos têxteis (-26,0%), produtos de minerais não-metálicos (-6,2%), insumos típicos para construção civil (-10,8%) e de embalagens (-14,8%), entre outros. As influências positivas ficaram a cargo de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+9,5%), produtos alimentícios (+5,9%) e celulose, papel e produtos de papel (+0,4%).
No acumulado em doze meses de 2021, que em jun/21 registrava alta de +6,6% na indústria geral, refluiu para um crescimento de +3,1% em jan/22. Desacelerações importantes nesta comparação vieram de bens de consumo duráveis (de +11,4% em jun/21 para 0% em jan/22) e bens intermediários (+7,2% e +2,6%, respectivamente). Já bens de consumo semi e não duráveis deixaram o terreno positivo, passando de +1,3% em jun/21 para -1,0% em jan/22. Em direção oposta, dada a “memória” que esta comparação traz, bens de capital registraram +20,2% em jun/21 e +25,5% em jan/22.
Por dentro da Indústria de Transformação
A queda de -2,4% da produção industrial geral em jan/22 ante dez/21, na série livre dos efeitos sazonais, foi acompanhada de variação de -2,2% na indústria de transformação e de -5,2% no ramo extrativo. Dessa forma, a indústria de transformação ainda se encontra 3% abaixo do nível de produção pré-pandemia, isto é, de fev/20.
Em relação a jan/21, tal como a indústria geral (-7,2%), o desempenho da indústria de transformação também foi negativo: -7,3%. No caso do ramo extrativo, o recuo foi um pouco menos intenso, de -6,7%.
Frente a dez/21, na série com ajuste sazonal, o resultado de -2,4% da indústria geral teve influência negativa de 20 dos 26 ramos pesquisados. Dentre as principais contribuições para este desempenho ficaram os seguintes setores da indústria de transformação: veículos automotores, reboques e carrocerias (-17,4%), bebidas (-4,5%), metalurgia (-2,8%), outros produtos químicos (-2,2%), máquinas e equipamentos (-2,3%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (-5,4%) e produtos de metal, entre outros. Já entre as contribuições positivas, que amenizaram as perdas gerais, estão: coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+3,5%) e produtos alimentícios (+1,4%).
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou queda de -7,2% na produção em jan/22, variações negativas marcaram o desempenho de 18 dos 26 ramos, 56 dos 79 grupos e 67,0% dos 805 produtos pesquisados.
As maiores influências negativas nesta comparação interanual vieram das seguintes atividades da indústria de transformação: veículos automotores, reboques e carrocerias (-23,5%), borracha e plástico (-18,8%), produtos de metal (-20,8%), móveis (-33,0%), produtos têxteis (-26,7%), couro, artigos para viagem e calçados (-22,6%) e confecção de artigos do vestuário e acessórios (-22,2%), entre outros. Em contrapartida, entre os oito setores da indústria de transformação que apontaram expansão na produção na comparação interanual, destacou-se coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+10,0%).
Exportação
Segundo os dados da Funcex, divulgados pelo IBGE juntamente com os resultados da produção industrial, o quantum das exportações de manufaturados no mês de jan/22 cresceu +17,6% ante jan/21. Por sua vez, as importações em quantum de matérias-primas para a indústria recuaram -6,9% na mesma comparação, sua primeira taxa negativa depois de out/20.
Utilização de Capacidade
Em jan/22, a utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, voltou ao nível de nov/21, depois do recuo apresentado no último mês de 2021. Ficou em 80,7% ante 79,7% em dez/21. Assim, superou a média histórica anterior à Covid-19 (79,5%), mas manteve-se abaixo do patamar imediatamente anterior à crise de 2014-2016, que era de 82,6% no 1º trim/14. Em fev/22 este indicador declinou para 79,9%.
Já pesquisa da CNI, mostra que a utilização da capacidade instalada da indústria de transformação de jan/22 deu continuidade à rota descendente que vem apresentando desde a entrada da segunda metade de 2021. Atingiu 79,1%, após ajuste sazonal. Em relação a jun/21, registrou declínio de -3,2 pontos percentuais. De todo modo, continua se mostrando em nível persistentemente superior ao observado antes da crise da Covid-19 (78% em fev/20), embora o adicional venha se reduzindo. Em relação a jan/21, o declínio foi de 1,0 ponto percentual.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, o indicador da evolução dos estoques de produtos finais da indústria total em jan/22 voltou a ficar abaixo da linha de 50 pontos, em 49,4 pontos, indicando redução dos estoques.
No caso do segmento da indústria de transformação, o indicador da CNI registrou 49,5 pontos (+0,2 ponto frente a dez/21), apontando queda dos estoques, assim como na indústria extrativa, que ficou em 48,0 pontos (+5,0 pontos ante dez/21).
Para a indústria geral, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 49,9 pontos, indicando relativo equilíbrio em jan/22. Vale lembrar que o equilíbrio é indicado pela marca de 50 pontos, acima da qual há excesso de estoques e abaixo dela, estoques menores do que o desejado. No caso do setor extrativo e no caso da indústria de transformação, o indicador de satisfação iniciou 2022 em 52,5 pontos e 49,8 pontos, respectivamente.
No grupo da indústria de transformação, a situação dos estoques se tornou mais confortável ao longo de 2021, mas o problema de estoques considerados abaixo do planejado continua difundido para um amplo conjunto de ramos.
Depois de praticamente todos os ramos industriais apresentarem estoques menores do que o planejado (abaixo de 50 pontos) em dez/20 (96% do total), em dez/21 a insatisfação quando ao nível dos estoques manteve-se presente em 58%, progredindo para 61,5% do total de ramos, o que equivale a 16 dos 26 ramos acompanhados pela CNI com índices abaixo dos 50 pontos.
Entre os poucos ramos iguais ou acima de 50 pontos destacam-se: móveis (60,8 pontos), informática, eletrônicos e ópticos (52,6 pontos) e bebidas (52,0). Ficaram mais distantes do equilíbrio os seguintes ramos: impressão e reprodução (42,2 pontos), produtos diversos (43,6 pontos) e farmacêuticos (44,3 pontos).
Confiança e Expectativas
O Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI, após ter atingido em nov/21 (56,1 pontos) o menor valor desde abr/21 (54,6 pontos), pouco variou desde então: 56,9 pontos em dez/21, 56,4 pontos em jan/22 e 56,3 pontos em fev/22. Ou seja, sem grande mudança de quadro na entrada do presente ano. Por ter ficado acima de 50 pontos neste período, o indicador aponta otimismo dos empresários do setor, mas bem menos do que indicava no final de 2020 (63,3 pontos em dez/20).
Na passagem de jan/22 para fev/22, o componente referente às expectativas em relação ao futuro registrou pequena melhora, passando de 59,6 pontos para 60 pontos. Já o componente que capta a percepção dos empresários quanto à evolução presente dos negócios recuou e ficou abaixo da marca de 50 pontos, denotando pessimismo dos empresários do setor. De 50 pontos em jan/22 foi a 48,9 pontos em fev/22. O indicativo recente é, então, de mais um mês de dificuldades para a produção em fevereiro próximo.
O Índice de Confiança da Indústria de Transformação (ICI) da FGV aponta de forma mais nítida uma deterioração da confiança na entrada de 2022. Deu continuidade ao movimento descendente já verificado desde ago/21 e ficou em 96,7 pontos em fev/22, o patamar mais baixo desde jul/20. Por ter ficado abaixo da marca dos 100 pontos, indica perda de confiança dos empresários.
O resultado em fev/22 foi influenciado por seus dois componentes, mas principalmente pelas expectativas em relação ao futuro, que passou de 97,1 pontos em jan/22 para 94,9 pontos em fev/22, mantendo-se fora da região de otimismo (acima de 100 pontos). Já a avaliação da situação atual recuou de 99,8 pontos em jan/22 para 98,5 pontos em fev/22, o nível mais baixo também desde meados de 2020.
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Pelo quarto mês consecutivo este indicador ficou abaixo dos 50 pontos em fev/22. Apesar disso, registrou alguma melhora ao passar de 47,8 pontos em janeiro para 49,6 pontos.
Anexo Estatístico
Mais Informações
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)